DO PARADIGMA FÍSICO, ÀS LUTAS E CAMPO SIMBÓLICO NA CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO

deflexões

Alessandra Nunes de Oliveira[1]

Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" (PPGCI-UNESP)

alessandra.nunes@unesp.br

Jetur Lima de Castro[2]

Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho"

jetur.castro@unesp.br

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Resumo

Considerando as concepções epistemológicas do paradigma físico da CI, constituindo-o como o dominante na gênese da CI, baseando-se nas relações das Ciências Empírico-Analíticas sistematizadas em regras técnicas do conhecimento empírico e constituindo os demais paradigmas cognitivo e social, o paradigma físico da CI é problematizado produzindo simbolicamente obstáculos epistemológicos ao conceito de informação no campo científico, como é discutido por Bourdieu (1989), Capurro (2003) e Gonzalez de Gomez (2000). Além disso, destaca-se a concepção central no texto de Gonzalez de Gomez (2000) de que a informação é flutuante e produz diferentes efeitos de sentido em diferentes contextos, a “informação”. Portanto, trata-se de um estudo teórico, de abordagem crítica e interpretativa sobre o paradigma físico na CI, cujo desenvolvimento pautou-se na autorreflexão, pois é nesse arcabouço metodológico que se estabelece o significado da validade desta categoria de afirmações críticas, colocando o paradigma físico a uma compreensão de interesse emancipatório pelo conhecimento e contrapondo as relações discursivas aos poderes hipostasiado. Por isso, precisa-se de uma reconstrução propriamente pautada na compreensão teórica e, sobre isso, González de Gomez (2000) destaca a informação como um termo flutuante que pode estar inserido em áreas e contextos diferentes. Isso faz com que ocorra uma disputa interna no próprio campo da CI com os paradigmas. Com os estudos culturais em informação, no entanto, pode-se afirmar que, em comparação com os teóricos que defendem a abordagem física no campo da CI, há uma constituição de estudos, cruzado no "status" ou "poder". Ainda é tímido o lugar de influência dos demais paradigmas se comparado ao reconhecimento do paradigma físico. Torna-se necessário entender e realizar essas fissuras, buscando uma reconstrução epistemológica nesse paradigma.

Palavras-chave: Paradigma físico. Ciência da Informação. Campo simbólico. Obstáculo epistemológico. Estranhamento.

FROM THE PHYSICAL PARADIGM, TO STRUGGLES AND SYMBOLIC FIELD IN INFORMATION SCIENCE

deflections

Abstract

It considers the epistemological conceptions of the physical paradigm of IC, constituting it as the dominant in the genesis of IC, based on the relationships of the Empirical-Analytical Sciences systematized in technical rules of empirical knowledge, and constituting the other cognitive and social paradigms. The physical paradigm of IC is problematized, symbolically producing epistemological obstacles to the concept of information in the scientific field, as discussed by Bourdieu (1989), Capurro (2003) and Gonzalez de Gomez (2000). In addition, the central conception in the text by Gonzalez de Gomez (2000) that information is floating and produces different meaning effects in different contexts, the “information” stands out. Therefore, this is a theoretical study, with a critical and interpretive approach on the physical paradigm in IC, whose development was based on self-reflection, as it is in this methodological framework that the meaning of the validity of this category of critical statements is established. Putting the physical paradigm to an understanding of emancipatory interest in knowledge, contrasting discursive relationships with hypostasized powers. Therefore, what is needed is a reconstruction properly guided by the theoretical understanding in which, according to González de Gomez (2000), he highlights information as a floating term and can be inserted in different areas and contexts. This causes and promotes an internal dispute in the field of CI with the paradigms. With cultural studies in information, however, it can be said that, compared to the theorists who defend the physical approach in the field of IC, there is a constitution of studies, crossed in "status" or "power". The place of influence of other paradigms is still shy compared to the recognition of the physical paradigm. It becomes necessary to understand and realize these cracks, seeking an epistemological reconstruction in this paradigm.

Keywords: Physical paradigm. Information Science. Symbolic field. Epistemological obstacle. Strangeness.

 

1  INTRODUÇÃO

Considerando as relações intramundanas de força, monopólio, lutas, disputa de interesses e estratégias, a partir do conceito de Campo, podemos pensar também nas relações que sucedem da comunidade científica, em que há interesses específicos conceituais, visões teóricas, repertórios simbólicos de conhecimento e lutas discursivas que ocorrem no âmbito científico (BOURDIEU, 2004).

