Nanci Oddone
Doutora em ciência da informação pelo convênio Ibict/UFRJ. Professora do Instituto de Ciência da Informação da Universidade Federal da Bahia.
E-mail: neoddone@ufba.br
Resumo
Formulado em 1952 pelos pesquisadores e bibliotecários americanos Margaret Egan e Jesse Shera, o conceito de ‘Epistemologia Social’, que propunha o estudo da produção, do fluxo e do consumo de qualquer tipo de “produto intelectual”, teve pouca repercussão e baixa receptividade na literatura especializada da época. Retomando o conceito e relacionando-o a idéias e teorias concebidas por autores contemporâneos como Foucault, Lévy e Latour, o presente trabalho sugere que a ‘Epistemologia Social’ pode ser entendida como o estudo das relações recíprocas que se estabelecem entre os seres humanos e seu mutante entorno social, cultural e tecnológico, visando à atividade cognitiva, isto é, o ciclo que envolve a produção, a circulação e o uso do conhecimento, caracterizado em sua materialidade como uma ecologia sociotécnica do trabalho intelectual. Assim articulado, tal arcabouço conceitual poderia ser utilizado pela Ciência da Informação como embasamento teórico interessante e pertinente para as pesquisas científicas que a área desenvolve.
Palavras-chave
Epistemologia social. Teoria ator-rede. Sociologia da ciência.
Abstract
Formulated in 1952 by Margaret Egan and Jesse Shera, two American researchers in the Library Science field, the concept of ‘Social Epistemology’, envisaging the study of the production, flow and consumption of any sort of “intellectual product”, received limited acceptance and was slightly discussed within the specialized literature of that period. Resuming the concept and relating it to ideas and theories conceived by contemporary authors as Foucault, Lévy and Latour, this paper suggests that ‘Social Epistemology’ might be understood as the study of the reciprocal relations that are established between human beings and their changing social, cultural and technological environment regarding the cognitive activity or, in other words, regarding the cycle of knowledge production, circulation and use, featured in its materiality as a socio-technical ecology of the intellectual labor. Settled in this articulated manner, such a conceptual framework could be adopted by Information Science researchers as a relevant and interesting theoretical foundation for their scientific investigations.
Keywords
Social epistemology. Actor-network theory. Science studies.
COGNIÇÃO: INDIVÍDUO E SOCIEDADE
Desde o seu nascimento, o ser humano se vê envolvido em situações muito distintas, durante as quais é necessário ora emitir, ora apreender novos conhecimentos. Ainda bebê, o ser humano descobre que é preciso chorar para que seus pais saibam que está com fome e lhe ofereçam alimento. Antes de entrar para a escola, a situação será esta: o conhecimento é construído pelo recém-nascido mediante a convivência com os membros de sua família, com a experimentação com objetos e artefatos culturais que a família coloca ao seu alcance e mediante a interação com outras crianças e tipos diferentes de pessoas (VIGOTSKI, 1995, 1998). Esta é talvez a fase mais rica da aprendizagem humana, quando, entre outras realizações, desenvolvemos a capacidade de falar e de expressar nossos sentimentos e pensamentos. Tal riqueza decorre, principalmente, da diversidade e do número de estímulos que o círculo do conhecimento, por natureza fragmentado, coloca à nossa frente e à nossa disposição. Multiplicando continuamente seu valor, esse universo plural e mutante de agentes potencialmente cognitivos torna maiores as oportunidades de aprender e as possibilidades de criar novos conhecimentos.
Consciente, desde muito cedo, da qualidade multifacetada do meio ambiente e do conjunto de saberes necessários à sobrevivência, o ser humano logo reconheceu o imperativo de controlar o processo de aprendizagem, padronizando-o, sintetizando-o e abreviando-o (GOODY, 1987, 1988; LEROI-GOURHAN, 1984, 1990). Com tal propósito, foi aos poucos inventando tecnologias, constituindo procedimentos e aperfeiçoando competências: selos cilíndricos, signos matemáticos, tabletes de argila, signos lingüísticos, padrões de peso, estiletes, métodos de inscrição, ábacos, escolas de escribas (CHILDE, 1981). Contudo, quanto mais rápido e mais organizado o processo de aprendizagem e de controle sobre a natureza se tornava, mais complexo ele se apresentava.
* Versão revista e atualizada do capítulo 2 da tese de doutorado defendida pela autora em dezembro de 2004 junto ao Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação mantido pelo convênio Ibict/UFRJ (Cf. ODDONE, 2004).
Desde Gutenberg, tipógrafos e editores sempre se preocuparam em descobrir ou inventar meios melhores e mais precisos de simplificar e acelerar a leitura, a aprendizagem e a transferência de conhecimentos: sinais diacríticos, folhas de rosto, numeração de páginas, capas, sumários, índices, notas de rodapé (EISENSTEIN, 1994; GRAFTON, 1998). No decorrer da história da humanidade e ainda hoje, escribas, copistas, iluministas, encadernadores, editores, impressores, revisores e muitos outros trabalhadores especializados procuraram desenvolver técnicas e metodologias que, entre outros efeitos, aprimorassem a legibilidade dos textos, aumentassem a velocidade da leitura e facilitassem a disseminação dos conhecimentos. Para Frohmann, por exemplo, uma imagem familiar das vantagens da estabilidade tipográfica alcançada pela cultura impressa é a dificuldade de coordenar reuniões quando cada participante possui sua própria cópia do mesmo documento obtido na internet, mas cada versão tem uma numeração de páginas diferente (FROHMANN, 2004, p. 17).
A invenção da página e do espaço em branco à sua volta, dos capítulos numerados em seqüência, da abertura de parágrafos, da ordem alfabética, dos gráficos, mapas e tabelas, das citações, das bibliografias, dos catálogos de biblioteca, das classificações bibliográficas e de toda uma série de outros padrões de organização e ordenamento do universo do conhecimento permitiu que a escrita e a leitura fossem moldadas de modo a ampliar as chances da mais perfeita geração, recepção e reprodução do saber humano, reduzindo as dificuldades de comunicação e aprendizagem. Todo esse extenso e variado arsenal de meios extraordinários de redução, tradução, adaptação, classificação, uniformização, mobilização e aceleração (LATOUR, 1996, 2000) acabou por produzir um impacto imenso nas modernas concepções de literatura, de educação e de pesquisa científica (EISENSTEIN, 1994). Porque em sua essência todos esses artefatos, técnicas e procedimentos disciplinam nosso pensamento e reduzem o caleidoscópico universo de agentes virtualmente cognitivos que nos rodeia, conformando a maneira como desenvolvemos e aplicamos nossos raciocínios.
Assim, quando a criança chega à idade de ir à escola, o conhecimento que lhe é oferecido não é mais tão fragmentado, múltiplo e mutante: ele é filtrado, interpretado, padronizado, organizado e formalizado em currículos, programas, planos de aula, cartilhas, livros didáticos, dicionários, enciclopédias e bibliografias. Todas estas tecnologias e artefatos intelectuais traduzem e limitam a amplitude do universo do conhecimento, reduzindo a sua diversidade, controlando sua fragmentação e permitindo que tenhamos um domínio cada vez maior sobre a natureza e a sociedade. Portanto, antes de acreditar que nossa maior ou menor capacidade de aprender e de criar se deve principalmente às habilidades cognitivas que nos são inatas, é preciso reconhecer que na verdade essa capacidade decorre primeiramente do trabalho daqueles que, antes de nós, em uma seqüência gradual e crescente de complexidade, inventaram e disponibilizaram modos e técnicas eficazes de pensar, de estudar, de usar essas habilidades cognitivas para guardar – em nossa memória, em nossos hábitos ou em repositórios de recursos que trazemos sempre à mão – conhecimentos que nos ajudem a dominar nosso meio ambiente e a sobreviver com tranqüilidade.
Esse processo, primitivamente mediado por nosso próprio corpo – quando usávamos os braços ou os pés como padrões de medida, por exemplo –, foi aos poucos incorporando também artefatos produzidos para substitui-lo ou estendê-lo, liberando-o para o desempenho de outras ações, sempre mais complexas (MCLUHAN, 1974). Assim, voltando no tempo, um galho de árvore poderia servir para tocar um objeto potencialmente perigoso ou estranho e aprender mais sobre ele; ou um estilete poderia ser usado para registrar uma negociação contábil sobre um pedaço de argila úmida. Antes disso, porém, os primeiros símbolos traçados com grande habilidade manual sobre as paredes de cavernas pré-históricas já indicavam, por exemplo, a magnitude de sentidos associada ao desenho de um bisão. As técnicas pictográficas de nossos ancestrais assinalaram um enorme salto qualitativo em termos intelectuais, pois liberaram parte de nossas mentes e nos permitiram alcançar as abstrações e as representações. Ou seja, as técnicas de pintura desenvolvidas naquele período possibilitaram ao ser humano falar das coisas do mundo sem estar na presença delas (VIGOTSKI, 1995).
