TEORIA DO DOCUMENTO

 

Niels W. Lund[1]

 

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Resumo

O artigo apresenta uma revisão de literatura a partir de uma abordagem histórica, busca demonstrar como as diferentes compreensões acerca do conceito de documento evoluíram em relação umas às outras e também em relação às mudanças nas comunidades profissionais e acadêmicas, assim como na sociedade em geral. Aprofunda os estudos a partir das teorias a capacidade de complementar tanto as pesquisas feitas em torno da Documentação com vistas a entender a construção do conceito de documento e como esse pode ser inserido nas práticas dos profissionais de informação.

Palavras-chave: Teoria do Documento. Documentação. Ciência da Informação. Biblioteconomia.

DOCUMENT THEORY

 

Abstract

The article presents a literature review from a historical approach, seeks to demonstrate how different understandings of the concept of document have evolved in relation to each other and also in relation to changes in professional and academic communities, as well as in society in general. It deepens the studies based on theories and the ability to complement both the research carried out around Documentation in order to understand the construction of the document concept and how it can be inserted in the practices of information professionals.

Keywords: Document Theory. Documentation. Information Science. Librarianship

1  INTRODUction

Um Renascimento da Abordagem do Documento

 

            Se alguém procurar por títulos específicos de livros e artigos com foco explícito em teoria do documento esperando encontrar uma riqueza de literatura semelhante àquela sobre informação ou teoria da comunicação, ficará desapontado. No entanto, a literatura sobre teoria da documentação está crescendo, lenta, mas seguramente. Desde o final da década de 1980, parece ter ocorrido uma ênfase crescente na perspectiva do documento na Biblioteconomia e na Ciência da Informação (BCI[2]), assim como na sociedade em geral. O interesse pela documentação na BCI tem variado ao longo dos anos. As razões podem ser diversas, dependendo dos diferentes contextos nos quais a noção de documento é utilizada (FRANCKE, 2005). Portanto, escolhi revisar a literatura a partir de uma abordagem histórica, buscando demonstrar como as diferentes compreensões acerca do conceito de documento evoluíram em relação umas às outras e também em relação às mudanças nas comunidades profissionais e acadêmicas, assim como na sociedade em geral.

 

Uma Arqueologia Conceitual dos Documentos

 

           Se rastrearmos o uso da palavra documento ao longo da história, empreendendo um tipo de arqueologia conceitual, logo perceberemos que “documento” tem sido compreendido de muitas maneiras diferentes. Na Antiguidade, a palavra documento – e sua predecessora em latim, documentum – não se referia somente a um objeto que poderia ser segurado nas mãos ou a uma peça de evidência escrita. Era principalmente relacionado ao ensino e à educação. Em 1216, a forma latina 'documentum' significava exemplo, modelo, palestra, ensino e demonstração. Até o século XVII, a palavra significava primariamente “ce qui sert à instruire, enseignement, leçon” [aquilo que serve para instruir, educar] (REY, 1992, p. 620). Uma conferência ou aula poderiam ser documentos e podem, de fato, ter sido o protótipo de um documento. Essa tradição do documento oral, a qual era orientada para fins educacionais, está quase esquecida hoje. Muitos considerariam que a concepção jurídica de documento é a concepção original, aquela que data da Antiguidade. No entanto, este significado específico está ligado ao surgimento da burocracia estatal europeia a partir do século XVII. Na França,esse significado é encontrado pela primeira vez em 1690 na expressão “titres et document” [certificados, títulos e documento] (REY, 1992, p. 620). E é definido como "écrit servant de preuve ou de renseignement" [escrito servindo de prova ou informação] (REY, 1992, p. 620) ou como “algo escrito, inscrito, etc. que fornece evidência prova ou informação sobre qualquer matéria, como um manuscrito, título, escritura, lápide, moeda, desenho, etc.” (SIMPSON; WEINER, 1989, IV, p. 916). Desde o início da modernidade Europeia e do Iluminismo em diante, um documento é, antes de tudo, um objeto escrito que declara e prova transações, acordos e decisões feitas por cidadãos. Documentos desempenharam um papel essencial na criação de uma burocracia pública além e independente dos costumes locais, baseada em um droit écrit (lei escrita) contrário ao droit coutumier (leis de costume), que são as leis e regras que variam de um lugar para outro, sendo oral ou através de gestos, como acordos firmado através de apertos de mão no mercado. Secundariamente, os documentos tornaram-se matéria de prova, dependendo da veracidade das declarações nos documentos; desta forma, a autenticidade dos documentos tornou-se crucial. Muitos processos judiciais lidaram e continuam lidando exatamente com essa questão.Terciariamente, o documento continua sendo um problema de “renseignement” (informação), de provimento de informação, parcialmente baseado no mais antigo conceito educacional de documento. Nesse contexto, um documento é uma peça escrita que conta/relata alguma coisa. Essas três características podem ser fundidas em um fenômeno central na sociedade moderna: escrito, conhecimento verdadeiro. Durante o século XVIII, uma parte essencial do desenvolvimento da moderna sociedade burguesa, e especialmente sua esfera pública, era que a legitimidade da política, da economia, do jurídico e da ciência tornou-se crescentemente dependente da capacidade dos atores de documentarem seus direitos e reivindicações.

             Seguindo a tradição legal, a ciência começou, no final do século XVIII, a ser uma questão de prova empírica e, assim, a “appuyer (une thèse) par des documents” [apoiar (uma tese) por documentos] (REY, 1992, p. 620). Durante o século XIX, o substantivo “documentação”, criado a partir da forma verbal “documentar”, tornou-se uma palavra importante para a ciência e também para a administração. Desde então, a qualidade de um trabalho científico passava a depender da documentação que o pesquisador podia apresentar a seus colegas e ao público. Não era mais suficiente apresentar uma boa narrativa ou sólidos argumentos lógicos. Cientistas, e também eruditos trabalhando em artes, especialmente historiadores, agora tinham de mostrar um conhecimento positivo verdadeiro através da realização de experimentos controlados e da coleta de documentos demonstrando que tinham provas empírica como base para suas afirmações e argumentos. Isso criou o ambiente perfeito para a primeira explícita teoria do documento, articulada como parte do que foi chamado de primeiro movimento da documentação, liderado pelo advogado belga Paul Otlet.

 

Teoria Profissional do Documento

 

Paul Otlet (1868–1944)

 

            Há mais de um século atrás, por volta de 1900, muitos estudiosos europeus trabalharam juntos para a criação de ambientes e ferramentas para colaboração internacional. Muitas associações científicas internacionais, assim como revistas internacionais, foram fundadas naquela época. Esse esforço também suscitou uma urgente necessidade de ferramentas para localizar trabalhos de colegas, encontrar publicações e utilizar conjuntos de dados coletados por estudiosos. Esse era o pano de fundo para o trabalho iniciado por Henri La Fontaine que, na Society for Social and Political Studies, criou a seção bibliográfica da instituição. Junto com seu colega mais jovem, Paul Otlet, ele fundou o International Office of Sociological Bibliography em 1893. Em 1895 o órgão se expandiu para se transformar no International Institute of Bibliography (IIB), um centro de cooperação internacional com um catálogo, Répertoire Bibliographique Universel (RBU), organizado por uma elaborada versão do sistema de Classificação Decimal de Dewey: a Classificação Decimal Universal, CDU (OTLET, 1903, 1907, 1920). Tudo isso foi feito por razões práticas, para fornecer ferramentas úteis para estudiosos. Nem Otlet nem La Fontaine eram teóricos. Eles eram praticantes reflexivos. Para Otlet (1990, p. 86), o objetivo principal era: “A organização da documentação em uma base cada vez mais abrangente, cada vez mais prática, de forma a alcançar para o trabalhador intelectual o ideal de um mecanismo para explorar o tempo e o espaço”

            Mas se Otlet queria realizar seu ideal e melhorar a organização prática da documentação, primeiramente seria necessário definir o que exatamente significava o termo documento. Para isso, ele precisou redefinir a ciência da bibliografia:

 

A Ciência da bibliografia pode ser definida como a ciência cujo objeto de estudo são todas as questões que são comuns a diferentes tipos de documentos: produção, manufatura física, distribuição, inventário, estatística, preservação e uso de documentos bibliográficos; isto é, tudo que lida com a edição, impressão, publicação, venda de livros, bibliografia e economia biblioteconômica. O âmbito desta ciência se estende a todos os documentos escritos ou ilustrados que são semelhantes, em natureza, aos livros: obras literárias impressas ou manuscritas, livros, brochuras, artigos de periódicos, relatórios de notícias, documentos publicados ou manuscritos, mapas, planos, tabelas, esquemas, ideogramas, diagramas, desenhos originais ou reproduções e fotografias de objetos reais. (OTLET, 1990, p. 86).