Para Bourdieu (2004), o “campo científico” compreende simbolicamente o espaço das relações das forças sociais, entre atores sociais e instituição que aplica suas próprias regras e leis, no entanto, não se tornam permanentes, pois são apenas um campo de disputas em que leis e regras mudam segundo as relações assimétricas da constituição do poder.

Nesse texto, objetiva-se analisar as concepções epistemológicas do paradigma físico da CI, constituindo-o como o dominante na gênese da CI, baseando-se nas relações das Ciências Empírico-Analíticas sistematizadas em regras técnicas baseadas no conhecimento empírico e constituindo os demais paradigmas cognitivos e sociais.

O paradigma físico da CI é problematizado, produzindo simbolicamente obstáculos epistemológicos ao conceito de informação no campo científico, como discutido por Bourdieu (1989), Capurro (2003) e Gonzalez de Gomez (2000). Além disso, destaca-se a concepção central no texto de Gonzalez de Gomez (2000) de que a informação é flutuante e produz diferentes efeitos de sentido em diferentes contextos. A “informação” designa um fenômeno, processo ou construção vinculado às diversas “camadas” ou “estratos” de realização.

A constituição dessas relações também se baseia na teoria de Chalmers (1999) nas definições científicas do termo informação em que ele considera a existência de muitas categorias sobre o conceito, e que tudo depende das funções que lhes damos no percurso teórico. Então, como entendemos o campo que gera a concepção dominante do paradigma físico da CI? O conceito fisicista é considerado no estudo de Capurro (2003) quando discute a gênese da CI pautada na epistemologia fisicista através da teoria da information retrieval, que se tornou o primeiro paradigma.

Dessa forma, precisa-se de uma reconstrução propriamente pautada na compreensão teórica e, sobre isso, González de Gomez (2000) destaca a informação como um termo flutuante e que pode estar inserido em áreas e contextos diferentes. Isso faz com que ocorra uma disputa interna no próprio campo da CI com os paradigmas.

Portanto, trata-se de um estudo teórico, de abordagem crítica e interpretativa sobre o paradigma físico na CI, cujo desenvolvimento pautou-se na autorreflexão, pois é nesse arcabouço metodológico que se estabelece o significado da validade desta categoria de afirmações críticas, colocando o paradigma físico a uma compreensão de interesse emancipatório pelo conhecimento, contrapondo as relações discursivas aos poderes hipostasiados (HABERMAS, 2009).

Deve-se notar, no entanto, que essas assimetrias entre a constituição dos paradigmas criam o campo do confronto discursivo, sobretudo, a partir do conceito de informação regido no campo científico da CI. Nesse sentido, o paradigma físico destaca-se como aquele que determina o conceito de informação, mas neste texto é necessário entender como também ele influi no conceito de informação instrumentalizando as práticas a partir dos outros paradigmas.

Por isso, a CI contribuiu e ampliou ainda mais as necessidades de informação da sociedade em armazenamento e recuperação da informação. O paradigma físico concentrou-se em sistemas, e assim o conceito de informação deu continuidade a um sentido puramente técnico, uma informação mensurável que não inclui necessariamente significados ontológicos e semânticos (ALMEIDA; ANTONIO; BOCCATO; GONÇALVES, 2007).

Contudo, com o desenvolvimento da sociedade com suas diferentes formas de uso da informação e a criação de diferentes comunidades discursivas que utilizam seus próprios métodos de uso e troca de informações, a CI tende a se perpetuar, resistindo à pesquisa e à investigação, guiada pelo paradigma físico e baseando-se no "instrumento" e no "funcionalismo".

No nível de diversidade, a complexidade do sentido da informação, Marteleto (1995), por outro lado, descreve isso como uma "configuração complexa de sentido", dando importância" às relações socioculturais, especialmente no que se refere às investigações em ambientes e comunidades excluídas de parâmetros sistemáticos, às quais Marteleto (2017) chama a atenção para promover um maior alcance nas discussões epistemológicas sobre a informação e em suas diferentes concepções.

Com os estudos culturais em informação, no entanto, pode-se afirmar que, em comparação com os teóricos que defendem a abordagem física no campo da CI, há uma constituição de estudos, cruzado no "status" ou "poder".

