CONSEQUÊNCIAS DA ECONOMIA GIG NA IDENTIDADE PROFISSIONAL: REVISÃO SISTEMÁTICA DA LITERATURA

 

 

Danielle Rezende Rodrigues Cochrane

Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca

 daniellerrodrigues@gmail.com

José André Villas Boas Mello

Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca

 joseavbm@yahoo.com.br

 

 

______________________________

Resumo

A economia gig tem sido caracterizada como uma tendência mundial de empresas optarem pela contratação temporária de acordo com a demanda. Isso é favorecido pela utilização das plataformas digitais e das mudanças tecnológicas, influenciando no mercado de trabalho. Nesse contexto, discute-se as consequências na identidade profissional e suas perspectivas de carreira. Esse texto tem como objetivo compreender os efeitos da economia gig através de uma revisão de literatura, aplicando a revisão sistemática com metodologia PRISMA como técnica utilizada. As principais conclusões são as mudanças que as empresas devem adotar para manterem seus colaboradores motivados, a busca por ações que evitem a precarização do trabalho e as competências a serem desenvolvidas para manutenção da empregabilidade frente às mudanças citadas.

 

Palavras-chave: Economia Gig. Identidade profissional. Motivação. Precarização. Prisma. Mercado de trabalho.

 

 

CONSEQUENCES OF THE GIG ECONOMY ON PROFESSIONAL IDENTITY: SYSTEMATIC LITERATURE REVIEW

 

Abstract

The gig economy has been characterized as a worldwide trend for companies to choose temporary contracts according to demand. This is favored by the use of digital platforms and technological changes, influencing the job market. In this context, the consequences on professional identity and their career prospects are discussed. This article aims to understand the effects of the gig economy through a literature review, applying the systematic review with PRISMA methodology as the technique used. The main conclusions are the changes that companies must adopt to keep their employees motivated, the search for actions that avoid job insecurity and the skills to be developed to maintain employability in the face of the changes mentioned.

 

Keywords: Gig economy. Professional identity. Motivation. Precariousness. Prism. Job. Market.

 


 

1 INTRODUÇÃO

 

A gig economy refere-se aos padrões temporários de contratação prevalecendo sobre os contratos permanentes, onde plataformas online são utilizadas para negociação do trabalho a ser prestado por demanda do contratante (DE STEFANO, 2016; KÄSSI; LEHDONVIRTA, 2018). Assim, é possível ter uma combinação de oportunidades disponíveis, horários flexíveis e homeoffice. Os defensores desse modelo acreditam que é benéfico para ambas as partes, sendo o caminho natural para o futuro do trabalho (GROSS; MUSGRAVE; JANCIUTE, 2018).

O outro lado da moeda é uma nova modalidade de maximização do processo de precarização social, com baixos pagamentos, ausência de treinamento, onde não há preocupações com a saúde ou benefícios extras, deslocando maior risco para o empregado (BAJWA et al., 2018). O trabalhador então é responsável pela administração do seu próprio trabalho, do tempo necessário para cada operação, bem como dos custos e riscos da sua produção, transformando-o permanentemente disponível (ABÍLIO, 2017).

A incorporação da tecnologia nas atividades laborais e aumento da população economicamente ativa (HIDALGO et al., 2020) trazem como tendência o aumento percentual significativo de profissionais sem carteira assinada (NORTON; CHERASTIDTHAM; MACKEY, 2016; HAJKOWICZ et al., 2016; ALCOBIA, 2019). Com isso, destacam-se os trabalhos autônomos, microempreendimentos, freelancers, dentre outros. Esse cenário aliado a possibilidade do trabalho remoto, como citado anteriormente, consolidam a permanência da economia gig.

Pesquisas questionam se os jovens que ingressarão nessa nova realidade estão cientes desse cenário e quais as implicações no gerenciamento de suas carreiras, contrabalanceando as demandas do mercado de trabalho com as suas necessidades profissionais (JARADAT; JIBREEL; SKAIK, 2019; MANKEKAR; GUPTA, 2017; NACCARATO; FALORSI; LORIGA; PIERINI, 2018).  Seguindo nessa linha, em busca de uma melhor compreensão sobre o ambiente e a evolução teórica sobre o tema, o presente trabalho se propõe a realizar um levantamento da produção científica que relaciona a economia gig e a identidade laboral construída pelos profissionais no mercado de trabalho.