 

            Otlet desenvolveu um conceito muito amplo de documento, com uma tendência para os textos impressos, livros. Ele sempre falou tanto sobre livros e documentos quanto sobre bibliografia e documentação. Ele desenvolveu uma teoria dos documentos para bibliotecas, não para a vida social em geral (OTLET, 1934). Ela era um conjunto de reflexões sistemáticas e especulações sobre a organização e preservação do conhecimento humano (ØROM, 2007, p. 54). Embora a palavra falada seja o foco principal para os linguistas, são as fontes escritas que interessam a Otlet e seus companheiros no IIB:

 

Hoje, a Documentação é compreendida como o trazer para uso todas as fontes escritas ou gráficas de nosso conhecimento, incorporadas em documentos de todo tipo, ainda que, principalmente, textos impressos… O conhecimento e as impressões durariam somente um tempo limitado sem a ajuda da memória gráfica para rapidamente capturá-los e mantê-los, porque a memória sozinha é insuficiente para a lembrança (OTLET, 1990, p. 86).

 

            Apesar de Otlet reconhecer que a comunicação oral tem algum valor, é a documentação grafada que garante a preservação da memória humana. Otlet (1990, p. 83), também era realista sobre a inevitável diversidade de documentos: “Publicações individuais continuarão a aparecer bastante independentemente umas das outras. Elas manterão suas características de serem separadas, idiossincráticas e pobremente relacionadas com o próprio corpo integral do conhecimento.”

            Ele também era muito otimista sobre as possibilidades e vantagens de um “Livro Universal” (OTLET, 1990, p. 83). Enfatizava as possibilidades técnicas das novas mídias à época para a produção do Livro Universal (OTLET, 1990, p. 87). Este livro deveria ser criado de acordo com o chamado princípio monográfico. Isso envolvia um processo de isolamento de cada “fato” em um documento e então recortar e colar esses fatos em cartões individuais (OTLET, 1990, p.105). Esses cartões-de-fatos deveriam então ser ligados, criando um cosmos coerente a partir do caos dos documentos idiossincráticos. Embora esse método de “codificação” pudesse ser desastroso em um ambiente de impressão tradicional, destruindo o documento original para sempre (OTLET, 1934, p. 409), pode-se dizer que Otlet antecipou os princípios dos sistemas digitais de hipertexto/hipermídia e bancos de dados, que surgiram décadas mais tarde (Cf. RAYWARD, 1992, 1994, 1997).

            Mesmo que Otlet estivesse primariamente interessado em documentos escritos, ele estava, em princípio, aberto a outros tipos de documentos, não apenas imagens e gravações sonoras, mas também objetos naturais, modelos, jogos e assim por diante (OTLET, 1934). Ele foi além do universo gráfico e do modelo de biblioteca para a ideia do Palais Mondial ou Mundaneum, que incluía todos os tipos de documentos. Isso rompeu com as tradições das bibliotecas, arquivos e museus, criando um grande documento, o "livro universal". Otlet (1934,1935), estava propondo um modelo de documentação bastante centralizado.

 

Suzanne Briet (1894–1989)

 

            Embora outros, além de Otlet, tenham considerado as questões teóricas ligadas a documentos (como por exemplo, Walter Schürmeyer, 1978 e Donker Duyvis, 1959), a pessoa mais importante em contribuições à discussão teórica dos documentos foi Suzanne Briet, documentalista francesa e autora de muitos artigos sobre o assunto. Para uma bibliografia selecionada sobre a questão, Cf. Briet (2006, p. 65.) e Buckland (2007).

            Da mesma forma que Otlet, a principal agenda de Briet era melhorar a documentação prática e resolver problemas concretos. No mesmo tempo, ambos estavam muito conscientes da necessidade de teorizar o campo e formular princípios para a prática documental. Com esse fim, ela publicou um pequeno livro, que era uma espécie de manifesto, em 1951: “Qu'est-ce que la documentation?” (What is documentation? na versão em inglês[3]) (BRIET, 1951, 2006). Naturalmente, ele incluía a discussão sobre o que constitui um documento. Ela começa com uma definição muito geral: “Um documento é uma prova em apoio a um fato” (BRIET, 2006, p. 9), também apresenta a definição “oficial” da União Francesa de Organizações de Documentação [Union française des organismes de documentation], de 1935: “todas as bases de conhecimento materialmente fixadas e que possuam a capacidade de ser utilizadas para consulta, estudo e prova” (BRIET, 2006, p. 10).

             Ao mesmo tempo, Briet reconhece a possibilidade de haver alguns problemas teóricos associados a esse tipo de definição pragmática:

 

Esta definição tem sido discutida por linguistas e filósofos, ciosos que são de minúcia e lógica. Graças à análise do seu conteúdo, pode-se propor uma definição, a mais adequada atualmente, mas também a mais abstrata e, portanto, a menos acessível. (BRIET, 2006, p. 10[4]).

 

            Infelizmente, Briet (2006, p. 10[5]), não especificou as fontes para esta discussão e análise, mas algumas das influências que moldaram sua redefinição do conceito do documento são evidentes: “qualquer signo indexical [índice] concreto ou simbólico, preservado ou registrado com o objetivo de representar, reconstituir ou provar um fenômeno físico ou intelectual”.

            Embora não saibamos se Briet estava familiarizada com a semiótica de Charles S. Peirce (1839-1916), sua teoria, até certo ponto, parece estar em concordância com a semiótica peirciana, especialmente a teoria dos três tipos básicos de signos: icônicos, indexicais e simbólicos. Peirce (1894, §3) escreve:

 

Existem três tipos de signos. Primariamente, existem similitudes ou ícones; Secundariamente, existem indicações ou índices; os quais demonstram alguma coisa sobre coisas por estarem fisicamente ligados a elas. Tal é o caso de um poste indicativo que aponta a estrada que deve ser seguida, ou um pronome relativo, que é posto logo após o nome da coisa que se pretende que seja designada, ou uma exclamação vocativa, como o "Olá" “Olhe!Aí!”, que atua sobre os nervos da pessoa a quem se dirige e provoca sua atenção. Terciariamente, existem símbolos, ou signos gerais, que se tornaram associados a seus significados pelo uso. Este é o caso da maioria das palavras, das frases, dos discursos, dos livros e das bibliotecas. (PEIRCE, 1894, §3).

 

Pierce (1894, p. 7), ainda afirma:

 

A similitude não tem nenhuma conexão dinâmica com o objeto que representa; simplesmente ocorre que suas qualidades parecem com as daquele objeto em questão e provocam análogas sensações na mente, em relação ao que é similar. Mas, realmente permanecem desconectados. O Index está fisicamente conectado com seu objeto, eles formam um par orgânico. Mas a mente interpretante não tem qualquer ligação com essa conexão, exceto a de notá-la, uma vez estabelecida. O símbolo está conectado com seu objeto em virtude do pensamento da mente que usa o símbolo [symbol-using mind], sem a qual nenhuma conexão existiria. (PEIRCE, 1894, §7).

 

            Partindo deste ponto, pode-se perceber porque e como Briet considerou que os documentos são, em alguns casos, signos concretos e, em outros, signos simbólicos. Isso é ilustrado no parágrafo a seguir:

 

Uma estrela é um documento? Um seixo rolado pela correnteza é um documento? Um animal vivo é um documento? Não, mas são documentos as fotografias e os catálogos de estrelas, as pedras de um museu de mineralogia, os animais catalogados e expostos num zoológico. (BRIET, 2006, p. 10[6]).