Ainda é tímido o lugar de influência dos demais paradigmas se comparado ao reconhecimento do paradigma físico. Torna-se necessário entender e realizar essas fissuras, buscando uma reconstrução epistemológica nesse paradigma.

 

2 LUTAS DISCURSIVAS E PARADIGMÁTICA NO CAMPO DA CI

É discutível que o “campo” da CI é caracterizado por lutas discursivas as quais o pesquisador busca se posicionar especificamente na luta por legitimidade. Essas lutas fluem no campo da CI no âmbito da “legitimidade científica”. Nesse âmbito, a “legitimidade científica” refere-se ao campo científico e, segundo Bourdieu (2011), cada pesquisador luta com suas habilidades científicas, por discursos, eventos, escritos e publicações para permanecer no poder ou ganhar poder simbólico e assim reproduzir suas ideias.

Nesse sentido, podemos considerar que o campo da CI, por sua vez, ocorre através da discussão e apropriação do conceito de informação através do estabelecimento de paradigmas que, para nós, é central nessa discussão. Capurro (2003) as estabelece da seguinte forma:

Paradigma físico: está intimamente relacionado com a assim chamada Teoria matemática da informação de Claude Shannon e Warren Weaver (1949-1972) é tomada como modelo na CI, implicando numa analogia entre a veiculação física de um sinal e a transmissão de uma mensagem.

 

Paradigma cognitivo: distinguir entre o conhecimento e seu registro em documentos. A documentação e, em seguida, a CI têm a ver, aparentemente, em primeiro lugar com os suportes físicos do conhecimento, mas na realidade sua finalidade é a recuperação da própria informação, ou seja, o conteúdo de tais suportes, diretamente ligada ao conteúdo intelectual dos documentos.

 

Paradigma social: estuda campos cognitivos está em relação direta com comunidades discursivas (usuário/ informação), ou seja, com distintos grupos sociais e de trabalho que constituem uma sociedade moderna. (CAPURRO, 2003, grifo nosso).

 

Levando-se em conta os paradigmas, os horizontes abrem-se para compreender a luta discursiva pelo trilema paradigmático pelo qual Capurro (2003) discute. Em primeiro lugar, as lacunas são notadas pelas incompreensões das relações dialógicas e interrelações que se estabelecem através do uso de informações e que orientam e implementam simultaneamente o conjunto desses paradigmas. Apesar disso, negam espaços no mesmo campo de conhecimento, no qual eles são estabelecidos, mas pontualmente distanciados por convicções e linhas de pensamento que direcionam o conceito de informação.

Além disso, devem ser observados os confrontos discursivos entre os três paradigmas, visto que há também disputas de significado na literatura no campo da CI argumentadas como unicamente mútuas.

Como responde Capurro (2003), a CI precisa de toda a competência de seus respectivos paradigmas para formar o que campo chama de informação. No entanto, Araújo (2009) conclui em sua investigação que todos os campos que conceituam a informação têm a concepção como uma “coisa” em que é dotada de objetividade.

Apesar da defesa da interdependência, teorias e práticas no campo da CI são determinadas pela influência de um poder simbólico no campo, mas não por uma força que compromete diretamente a pesquisa, mas que é invisível e sutilmente estruturada no campo. Bourdieu (1989) conceitua essa relação de poder simbólico que influencia a pesquisa nesse campo por detalhes, sinais, práticas sutis e veladas. Esse poder invisível que se apresenta no âmago da CI é, ao nosso ver, apresentado pelo paradigma físico.

O paradigma físico destaca-se como o primeiro em sua constituição e, dessa forma, nesse diálogo nós deteremos a nossa análise intimamente nele. Aqui entendemos o termo “paradigma físico” como aquele em que se supõe “[...] que há algo, um objeto físico, que um emissor transmite a um receptor”, tendo por modelo a teoria da informação, [...] excluídos os aspectos semânticos e pragmáticos da informação, [...] para ordenamento e recuperação da informação” (CAPURRO, 2003).

Em virtude do que foi mencionado, o campo discursivo pelo qual se discute a proposta de Bourdieu (1983), referimos o paradigma físico como aquele que estrutura as relações de poder simbólico (monopólio), influencia e orienta estudos no campo da CI, à medida que emerge com gênese. Em algumas relações com o campo da CI, o paradigma trata-se da informação reificada, materialmente documentada, numerada e institucionalizada pela relação sistemática e hegemonizada na apreensão de públicos cognoscentes. São defendidas no paradigma físico e exercem influência discursiva, objetiva ou sutil sobre os demais paradigmas no campo.