A contribuição dessa pesquisa reside na importância de compreender esse novo modelo de atuação das organizações, onde não se negligencia o autoconhecimento e análise das oportunidades, considerando as mudanças tecnológicas que irão acontecer no curto prazo. Estudos como esse podem contribuir para o que Kirby (2020) aponta como 'conhecimento local' que pode ser um 'conhecimento poderoso', e ter implicações importantes para os currículos das escolas e faculdades.

Além desta introdução, o estudo apresenta uma seção de Metodologia, uma seção com os resultados de avaliação dos principais itens para relatar Revisões sistemáticas e Meta-análises (método Prisma). Por fim, uma seção de discussão e análise do conteúdo, e as conclusões.

 

2 METODOLOGIA

 

Trata-se de uma revisão sistemática da literatura dos estudos científicos iniciando-se pela elaboração de uma questão de pesquisa que norteia a estratégia de busca, definição das variadas bases onde os estudos estão localizados, definição dos critérios de exclusão, elegibilidade e por fim inclusão na análise.

 

2.1 Estratégia de busca e definição das bases

 

Foi elaborado um planejamento da revisão, elaborando as questões da pesquisa e o protocolo. Nessa etapa, duas perguntas surgiram como norteadoras dessa revisão:

·         Quais as tendências observadas pelos pesquisadores em relação às implicações da economia gig na construção de identidade profissional?

·         Considerando a necessidade das organizações de contratações por demanda/projeto, quais as competências e habilidades serão requeridas para que o trabalhador possa manter ou melhorar sua empregabilidade?

Para levantamento dos conteúdos a serem estudados, foram realizadas pesquisas em sete bases, consideradas as maiores referências mundiais: Web of Science, Science Direct, Scielo, PubMed, DOAJ, Emerald e Lilacs. Com o intuito de ampliar a pesquisa, apenas a expressão “gig economy” foi utilizada, optando-se então por realizar o filtro na análise da etapa seguinte.

 

2.2 Definição dos critérios de exclusão

 

Como critérios de exclusão, houve um trabalho de comparação das bases, eliminando os artigos duplicados, além de terem sido retirados também livros, capítulos de livros, os artigos que não estão disponibilizados na íntegra e outros formatos de textos que não seguem os padrões de avaliações por pares, como feito em artigos científicos.

 

2.3 Inclusão na análise

 

Após a leitura dos artigos aprovados segundo os critérios de exclusão, permaneceram somente os artigos que relacionam as transformações da economia gig com a discussão da identidade profissional nessa lógica em que não há vínculo empregatício, tampouco crescimento uniforme e previsível de carreira.

 

3 PRINCIPAIS ITENS PARA RELATAR REVISÕES SISTEMÁTICAS E META-ANÁLISES

 

O levantamento bibliográfico utilizando somente a expressão “gig economy” retornou 409 títulos, onde 16 foram retirados por serem duplicados. Quando utilizado o termo em português (“economia gig”), foi encontrado apenas um artigo, porém eliminado na etapa posterior. Após a aplicação dos critérios de exclusão citados anteriormente, 136 não estavam disponibilizados na íntegra e 242 foram eliminados após leitura do título ou resumo por não apresentarem o assunto “identidade profissional” como objeto de pesquisa, restando assim 52 artigos para serem apreciados. Após a leitura completa dos artigos em questão, 37 artigos foram eliminados por não adentrarem no assunto em questão com profundidade. Sendo assim, apenas 15 artigos foram considerados na composição na análise da revisão. É importante ressaltar que essa etapa é bastante subjetiva, por isso não é possível descartar a hipótese de que outros artigos com conteúdo relevante não tenham sidos considerados na etapa de inclusão da análise.

A seleção dos estudos foi orientada pela metodologia Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses (PRISMA), gerando a síntese do resultado representado na figura 1.


 

Figura 1 - Estrutura de seleção e análise de dados

 

Fonte: Elaborado pelo autor.

Os artigos utilizados na análise da revisão estão localizados nas bases de dados ScienceDirect (4), Web of Science (10) e Emerald (1) todos em periódicos internacionais, principalmente dos Estados Unidos e países europeus.