A atividade cognitiva é mediada, portanto, por toda uma série de ações histórica e socialmente definidas, assim como por todo um conjunto de artefatos que têm sido aperfeiçoados e burilados ao longo de milênios. A disponibilidade ou não desses artefatos e a vigência ou não dessas condições sociais afetam, por sua vez, a quantidade e a qualidade do que é individualmente captado e produzido pelo aparelho cognitivo. Por conseguinte, mais do que comportamentos eminentemente individuais, para os quais apenas nosso intelecto, nossa intenção e nossa deliberação contribuem, conhecer e aprender são ações sociais, ou melhor, ações socialmente constituídas e determinadas (GONZÁLEZ DE GÓMEZ, 2000, 2004).
Na verdade, a atividade cognitiva individual depende em alto grau dessa intrincada aparelhagem sociotécnica que nos permite destacar de nossos corpos parte substantiva do conhecimento que adquirimos ao longo de nossa existência e confiá-la ao corpo social, preservando-a em artefatos como livros (MOLES, 1978), acumulando-a em competências especializadas como técnicas de tradução e métodos de pesquisa e depositando-a em aparelhos como microscópios e máquinas de gravação de áudio, por exemplo (LATOUR; WOOLGAR, 1997). Ao capitalizarmos esses saberes e suas diferentes propriedades para uso e benefício de outros sujeitos cognoscentes, aproximamo-nos daquilo que Karl Popper denominou de Mundo 3 (POPPER, 1997; MIRANDA, 2002) e Abraham Moles chamou de Memória do Mundo, a “cristalização permanente da logosfera” (MOLES, 1974, p. 31). O processo e o fenômeno da cognição, abstraídos de todos esses artefatos não-humanos e examinados fora de seu contexto de efetivação, perdem sua complexidade, deixando de levar em conta variáveis indispensáveis à sua compreensão.
[…] A imagem do mundo não está contida senão por fragmentos no cérebro dos cientistas, ela não se apresenta em sua totalidade a não ser no conjunto dos signos impressos, dos livros, das memórias e das coletâneas de documentos. São estes que, na acepção material da palavra, constituem o mundo teórico, resultado permanente da ciência […] (MOLES, 1971, p. 12, grifos do original).
É socialmente, portanto, que os atores não-humanos que participam do processo individual de cognição adquirem sua significação, sua importância, sua utilidade. Assim, um alto grau na escala da cognição indica um ambiente social favorável ao aprimoramento dos artefatos que participam desse processo. Entretanto, como defendem Jack Goody e Bruno Latour, não se deve acreditar que nossa sociedade ocidental possui um aparelho social de cognição mais desenvolvido que, por exemplo, o de uma tribo indígena (GOODY, 1988; LATOUR, 2000). Para fazer uma comparação como esta e superar a “grande divisão” que se estabeleceu entre civilização e barbárie (ODDONE et al., 2000) seria preciso avaliar o grau de cognição dos indivíduos de uma dada sociedade conforme o pano de fundo de sua aparelhagem cognitiva. E para isso é necessário mapear a ecologia desse aparelho social de cognição ou, como definiu Lévy, estudar a ecologia cognitiva de cada grupo social (LÉVY, 1993).
[…] A ilusão da modernidade foi acreditar que quanto mais progredíssemos, mais afastadas ficariam a objetividade e a subjetividade, criando assim um futuro radicalmente diferente do nosso passado. […] [N]ós agora sabemos que isto nunca será o caso, na verdade, que isto nunca foi o caso. Objetividade e subjetividade não são opostas, […] elas se desenvolvem irreversivelmente juntas, rompendo desse modo a grande divisão entre os coletivos modernos e os assim chamados tradicionais. […] (LATOUR, 1994a).
EPISTEMOLOGIA SOCIAL
As habilidades cognitivas desenvolvidas pela mente humana acabam sendo progressivamente ampliadas e, às vezes, substituídas por artefatos cujas propriedades, em contrapartida, tornam-nos ainda mais habilidosos e poderosos diante da natureza. Expandidas, essas habilidades nos levam a conceber e a inventar outros artefatos ainda mais aprimorados, em uma cadeia sem fim de intercâmbios, traduções, extensões e acréscimos. Talvez fosse esta a concepção que animava a idéia da “epistemologia social” (EGAN; SHERA, 1952): o exame das relações recíprocas que se estabelecem entre os seres humanos e seu mutante entorno social, cultural e tecnológico, visando à atividade cognitiva; ou seja, o estudo do ciclo que envolve a produção, a circulação e o uso do conhecimento, caracterizado em sua materialidade como uma verdadeira ecologia sociotécnica do trabalho intelectual.
O presente trabalho constitui uma tentativa de resgatar a noção de “epistemologia social”, uma disciplina científica proposta em diversas ocasiões, a partir do início da década de 1950, por dois bibliotecários e pesquisadores americanos: Margaret Egan e Jesse Shera. Associada a um contexto histórico-social e científico bastante peculiar, que vinha colocando em xeque não só o arcabouço da antiga biblioteconomia como as promessas da jovem documentação – e que duas décadas mais tarde conduziria à promissora emergência da ciência da informação –, a nova disciplina, provisoriamente designada “epistemologia social”, teve seu programa de ação descrito e defendido pela primeira vez em um artigo de abril de 1952 intitulado Foundations of a theory of bibliography (EGAN; SHERA, 1952). Este artigo, no entanto, não mereceu citações nem gerou discussões entre os pesquisadores e bibliotecários que se encontravam em atividade naquele período.
Reconhecendo a importância da proposta de Egan e Shera e revelando não compreender por que ela tivera tão pouca aceitação pública, Douglas Foskett afirmava acreditar, em trabalho do início da década de 1970, que o motivo do esquecimento a que havia sucumbido, sem qualquer controvérsia, a tese da epistemologia social, fora a ausência de qualquer reflexão nova nos livros publicados por Shera após aquele primeiro artigo. Foskett pensava que, para marcar um ponto crítico nas ciências sociais, os dois pesquisadores deveriam ter escrito um livro inteiro sobre a questão (FOSKETT, 1980).
De fato, apesar de insistentemente reiterada pelos autores em palestras, conferências e artigos durante longos anos – aproximadamente até meados da década de 1970 –, a tese de Egan e Shera não logrou conquistar a adesão de seus pares. Embora inúmeros fatores tenham concorrido para esse resultado, alguns deles, em especial, são prontamente identificáveis. A princípio, deve-se observar que a vinculação do novo conceito à filosofia e à bibliografia não pareceu satisfazer os bibliotecários, já que estas eram referências consideradas ultrapassadas àquela altura, indo de encontro tanto ao eufórico espírito do pós-guerra quanto ao modelo tecnicista adotado pela área desde o início do século – após Cutter e Dewey. Em seguida, deve-se assinalar a cansativa redundância dos textos nos quais a epistemologia social foi sucessivamente anunciada e justificada, condição que resultava da transposição de parágrafos inteiros de um artigo a outro, embora a argumentação dos autores, com o passar dos anos, tenha agregado o vocabulário e as discussões teóricas que surgiram na biblioteconomia e em áreas afins – especialmente nas ciências cognitivas, na precocemente emancipada “recuperação da informação” e mais adiante na própria ciência da informação. Por fim, deve-se destacar a ausência de estudos empíricos subseqüentes que discutissem e aprofundassem o novo conceito, pondo-o à prova de forma sistemática.