É interessante observar o porquê isso concebe o que Bourdieu (2004) considera de monopólio no campo científico. Segundo ele, isso está sob a influência da economia e da política, no entanto, se analisarmos a origem histórica da CI, notamos que ela recebe, desde a sua gênese, a influência do traço industrial, o avanço do Estado e da indústria, combinado com as políticas de segurança e desenvolvimento do pós-guerra para o seu desenvolvimento da ciência (GONZÁLEZ DE GOMEZ, 2000).

Em outras palavras, o paradigma físico confere autoridade científica àqueles que conduzem ou realizam pesquisas do ponto de vista dele. Esse contexto refere-se ao conceito de tecnocracia, caracterizado por Bourdieu (1983). Ao nosso ver, compreende a razão da autoridade e legitimidade do paradigma físico no campo da CI, pois ele se baseia exclusivamente no funcionalismo, sendo apresentado por critérios científicos objetivos onde a racionalidade técnica direciona a um propósito específico, um serviço para resultados objetivos e quantificáveis

Outro fator existente é a forma linear e intrínseca de pensar sobre outros paradigmas, pois, embora teoricamente considerando o paradigma social, mesmo com a defesa teórica de que investiga as comunidades e está na relação inter e transdisciplinar nos estudos da informação social, como é tendência na CI, sua reprodução logra nas práticas do paradigma físico, o que torna essa prática ainda conivente e reproduzida no núcleo estruturante na CI.

Diante desta relação, observa-se que os aspectos paradigmáticos da CI estão constantemente cercados pela ação da técnica, ou seja, na organização, na recuperação e na disseminação da informação. Em sua totalidade, seu desenvolvimento com as tecnologias deve ser incansável com sua interatividade como fator em que se condensa a informação e não se considera mais como uma “mecanização” das normas bibliométricas e cognitivas em que seu núcleo é baseado, embora segundo a visão de Araújo (2018), no campo do CI entre os paradigmas, haja uma convivência entre diferentes formas de estudar informação com perspectivas atuais baseadas em perspectivas físicas e cognitivas.

A crítica a esse contexto do paradigma físico em que é dominante sobre o campo da CI parte também de algumas reflexões de Alfaro Lopez (2010) e, embora esse autor faça uma comparação entre Biblioteca e biblioteca e as lutas discursivas que ocorrem entre eles, torna-se possível analisar as críticas com um olhar de dentro do campo da CI (B).

 Quando a abordagem à "deficiência" de um campo, que faz parte de estudos de orientação pragmática e cujo apoio cognitivo baseia-se em uma funcionalidade técnica com raízes empiristas ou, no máximo, positivistas, e quando "elementos periféricos" que lembram o paradigma social são afetados e revestidos com uma forte carga afetiva que, através do imaginário do serviço ou da oferta de um produto informacional, acreditam que eles fazem de forma suficiente sua prática social, mas ainda permanecem presos a essa atividade pragmática e funcional.

Segundo o princípio hermenêutico da suspeita, as teorias e práticas desse paradigma, neste caso o “social”, ainda estão ligadas ao sentido de emissor e receptor, isto é, carregado da racionalidade instrumental que, de alguma forma, distorce de sentido o que é dado ao social.

Ainda que seja enfatizado o social, esse paradigma, em seu primado, deve corresponder às questões relacionais ou aos estudos emancipatórios de forma simbólica e contextual, alicerçado nas relações que se afetam e que fornecem de base a compreensão desses paradigmas pensados de forma dialógica.

Entretanto, o sentido de está ligado ao que Capurro e Hjørland (2007) denotam de “conceito formal” de informação, que se refere ao trabalho com documentação e informação, recuperação, centros de informação que definem apenas estudos quantitativos que privilegiam apenas uma parte da sociedade.

Dessa forma, surgem algumas questões: o paradigma social realmente se refere à relação indivíduo e sociedade? Qual sociedade está denominando-se, a sociedade que tem as relações simbólicas do capital: intelectual, social e econômico ou aquela sociedade que luta por redistribuição?