Pela escassez de artigos encontrados sobre o tema, deixa claro que essa área ainda está em construção, vide a data de publicação desses artigos, onde os mais antigos datam do ano de 2016 (2) e a maioria foi publicado em 2018 (7), evidenciando os temas a serem estudados e, consequentemente, utilizados para elaboração de novas pesquisas que colaborem para o entendimento da inserção do profissional no ambiente de trabalho, assunto de extrema relevância para a comunidade global.


 

Quadro 1 - Evolução anual das pesquisas científicas sobre economia gig

Fonte: Elaborado pelo autor.

 

Em termos metodológicos dos documentos selecionados, predomina o estudo teórico, observando a necessidade de desenvolvimento de pesquisas empíricas que possam ser aplicadas em campo. O baixo número de Surveys realizados, até o momento, é decorrência do espaço de tempo do surgimento do conceito “economia gig”, pois seus efeitos ainda estão sendo analisados e somente se tornaram concretos a partir da consolidação definitiva do modelo em escala global. O quadro 2 retrata a síntese de cada trabalho selecionado nesta pesquisa:


 

 

Quadro 2 - Foco e objetivos dos trabalhos sobre economia gig

Autores

Método

Objetivo

Ashford et al (2018)

Estudo teórico

Identificar os desafios de ser seu próprio chefe, focando nas capacidades específicas e comportamentos que permitem sobreviver nessa nova lógica de mercado.

Bajwa (2018)

Estudo teórico

Estudar as vulnerabilidades trazidas pela economia gig que prejudicam a saúde do trabalhador

Devoe (2019)

Estudo teórico

Discutir a tomada de decisão individual quando se pensa no tempo em relação a dinheiro e a consequência na felicidade do indivíduo.

Gleim et al (2019)

Estudo teórico

Classificar dois tipos de economia gig: economia compartilhada e venda direta; e como essas diferenças afetam a percepção do trabalhador sobre a atividade.

Ibarra e Obodaru (2016)

Estudo teórico

Discutir os conceitos de liminaridade, identidade e carreira, estudando a importância dessas conexões entre si.

Jabagi et al (2019)

Estudo teórico

Entender o papel da tecnologia na motivação do trabalhador no contexto da economia gig

Kuhn (2016)

Estudo teórico

Estudar temas como atração organizacional, satisfação no trabalho e turnover no contexto do crescente número de trabalhadores individuais.

Lehdonvirta (2018)

Survey

Entrevista em três plataformas de contratação online para analisar os efeitos da flexibilidade no desempenho do trabalho

Lewchuk (2017)

Survey

Desenvolver uma ferramenta para medir o nível de precariedade do trabalho e comparar com os efeitos no bem-estar e relações sociais.

Petriglieri Ashford, Wrzesniewski (2018)

Survey

Apresenta como colaboradores contornam a precarização do trabalho estabelecendo conexões com a rotina, pessoas, lugares e construção de propósito.

Pichault e McKeown (2019)

Estudo teórico

Analisar as dimensões da autonomia do trabalhador para entender os desafios e oportunidades das novas formas de atuação

Poon (2019)

Estudo teórico

Explicar a tendência crescente de trabalhadores individuais e discutir a necessidade de ações coletivas contra condições inadequadas de trabalho.

Sousa e Rocha (2019)

Estudo teórico

Revisão de literatura sobre as competências a serem desenvolvidas pelos trabalhadores no contexto das transformações digitais

Spreitzer, Cameron, Garrett (2017)

Estudo teórico

Compara três tipos de flexibilização no trabalho, observando a diferença entre dois mundos: os profissionais altamente capacitados e os de baixa capacitação

Wood et al (2018)

Estudo teórico

Avaliar a qualidade do trabalho remoto da economia gig e as consequências dos mecanismos de controle

Fonte: Elaborado pelo autor.

 

Dentre os autores citados, não há nenhum brasileiro na lista e uma forte concentração de publicações sobre o tema nos Estados Unidos e Europa. A falta de publicações nacionais dificulta a comparação de cenários, já que as situações políticas e socioeconômicas são diferentes das regiões citadas e afetam diretamente no crescimento das empresas e, consequentemente, na sua forma de contratação de profissionais para executarem as atividades.