 

            A principal diferença entre os dois tipos de objetos é que a estrela, o seixo e etc. são objetos concretos desconectados de qualquer signo específico, mas as fotografias etc. são especificamente intencionadas para representar coisas como estrelas, um tipo especial de mineral ou um espécime animal – tal como o novo tipo de antílope que Briet utiliza como um exemplo da relação entre documento e o processo todo de documentação. Quando o antílope é catalogado, o próprio antílope concreto torna-se ele mesmo um documento (BRIET, 2006, p. 11). Os objetos concretos são, como ela escreve, “documentos primários” distintos do que ela chama de “documentos secundários” (BRIET, 2006, p. 11). Esses documentos primários podem ser considerados signos concretos, tendo uma conexão física com o objeto que representam. Além disso, Briet descreve como novos documentos são criados como derivados ou documentos secundários em relação ao antílope considerado o documento primário a base para um complexo de documentos, como catálogos, gravações fonográficas, monografias sobre antílopes, verbetes sobre antílopes em enciclopédias e assim por diante. Esses documentos secundários podem ser considerados como signos simbólicos que não têm uma conexão direta, com o objeto primário, mas, pelo contrário, são dependentes da mente subjetiva e interpretativa do documentalista. Em sua totalidade, os signos simbólicos criam um novo tipo de cultura para cientistas, centros de documentação operados por documentalistas que “executam a arte da documentação” (BRIET, 2006, p. 11) utilizando uma nova técnica cultural de documentação:

 

A principal função dos serviços de documentação é produzir documentos secundários, derivados dos documentos primários, os quais, via de regra, não criam, mas que, algumas vezes, conservam [...] Estamos no cerne da profissão de documentalista. Os documentos secundários são: traduções, resumos, boletins de documentação, fichários, catálogos, bibliografias, pastas de arquivos, fotografias, microfilmes, seleções, revisões da literatura, enciclopédias, guias de orientação. (BRIET, 2006, p. 25-26[7]).

 

            Como a de Otlet, a teoria de Briet se concentra especificamente nos documentos e possui o objetivo de promover um novo campo profissional no qual as bibliotecas são centros proativos de documentação. Ao mesmo tempo, a teoria do documento de Briet difere de duas maneiras importantes daquela de Otlet, favorecendo um modelo descentralizado de documentação e uma diversidade de documentos secundários, a partir dos documentos primários.

            Otlet e Briet desempenharam papéis-chave na fundação da comunidade internacional de documentação. O movimento da documentação espalhou-se pelos continentes, tornando possível a Bradford (1948), em seu trabalho para a Fédération internationale de documentation (FID), falar sobre “cinquenta anos de documentação”. Em 1924, foi criada a Association of Special Libraries and Information Bureaux (ASLIB), que estabeleceu o ainda em circulação: Journal of Documentation. Em 1931, foi fundada a Union française des organismes de documentation (UFOD). Em 1937, surgiu o American Documentation Institute (com o periódico American Documentation) e também o similar comitê francês de documentação (MEYRIAT, 1993). A cooperação internacional segue ativa desde então, mas uma diferença importante entre os mundos anglo-americano e francófono começou a emergir lenta, mas gradualmente, devido a existência de duas distintas tradições biblioteconômicas na América do Norte e na Europa continental.

            A biblioteca norte-americana é focada no usuário e tenta prover todos os materiais relevantes da maneira mais conveniente; a biblioteca da Europa continental – e não apenas a francesa –, entretanto, está muito mais preocupada em preservar e cuidar dos materiais da biblioteca – guardando-os a uma segura distância do usuário dentro das paredes da biblioteca (MEYRIAT, 1993). Essa diferença pode parcialmente explicar a decisão do American Documentation Institute, em 1968, de mudar o seu nome para American Society for Information Science (FARKAS-CONN, 1990).

 

A Teoria do Documento no Mundo Latino

 

            Como Jean Meyriat observou em 1993 (MEYRIAT, 1993), os mundos das bibliotecas e da documentação latino/francófono e anglófono tiveram diferentes tradições e valores profissionais desde a Segunda Guerra Mundial. “Documentação” era considerada fora de moda no mundo anglófono, mas na cultura latina/francófona ainda é considerada como uma importante parte da profissão. Esta diferença conceitual teve um impacto importante em considerações teóricas na disciplina. Se o nome do campo é “Biblioteconomia e Ciência da Informação” [Library and Information Science], existe uma obrigação explícita de definir bibliotecas e informação (mas não documentação ou documentos). Se documentação integra o nome do campo, então há a obrigação de definir documentação e documentos. Sobre essa questão, é revelador que o grande Traité de Documentation de Otlet tenha sido traduzido para o espanhol, mas não para o inglês. A Espanha, durante o período em que a Ciência da Informação estava se desenvolvendo no mundo anglo-americano, viu a Documentação emergir como uma disciplina, incluindo a pesquisa sobre a natureza dos documentos (ROS GARCÍA, 2000). O pensamento espanhol baseou-se explicitamente nos trabalhos teóricos de Otlet e Briet (MARTINEZ-COMECHE, 2000, p. 5-10). A relação entre informação, comunicação e documentação é um assunto para discussão. Afirma-se que, em um arquivo, um documento se refere a um acontecimento, a um processo ou a um ato de caráter administrativo ou legal expresso em algum suporte, desse modo, criando um documento. Em uma biblioteca, um documento pode ser uma cópia única de um livro, expressando, de alguma forma, a mente humana e sendo “memória materializada da humanidade” (MARTINEZ‐COMECHE, 2000, p. 6). Finalmente, em um museu, quase tudo que se relacione à natureza ou a seres humanos pode ser considerado um documento.

              Daí, pode-se concluir, segundo Martinez-Comeche (2000, p. 7), que: “Tudo pode ser um documento. Nada é um documento antes de ser considerado um documento”.

             Pode-se distinguir um documento potencial ou pré-documento de um documento efetivo (DESANTES GUANTER, 1987; GARCÍA GUTIÉRREZ, 1984). Com qualquer documento, deve-se ser capaz de identificar um agente humano com um interesse em transformar um objeto em documento; assim, um valor referencial específico e coordenadas espaço-temporais específicas do fenômeno podem ser identificados. Isso não significa necessariamente que a mesma entidade física esteja relacionada ao mesmo valor referencial em toda situação. Isso depende, no final das contas, de quem está envolvido: produtor/emissor da entidade física, o mediador/gestor dos documentos ou o usuário final. Este é o desafio que enfrentam a Documentação e a Biblioteconomia e Ciência da Informação (BCI): como lidar com a diversidade potencial de informação em cada entidade física. Usando a semiótica de Peirce, um documento pode ser definido como mensagem(ns) icônica(s) ou simbólica(s), permanentemente incorporada(s) em um suporte e utilizada pelo emissor, mediador ou receptor para um propósito relacionado à informação (MARTINEZ-COMECHE, 2000; MEYRIAT, 1981). Assim, há também a possibilidade de um campo documental mais geral na tradição latina/francófona de estudos de Documentação devido às tradições disciplinares relativamente estáveis. Para mais acerca da história da profissão e da ciência da documentação no mundo latino/francófono, ver Fayet‐Scribe (1997, 2000), López‐Yepes (1995, 2000), Meyriat (1981, 1993), Sagredo Fernández e Izquierdo Arroyo (1983) e Woledge (1983).