 Quando pensamos na complexidade da sociedade, damos uma olhada na variedade de estudos que envolvem a compreensão da informação em que cada comunidade apreende e usa e que não se alinham somente com as abordagens discutidas dentro da CI, conforme o paradigma social. Isso porque ao examinar estudos críticos que discutem o paradigma social, como os de Araújo (2018), percebe-se uma tendência atualmente em reconstruir as abordagens sociais estudadas pela CI a constituir um pensamento na Ibero-americano.

Isso evidencia uma tendência, que é também um olhar mais atento à complexidade dos fenômenos, ao interrelacionamento de seus elementos e dimensões, bem como aos novos aspectos das realidades empíricas que demandam novos modelos explicativos (ARAÚJO, 2017, p. 30).

 

Reflete-se o paradigma social, que, no entanto, tende a incluir uma variedade de estudos e métodos com abordagens de informação. No entanto, ainda está entrelaçado em estudos instrumentalizados do paradigma físico.

 Se pensarmos na sociedade como números, já que há um número expressivo de pesquisas nesse campo, não reduzimos a pesquisa do campo da informação ao primeiro paradigma? Outro ponto a ser questionado é a crítica social da leitura levantada por Alfaro Lopez (2010), porque se considerarmos esse tema da leitura no paradigma, não desempenharíamos um papel que vai além de meramente "servir" uma prática colonial?

Na verdade, há estudos sobre a questão social, mas ainda estão ligados à questão do emissor e receptor, produto, serviço e colocação de sujeitos como meramente passivos e neutros, entretanto, para abarcar os estudos do paradigma social entende-se que não apenas deve-se partir dos pressupostos do paradigma físico, mas também conseguir descortina uma passagem dialógica em que se consiga protagonizar os estudos culturais.

Segundo Araújo (2018), são os estudos que enfatizam a ligação entre o bibliotecário e a comunidade, a necessidade de sua participação política e seu papel nas sociedades marcadas por contradições e desigualdades estruturais. Para esse autor, nessa linha de trabalho, também se discute o papel das bibliotecas nos valores da UNESCO - educação, cultura, promoção da paz, inclusão, disseminação social de informação e informação, aprofundamento da democracia, além da perspectiva de descolonização do conhecimento a ser promovida pelas bibliotecas, transformando o modelo hegemônico de privilégio do conhecimento.

Termos como pragmático, intersubjetivo, sociocultural são usados para descrever esse novo modelo, apontando que informação é algo da ordem não apenas do objetivo ou do subjetivo, mas também do coletivo, de uma construção social (ARAÚJO, 2019, p. 49).

 

No meio dessa estrutura simbólica de poder, através da qual ela se manifesta de forma implícita, concordamos com a ideia de Hjørland (2000) sobre a prática dos "culturalistas", termo que ele recorre para aproximar os pesquisadores de ciência da informação a compor estudos na ampla formação cultural. Teoriza os seus estudos da CI com outras áreas das Ciências Sociais e Humanas, de modo a promover o diálogo entre informação e cultura, sem estar relativamente sob à influência do poder simbólico do campo, tornando-se parte motivadora do estudo em informação.

Para entender melhor essa abordagem dos culturalistas, Araújo (2018) explica que os estudos desses pesquisadores são contra o "elitismo" dos modelos hegemônicos estudados no campo da ciência da informação, pois é um movimento com propostas para questionar o modelo hegemônico que ainda se perpetua no campo do conhecimento.

Dentro do próprio conhecimento científico, em diversos momentos, movimentos e propostas de uma alteridade, uma especificidade, foram propostos como forma de se propor questionamentos aos pensamentos estabelecidos, colocar em dúvida modelos hegemônicos, subverter ordens, promover deslocamentos. Os estudos culturais, em sua crítica ao elitismo cultural; o feminismo, em sua crítica ao patriarcado e à naturalização biológica dos gêneros; o pensamento negro e seu questionamento das ideias de raça e etnia; e o pensamento decolonialista e sua reinterpretação da história são alguns exemplos de tradições de pensamento que consistem em escritas de resistência, de rupturas epistemológicas (ARAÚJO, 2018, p. 2)

 

Quando se pensa nos culturalistas, esses assemelham-se a algumas pesquisas que se esforçam para empreender estudos teóricos e críticos através do termo "temáticas marginais", defendido por Karpinski (2018), e se reflete para no campo da CI nos estudos emancipatórios e busca acesso mais próximo na Organização do Conhecimento, como estudos socioculturais.