Em sua concepção original, a epistemologia social foi descrita como uma “disciplina-mãe”, uma espécie de “fundamento científico” para a biblioteconomia, a bibliografia e a comunicação, “um corpo de conhecimentos sobre o próprio conhecimento […], sobre os modos por meio dos quais o conhecimento é coordenado, integrado e posto a funcionar […], sobre as forças intelectuais que modelam as estruturas e as instituições sociais” (SHERA, 1972, p. 111-2). Seus autores acreditavam que o “foco de atenção” da nova área de estudos era a análise “da produção, do fluxo, da integração e do consumo de todas as formas de pensamento comunicado [os “produtos intelectuais”] por meio de todo o tecido social” (SHERA, 1973, p. 89), já que “é exatamente desse sistema secundário de comunicação que a humanidade depende para empreender ações sociais inteligentes” (EGAN; SHERA, 1952, p. 29). Além disso, Egan e Shera situaram a epistemologia social no âmbito da prestigiada ciência social que vinha sendo praticada na Universidade de Chicago naquele período, empenhando-se em demonstrar a natureza positiva e não-teleológica dos métodos que a nova disciplina deveria empregar e esforçando-se por definir alianças e contrastes entre sua área de atuação e outros territórios disciplinares (ZANDONADE, 2004).
“INFORMAÇÃO” E CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO
Tal elenco de princípios e procedimentos, contudo, não garantiu à tese da epistemologia social condições favoráveis à sua aceitação, muito embora aquele fosse um período que testemunhava muitas e intensas transformações conceituais e semânticas – como certamente percebiam seus autores, experientes no convívio com os problemas da área. Ainda que restrita, a documentação de Paul Otlet exercia influência, particularmente no que concerne ao reconhecimento da diversidade tipológica dos documentos (BRIET, 1970) e à necessidade de tratamento de seu conteúdo. Aliás, desde o início daquele século, a “informação” já havia começado a se libertar do suporte físico que a aprisionava, passando a compor expressões como “information work” e “information bureau” (SHAPIRO, 1995; FAYET-SCRIBE, 2000). Só em 1948, porém, com Shannon e Weaver (1975), ela ganharia estatura, transformando-se em entidade com sentido independente (SEGAL, 1998). Em 1950, com os primeiros avanços na área do processamento automatizado de dados, surgia o termo “information retrieval” (LESK, 1996), que alcançou grande popularidade na área. O passo seguinte foi dado pelo inglês Farradane, que em 1953 lançou a expressão “information scientist” e em 1955 completou a operação, cunhando “information science” (SHAPIRO, 1995).
É interessante observar que Farradane atribuiu à forma verbal “information scientist” valor equivalente ao do termo “documentalist”, no sentido com o qual – ele o declarava – este último era empregado no continente europeu. Contudo, ele excluiu o bibliotecário desse campo semântico, pois isso poderia “confundir a questão” (FARRADANE, 1955, p. 76). Ao afirmar que o “information scientist” era “essencialmente um cientista pesquisador [research scientist] que se especializou em coletar e disseminar o conhecimento” (FARRADANE, 1953, p. 328, apud SHAPIRO, 1995, p. 384) ou, como exemplificou Shapiro, “um físico que provê informação a seus colegas cientistas” (SHAPIRO, 1995, p. 384-5), Farradane parece não ter levado em consideração o modo como a área estava organizada nos Estados Unidos, onde documentação era o nome europeu para o trabalho dos bibliotecários especializados (EGAN; SHERA, 1961). Essa intrincada divergência de nomenclaturas atesta a situação instável, em termos de identidade, em que teóricos e profissionais ligados à gestão da informação e dos documentos se encontravam naquele momento, condição que ainda subsiste hoje (CRONIN, 1995).
Por demonstrar maior sintonia com o contexto científico e cultural de sua época – caracterizado pela expansão do fenômeno que foi chamado de “discurso informacional” (SEGAL, 1998) – o sintagma “information science” logo se estabilizou, passando a constituir uma nova disciplina nessa complexa área de pesquisa, agora claramente compartimentada: à “library science” ficariam os livros e as bibliotecas, com seus instrumentos de coleta, organização e armazenagem; à “documentation”, com seus meticulosos instrumentos de indexação, restaria o exílio no continente europeu e à “information sience” caberia a informação extraída pelas técnicas mecanizadas da “information retrieval”. Na prática, porém, a disputa permanecia e, como reconheceu Shera, “no início dos anos 1960 os termos ‘librarian’, ‘documentalist’, ‘information specialist’ e suas variantes tornavam-se muito confusos” (SHERA, 1972, p. 288).
Em 1968, quando o American Documentation Institute alterou sua denominação para American Society for Information Science, a nova expressão ganhou definitiva consagração. Aos poucos, o espaço da information sience, que a princípio era composto majoritariamente por cientistas de várias filiações, passou a abrigar também outros tipos de pesquisadores e profissionais diretamente interessados nas questões ligadas ao processamento e à recuperação da informação. Essa integração acabou por demonstrar que os bibliotecários mantinham mais proximidade com a ciência da informação do que se supunha (GARCIA, 2002). Partindo das universidades americanas, a ciência da informação espalhou-se então pelo restante do mundo, constituindo, ao longo das décadas seguintes, faculdades, escolas e departamentos de library & information science. A forma como esses coletivos intelectuais se adaptaram às transformações acabou por resultar em uma mudança de perspectiva na configuração da comunidade internacional da área. A composição demográfica e a estrutura social da ciência da informação haviam mudado bastante depois de Farradane, e a epistemologia social estava definitivamente enterrada.
EPISTEMOLOGIA SOCIAL E DESDOBRAMENTOS
A cuidadosa revisão dos diversos documentos em que a teoria de Margaret Egan e Jesse Shera foi mencionada revela ao pesquisador atual, no entanto, curiosas analogias entre as diretrizes originais da epistemologia social e teorias bem mais recentes, produzidas no âmbito da literatura internacional das ciências sociais, como é o caso dos conceitos de ecologia cognitiva, de Pierre Lévy, paradigmatologia, de Edgar Morin, e mediologia, de Régis Debray. Entretanto, a argumentação utilizada na defesa da epistemologia social lançava mão de noções que só encontrariam pleno amadurecimento mais tarde, no bojo de obras cuja proximidade temática com a disciplina proposta por Egan e Shera está longe de representar um consenso, como, por exemplo, a arqueologia do saber, de Michel Foucault, e a teoria ator-rede, de Bruno Latour, para mencionar apenas esses dois casos. Além disso, chega a ser surpreendente a maneira pela qual toda uma extensa gama de recursos discursivos e conceituais – como metáforas, imagens e expressões lingüísticas – superpõe-se nos textos Egan e Shera, Foucault e Latour. Registramos aqui, a título de exemplo, a metáfora da rede ferroviária (EGAN; SHERA, 1952), a imagem do fio de Ariadne, o conceito de ator e o sintagma “cognição social” como sinônimo de epistemologia social (SHERA, 1973).
O que se observa, desde logo, é que a epistemologia social parece compartilhar com essas teorias, a despeito de sua distância no tempo, uma idêntica matriz epistêmica, um mesmo movimento paradigmático – o que sem dúvida autoriza uma leitura mais abrangente ou de maior alcance, poder-se-ía dizer, da proposta dos dois americanos. Na verdade, o simples acercamento da epistemologia social a conceitos que só há pouco emergiram no cenário das ciências do humano e da sociedade – como paradigma, epistéme, noosfera, formação discursiva, redes sociais, redes sociotécnicas, comunidade científica, tecnologias intelectuais, metrologia, inteligência coletiva e inteligência distribuída, entre outros – produz de imediato notáveis desdobramentos em seu esquema conceitual, favorecendo a observação de conexões e solidariedades que lhe conferem substância e coerência, estendendo as possibilidades de sua utilização em diferentes direções (GOLDMAN, 2001).
Quando referendada por um quadro teórico mais amplo e complexo, que simultaneamente a enriquece e contextualiza, a tese da epistemologia social transforma-se, atualiza-se, passando a constituir um corpo de conhecimentos sobre a dinâmica social da atividade intelectual dos coletivos humanos. Enquanto espaço circunscrito de fenômenos, sua perspectiva abrange ao mesmo tempo toda a economia do mercado material e simbólico de bens culturais e toda a ecologia do sistema social de produção intelectual, ou seja, toda a extensão e toda a variedade do sistema social de produção, circulação e consumo de informação. Com tal escopo, portanto – e como desejavam seus autores – a epistemologia social poderia vir a representar uma consistente alternativa teórica às preocupações epistemológicas da ciência da informação, oferecendo uma contribuição substantiva ao esforço dos que hoje se dedicam ao exercício de definir suas bases científicas e de demarcar suas fronteiras disciplinares. Julgando ser possível defender e esclarecer esta última reflexão, buscamos analisar algumas contribuições que pareceram mais significativas ao enriquecimento da matriz epistêmica acima referida, fazendo repercutir sobre este texto a força de sua influência.