 

 

Teoria Geral do Documento

 

            No final da década de 1960 e durante a década de 1970, a teoria profissional do documento perdeu a predileção no mundo anglófono. Teorizar a informação tornou-se a base para transformar as Ciências da Documentação em Ciência da Informação. No entanto, ao mesmo tempo, um novo tipo de teoria do documento estava emergindo fora do campo da Documentação Profissional – a teoria crítica do documento. Ela foi desenvolvida originalmente no escopo seio das tradições críticas e marxistas da filosofia, sociologia e antropologia, as quais possuíam, de fato, suas raízes no período em que Otlet trabalhava em seus projetos. Muitos cientistas no início do século XX trabalharam com ideias sintéticas para capturar a essência da vida, a qual não podia ser alcançada apenas no nível superficial. Um deles era o sociólogo alemão Karl Mannheim (1893–1947), que desenvolveu uma sociologia do conhecimento (MANNHEIM, 1952). Mannheim enfatizou a diferença entre objetos naturais e objetos culturais, afirmando que os últimos mereciam suas próprias ferramentas analíticas. Para esse objetivo, elaborou um arcabouço conceitual com três tipos de significado: objetivo, expressivo e documentário. Embora o significado objetivo de um objeto possa ser estabelecido com relativa facilidade, sem muito conhecimento sobre as as intenções do artista, o significado expressivo requer mais conhecimento sobre a consciência do artista, suas intenções e como o artista se sentia enquanto produzia o objeto. O significado documentário é o significado que o documento revela não intencionalmente, o que podia ser o seu significado em um contexto social mais amplo. Em outras palavras, a interpretação documentária lida com o papel social do documento, o qual não é explicitamente expresso no documento (em contraste com o significado expresso), mas é, no entanto, demonstrado pelo seu lugar na construção do mundo social como um todo. O significado documentário está preocupado em encontrar o ethos geral ou Weltanschauung, expresso até mesmo em um fragmento de documento. Alguém pode coletar uma série de objetos e documentos, então fazer uma interpretação geral e procurar o significado documentário geral da época, o Zeitgeist. Mannheim o formula desta maneira:

 

Devemos executar um novo tipo de ato intencional, correspondente a este novo tipo de objeto intencional que é o significado documentário, de forma a separá-lo dos significados objetivo e expressivo aos quais é associado. E, no fim, se alcançará a impressão de que ele derivou um significado documentário comum de uma ampla variedade de significados objetivos e expressivos. (MANNHEIM, 1952, p. 57).

 

            Esse significado é encontrado por meio da interpretação documental que provê evidência documental. A razão para usar documento como termo relacionado tem a ver com o fato de que, em uma cultura mais ampla, o significado de “documentário” é associado à evidência ou prova. Prova-se existir uma Weltanschauung geral por meio da interpretação documental de uma série de objetos. A Weltanschauung não pode ser demonstrada como tal, mas tem de ser mediada por objetos parciais, que possuem significados objetivo e expressivo.

            No final dos anos 1960 e durante a década de 1970, antropólogos e sociólogos norte-americanos, como Harold Garfinkel e Dorothy E. Smith, desenvolveram novas teorias sobre práticas documentárias a partir dessa teoria geral do significado e da interpretação documentária. Eles também elaboraram métodos para analisar detalhadamente essas práticas: a etnometodologia (GARFINKEL, 1967; SMITH, 1974). Eles estudaram como os documentos são construídos para que desempenhem um papel instrumental na vida social; são construídos para reforçar o poder, para que se governe, para controlar por meio de documentos/textos. Smith, em particular, demonstrou isso em sistemas públicos, sociais e em sistemas educacionais, demonstrando que regras favorecendo gênero podem ser implementadas por meio de práticas documentárias (SMITH, 1984, 1990a, 1990b, 1999; SMITH; SCHRYER, 2008). Tendo começado como um método para a captura de um certo espírito ou Zeitgeist, a teoria do documento crítico evoluiu para um método crítico de busca de padrões dominantes. O foco da pesquisa em estudos documentários, portanto, muda da análise de conteúdo de documentos para uma análise do papel de documentos em sistemas sociais. Isso é muito semelhante à forma com que o filósofo francês Michel Foucault tratou o documento em suas teorias do poder e da elaboração dos sistemas de conhecimento. Por exemplo, Foucault (2002, p. 6-7) escreve sobre documentos na introdução de ‘A Arqueologia do Saber’:

 

Desde que a história existe como disciplina, documentos foram utilizados, questionados e deram origem a perguntas; os estudiosos não somente questionaram o que significavam esses documentos, mas também se diziam a verdade... toda essa preocupação crítica apontava para um único e mesmo fim: a reconstituição, com base no que os documentos dizem, e às vezes meramente sugerem […] o documento foi sempre tratado como a linguagem de uma voz desde então reduzida ao silêncio, seu traço é frágil, mas possivelmente decifrável. (FOUCAULT, 2002, p. 6-7).

 

E segue:

Para ser breve, então, digamos que a história, em sua forma tradicional, se comprometeu a “memorizar” os monumentos do passado, transformá-los em documentos e emprestar fala àqueles traços que, neles mesmo, frequentemente são não verbais, ou que dizem, em silêncio, algo outro do que realmente dizem; no nosso tempo, é a história que transforma documentos em monumentos. (FOUCAULT, 2002, p. 7).

 

            A partir deste caso específico da disciplina História, Foucault desenvolve uma teoria geral do documento, movendo o foco do conteúdo assumido ou mensagem do documento para o papel muito material e ativo dos documentos como elementos na construção de uma totalidade histórica. Em seu último livro, sobre o surgimento da prisão, ‘Vigiar e Punir: Nascimento da Prisão’, Foucault (1975) demonstra como a teoria dos documentos pode ser utilizada não apenas nos estudos históricos, mas também como uma ferramenta analítica crítica quanto à sociedade moderna de forma geral. Essa é uma crítica fundamental à crença de que um documento contém uma mensagem em si mesmo, como se um livro fosse um documento per se. Somente quando a coisa material particular, como um livro impresso, torna-se parte de uma totalidade construída, o mundo literário, é que ele se torna um documento. Quando se compara essa concepção de documento ao conceito de cultura documentária na obra de Briet, a diferença parece pequena. No entanto, pode-se argumentar que a crítica de Foucault à assunção do conteúdo documentário inerente desafia a crença de Otlet na existência de conhecimento em uma coleção de cartões contendo os assim chamados fatos.

             Seguindo as mesmas linhas, o sociólogo francês Bruno Latour utilizou uma abordagem do documento em seus estudos sobre como os fatos científicos são construídos no laboratório. Latour o demonstrou em vários trabalhos, especialmente no livro em coautoria com Steve Woolgar (LATOUR; WOOLGAR, 1979). Latour e Woolgar conduziram um trabalho antropológico no Instituto Salk, na Califórnia, observando como os fatos científicos eram construídos pela feitura de documentos de diferentes tipos, como artigos, monografias, diagramas e fotografias. Desde então, um subcampo foi desenvolvido nos estudos da ciência baseado na mesma teoria geral do documento (WOOLGAR, 1990).

            Esse foco no papel dos documentos também foi enfatizado no ensaio de John Seely Brown e Paul Duguid (1996), intitulado "The social life of documents", no qual apresentaram uma teoria social dos documentos baseada em leituras com foco na questão dos documentos de teóricos da sociologia, comunicação e estudos de mídia. Eles começam discutindo “a noção amplamente difundida do documento como uma espécie de transporte de papel que leva 'idéias' ou ‘informações’ pré-fabricadas através do espaço e do tempo” com base na metáfora do “conduto” e na crença de que “a informação existe como conteúdo ‘em’ livros, arquivos ou bases de dados como se pudesse facilmente estar ‘fora’ deles.” (BROWN; DUGUID, 1996, online). Eles prosseguem: “À medida que as novas tecnologias nos conduzem por grandes transformações na maneira como utilizamos documentos, torna-se cada vez mais importante olhar para além da imagem do conduto. Precisamos ver a forma como os documentos serviram não apenas para escrever, mas também para subscrever interações sociais; não simplesmente para comunicar, mas também para coordenar práticas sociais.”

 

A Teoria do Documento como um Paradigma Crítico na Biblioteconomia e na Ciência da Informação.