 

4 DISCUSSÃO E ANÁLISE DO CONTEÚDO

 

Após leitura dos artigos e análise dos conteúdos, foi possível identificar três principais assuntos dentro de economia gig e suas consequências na identidade profissional:

 

4.1 Motivação e Flexibilidade

 

Há uma busca incansável das organizações por manter seus profissionais motivados e, consequentemente, produtivos. Porém, como fazer isso em um contexto de economia gig, onde o trabalhador não possui um vínculo formal? Segundo Gleim, Johnson e Lawson (2019), quando um profissional performa bem, ele espera uma compensação financeira por isso. Porém, a motivação vai além de valores recebidos em espécie. Para um trabalhador se manter altamente motivado, ele precisa se identificar com a companhia ou o produto oferecido, ter flexibilidade de horas e oportunidades de interação social dentro do trabalho, onde essa última característica fica prejudicada no formato da economia gig. Para Jabagi et al (2019), é possível resolver essa questão através da arquitetura das plataformas digitais, utilizando a tecnologia como suporte para manter as pessoas contratadas automotivadas. Com ferramentas de mídias sociais, as organizações são capazes de preencher os três fatores fundamentais para desenvolvimento da motivação intrínseca: competência, relacionamento social e autonomia.

Entretanto, essa interação social em excesso pode trazer prejuízos para a qualidade de vida desse colaborador. Devoe (2019) diz que a economia gig estimula o pensamento de “tempo é dinheiro”, onde as pessoas têm priorizado encontros com colegas de trabalho à vida social com família e amigos, com o objetivo de estabelecer contatos profissionais. Essa escolha tem deixado as pessoas menos felizes, pois o foco está em um futuro retorno financeiro e não emocional.

Outra questão levantada por Petriglieri et al (2018) na economia gig é a falta de rotina acarretando em desmotivação. Ter tarefas bem definidas atenua o estresse emocional que estão associados com a falta de produtividade e promove o foco, pois, segundo o relato dos entrevistados, é uma forma de se sentir completamente presente na atividade desempenhada. Além disso, a sociedade ainda vê a flexibilidade de horários como um estigma. Em geral, funcionários que optam por trabalhar de maneira flexível tem menor crescimento salarial, recebem avaliações de desempenho piores e são vistos como menos motivados (SPREITZER, CAMERON, GARRETT, 2017). Na pesquisa de Lehdonvirta (2018), alguns entrevistados responderam sobre a dificuldade de se manterem motivados como trabalhadores da economia gig, pois não há presença de outras pessoas para interagir, até mesmo da competição informal que ocorre no ambiente corporativo; também é mais difícil vencer a procrastinação e gerenciar o próprio tempo.

 

4.2 Precarização do trabalho

Com as novas transformações e tecnologias disruptivas, as organizações se reinventaram e adotaram novas posturas, incluindo a contratação por projeto/demanda. Segundo Batista e Santos (2015) a busca por ganhos na produtividade e lucratividade leva a empresa a rentabilizar o trabalho.

Nesse cenário, as empresas diminuem os custos e os riscos, transferindo-os para os trabalhadores que são contratados sem vínculos empregatícios e consequentemente, sem amparo de leis trabalhistas. Na falta de oportunidades de trabalhos formais, as pessoas se sentem impelidas a aceitarem contratos que implicam em uma regressão de carreira e por vezes em condições precarizadas (IBARRA; OBODARU, 2016). Os trabalhadores ficam em uma posição de vulnerabilidade econômica e social, onde precisam providenciar suas próprias ferramentas para execução do serviço, oportunidades limitadas de treinamento e crescimento na carreira, baixos salários e sem seguro social (BAJWA et al, 2018).

Um exemplo de como a saúde pode ser afetada por essa metodologia de trabalho está representada através de uma pesquisa realizada no Reino Unido com músicos onde aproximadamente 71,5% apresentaram sintomas de ansiedade e 68,5% altos níveis de depressão, que foram atribuídos a trabalhos precarizados e instáveis (ASHFORD; CAZA; REID, 2018). No artigo, Wood et al (2018) traz a reflexão do mito da flexibilidade, vendida como ponto positivo, porém que traz consigo um trabalho exaustivo, com muitas horas de dedicação em troca de baixa remuneração.