No entanto, com o pensamento de Alfaro Lopez (2010), compara-se à vertente pragmatista da CI em que os sujeitos aprendentes, por meio de seus fundamentos funcionais e técnicos, mergulham na visão viciante do campo sem problematizar as construções que constituem seu núcleo. Por fim, precisamos estranhar o familiar confrontando as visões que estão “viciadas” no campo por meio do paradigma físico.

 

3 ESTRANHAR O QUE É FAMILIAR: PODER SIMBÓLICO, REPRODUÇÃO, E OBSTÁCULO EPISTEMOLÓGICO ENTORNO DO PARADIGMA FÍSICO DA CI

 

Do ponto de vista de Alfaro Lopez (2010), busca-se a amplificação dos estudos culturais na CI, que se enquadram apenas na pequena fração necessária, de abstrações ou teorias que. Na verdade, uma aprendizagem de objetos que acreditam nas relações de poder do paradigma físico a que se tem um excesso de teoria, dificultando a eficiência do campo da informação.

Ainda assim, devido a essas ações de invariabilidade, inércia ou mesmo diálogos reificados, isto é, sem muita imersão em conflitos, criam-se os chamados obstáculos epistemológicos na CI, que impedem o campo de avançar e permanece em seu ciclo pragmático.

Essa prática sistemática de não problematizar o campo e sua teoria encontra-se na necessidade de "estranhar" o familiar ou observar o familiar de perto e de longe, como enfatiza Gilberto Velho (1978), tão necessário para as relações, comunidades e também para o campo para sair do alheamento que o cerca, olhando para as práticas que giram através de seu campo, que já estão cercadas por uma estrutura epistemológica formal.

No entanto, ser familiar não significa que conheça, ou seja, significa o movimento na busca da compreensão, pois embora existam várias literaturas no campo da CI que contextualizam sua historicidade e problemas, isso não concede a justificativa de dizer que sabe sem antes ocorrer certos estranhamentos, suspeitas e diálogos críticos às essas teorias que impulsionam as práticas no campo da CI.

A transformação do familiar na CI ocorre com a prática da autorreflexão a partir dos parâmetros da visão histórico-hermenêutica, do esclarecimento das tradições e do investimento em uma metodologia do estranhamento que consiste no distanciamento emocional e do apego às teorias, produtos e informações, diretrizes que perpetuam o status quo desse território paradigmático e que se firmam religiosamente, de modo a liderar muitos sujeitos no campo. O confronto intelectual com todas essas teorias e práticas torna-se o pilar predominante das práticas de estranhamento.

 O poder que se segue, com suas dominâncias simbólicas, deixa pequenas lacunas para o estranhamento da área, pois embora haja resistência da dimensão de cientistas culturais e críticos que buscam estudos informacionais além da tradição fisicista, sofrem a "violência simbólica" no campo da CI, uma conceituação correspondente de Bourdieu (1989), contextualizada por Alfaro López (2010), que utiliza seus estudos em favor de uma construção teórica e prática abstrata de informação.

Em outras palavras, a exclusão ocorre como uma materialização da violência simbólica, mas os caminhos dessa exclusão e seus estudos não são objetivos, pelo contrário, ocorrem em formas, meios e situações aparentemente "sutis", mas que não confluem com o poder da região ao provar certa punição violenta. Essa situação se reflete na autoexclusão dos sujeitos que, por não se reconhecerem como aceitos pela comunidade científica, acabam deixando os estudos críticos e relacionais da informação, se submetendo à condição de reprodução do poder dominante.

 É compreensível que a raiz dessa violência simbólica no campo reside naqueles que são as autoridades no campo da CI, que têm o capital puro científico, que ditam e convencem e estipulam as regras do jogo com suas teorias constantemente publicadas baseadas no paradigma fisicista.

Em consequência, são reconhecidas como autoridades neste campo devido ao seu puro capital de pesquisa e contribuição de longo prazo e estão no topo da hierarquia científica produzida por seus discursos dos outros sujeitos representados no campo. Aqui observamos o conceito de reprodução de poder contextualizado por Bourdieu (2009), mostrado a partir de uma ordem estabelecida.