REDES DE ASSOCIAÇÕES
Norbert Elias foi um dos primeiros teóricos da sociologia a pensar a problemática da sociedade em termos de redes (ELIAS, 1994). Afirmando que as sociedades são totalidades incompletas, abertas temporalmente a um fluxo contínuo entre o passado e o futuro, Elias acreditava que existe uma ordem oculta, invisível, nas diferentes formas de vida em comum. Essa ordem se configurava para o autor como um tecido de relações móveis, um arcabouço de funções interdependentes, regulado por leis próprias, que apresenta características particulares e distintas em cada associação de seres humanos (ELIAS, 1994, p. 21-23). As posições e as posturas que um indivíduo assume ao longo de sua vida, por exemplo, nunca dependem exclusivamente de seu próprio arbítrio, mas da natureza das relações estabelecidas entre ele e os outros indivíduos de seu grupo social, assim como da estrutura formada pela articulação conjuntural dessas diferentes e múltiplas relações.
[…] Cada pessoa singular está realmente presa; está presa por viver em permanente dependência funcional de outras; ela é um elo nas cadeias que ligam outras pessoas, assim como todas as demais, direta ou indiretamente, são elos nas cadeias que a prendem. Essas cadeias não são visíveis ou tangíveis, como grilhões de ferro. São mais elásticas, mais variáveis, mais mutáveis, porém não menos reais e decerto não menos fortes. […] (ELIAS, 1994, p. 23).
Ao considerar a sociedade como uma extensa rede social formada a partir da interseção e da articulação de redes menores, Elias identificava os fenômenos reticulares que resultam do múltiplo entrelaçamento das ações individuais. Esses fenômenos se caracterizariam pela contínua formação e transformação de idéias e atitudes, em um processo dinâmico, em que tanto a natureza individual quanto a social são incessantemente modeladas e modificadas por movimentos de intercâmbio de posições. A configuração das redes sociais revela-se assim em constante mutação, pois à medida que os indivíduos, por força de sua interdependência, alteram suas posições relativas, a sociedade também vê alterados seus contornos.
[…] Somente quando o indivíduo pára de tomar a si mesmo como ponto de partida de seu pensamento, pára de fitar o mundo como alguém que olha de ‘dentro’ de sua casa para a rua ‘lá fora’, para as casas ‘do outro lado’, e quando é capaz – por uma revolução copernicana em seus pensamentos e sentimentos – de ver a si e à sua concha como parte da rua, de vê-los em relação a toda a rede humana móvel, só então se desfaz, pouco a pouco, seu sentimento de ser uma coisa isolada e contida ‘do lado de dentro’, enquanto os outros são algo separado dele por um abismo, são uma ‘paisagem’, um ‘ambiente’, uma ‘sociedade’. […] (ELIAS, 1994, p. 53).
O que Norbert Elias propôs, em resumo, foi um novo ponto de vista para o estudo dos homens e de suas associações. Um ponto de vista que, em vez de favorecer os atributos e as características individuais, isolando-os de seus contextos, privilegie as trocas, as inter-relações e as interdependências entre os seres, de forma a captar o dinâmico e contínuo movimento que os anima e que os transforma em conjuntos coesos e significativos. Em um importante ensaio sobre a obra de Elias, o historiador francês Roger Chartier afirma que os “utensílios intelectuais” desenvolvidos pelo sociólogo – conceitos como os de interdependência, equilíbrio de tensões, formação e evolução das formações – podem ser aplicados com bastante proveito à “questão de saber de que maneira e por que razão os homens se ligam entre si e formam em conjunto grupos dinâmicos específicos” (CHARTIER, 1990, p. 100).
[…] Contra as categorias idealistas do indivíduo em si ou da pessoa absoluta, contra uma representação atomista das sociedades, que apenas as considera como a agregação de sujeitos isolados e a soma de comportamentos pessoais, Elias atribui um papel central às redes de dependências recíprocas que fazem com que cada ação individual dependa de toda uma série de outras, que modificam, por seu turno, a própria figura do jogo social. […] Contra uma concepção empobrecedora do ‘real’ muitas vezes encontrada […] e que só tem em conta o concreto de existências individuais bem identificáveis, Elias propõe uma outra maneira de pensar, que considera de igual modo reais as relações, evidentemente invisíveis, que associam essas existências individuais, determinando assim a natureza da formação social em que elas se inscrevem. […] (CHARTIER, 1990, p. 101-102).
ECOLOGIA COGNITIVA
Em uma perspectiva como a de Elias, os conceitos de ‘tecnologias da inteligência’ e de ‘ecologia cognitiva’, desenvolvidos pelo filósofo Pierre Lévy (1993), inscrevem-se de maneira precisa. Aproximando-se pelo viés das interdependências reticulares, tais conceitos revelam também estreita conexão com a teoria socioantropológica elaborada por Bruno Latour, que abordaremos mais adiante. Interessado nas questões interpostas pelo advento da era da informática, Lévy procura contextualizar esse evento, propondo que o observemos do ponto de vista de uma evolução histórica que teria se originado na oralidade, passando pela invenção da linguagem escrita e pelo surgimento da impressão com tipos móveis.
[…] Não é a primeira vez que a aparição de novas tecnologias intelectuais é acompanhada por uma modificação nas normas do saber. […] De que lugar julgamos a informática e os estilos de conhecimento que lhe são aparentados? Ao analisar tudo aquilo que, em nossa forma de pensar, depende da oralidade, da escrita e da impressão, descobriremos que apreendemos o conhecimento por simulação, típico da cultura informática, com os critérios e os reflexos mentais ligados às tecnologias intelectuais anteriores. Colocar em perspectiva, relativizar as formas teóricas ou críticas de pensar que perdem terreno hoje, isto talvez facilite o indispensável trabalho de luto que permitirá abrirmo-nos a novas formas de comunicar e de conhecer. […] (LÉVY, 1993, p. 19).
Perguntando-se que tipo de relação pode existir entre o pensamento individual, as instituições sociais e as técnicas de comunicação, Lévy argumenta que os três elementos se associam para formar coletivos heterogêneos que freqüentemente transgridem as fronteiras tradicionais entre homens e coisas, entre sujeitos e objetos, entre idéias e técnicas. Para estudar esses coletivos e suas realizações, o autor apresenta o programa de uma ‘ecologia cognitiva’, que se configura como uma análise molecular, em termos de redes de interfaces, dessas coletividades.
[…] A inteligência ou a cognição são o resultado de redes complexas onde interage um grande número de atores humanos, biológicos e técnicos. Não sou ‘eu’ que sou inteligente, mas ‘eu’ com o grupo humano do qual sou membro, com minha língua, com toda uma herança de métodos e tecnologias intelectuais […]. Para citar apenas três elementos entre milhares de outros, sem acesso às bibliotecas públicas, à prática em vários softwares bastante úteis e a numerosas conversas com os amigos, aquele que assina este texto não teria sido capaz de redigi-lo. Fora da coletividade, desprovido de tecnologias intelectuais, ‘eu’ não pensaria. O pretenso sujeito inteligente nada mais é que um dos microatores de uma ecologia cognitiva que o engloba e restringe. […] (LÉVY, 1993, p. 135).
A conexão que Lévy estabelece entre o pensamento e as tecnologias intelectuais mantém íntima afinidade, por sua vez, com a perspectiva latouriana sobre a produção, a circulação e o uso de inscrições no âmbito da atividade científica (LATOUR, 1996). De fato, como observamos no princípio deste texto, parecem existir múltiplos regimes de interferência, de compartilhamento e de tradução nesta relação, inscrevendo ordens de determinação singulares sobre as atitudes e ações envolvidas nos atos de pensar e de produzir conhecimentos, assim como em seus resultados observáveis e tangíveis. Situando essa relação no contexto ecológico das redes, Lévy parece concordar que o pensamento e os conhecimentos acumulados por meio da produção de inscrições são, em larga medida, tributários do processo de circulação que irriga e estende as redes do saber, sustentando as trocas realizadas em seu interior. Os híbridos que circulam por essas redes – as teorias mais respeitáveis, os fatos científicos mais concretos, os artefatos mais práticos (LATOUR, 2000) – são, sem dúvida, resultantes dos agenciamentos heterogêneos articulados no movimento dessas complexas teias de relações.