Lewchuk (2018) elaborou uma ferramenta chamada Employment Precarity Index (EPI) usada para indicar o quanto um emprego inseguro associado aos padrões da economia gig pode afetar o bem-estar e relações sociais, incluindo saúde, família e comunidade. Nessa pesquisa, chegou-se a conclusão que, em geral, o mercado está passando por uma transição e tornando-se menos seguro, com menos posições de tempo integral e mais temporário.

Para Petriglieri, Ashford e Wrzesniewski (2018), apesar do cenário desfavorável para o trabalhador, algumas saídas para minimizar o impacto é cultivar conexões com a rotina, lugares, pessoas e construir um propósito, focando em um trabalho que possa se expressar e se desenvolver, tornando o processo mais tolerável. Segundo Spreitzer, Cameron e Garrett (2017), a melhor forma de driblar as ofertas de trabalhos precários é se manter atualizado e aproveitar as oportunidades educacionais, com as informações disponíveis online.

 

4.3 Desenvolvimento de Competências

 

Em uma primeira impressão, a contratação de profissionais freelancers leva a crer que o papel dos Recursos Humanos e a necessidade do desenvolvimento de competências está caindo. Porém, a qualidade do trabalho desempenhado pelo contratado continua sendo um alto índice de avaliação, principalmente no que diz respeito ao atendimento ao cliente e a marca da organização. Um exemplo disso é o Uber, onde o passageiro classifica o serviço prestado e, se mal avaliado, o motorista pode ter seu contrato encerrado. Isso significa que a atuação do setor de Gestão de Pessoas das organizações continua olhando para temas como atração, satisfação e retenção, mesmo para contratações sem vínculo empregatício (KUHN, 2016).

Ou seja, não é porque não há vínculo, que só há preocupação com as competências técnicas. As competências comportamentais continuam sendo avaliadas e sendo cada vez mais relevantes. Há quem diga que esses profissionais são empreendedores, ou “a menor parte de um pequeno negócio”. Entretanto, políticos e ativistas dizem que o crescimento da economia gig coloca esses freelancers em situação de vulnerabilidade, ao invés de empreendedores empoderados (KUHN, 2016).

Uma das competências mais citadas quando se trata de economia gig é a autonomia. Pichault e McKeown (2019) diferenciam a autonomia nas condições de trabalho através de uma linha contínua com características diferentes para situações com baixa e alta autonomia. Com menos autonomia, a dependência econômica é maior, associada a oportunidades reduzidas, ritmo de trabalho imposto e carga de trabalho, pouco acesso a experiências e práticas compartilhadas em comunidades profissionais, bem como caminhos de treinamento padronizados, grades salariais ou arranjos de tempo e espaço que não se ajustam necessariamente aos desejos individuais. Por outro lado, existem benefícios potenciais em torno de cada polo. Com mais autonomia, não apenas a liberdade de escolha é maior, mas também a possibilidade de emprego, a oportunidade de ser responsável pelo ritmo de trabalho e carga de trabalho, desenvolvimento de habilidades, arranjos de tempo e espaço. Com menos autonomia, o status legal é mais seguro, abrindo acesso contínuo à proteção social; programas de treinamento são fornecidos, os fluxos de renda são menos voláteis.

Para Poon (2019), existem mais organizações que consideram benéfico contratar trabalhadores independentes para projetos específicos, usando uma mistura de diferentes tipos de trabalhadores, acrescentando em diversidade. Além disso, quanto mais millennials (geração dos nascidos de 1980 a 1995) começam a ingressar na força de trabalho, seus valores de trabalho valorizam a flexibilidade, a vida profissional em equilíbrio, e sua apreciação das necessidades pessoais além do compromisso com o trabalho formal, certamente irá alimentar a velocidade e o volume de crescimento de trabalhadores independentes. Finalmente, o avanço tecnológico e a crescente popularidade das plataformas digitais, combinando os trabalhadores por demanda com clientes ou empresas que procuram serviços específicos.

No que diz respeito as competências técnicas a serem desenvolvidas para o futuro, Sousa e Rocha (2019), chegaram à conclusão, através de pesquisa, que conhecimentos na área de inteligência artificial, nanotecnologia, robotização, internet das coisas, realidade aumentada e digitalização serão fundamentais para a adaptação do profissional nas novas demandas de mercado. Nesse cenário, as oportunidades para novos negócios disruptivos tem forte correlação positiva com as novas tendências de competências.