 

            É interessante ver como, desde a década de 1980, a abordagem da Documentação e a teoria do documento surgiram no mundo da BCI anglófona/escandinava. Por exemplo, tem sido uma parte importante da abordagem histórica do campo da BCI reconhecer suas raízes na documentação. Mais ou menos entrelaçada com esta abordagem histórica existe uma crítica cultural e social dos paradigmas dominantes da informação que utilizam a Documentação e a teoria do documento como alternativas potenciais aos paradigmas centrados na informação.

            É natural combinar um interesse em história da BCI com um interesse na Documentação e na teoria do documento, até porque a documentação é, em um alto nível, o pano de fundo histórico da BCI antes de 1968 (BUCKLAND; HAHN, 1998; BUCKLAND; LIU, 1995).

            São especialmente interessantes de uma perspectiva do documento os extensos estudos sobre os pioneiros do documento: Otlet e Briet, compreendendo biografias (BUCKLAND, 1995, 2006; RAYWARD, 1975, 1991, 1992, 1997, 1998), e edições críticas, assim como traduções de obras selecionadas para o inglês (BRIET, 2006; OTLET, 1990). É característico do campo que embora Otlet e Briet sejam reverenciados, esses estudos históricos não sejam uma tentativa de romantizar o passado.

            Rayward (1997, p. 290), por exemplo, escreve sobre Paul Otlet e seu trabalho no esforço de descobrir questões interessantes ainda relevantes para o nosso tempo:

 

Primeiramente, deve-se notar que o que é apresentado aqui como “documentação” vai além das definições aceitas atualmente. Estas tendem a ser restritas historicamente a aspectos da biblioteconomia especializada [special librarianship] e ao tratamento de informação científica e técnica. Otlet pretende algo mais amplo para ‘documentação’ e ‘documento’ do que aquilo que foi compreendido por aqueles que se autodenominavam ‘documentalistas’ imediatamente antes e depois da Segunda Guerra Mundial (por exemplo, FARKAS-CONN, 1990; RICHARDS, 1988). Nosso desafio é voltar às ideias originais de Otlet para que então possamos examinar algumas das suas implicações para a disciplina em desenvolvimento ou o conjunto de disciplinas que hoje chamamos de ‘ciência da informação’, (RAYWARD, 1997, p. 290).

 

            Quando Frohmann defende que se dê atenção ao trabalho de Otlet em relação ao trabalho sobre análise do discurso de Foucault, ele o faz de maneira semelhante. Pode-se utilizar os exemplos históricos de Otlet e Foucault para identificar vários temas e questões, mas também para reconfigurar os conceitos de documento e de documentação em um cenário contemporâneo e observar como um novo tipo de estudo de documentação poderia ser desenvolvido (FROHMANN, 2000).

            Na década de 1960, um dos principais argumentos para abandonar a abordagem da Documentação nos campos da biblioteconomia/documentação era uma crença otimista no poder do computador, o qual tornaria possível transcender barreiras físicas e estabelecer acesso imediato a documentos no ciberespaço: o sonho de Otlet e de outros de um “Cérebro Mundial” – tudo em um lugar, em um formato (RAYWARD, 1997, p. 298). Se esse tivesse sido o caso, teria feito sentido focar exclusivamente no usuário/usuária e em suas necessidades de informação. A crença persistente de que o Cérebro Mundial pode, algum dia, ser possível, transformou a informação-como-conteúdo na questão central da BCI e o documento uma questão secundária, simplesmente um problema prático a ser resolvido. A tarefa central do campo tornou-se formular as necessidades de informação dos usuários: fazer com que suas estruturas cognitivas correspondam às estruturas de dados no computador. Isso tem direcionado o desenvolvimento da BCI como a estrutura disciplinar predominante no amplo campo aqui chamado de documentação e o conceito de informação tornou-se seu conceito central (CAPURRO; HJØRLAND, 2003).

 

O assunto ainda importa?

 

            Seguindo a abordagem histórica, Buckland escreve uma série de artigos, notadamente o “Informação como coisa” (BUCKLAND, 1991), em que questionou a tendência da BCI em focar as dimensões subjetivas da informação. Ele faz uma distinção entre informação-como-processo, informação-como-conhecimento e informação-como-coisa. Buckland (1991, p. 351), menciona dois teóricos, Fairthorne (1954) e Machlup (1983), que argumentam que a informação não é “coisa”, e sim um “atributo do conhecimento do receptor''. No entanto, ele defende a informação-como-coisa, de fato, desempenhar um papel fundamental. Isto é de especial interesse em relação a sistemas de informação formais porque, em última análise, sistemas de informação, incluindo sistemas especializados e sistemas de recuperação de informação, só podem lidar com a informação neste sentido.

            Buckland lida com a condição última para informação, a coisificação ou materialidade. Ele quer “esclarecer o seu significado”, “afirmar o papel fundamental da 'informação-como-coisa’”e assim “trazer […] ordem teórica aos heterogêneos, mal ordenados campos associados à ‘ciência da informação’” (BUCKLAND, 1991, p. 352). A noção de “documento” é discutida como um possível conceito para a “coisa informativa'', sendo o objeto principal de todo o campo, o qual se baseia fortemente nas contribuições de Otlet e Briet (BUCKLAND, 1991, p. 352, 354).

            Em seu clássico artigo “O que é um documento?”, Buckland (1997) revisa uma série de definições. A maioria dos autores (exceto S. R. Ranganathan,[8] que define documentos estritamente como objetos “adequados para manuseio em uma superfície plana”) realmente preferem uma definição bastante ampla de documento, como a definição geral internacional, de 1937: “Qualquer fonte de informação, em forma material, capaz de ser utilizada para referência, ou estudo ou como uma autoridade” (BUCKLAND, 1997, p. 805).

            Pode-se, assim, perguntar se a questão mais importante é até que ponto se pode realmente ampliar a noção de documento, ou se isso é simplesmente uma discordância sobre as propriedades de definição de um documento que pode separar as pessoas. Isso nos leva a outra questão importante, que Buckland (1997, p. 807), levanta em seus comentários conclusivos:

 

Uma diferença entre as visões dos documentalistas discutidas acima e as visões contemporâneas é a ênfase que agora se colocaria na construção social do significado, na percepção do espectador sobre a significância e o caráter evidencial dos documentos. (BUCKLAND, 1997, p. 807).

 

            Isso muda o foco, retirando-o da materialidade do documento e realocando-o para suas dimensões sociais e perceptivas, remontando à tradição semiótica do “objeto-como-signo” (BUCKLAND, 1997, p. 807). Tendo sido dito que a materialidade é a condição última para lidar com a informação, é talvez surpreendente ler que não se deveria focar tanto na forma física, mas na função social e cultural do documento e em como ele é percebido por pessoas em diferentes independentemente de contextos sociais. Isso parece ser ainda mais importante para Buckland (1997, p. 808), à luz do emergente ambiente digital: “Qualquer perceptibilidade de um documento como uma configuração física é ainda mais reduzida, e a discussão sobre ‘o que é um documento digital?’ torna-se ainda mais problemática, a menos que nos lembremos do caminho de raciocínio que está subjacente às discussões amplamente esquecidas dos objetos de Otlet e do antílope de Briet.”

            Este aparente paradoxo na teoria do documento pode ser melhor compreendido se entendermos o trabalho de Buckland não apenas como uma crítica materialista do paradigma de informação dominante em BCI, mas também como parte de um esforço maior de formular alternativas mais social e culturalmente orientadas em BCI desde o final dos anos 1980 e início dos de 1990. Um exemplo inicial pode ser visto é um artigo de Houser (1986, p. 167), que escreveu que um documento é um “discurso social, produzido de acordo com uma função linguística específica e que é registrado em alguma forma publicada”. Houser não inclui nenhuma outra mídia além da palavra escrita, excluindo filmes e registros sonoros, em contraste tanto com Otlet como com Briet. Da mesma forma, Levy (1988, p. 187), define documentos pela satisfação de uma necessidade por “recursos comunicacionais estáveis e externos”. Ele destaca a necessidade de que se realizem mais pesquisas sobre os documentos, não apenas pela diferenciada separação entre o armazenamento e a representação de documentos no ambiente digital, o que inclui o artefato de armazenamento, o arquivo que contém sua representação, o artefato de representação na tela e a interface que dá acesso à representação.