Ao definir a ecologia cognitiva como “o estudo das dimensões técnicas e coletivas da cognição” (LÉVY, 1993, p. 137), o autor pretende que sejam observadas – em suas estruturas fluidas, distribuídas, provisórias e mestiças, operadas por coletivos híbridos, compostos por atores humanos e não-humanos – as distintas formas de gestão social do conhecimento que prevalecem em culturas e períodos históricos determinados. Estudando as técnicas, os processos e as formas de inteligência em uso em uma dada sociedade, a ecologia cognitiva assinala o espaço e o papel que cabem a cada elemento individual na construção, transformação e sustentação das redes sociais do conhecimento. Como já alertava Norbert Elias (ELIAS, 1994, p. 57), nem mesmo a compreensão de um “eu penso” pode ser desligada ou desvinculada da existência de grupos de indivíduos com os quais convivemos e trocamos idéias e informações.
[…] Quem pensa? Uma imensa rede loucamente complicada, que pensa de forma múltipla, cada nó da qual é por sua vez um entrelace indiscernível de partes heterogêneas […]. Os atores dessa rede não param de traduzir, de repetir, de cortar, de flexionar em todos os sentidos aquilo que recebem de outros. […] As tecnologias intelectuais situam-se fora dos sujeitos cognitivos, como este computador sobre minha mesa ou este livro em suas mãos. Mas elas também estão entre os sujeitos como códigos compartilhados, textos que circulam, programas que copiamos, imagens que imprimimos e transmitimos […]. Mesmo com as mãos vazias e sem nos mexermos, pensamos com escritas, métodos, regras, compassos, quadros, grafos, oposições lógicas, algoritmos, modos de representação e de visualização diversos. […] Mas estas coisas do mundo, sem as quais o sujeito não pensaria, são em si produtos de sujeitos, de coletividades intersubjetivas […]. (LÉVY, 1993, p. 173-174)
PERSPECTIVA FOUCAULTIANA
Preocupado em entender as circunstâncias que envolveram o surgimento histórico de disciplinas como a medicina, a psiquiatria e a psicopatologia, por exemplo, Foucault sugere que se verifiquem as condições de possibilidade da existência dessas disciplinas. Para este autor, as condições que possibilitam a existência de uma ciência estão inscritas em um campo de determinação histórica constituído por conjuntos discursivos “que não têm nem o mesmo estatuto, nem o mesmo recorte […], nem a mesma organização, nem o mesmo funcionamento que as ciências às quais dão lugar” (FOUCAULT, 1971, p. 44), mas cuja unidade é assegurada pelas regras de um sistema de positividades. À constelação de enunciados que enseja a instauração de um conhecimento dito científico, Foucault atribuiu a denominação de ‘formação discursiva’, expressão que designa
[…] todo um conjunto de objetos, de tipos de formulação, de conceitos, de opções teóricas que estão investidos em instituições, técnicas, condutas individuais ou coletivas, em operações políticas, atividades científicas, ficções literárias, especulações teóricas. O conjunto assim formado a partir do sistema de positividade e manifestado na unidade de uma formação discursiva é o que se poderia chamar um saber. O saber não é uma soma de conhecimentos – […] é o conjunto dos elementos (objetos, tipos de formulação, conceitos e escolhas teóricas) formados, a partir de uma única e mesma positividade, no campo de uma formação discursiva unitária. […] (FOUCAULT, 1971, p. 42).
Para estudar uma formação discursiva, Foucault recorre a um modelo de análise que envolve a complexa descrição do modo por meio do qual os enunciados, enquanto eventos de natureza discursiva, articulam-se, em intrincados jogos de relações, com acontecimentos outros, de natureza prática, técnica, econômica, social e política. Essa articulação e esses jogos configuram a episteme de determinado momento histórico e enquanto tal são identificáveis por meio de três tipos de critérios: os critérios de formação, os critérios de transformação e os critérios de correlação. Os critérios de formação envolvem as regras que dão forma a todos os objetos, todas as operações, todos os conceitos e todas as opções teóricas que constituem aquela formação discursiva; os critérios de transformação dizem respeito às condições que propiciam a emergência de determinadas formas (objetos, operações, conceitos e opções teóricas), e não de outras, a partir de uma formação anterior. Os critérios de correlação, por sua vez, inventariam o conjunto de relações que define aquela formação discursiva, situando-a quanto a seu contexto discursivo maior – outros tipos de discurso – e a seu contexto não-discursivo (FOUCAULT, 1972, p. 59-60). Para estudar uma formação discursiva, portanto,
[…] O que se trataria de fazer aparecer é o conjunto das condições que regem, em um momento dado e em uma sociedade determinada, a aparição dos enunciados, sua conservação, os laços que são estabelecidos entre eles, a maneira pela qual os agrupamos em conjuntos estatutários, o papel que exercem, o jogo dos valores ou das sacralizações que os afetam, a maneira pela qual são investidos em práticas ou condutas, os princípios segundo os quais circulam, são recalcados, esquecidos, destruídos ou reativados. Em suma, tratar-se-ia do discurso no sistema de sua institucionalização. […] (FOUCAULT, 1971, p. 25).
Neste sentido, Foucault argumenta também que, “para que uma seqüência de elementos […] possa ser considerada e analisada como um enunciado, é preciso que ela preencha uma […] condição: deve ter existência material”. Sem essa “espessura material” que lhes dá vida, os enunciados estão para sempre condenados ao silêncio, pois “o enunciado tem necessidade dessa materialidade […]: em parte, ela o constitui” (FOUCAULT, 1997, p. 115). Neste ponto, é interessante assinalar a proximidade entre as concepções de Foucault e as de Latour, sobretudo no que diz respeito à existência objetiva dos enunciados. Para ambos os autores, o registro material é condição sine qua non do trabalho científico (LATOUR, 1996).
[…] Essa materialidade repetível que caracteriza a função enunciativa faz aparecer o enunciado como um objeto específico […] entre os que os homens produzem, manipulam, utilizam, transformam, trocam, combinam, decompõem e recompõem, eventualmente destroem. Ao invés de ser uma coisa dita de forma definitiva – e perdida no passado como a decisão de uma batalha, uma catástrofe geológica ou a morte de um rei – o enunciado, ao mesmo tempo em que surge em sua materialidade, aparece com um status, entra em redes, se coloca em campos de utilização, se oferece a transferências e a modificações possíveis, se integra em operações e em estratégias onde sua identidade se mantém ou se apaga. Assim, o enunciado circula, serve, se esquiva, permite ou impede a realização de um desejo, é dócil ou rebelde a interesses, entra na ordem das contestações e das lutas, torna-se tema de apropriação ou de rivalidade. […] (FOUCAULT, 1997, p. 121).
Outro elemento que torna o universo conceitual desenvolvido por Latour análogo àquele concebido por Foucault é a noção de rede. Reconhecendo que os discursos, por natureza, são passíveis de múltiplas leituras, Foucault recusa os rótulos e as classificações formais e apriorísticas – como as de autor, de obra e de livro –, por considerar que tais categorias homogeneízam os discursos, impondo-lhes uma interpretação redutora. Optando por observar os enunciados no espaço de sua dispersão e de sua descontinuidade, Foucault utiliza a noção de rede para descrever o locus no qual se dá o jogo de relações e de rupturas que configura uma determinada formação discursiva.
[…] A unidade do livro não é, inicialmente, uma unidade homogênea: a relação que existe entre diferentes tratados de matemática não é a mesma que a[quela] que existe entre diferentes textos filosóficos […]. Mas, além disso, os limites de um livro não são claros nem rigorosamente traçados: nenhum livro pode existir por si mesmo; está sempre numa relação de apoio e de dependência em relação aos outros; é um ponto em uma rede; comporta um sistema de indicações que remetem – explicitamente ou não – a outros livros, ou a outros textos, ou a outras frases. […] É inútil dar-se o livro como objeto que se tem sob a mão; é inútil encarquilhá-lo nesse pequeno paralelepípedo que o encerra; sua unidade é variável e relativa: ela não se constrói, não se indica e, por conseguinte, ela não se pode descrever senão a partir de um campo de discurso. […] (FOUCAULT, 1971, p. 18-19).