 

5 CONCLUSÃO

 

Através da pesquisa realizada, é possível concluir que o conceito de gig economy ainda é embrionário no que diz respeito a publicação de artigos sobre o tema. Apesar de ser uma estrutura econômica que vem se consolidando desde 2008, aparentemente, é preciso um tempo para mobilizar pesquisadores a observarem, realizarem levantamento de dados e criticarem o que inicialmente se coloca como uma tendência de mercado. No Brasil, esse assunto está ainda menos evidenciado, o que pode ser visto como uma oportunidade de exploração, coleta de dados e, consequentemente, desenvolvimento de trabalhos originais, considerando as características da população e das organizações brasileiras.

Observou-se também que não há pesquisadores consolidados como referência na área, com grande número de publicações no tema, nem de citações. Apesar disso, há uma provável expansão do modelo, levando a crer que outros estudos serão concluídos e publicados em um curto espaço de tempo, tendo como referência os anos das publicações já realizadas e analisadas nesse trabalho.

A limitação dessa pesquisa diz respeito a escolha do termo de busca, que por ser um conceito novo ainda, pode não ter considerado algumas publicações que citem as características da geração com suas expectativas de ingresso na atividade laboral, sem explicitar a gig economy. O impacto disso é uma seleção incompleta de outras pesquisas significativas.

Estudos originais sobre a temática tendem a elevar a busca de informações sobre o assunto, inspirando investigações sobre esse novo arranjo econômico social contemporâneo, visto que a economia gig pode ser pensada como de 'conhecimento local' que pode levar a um 'conhecimento poderoso'. Para elevar a repercussão sobre o tema e para contribuir na construção teórica sobre a temática, se sugere pesquisas exploratórias direcionadas aos jovens estudantes que estejam desempenhando pratica laboral em organizações, e que se estude organizações do terceiro setor.


 

REFERENCIAS

 

ABÍLIO, Ludmila C. Uberização do Trabalho: subsunção real da viração. In: Blog da Boitempo. São Paulo. 22 fev. 2017. Disponível em: https://blogdaboitempo.com.br/2017/02/22/uberizacao-do-trabalho-subsuncao-real-da-viracao. Acesso em: 13 maio 2019.

 

ALCOBIA, O. M. P. Tourism, Hotel Management and Socio-Economic Development in the developing World: County of Inhambane, Mozambique. Revista Produção e Desenvolvimento, Rio de Janeiro, v. 5, p.1-18,  mar. 2019.

 

ASHFORD, S. J.; CAZA, B. B.; REID, E. M. From surviving to thriving in the gig economy: A research agenda for individuals in the new world of work. Research in Organizational Behavior, [s. l.], v. 38, p. 23-41, 2018.

 

BAJWA, Uttam; GASTALDO, Denise; RUGGIERO, Erica; KNORR, Lilian. The health of workers in the global gig economy. Globalization and health, [s. l.], v. 14, n. 1, p. 1-4, 2018.

 

BATISTA, I. C. P.; SANTOS, M. G. F. O Impacto Financeiro das Auditorias da Qualidade nas empresas Portuguesas. Revista Produção e Desenvolvimento, Rio de Janeiro, v. 1, n. 3, p. 90-102, set./dez. 2015.

 

DE STEFANO, Valerio. The rise of the “just-in-time workforce”: On-demand work, crowdwork and labour protection in the “gigeconomy”. Geneva: International Labour Office, 2016. Disponível em: https://www.ilo.org/wcmsp5/groups/public/---ed_protect/---protrav/---travail/documents/publication/wcms_443267.pdf. Acesso em: 13 maio 2019.

 

DEVOE, S. E. The psychological consequence of thinking about time in terms of money. Current opinion in psychology, Amsterdam, v. 26, p. 103-105, 2019.

 

GLEIM, Mark R.; JOHNSON, Catherine M.; LAWSON, Stephanie J. Sharers and sellers: A multi-group examination of gig economy workers' perceptions. Journal of Business Research, [s. l.], v. 98, p. 142-152, 2019.

 

GROSS, S.; MUSGRAVE, George; JANCIUTE, Laima. Well being and mental health in the gig economy: Policy perspectives on precairty. Londres: University of Westminster Press, 2018.