             Além de Buckland, Rayward, Houser e Levy, vários outros estudiosos estadunidenses e escandinavos, incluindo Day, Frohmann, Hjørland, Andersen, Lund e Suominen, contribuíram para formular uma abordagem centrada no documento na BCI.

            Baseando-se em muitas teorias gerais da filosofia, especialmente as de Benjamin, Foucault, Derrida, Deleuze e Peirce, Day (1996, 1997, 2000a, 2000b, 2001, 2005a, 2005b), demonstrou o caráter metafísico do paradigma dominante da informação, que assume que informação é algo abstrato existindo puramente em nossas cabeças. Day fez isso especialmente por meio de leituras profundas das obras de Otlet e Briet (Briet, 2006). Se enfatizarmos as dimensões processuais na visão de Otlet (1990, p. 86), do livro como uma verdadeira "máquina para explorar o tempo e o espaço", pode-se melhor apreciar as qualidades sociais e culturais de seu trabalho e visão como um tipo precoce e bastante dinâmico de hipertexto, mais do que uma coleção estática de todo o conhecimento, em um limitado sentido positivista. Dessa forma, Otlet pode ser visto à uma luz mais positiva. De maneira semelhante, Day explorou a teoria do documento de Briet, focando em várias diferenças entre Otlet e Briet. De acordo com Day, uma das contribuições mais importantes de Briet à teoria dos documentos pode ser a distinção que faz entre documentos primários/iniciais e documentos secundários. Os documentos primários não são produzidos, mas descobertos pelo profissional como um signo indexical de um fenômeno na natureza ou na sociedade; eles são produzidos pela catalogação disso como uma instância de uma certa classe de fenômenos, tal como um antílope é parte de uma classe de animais. A ficha de catálogo é um dos primeiros documentos secundários produzidos sobre os documentos iniciais. Este último processo é o que Briet chama de técnica cultural. O catálogo e os documentos secundários, como artigos, livros e exposições sobre o animal são criados em uma rede complexa, criando a fundamentação documental para culturas científicas como a zoologia e para outros tipos de redes culturais, tais como a educativa e museológica. Em contraste a Otlet (1935), Briet não imaginou um centro unificado, “A Cidade Mundial”, com uma enorme coleção de conhecimento factual; pelo contrário, Briet considerou uma multiplicidade de centros de documentação em todo o mundo, oferecendo documentação adaptada a cada cultura específica.

             Como Day, Frohmann (1992, 1994, 1998, 2000, 2004, 2007), trabalha com várias teorias mais amplas, não apenas para criticar o paradigma da informação, mas também para apresentar uma alternativa paradigmática. Frohmann começou, no início da década de 1990, a fazer uma série de questionamentos críticos sobre alguns dos paradigmas dominantes da BCI, particularmente o paradigma cognitivo, a fim de apresentar alternativa à abordagem materialista dos sistemas documentários, antes conhecidos como sistemas de informação (FROHMANN, 1992, 1994). Em um artigo de 1998 sobre o papel do artigo científico no sistema de comunicação científica, Frohmann demonstrou como os artigos científicos individuais exercem um papel significativo em uma rede de documentos que constitui todo o sistema científico. A informação não é o único elemento documentário importante em um artigo científico, existe evidência de que o autor é parte da comunidade científica e também participa de um sistema discursivo ao escrever artigos em periódicos, o que lhe confere uma posição na comunidade científica. Em “Discourse and Documentation: Some Implications for Pedagogy and Research”, Frohmann (2000), defende o uso das ideias de Foucault sobre materialidade para possibilitar uma forma de estudar o papel que os documentos desempenham na vida social.

            A contribuição mais importante de Frohmann é sua monografia de 2004, Deflating Information: From Science Studies to Documentation. Nela, Frohmann apresenta uma alternativa paradigmática integral para os paradigmas dominantes da BCI, baseada em uma complexa teoria do documento. Ele define documentos como “diferentes tipos materiais de pacotes situados temporal e espacialmente de inscrições, enterrados em tipos específicos de práticas culturais” (FROHMANN, 2004, p.137). O que interessa a Frohmann é como os documentos funcionam em diferentes situações, como eles funcionam como fatores de estabilidade em comunidades sociais (por exemplo, o papel das revistas científicas em comunidades científicas). Dessa forma, ele segue a teoria geral do documento desenvolvida por Foucault e outros filósofos críticos e cientistas sociais, como Garfinkel, Smith e Latour.

            Estudiosos escandinavos adotaram uma abordagem semelhante. Hjørland (2000, p. 39) recomenda que “o objeto de estudo” mude “de fenômenos mentais de ideias, fatos e opinião, para fenômenos sociais de comunicação, documentos e instituições de memória.” Ele (p. 39), defende que a coisa mais importante é que “as naturezas intrínsecas desses objetos são relativamente irrelevantes”. Eles tornam-se documentos apenas quando lhes é atribuído um valor informativo por um coletivo ou domínio, como Hjørland denominou as comunidades estabelecendo se uma coisa se torna um documento (FJORDBACK SØNDERGAARD, ANDERSEN, HJØRLAND, 2003, p. 310). Documentos são utilizados como meios estabilizadores em nossa sociedade, sendo “relativamente estáveis formas de prática” (p. 310). Desta forma, o trabalho de Hjørland contribui para a teoria sócio-cultural do documento ao longo das linhas do trabalho de Day.

             A tentativa de Andersen (2002, 2004, 2006), de desenvolver uma teoria da organização social dos documentos e do conhecimento na sociedade tem como cenário teórico primário a noção de esfera pública trabalhada por Jürgen Habermas (1989). Essa abordagem enfatiza o papel de vários meios de comunicação na organização e na transformação das sociedades modernas, na formação da opinião pública e nas operações dos modos de produção capitalistas (ANDERSEN, 2004). Ela possibilita que Andersen traduza a teoria da esfera pública em uma teoria da organização social dos documentos e do conhecimento na sociedade. Como Andersen (2004, p. 72) afirma:

 

O que é crucial sobre essa variedade de gêneros de documentos que operam na sociedade e [no] Estado, é que eles [os documentos/os gêneros] organizam as atividades comunicativas de várias esferas e domínios. As esferas geram documentos para atuar dentro e entre as esferas particulares, formando assim uma ação comunicativa. (ANDERSEN, 2004, p. 72).

 

            A teoria de Andersen (2008), da organização social dos documentos na sociedade explica a necessidade e as vantagens potenciais de uma diversidade de formas documentais, em contraste com o interesse de Otlet de reunir todos os documentos do mundo em um formato comum.

             Uma aplicação da teoria do documento mais orientada à prática do trabalho em bibliotecas e instituições similares pode ser encontrada nos escritos de Suominen. Sua dissertação de 1997, intitulada: “Filling empty space”, é um tratado sobre as estruturas semióticas em recuperação da informação, em documentação e em pesquisas afins. Para Suominen (p. 57), documento é “uma mensagem com alguma permanência. Isso implica que pode ser utilizado (recebido) diversas vezes.”. Um documento deve durar algum tempo para que se torne um assunto para recuperação e um objeto para discussão. A noção de “aboutness” (Assunto/Tematicidade/Atinência[9]) é crucial para Suominen porque, ao falar em mensagens, o assim chamado conteúdo depende enormemente da cultura da qual o documento é parte. Conteúdo é definido como “potencial mental (isto é, pensamentos ou ideias potenciais, desde que as ideias sejam, elas mesmas consideradas, em última análise, como algo mental) social/culturalmente disponível” (p. 70). De acordo com Suominen, isso significa que a mensagem no documento se refere em parte a uma história documentária (por exemplo, a produção de um documento por autores) e em parte à prática documentária, sendo a comunicação sobre documentos o que os liga a uma determinada cultura através de uma linguagem documentária mediadora. É uma questão de combinar a cultura na qual o documento é produzido (por exemplo, ciência) com a cultura na qual ele é comunicado (por exemplo, uma biblioteca pública). A preocupação central para Suominen (1997, p. 89), é o desafio de responder a pergunta: “Sobre o que um documento é?” de forma profissional (SUOMINEN, 1997, 2004, 2007).