Neste acercamento inicial – e por certo superficial – ao arcabouço teórico elaborado por Foucault, percebem-se algumas afinidades entre a arqueologia do saber, a teoria ator-rede e a epistemologia social. Uma dessas afinidades envolve o caráter coletivo da produção do saber. Um ponto que também alinha as três proposições e as diferencia de outra espécie de investigações sobre a ciência, como já salientaram alguns autores (KUHN, 1975; FROHMANN, 1995), é o destaque que as mesmas atribuem à materialidade da prática científica, em suas diversas instâncias significantes: os discursos, as inscrições, os registros, os documentos, os arquivos, as bibliotecas. Na citação a seguir, Foucault mais uma vez sintetiza esse traço material como um dos marcos distintivos de sua metodologia:
[…] Eu não interrogo os discursos sobre aquilo que, silenciosamente, eles querem dizer, mas sobre o fato e as condições de seu aparecimento manifesto; não sobre os conteúdos que eles podem encobrir, mas sobre as transformações que eles efetuaram; não sobre o sentido que se mantém neles como uma origem perpétua, mas sobre o campo onde eles coexistem, permanecem e se apagam. Trata-se de uma análise dos discursos na dimensão de sua exterioridade. […] (FOUCAULT, 1972, p. 67).
SOCIOLOGIA DA CIÊNCIA E TEORIA ATOR-REDE
Surgida no bojo das expressivas mudanças experimentadas pela sociologia da ciência durante as últimas décadas do século XX, a teoria ator-rede representa o conjunto teórico mais abrangente e mais orgânico para o exame das questões associadas ao ciclo documentário. Todo um novo e articulado esquema conceitual é apresentado por essa teoria, que permite identificar e seguir os atores, as redes e os movimentos cuja inter-relação engendra e mantém estável o estado particular de cada situação e de cada acontecimento envolvido na produção, circulação e uso das informações registradas e dos documentos.
A moderna sociologia da ciência, no interior da qual a teoria de Latour se inscreve, é uma disciplina vinculada à contemporaneidade. As transformações que ela aporta têm sido sistematicamente associadas à publicação, em 1962, da pioneira obra de Thomas Kuhn, The structure of scientific revolutions (1975), muito embora seja possível atribuir-lhe origens mais remotas, em especial as que apontam para Ludwik Fleck (FLECK, 1981; LÖWY, 1998) e Robert Merton (LIMA, 1998), entre outros autores, e trabalhos menos conhecidos (LATOUR; WOOLGAR, 1997, p. 19). O programa da sociologia da ciência, segundo seus articuladores e analistas, baseia-se em pressupostos teóricos bastante radicais do ponto de vista epistemológico tradicional. Mencionam-se a seguir, sumariamente, alguns de seus princípios:
• a ciência é uma atividade humana como qualquer outra, sendo social e historicamente determinada;
• a ciência, enquanto fenômeno cultural, deve ser compreendida em relação aos contextos em que ocorre;
• o produto da ciência afeta a sociedade na mesma medida em que é por ela afetado;
• o que chamamos de conhecimento científico é um produto socialmente construído, negociado e aplicado;
• as investigações sobre a ciência devem levar em conta, simultaneamente, suas formas institucionais, seus usos sociais, suas práticas e também seu conteúdo;
• a sociologia da ciência deve ser imparcial, ou seja, deve tomar como objeto a ser explicado tanto o que se julga ser verdadeiro quanto o que se crê ser falso, tanto o racional quanto o irracional;
• a sociologia da ciência deve oferecer aos fenômenos que observa explicações simétricas, ou seja, que esclareçam tanto os seus aspectos positivos quanto os negativos;
• a sociologia da ciência deve ser reflexiva, ou seja, os padrões de explicação que ela adota para seus objetos devem, identicamente, ser aplicados a ela própria (BARNES, BLOOR; HENRY, 1996, p. viii).
Ao longo dos últimos 20 anos, os estudos sociais da ciência se dividiram em duas diferentes perspectivas, muitas vezes irreconciliáveis entre si: as análises macrossociológicas e as microssociológicas. Esta cisão possui diversas implicações e levanta inúmeras questões pertinentes para a epistemologia. Neste texto, porém, limitar-nos-emos a revisar a problemática identificada com o ponto de vista microssocial, uma linha de pesquisa cujos dois principais representantes são Bruno Latour e Karin Knorr-Cetina. Latour, por exemplo, defende a idéia de que a sociologia da ciência deve investigar a ciência em ação, “a ciência atual, a que está sendo feita, em meio a toda controvérsia” (LATOUR; WOOLGAR, 1997, p. 21). No entanto, para tornar independentes as análises sobre a ciência é preciso, sobretudo, “não se basear unicamente no que os pesquisadores e descobridores dizem de si mesmos: eles devem tornar-se o que os antropólogos chamam de ‘informantes’” (LATOUR; WOOLGAR, 1997, p. 19).
[…] Considerou-se que o conhecimento científico não derivava da aplicação imparcial de claros critérios técnicos de adequação, mas de fatores tais como os recursos retóricos dos praticantes e suas adesões socialmente negociadas. A observação cuidadosa de cientistas trabalhando parecia mostrar que o conhecimento científico não é uma representação objetiva e imparcial de um mundo natural independente, mas, pelo contrário, uma criação ativa e comprometida desse mundo no transcorrer da interação social. As conclusões da ciência são formulações socialmente contingentes que foram consideradas adequadas por grupos específicos em determinadas situações culturais e sociais. […] (MULKAY, 1997, p. 744).
Segundo Latour, se o objetivo da sociologia da ciência é descrever a “produção social do fato científico”, então só poderemos afirmar que ela é de fato praticada quando for possível estabelecer um nexo real entre o conteúdo científico e o contexto social. Enquanto os dois conjuntos permanecerem “justapostos em tranqüila coexistência”, não se poderá compreender nem explicar o fenômeno científico. Por isso, no seu entender, “uma sociologia dos saberes superpõe-se, mistura-se a uma epistemologia” (LATOUR; WOOLGAR, 1997, p. 20). Em outras palavras, uma verdadeira sociologia da atividade científica não pode pretender segregar as questões epistemológicas colocadas pela ciência e vice-versa: a epistemologia não pode eximir-se de levar em conta as questões culturais e sociais envolvidas na atividade científica. Isso significa, em última instância, que o corte que vem mantendo isoladas a natureza e a cultura deve ser vencido para que legitimamente se possa falar em sociologia da ciência (LATOUR, 1994b, p. 9).
Para superar o fosso que distancia a natureza da cultura, o conhecimento do poder e a ciência da sociologia, Latour propõe utilizar, como “meio de transporte”, o conceito de rede. “Mais flexível que a noção de sistema, mais histórica que a de estrutura, mais empírica que a de complexidade, a rede é o fio de Ariadne dessas histórias confusas” (LATOUR, 1994b, p. 9). A idéia de rede, segundo Latour, é uma forma nova de encarar a problemática da “produção social do conhecimento científico”, porque ela “se conecta ao mesmo tempo à natureza das coisas e ao contexto social, sem contudo reduzir-se nem a uma coisa nem a outra” (LATOUR, 1994b, p. 11).
[…] Se a corrida pela descoberta científica tem um custo tão alto que apenas poucas pessoas, nações, instituições ou profissões podem sustentá-la, então a produção dos fatos e artefatos não ocorrerá em qualquer lugar e de modo gratuito, mas somente em locais restritos e momentos específicos. Isso leva [a concluir que] […] a tecnociência é elaborada em lugares relativamente novos, raros, caros e frágeis, que armazenam quantidades desproporcionais de recursos; esses locais podem vir a ocupar posições estratégicas e podem estar relacionados uns com os outros. […] Se a tecnociência pode ser descrita como sendo tão poderosa e ainda assim tão pequena, concentrada e diluída, isso significa que ela possui as características de uma rede. A palavra rede indica que os recursos estão concentrados em alguns poucos locais – os nós e os nodos – os quais estão conectados uns aos outros – os vínculos e a malha: essas conexões transformam os recursos que estão dispersos, convertendo-os em uma teia que parece estender-se para todos os lados. […] A noção de rede nos ajudará a reconciliar os dois aspectos contraditórios da tecnociência […]. (LATOUR, 2000, p. 179-180).
Para Knorr-Cetina, cujas teorias não possuem tanta amplitude quanto as de Latour, mas se situam na mesma linha construtivista, “o produto da ciência não pode ser entendido como algo separado das práticas que o constituíram” (HOCHMAN, 1998, p. 221). Partindo deste pressuposto, a pesquisadora cria o conceito de arenas transepistêmicas para fazer referência ao campo de relações e atividades que, transcendendo o laboratório, oferece sustentação ao trabalho científico. As arenas transepistêmicas da autora remetem, sem dúvida, às redes descritas e documentadas por Latour em seus estudos, configurando uma concepção de ciência em que “o produto da pesquisa é fabricado e negociado por agentes específicos, em um tempo e espaço particulares, não sendo fruto de uma racionalidade científica especial” (HOCHMAN, 1998, p. 222).