 

HAJKOWICZ, S. A. et al. Tomorrow’s digitally enabled workforce: Megatrends and scenarios for jobs and employment in Australia over the coming twenty years. [s. l.: Australian Policy Online, 2016

 

HIDALGO, A., GABALY, S., MORALES-ALONSO, G., URUEÑA, A. The digital divide in light of sustainable development: an approach through advanced machine learning techniques. Technological Forecasting and Social Change, [s. l.], v. 150, 2020.

 

IBARRA, Herminia; OBODARU, Otilia. Betwixt and between identities: Liminal experience in contemporary careers. Research in Organizational Behavior, [s. l], v. 36, p. 47-64, 2016.

 

JABAGI, Nura; CROTEAU, Anne-Marie; AUDEBRAND, Luc K.; MARSAN, Josiane. Gig-workers’ motivation: thinking beyond carrots and sticks. Journal of Managerial Psychology, [s. l.], v. 34, n. 1, feb. 2019.

 

JARADAT, M.; JIBREEL, M.; SKAIK, H. Individuals' perceptions of technology and its relationship with ambition, unemployment, loneliness and insomnia in the Gulf. Technology in Society, [s. l.], v. 60, out. 2019.

 

KÄSSI, Otto; LEHDONVIRTA, Vili. Online labour index: Measuring the online gig economy for policy and research. Technological forecasting and social change, [s. l.], v. 137, p. 241-248, 2018.

 

KIRBY, A. Reconstructing Powerful Knowledge in an era of climate change. Revista Produção e Desenvolvimento, Rio de Janeiro, v. 6, jan. 2020.

 

KUHN, Kristine M. The rise of the “gig economy” and implications for understanding work and workers. Industrial and Organizational Psychology, [s. l.], v. 9, n. 1, p. 157-162, mar. 2016.

 

LEHDONVIRTA, Vili. Flexibility in the gig economy: managing time on three online piecework platforms. New Technology, Work and Employment, [s. l.], v. 33, n. 1, p. 13-29, 2018.

 

LEWCHUK, Wayne. Precarious jobs: Where are they, and how do they affect well-being?. The Economic and Labour Relations Review, [s. l.], v. 28, n. 3, p. 402-419, 2017.

 

MANKEKAR, P.; GUPTA, A. Future tense: Capital, labor, and technology in a service industry: The 2017 Lewis Henry Morgan Lecture. Journal of Ethnographic Theory, Londres, v. 7, n. 3, p. 67-87, 2017.

 

NACCARATO, A.; FALORSI, S.; LORIGA, S.; PIERINI, A. Combining official and Google Trends data to forecast the Italian youth unemployment rate. Technological Forecasting and Social Change, [s. l.], v. 130, p. 114-122, 2018.

 

NORTON, A.; CHERASTIDTHAM, I.; MACKEY, W. Mapping Australian higher education. [S. l.]: Grattan Institute, 2016.

 

PETRIGLIERI, Gianpiero; ASHFORD, Susan J.; WRZESNIEWSKI, Amy. Agony and ecstasy in the gig economy: Cultivating holding environments for precarious and personalized work identities. Administrative Science Quarterly, [s. l.], v. 64, n. 1, p. 124-170, 2019.

 

PICHAULT, F.; MCKEOWN, T. Autonomy at work in the gig economy: analysing work status, work content and working conditions of independent professionals. New Technology, Work and Employment, [s. l.], v. 34, n. 1, p. 59-72, 2019.

 

POON, Teresa Shuk-Ching. Independent workers: Growth trends, categories, and employee relations implications in the emerging gig economy. Employee Responsibilities and Rights Journal, [s. l.], v. 31, n. 1, p. 63-69, 2019.

 

SOUSA, M. J.; ROCHA, Á. Digital learning: Developing skills for digital transformation of organizations. Future Generation Computer Systems, [s. l.], v. 91, p. 327-334, 2019.

 

SPREITZER, G. M.; CAMERON, L.; GARRETT, L. Alternative Work Arrangements: Two Images of the New World of Work. Annual Review of Organizational Psychology and Organizational Behavior. Palo Alto, v. 4, p. 473-499, mar. 2017.

 

WOOD, A.J.; GRAHAM, M.; LEHDONVIRTA, V.; HJORTH, I. Good gig, bad gig: autonomy and algorithmic control in the global gig economy. Work, Employment and Society, v. 33, n. 1, p. 56-75, 2019.