            Revisando a literatura da teoria do documento na comunidade anglo-escandinava da BCI desde o final dos anos 1980, pode-se verificar várias tendências, ora convergentes, ora divergentes. A primeira é a ênfase na materialidade do documento, às vezes vista como a condição última para ser um documento e, em outros momentos, como se quase não tivesse nenhuma relevância funcional. A segunda enfatiza o papel social do documento, fazendo-o dependente de um julgamento em uma comunidade (discursiva) específica. Se alguém considera um objeto ou evento um documento, então ele é, por definição, um documento. Essa teoria social do documento pode ser definida de forma muito ampla, abrangendo muitos diferentes tipos de mídia e situações na sociedade e focando o papel social do documento; ou pode ser definida de forma mais restrita, cobrindo principalmente mensagens linguísticas, faladas ou escritas. Essa diferença ressalta um desafio importante para a BCI e como ela lida com a teoria do documento. Uma teoria do documento definida de forma ampla favorece um interesse científico geral em analisar como os documentos funcionam na sociedade, mas uma teoria de documento definida de forma estrita é mais relevante para o desenvolvimento de uma base teórica para o gerenciamento profissional de documentos.

 

Teoria do Documento na Era Digital

 

             Em um artigo de 2001, “Where is meaning when form is gone? Knowledge representation on the Web”, Brooks pergunta: “Se abandonarmos o paradigma do documento, onde devemos situar nossos significantes de sentido, como os cabeçalhos de assunto, ou o equivalente da Web, metadados portadores de significado?” (BROOKS, 2001, online). De acordo com Brooks, o paradigma do documento luta para acomodar a Web, especialmente após a introdução do XML. Assim conclui (BROOKS, 2001, online):

 

À medida em que perdemos metáforas familiares como o ‘documento’ e nos dirigimos ao problema de situar significado na segunda geração da Web, as futuras moradas de significado podem ser: a estrutura de um armazém de informações, qualificadores de elementos de um armazém de informações, relações entre armazéns de informações. (BROOKS, 2001, online).

 

Parece que Brooks acredita que o sonho otletiano foi alcançado pela pela Web 2.0, um enorme armazém de informações onde se pode escolher qualquer informação relevante desejada sem criar um documento permanente. Ao mesmo tempo, ele menciona que os novos “metadados portadores de conteúdo… podem ser mais proveitosamente empregados em uma comunidade fortemente normativa, que não dependa do conceito legado herdado de documento” (BROOKS, 2001, online). Em outras palavras, muito do e sobre o novo armazém de informações é estruturado. Um dos que lidaram com documentos em geral, não apenas documentos digitais, é Levy que, como antes mencionado, lançou a ideia de um grande programa para pesquisa de documentos (LEVY, 1988). Em seu livro, Scrolling forward: Making sense of documents in the digital age, Levy (2001, p. 23), afirma que documentos “são, de forma muito simplesmente, coisas que falam. São pedaços do mundo material – argila, pedra, pele de animal, fibra vegetal, areia, em que imbuímos a capacidade de falar.” Levy relaciona isso à noção de Latour de delegação de responsabilidade não apenas a outros humanos por meio de redes, mas também a objetos inanimados.

Tendo apresentado uma definição muito ampla de documentos, Levy (2001, p. 137), passa a examinar com proximidade “a natureza dos documentos digitais” na esperança de separar o que é novo e o que não é. Ele afirma: “Materiais digitais são constituídos tanto pela representação digital quanto pelas formas de percepção produzidas a partir dela” (LEVY, 2001, p. 138). Isso suscita a importante questão se é possível falar realmente de documentos digitais. Se são apenas uma coleção temporária de partes díspares reguladas por uma determinada linguagem de programação, possibilitando uma forma perceptível por algum limitado tempo, pode-se perguntar se faz sentido falar de documentos em um ambiente digital. Alguém pode perguntar: Onde está o documento? É possível falar de documentos se o documento pode mudar ou mesmo desaparecer em segundos? É frequentemente afirmado que documentos “tradicionais” (por exemplo, documentos em papel) são mais fixos e estáveis do que documentos digitais. Como Levy (1994) aponta em seu artigo “Fixed or Fluid? Document Stability and New Media”, não é necessariamente a questão dos velhos suportes serem mais estáveis que os novos. Ele liga isso à questão se é a fixidez do documento físico que importa ou se é a questão da estabilidade do conteúdo de um documento físico para outro, o que conduz à questão da identidade dos diferentes documentos. Isso, por sua vez, conduz a uma das mais importantes questões que Levy aponta: como garantir fixidez e permanência? O que significa ser o mesmo? Como identificar a igualdade entre dois documentos? Este é um tema que atraiu vários estudiosos e que leva a questões sobre a natureza de um documento. Se você tiver que estabelecer a igualdade entre dois documentos, você deve ser capaz de definir os critérios para que sejam iguais. Isso pode ser tanto uma questão de produção de uma cópia física exata do documento quanto à transferência do mesmo conteúdo de um documento para outro. Este problema desafia nossa compreensão da relação entre as dimensões física e abstrata de um documento.

É necessário um maior foco na teoria do documento para lidar com o digital. Renear e Dubin (2003, online), apontam uma série de importantes consequências da falta de uma teoria do documento bem desenvolvida: “Como resultado, não apenas este conceito crítico é subteorizado, mas o progresso de uma série de problemas importantes – incluindo preservação, conversão, garantia de integridade, recuperação, federation [associação/federação], metadados, identificadores – foi retardada.” Eles prosseguem em seu artigo Towards Identity Conditions for Digital Documents (RENEAR; DUBIN, 2003, online):

 

O desenvolvimento de condições de identidade para um tipo específico de entidade não é algo que possa ser separado, muito menos subsequente, à definição dessa entidade, de modo que não podemos começar nosso desenvolvimento das condições de identidade com uma explícita definição do que queremos dizer com "documento"... Por documento, então, nos referimos à expressão simbólica abstrata que pode ser fisicamente instanciada repetidamente e em vários suportes. Este uso corresponde mais ou menos ao termo expressão do FRBR e possui um sinônimo coloquial: ‘texto’. Embora agora razoavelmente comum, esse sentido de ‘documento’ compete com outro uso bem estabelecido e proximamente relacionado uso do termo... para o portador físico com sua inscrição instanciada. Escolhas terminológicas nesta área são difíceis, mas acreditamos que nosso uso é consistente com a prática comum e emergente na literatura e na ciência da informação. (RENEAR; DUBIN, 2003, online).

 

O uso de documento feito por Renear e Dubin, entretanto, não é no geral comum. Na crítica textual e na bibliografia material, por exemplo, a concepção dominante do documento tem sido o objeto físico. Shillingsburg (1991, p. 54), por exemplo, oferece a seguinte definição de documento:

 

A palavra documento pode ser utilizada para se referir ao “contêiner” físico do texto linguístico… Documentos são objetos físicos, materiais, que podem ser segurados nas mãos. Cada nova cópia do texto linguístico está em um novo documento. Dois documentos contendo o mesmo texto linguístico ainda são duas entidades separadas, mas só um texto linguístico. (SHILLINGSBURG, 1991, p. 54).

 

Um dos problemas com a definição de Shillingsburg é a exigência de que o documento seja segurado nas mãos. Isso não se aplica a um documento digital e, portanto, neste caso, pode-se acabar com uma definição abstrata, como a de Renear e Dubin.

A acadêmica de literautura Hayles (2003), estudou o impacto e as consequências das tecnologias digitais na literatura. Ela trabalha lida com a noção de documento e sugeriu uma série de níveis analíticos, com diferentes graus de materialidade: obra, texto e documento. Uma obra pode ser definida como uma assemblage, um aglomerado de textos. Um texto, ou mais precisamente a materialidade do texto, é uma “interação de suas características físicas com suas estratégias de significação” (HAYLES, 2003, p. 277). Finalmente, um documento é a corporificação física do todo. Quanto à questão se dois documentos corporificam o mesmo texto, Hayles (2003 p.278), escreve:

 

Em alguns casos, um texto permaneceria relativamente constante em muitos documentos, presumindo que o debate concordou que as diferenças físicas entre os documentos não eram importantes como componentes significativos. Em outros casos, podem existir tantos textos quanto existem documentos. (HAYLES, 2003 p. 278).