[…] O argumento aqui é que o discurso ao qual as seleções realizadas no laboratório correspondem aponta para campos transcientíficos variáveis; ou seja, ele nos remete a redes de relacionamentos simbólicos que em princípio vão além dos limites de uma comunidade ou campo científicos, a despeito de quão amplamente estes últimos sejam definidos. O ponto crucial é que um campo transcientífico variável não é determinado, primordialmente, por características que seus membros mantêm em comum, como no caso de um grupo lógico. Além do cientista no laboratório, ele pode incluir o reitor da universidade, os agentes administrativos do instituto de pesquisa, funcionários da Fundação Nacional de Ciência, oficiais do governo, membros ou representantes da indústria e o editor executivo de uma editora. Para a grande maioria, ele incluirá outros cientistas, tanto de áreas distintas quanto de áreas idênticas àquela na qual se desenvolve a produção do laboratório. […] (KNORR-CETINA, 1981, p. 82-83, grifo do original).
Concebendo a atividade científica como um sistema produtivo bastante concreto e material entre outros mantidos pela sociedade humana, Bruno Latour, por seu turno, enfatiza a natureza coletiva e acumulativa desse sistema (LATOUR, 2000). O primeiro desses atributos – ou seja, o caráter coletivo e consensual da prática científica – é demonstrado pelo fato de que “o destino do que afirmamos e […] construímos repousa nas mãos de seus usuários subseqüentes” (LATOUR, 2000, p. 29; LATOUR; WOOLGAR, 1997). Para comprovar tal característica, Latour mais uma vez emprega a noção de rede, a partir da qual ele descreve o contínuo jogo de relações que se estabelece entre um enunciado científico e outro; a inegável circularidade que entrelaça as condições de produção e as de reconhecimento de um determinado conjunto de textos; a ininterrupta negociação travada entre os cientistas, suas comunidades e a sociedade; o movimento dinâmico que caracteriza o campo científico; o constante intercâmbio posicional entre um pesquisador e outro e a incessante luta de fronteiras que prevalece entre uma especialidade e outra (LATOUR, 2000).
A segunda das propriedades assinaladas anteriormente – o aspecto acumulativo do trabalho científico – tem origem no conceito de ‘conhecimento’ desenvolvido por Latour. Descrevendo o significado de ‘conhecimento’ como “familiaridade com eventos, lugares e pessoas observadas muitas e muitas vezes” (LATOUR, 2000, p. 220), e não como categoria oposta, a ‘ignorância’ ou a ‘crença’, esse autor defende que as grandes assimetrias verificadas entre diferentes grupos e culturas humanas são efeitos de ‘ciclos de acumulação’, obtidos por meio da produção de inscrições de extrema estabilidade e mobilidade que percorrem várias vezes as distâncias entre o centro e a periferia (ODDONE et al., 2000), trazendo de volta informações que são capitalizadas em centros de cálculo limpos e organizados cuja principal função é reunir e preservar as extensas e preciosas coleções de evidências e de relatos que os cientistas produzem e de que necessitam para outras pesquisas (LATOUR, 1996).
INFORMAÇÃO, INSCRIÇÃO E PRODUÇÃO
Segundo Latour, os ‘ciclos de acumulação’ que permitem adquirir familiaridade com eventos, pessoas e lugares distantes resultam do complexo jogo relacional que caracteriza o trabalho e o conhecimento científicos. Para compreender de que modo tais ciclos se constituem e produzem efeitos, é necessário inicialmente examinar e descrever as múltiplas inter-relações, movimentos, trânsitos, traduções, deslocamentos, empréstimos, transferências, correspondências e concessões que ativam a rede de práticas da ciência e produzem numerosos e diversificados recursos de informação.
Nascida em meados do século passado no reino da matemática, o mais reservado e inexpugnável domínio das ciências exatas, a ‘informação’ foi celebrada por algumas áreas das ciências sociais e humanas como uma notável ‘descoberta’. Longe da própria Teoria Matemática da Comunicação que o gerou (SHANNON; WEAVER, 1975), porém, o conceito de ‘informação’ não conseguiu alcançar nem substância nem estabilidade. Invariavelmente “coisificada” como um “pacote que se leva” (JORGE, 1995, p. 298), a informação se cristalizou. A verdadeira natureza da informação, contudo – incorpórea, fluida e abstrata – recebeu uma nova perspectiva com as reflexões propostas por Bruno Latour no contexto de seus estudos sobre a ciência.
[…] A informação não é um signo, mas uma relação que se estabelece entre dois lugares, o primeiro que vem a ser uma periferia e o segundo que se torna um centro, com a condição de que entre eles circule um veículo que se costuma chamar de forma, mas que, para insistir em seu aspecto material, eu prefiro chamar de inscrição. […] A informação não é, portanto, um signo, mas uma ‘carga’ no interior de inscrições cada vez mais móveis e cada vez mais fiéis de uma grande quantidade de matérias. […] (LATOUR, 1996, p. 24 e 26).
Percebida como entidade eminentemente relacional, profundamente imersa na rede de interações que caracteriza a atividade científica, a informação, na verdade, dá forma ao perpétuo movimento entre o mundo exterior – as periferias – e as instituições e indivíduos privilegiados que se encontram reunidos em alguns pontos da rede, onde se constituem os centros. Por ser o recurso que possibilita reter o formato de uma evidência sem sofrer o embaraço de sua matéria, a informação, para Latour, é um “ajustamento entre a presença e a ausência” de uma realidade objetiva (LATOUR, 2000, p. 243). Um mapa, uma ave empalhada, um organograma, uma tabela, um gráfico, uma muda de árvore, a planta baixa de uma edificação, um fragmento de cristal de rocha, um cálculo, um texto: ao estabelecer relações específicas com as diferentes realidades de onde foram extraídos – as periferias –, todos esses objetos garantem a pesquisadores de qualquer área trabalhar com informações detalhadas sobre os fenômenos que estudam sem ter necessidade de se deslocarem fisicamente dos centros onde se localizam seus gabinetes e seus instrumentos de medição, cálculo e reflexão. Explicam-se assim os ciclos de acumulação produzidos pela ciência no interior de instituições como laboratórios, bibliotecas, centros de pesquisa, museus e arquivos: eles representam o capital informacional colocado à disposição de cientistas e estudiosos – a Memória do Mundo (MOLES, 1974) – para assegurar a ágil e econômica continuidade do exercício de geração e acumulação de conhecimentos. Esta é a verdadeira razão do enorme desequilíbrio que se observa entre os selvagens e os civilizados, entre as mentalidades científicas e as pré-científicas.
[…] Quando Mercator empregou pela primeira vez a palavra Atlas para designar não mais o gigante que carregava o mundo sobre os ombros, mas o volume que permitia ao cartógrafo segurar a Terra entre as mãos, ele inverteu a relação de forças que a cartografia tornou tão visível – mas que existe, em diferentes graus, em todas as disciplinas […]. Não existe ciência […] que não acabe espalhando os fenômenos pelos quais se interessa sobre uma superfície plana de alguns metros quadrados ao redor da qual se reúnem pesquisadores que apontam com o dedo as características pertinentes, enquanto discutem entre eles. A matriz intelectual, o domínio erudito, não se exerce diretamente sobre os fenômenos – galáxias, vírus, economia, paisagens –, mas sobre as inscrições que lhes servem de veículo e que circulam continuamente, nos dois sentidos, por extensas redes de transformações – laboratórios, instrumentos, expedições, coleções. […] (LATOUR, 1996, p. 33).
Latour argumenta, porém, que é necessário proceder a um concreto e preciso trabalho de produção para que uma inscrição viabilize o transporte de informações sempre confiáveis – absolutamente fiéis à realidade de onde foram extraídas. Assim, a relação que liga uma periferia a um centro deve resultar em um objeto bastante prático e essencialmente material, que apresente compatibilidade com todas as outras inscrições e que mantenha critérios de uniformidade extensíveis a todos os outros objetos do mesmo tipo. Essas diferentes características permitem às inscrições e, por conseqüência, à informação manter padrões que redundam em apreciável ganho de tempo, de recursos e de esforços.