Essa forma, em que o poder simbólico apresenta-se, forma um terreno fértil para o que Barchelard (1996) conceitua como obstáculos epistemológicos nessa área. Como a comunidade científica da CI continua a reproduzir os mesmos estudos, maximiza a pesquisa baseada no paradigma fisicista, na ideia de servir a sociedade se torna a norma, abrangendo a informação como produto e colocando as questões teóricas importantes em segundo lugar para a construção do Campo.

 Por meio das autoridades de reconhecimento teórico, elas tendem a influenciar aqueles que fazem parte do capital institucional por meio daqueles que alcançam o poder institucional burocrático nesse campo e tomam decisões sobre políticas que envolvem pesquisas científicas nessa área. Há como exemplo os editores de revistas da área.

Porquanto, se um paradigma como o físico tem uma forte tendência no campo da CI, a reprodução também terá uma forte tendência eficaz diante das diretrizes institucionais, cujos temas reproduzem o poder científico desse campo. Nesse contexto, há alguns pontos problemáticos no campo científico, a ver: as construções do poder simbólico (monopólio) do paradigma físico, reprodução, violência simbólica e obstáculo epistemológico.

 

4 CRÍTICA À DOMINAÇÃO: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

Tendo em vista os aspectos apontados neste artigo, nessa luta discursiva, o paradigma físico representa o poder que influencia os estudos no campo da informação. Embora seja inevitável evitar as lutas dentro de um campo, sua importância para o progresso da ciência é enfatizada, pois estimula os cientistas e busca novas teorias que atendam às necessidades sociais no campo.

Com a resistência dos pesquisadores culturalistas e a hegemonia do poder físico, há um símbolo da disputa no campo em que todos os participantes do campo do conhecimento da CI lutam pelo fortalecimento ou mesmo pela preservação do poder.

 No entanto, ao analisar os estudos de cientistas culturais e críticos que querem promover o campo, pode-se notar que, em comparação com os teóricos com uma abordagem fisicista, ainda não se têm evidências científicas com suas teorias através de diversos estudos, em comparação com o reconhecimento do poder hegemônico do paradigma físico dentro da CI. Na CI, porém, essa incitação parece muito distante e tímida, talvez por alguma apreensão a supressão do poder, que exclui o acesso à informação baseada não no material, mas no imaterial, em informações destinadas a uma comunidade que foge do clichê "produto da informação" espalhado em bancos de dados de bibliotecas.

 Quando se trata das relações de poder no campo da CI, não é uma conexão que está longe ou longe de nós. Ainda assim, sabemos que ela está ali e age nas relações conjuntas, veladas e intrínseco, que às vezes se torna tão presente e, ao mesmo tempo, tão sutil que mesmo aqueles que se reproduzem não sabem quem o são ou até mesmo não estranham.

Mostra-se que o paradigma físico não deve ser excluído, mas que estudos informacionais com grupos populacionais privados de políticas públicas estatais são poucos discutidos nesse campo devido à sua hegemonia no contexto da informação, em que se deparam as relações mais intensas ou menos nesses paradigmas, mas sua conexão ou não também deve ser destacada.

A crítica ao domínio teórico da área e suas reproduções, sempre aceitas pela comunidade, baseia-se em um olhar para a sociedade complexa que utiliza diferentes formas de informação e deve considerar na CI análises e estudos teóricos.

Porquanto, ainda baseada na tradição fisicista, essa transição para a complexidade social dos signatários informacionais, mantida e olhando para informações flutuantes, reduz a informação como objeto que reside em um documento material.

A menos que a CI tente seguir o espectro da informação, longe do formalismo que a mantém, das práticas reificantes, é necessária a busca por reconhecimento através da diversidade de comunidades que usam informação, no entanto, sua teoria tradicional só terá uma função para um grupo seleto de consumidores da informação.

 

REFERÊNCIAS

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[1] Doutoranda em Ciência da Informação pelo Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" (PPGCI-UNESP). Mestra em Ciências da Comunicação pelo Programa de Pós-Graduação Comunicação, Cultura e Amazônia da Universidade Federal do Pará (PPGCOM-UFPA). Graduada em Biblioteconomia pela Universidade Federal do Pará.

[2] Doutorando em Ciência da Informação pelo Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" (PPGCI-UNESP). Mestre em Ciências da Comunicação pelo Programa de Pós-Graduação Comunicação, Cultura e Amazônia da Universidade Federal do Pará (PPGCOM/UFPA). Graduado em Biblioteconomia pela Universidade Federal do Pará.