[…] Compreende-se melhor agora a expressão ‘centros de cálculo’. Desde que uma inscrição tire proveito das vantagens do inscrito, do calculado, do plano, do desdobrável, do superposto, daquilo que se pode inspecionar com o olho, ela se torna comensurável com todas as outras […]. A perda considerável de cada inscrição isolada em relação àquilo que ela representa se reverte na maior carga informacional que a compatibilidade com todas as outras inscrições lhe traz. […] Hoje entendemos melhor essa compatibilidade porque utilizamos computadores que se tornaram capazes de misturar, ligar, combinar e traduzir os desenhos, os textos, as fotografias e os cálculos que antes estavam fisicamente apartados. A digitalização prolonga essa extensa história dos centros de cálculo, oferecendo a cada inscrição o poder de todas as outras. Mas esse poder não decorre de sua entrada no universo dos signos. Ele deriva de sua compatibilidade, de sua coerência ótica, de sua padronização com outras inscrições que se acham sempre ligadas ao mundo por meio de uma rede. […] (LATOUR, 1996, p. 31-32).
Para Latour não existe prática científica que não dependa da transformação prévia que se opera entre o mundo real e as inscrições científicas. Mas ele observa também que todo o trabalho de mobilizar o mundo em rede, de construir, padronizar e acelerar os artefatos intelectuais é insuficiente, porque o resultado que se obtém não é o mundo, mas apenas sua representação. É preciso dar continuidade ao trabalho, voltando à periferia. A capacidade dos pesquisadores para construir e expandir redes da periferia para o centro e vice-versa é o que torna possível à ciência elaborar predições. Sempre que um fato é verificado ou que uma máquina entra em operação, isso significa que de alguma forma as condições do laboratório ou da oficina foram previamente estendidas em rede (LATOUR, 2000).
REDES SOCIOTÉCNICAS
Para que as redes possam ser estendidas, é necessário contar com o auxílio da metrologia. Latour atribui à metrologia tanto a grandiosidade, quanto a fragilidade dos centros de cálculo, já que a qualidade do trabalho realizado nessas instituições não representará absolutamente nada, se o efeitos da ciência não forem levados de volta ao mundo exterior. Artefatos práticos e fiéis mobilizam o mundo e criam idas e vindas, mas é essencial que esses caminhos não sejam interrompidos. De acordo com Latour, contudo, esse movimento do centro em direção à periferia é muito pouco estudado, em virtude da crença de que as ciências e as técnicas são universais e de que, por esse motivo, elas estarão em toda parte sem nenhum trabalho adicional. O que se constata é que foi a partir da construção e da proliferação dos instrumentos, das máquinas e dos equipamentos – os atores não-humanos, produtos da tecnologia – que o ser humano modificou a topografia das redes sociais por ele criadas ao longo da história, ensejando a ampliação e a diversificação das relações entre diferentes regiões.
[…] Uma ferrovia é local ou global? Nem uma coisa nem outra. É local em cada ponto, já que há sempre travessias, ferroviários, algumas vezes estações e máquinas para venda automática de bilhetes. Mas também é global, uma vez que pode transportar as pessoas de Madri a Berlim ou de Brest a Vladivostok. […] O modelo da ferrovia pode ser estendido a todas as redes técnicas que encontramos diariamente. Ainda que o telefone tenha se disseminado universalmente, sabemos que podemos esperar até a morte ao lado de uma linha caso não estejamos ligados a ela por uma tomada e um número. […] As ondas magnéticas estão em toda parte, mas ainda assim é preciso ter uma antena, uma assinatura e um decodificador para assistir televisão a cabo. Portanto, no caso das redes técnicas, não temos nenhuma dificuldade em conciliar seu aspecto local e sua dimensão global. […] (LATOUR, 1994b, p. 115).
A universalidade das redes sociotécnicas torna-se então transparente: ela resulta de seu prolongamento a todos os domínios do universo conhecido. Latour argumenta em seguida que se deve aplicar o mesmo critério em relação ao conhecimento, aos saberes e às competências. Ao verificar que o saber percorre caminhos em tudo semelhantes às redes sociotécnicas, compreende-se com mais facilidade sua trajetória do local ao universal.
[…] O percurso das idéias, do saber ou dos fatos […] torna-se tão facilmente traçável quanto o das ferrovias ou dos telefones, graças à materialização do espírito que […] os computadores permitem. Quando medimos as informações em bits e bauds, quando assinamos um banco de dados, quando nos conectamos ou desconectamos de uma rede de processamento distribuído, é mais […] fácil do que antes, então, ver em nossas leis e em nossas constantes, em nossas demonstrações e em nossos teoremas, objetos estabilizados que circulam bem longe, de fato, mas ainda assim no interior de redes metrológicas bem gerenciadas das quais eles são incapazes de sair – exceto por meio de ramificações, assinaturas e decodificação. […] (LATOUR, 1994b, p. 117).
COGNIÇÃO DISTRIBUÍDA
A universalidade do conhecimento científico depende, portanto, de sua maior ou menor adaptação aos padrões metrológicos que garantem sua circulação uniforme pelas redes sociotécnicas. Por exemplo, para que uma teoria científica qualquer possa ser compreendida e aplicada de maneira idêntica em todas as regiões do planeta – em todos os pontos da rede –, é necessário padronizar os experimentos de modo a produzir sempre os mesmos resultados. Pesquisadores e instituições que se mante-nham conectados a essa extensa malha de laboratórios, bibliotecas, instrumentos e medidas asseguram a universalidade de suas teorias, sempre verificadas e atestadas de forma semelhante em todas as partes.
Essas redes de práticas, de saberes, de instrumentos e de documentos transformam o conhecimento, sempre construído localmente, em fato universal, acessível a todos os que estiverem dispostos a conectar-se e a adotar seus padrões. Em contrapartida, as redes também contribuem para uma inevitável materialização do pensamento que, não dispensando mais os instrumentos para constituir-se e manter-se estável, torna-se um “híbrido outrora impensável” (LATOUR, 1993, p. 156). A atividade científica equipara-se, assim, a outros ofícios e saberes “menores”, mas igualmente dignos e relevantes, resultando em uma prática amplamente concreta e localizada, para a qual concorre uma multiplicidade de fatores heterogêneos (LATOUR, 1993, p. 157). A combinação entre o trabalho das redes metrológicas – disciplinando os operadores e as operações – e o das redes sociotécnicas – estendendo a circulação do conhecimento – emerge na noção latouriana de inteligência distribuída.
[…] A inteligência não se localiza mais em um único local – ela não se encontra nem no cérebro, nem no conhecimento tácito, nem nas máquinas, nem no grupo social, nem nos conceitos – ela se distribui. […] E tudo muda com a redistribuição da inteligência. […] (LATOUR, 1993, p. 157)
No contexto da teoria ator-rede, o conhecimento partilha sua força com todos os artefatos que o materializam e que disciplinam o pensamento; além disso, o conhecimento também se distribui pelas redes que o fazem circular. Assim, sua universalidade e seu poder não resultam do improvável privilégio da razão, como pensava Descartes (FROHMANN, 2004), mas de uma inteligência que se ramifica em torno dos coletivos humanos. É aqui, talvez, que melhor se compreende o conceito de ecologia cognitiva, proposto por Pierre Lévy. Ao estudar as técnicas, os processos e as práticas intelec-tuais em uma determinada sociedade, a ecologia cognitiva permitiria identificar as diversas variáveis introduzidas no universo cognitivo pelas estruturas híbridas, hetero-gêneas, flexíveis, provisórias e perecíveis do trabalho de gestão social da informação e dos documentos.
Mapear e descrever a inteligência coletiva que se distribui em redes complexas, compartilhadas por diferentes agentes e agenciamentos, humanos e técnicos – fora das quais não haveria nem pensamento, nem inteligência, nem informação – parece ser, sem dúvida, um programa de pesquisa afinado com a epistemologia social, tal como a conceberam Margaret Egan e Jesse Shera na década de 1950. Associada às idéias e teorias aqui revistas, a epistemologia social poderia ser interpretada como uma verdadeira ecologia sociotécnica do trabalho intelectual, ou seja, um exame das redes que sustentam, organizam e disciplinam a produção, a circulação e o uso do conhecimento, caracterizadas em sua materialidade e em suas relações com o meio ambiente social, cultural e tecnológico. Como já se propôs antes (ODDONE, 1998), tal arcabouço conceitual poderia ser utilizado pela ciência da informação como embasamento teórico interessante e pertinente para as pesquisas científicas que a área desenvolve.
Artigo submetido em 25/11/2005 e aceito em 13/03/2007.
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