 

Neste ponto, Hayles defende que as diferenças físicas tornam-se importantes se forem consideradas importantes pelos intérpretes. Ela prossegue:

 

Nenhum documento, texto ou obra seria considerado imaterial; todos seriam investidos de sentidos nuançados de suas materialidades, um ponto de vista que dinamizaria e privilegiaria as discussões de como características físicas, conteúdo verbal e estratégias de significação não-verbais trabalham conjuntamente para produzir o objeto chamado ‘texto’. (HAYLES, 2003, p. 278).

 

Pode-se inverter a questão e discutir se o documento também podia ser mais do que a corporificação física. Hayles (p. 277), afirma: “Se casos sólidos podem ser construídos para interação das diferenças físicas com os dois documentos significando estratégias como compreendido e interpretado pelos leitores, então talvez devessem ser considerados textos diferentes.” Assim, os documentos não são simples corporificações físicas, mas são igualmente definidos pelas formas pelas quais são compreendidos, isso levando-nos à questão se a noção de texto é ainda necessária. É possível definir uma obra como um aglomerado de documentos?

Zacklad argumenta que o fator principal na produção de documentos é fazê-los estáveis, inserindo uma transação comunicável em suporte persistente, de forma a fazê-lo acessível para recuperação e reutilização. De fato, ele afirma que essa é a essência de um documento. Zacklad (2006, p. 217), defende que documento é “um produto semiótico transcrito ou gravado em um substrato perene, dotado de atributos específicos destinados a facilitar as práticas associadas à sua posterior utilização na estrutura das transações comunicacionais distribuídas.”

Ao incluir esses atributos à “produção semiótica” (ZACKLAD, 2004, p. 1), ele se torna um documento que pode ser utilizado no futuro, permitindo a “circulação do documento através do espaço, tempo e comunidades de interpretação” (p. 2). É, em parte, a qualidade de ser o veículo persistente e, em parte, atributos como título e índice que constituem a produção semiótica de um documento. Mas, acima de tudo, esta teoria do documento é visualizada integrando uma teoria geral de “transações comunicacionais” (ZACKLAD, 2004, p. 2; ZACKLAD, 2000, 2006), e em primeiro lugar é necessário um ou vários produtores, bem como um ou vários beneficiários (ZACKLAD, 2004), que concordem com uma mídia comum e uma compreensão comum da situação.

Drucker (1994), um estudioso americano de mídia e literatura que trabalha com a materialidade tanto da arte visual e visual como da arte verbal, formulou uma complexa compreensão dos documentos:

 

Quando olho para um documento, não vejo um fato material simples, positivo, vejo campos de relações mutantes momentaneamente estabilizadas em um artefato que existe em um continuum de dimensões temporais, espaciais e quânticas, somente constituído por meio de enquadradores atos estruturais. (DRUCKER, 2007, p. 51).

 

Nesta definidora observação da natureza de um documento, Drucker afirma que o último elemento constituinte na produção do documento são os atos estruturais de intervenção, em outras palavras, a existência de um agente interveniente, de uma dimensão sociocultural somada às dimensões físicas e abstratas. Tudo isso ilustra a complexidade do documento, especialmente na era digital, quando não se pode mais segurá-lo na mão, como Shillingsburg descreveu.

Este desafio teórico também foi tratado no talvez mais ambicioso projeto moderno em teoria do documento, o projeto da rede francesa ‘RTP-DOC: Résau thématique pluridisciplinaire: Documents et contenu: création, indexation, navigation’ (rtp‐doc.enssib.fr). Não é surpresa que seja este um projeto francês, dada a longa tradição da documentação na França. O grupo é composto por estudiosos de muitas disciplinas diferentes – ciência da computação, linguística, estudos literários, arqueologia, biblioteconomia e ciência da informação – todos com diferentes interesses em documentos. Além de ser um projeto interdisciplinar, possui uma abordagem inovadora: a escrita colaborativa de um texto coletivo em teoria do documento digital que não menciona explicitamente fontes e referências, tornando-se uma espécie de manifesto teórico semelhante àquele que Briet criou cinquenta anos antes. Ele começou com um rascunho escrito por um pequeno grupo de trabalho que colocou seu texto na Internet para discussão na comunidade do projeto. O processo de escrever comentários, acréscimos e novas versões era restrito aos colaboradores ativos. Tinha-se que estar envolvido no processo para ganhar acesso à obra antes que fosse finalmente aceita por todos e publicada sob o pseudônimo do coletivo “Roger T. Pedauque”, que se refere às primeiras letras do nome público do grupo (PEDAUQUE, 2006, 2007).

Esse projeto reconhece que, na era pós-moderna, estamos experimentando uma espécie de re-documentação em grande escala, similar ao movimento mundial de documentação que ocorreu 100 anos atrás liderado por Otlet e outros. No início da sociedade em rede global, há 30 anos, parecia que a abordagem do documento estava obsoleta, mas agora parece mais relevante do que nunca. A crença otimista de Otlet, H.G. Wells e outros de que novos tipos de tecnologias de informação e comunicação facilitariam uma maior ordem na documentação foi desafiada pela anarquia da World Wide Web. A Web tornou pública a comunicação anteriormente privada e possibilitou que quase todo mundo publicasse qualquer coisa, mas também fez cada vez mais difícil navegar e encontrar material relevante e confiável. As relações entre autoridades públicas e agentes comerciais, entre organismos nacionais e internacionais e entre diferentes tipos de mídia têm sido desafiadas a lidar com o documento eletrônico. Não há soluções fáceis. Não é apenas um problema técnico, político ou cultural. Todas essas dimensões estão interligadas. A ambição do Google de digitalizar milhões de livros e fazê-los universalmente acessíveis é um bom exemplo. O Google não precisa apenas de tecnologia de digitalização, mas também da permissão dos autores, editoras etc. O projeto pode tender a favorecer livros em inglês sobre línguas europeias e de outros lugares do mundo. Assim, o Google desafia os editores em todo o mundo e os força a competir ou a confiar nos serviços do Google.

O grupo RTP-DOC decidiu, portanto, abordar o conceito de documento em três ângulos: primeiro, focalizando no documento como forma, enfatizando a fisicalidade dos documentos. A segunda perspectiva era a de documento como texto, focando em como um documento faz sentido, é significativo e é intencional. A terceira perspectiva é o documento como um objeto social, refletindo sua posição em um contexto social.

Documentos são discutidos desde a perspectiva da forma (física) no primeiro documento de trabalho, “Pedauque I, Document: Form, Sign and Medium, As Reformulated for Electronic Documents” (PEDAUQUE, 2003). Esse texto mostra como surgiu o documento digital e como seu desenvolvimento mudou seus elementos constitutivos. Isso pode ser expresso em uma equação básica para documentos, por meio da mudança da formatação e da linguagem de programação/codificação. Pode-se formular o desenvolvimento do documento digital como uma progressão de um documento analógico (“suporte + inscrição”) para um documento digital (“estrutura + dados”), criando a noção de um documento estruturado (com base na obra de André, Furuta, e Quint [1989], sobre o desenvolvimento de redes digitais e o conceito de um documento estruturado). Um documento estruturado é criado por meio do processo de estruturação de um conjunto de dados pelo uso de uma série de ferramentas de autoria, linguagens de programação e normas (QUINT; VATTON, 2004), levando assim a uma série de tipos padronizados de documento digital. Agregar mais e mais dados em enormes repositórios produz dados que já são estruturados em um determinado nível; agora, um padrão como o XML permite uma nova definição de documento: “dados estruturados + formatação”.

Desta forma, a RTP-DOC tentou chegar a uma definição de documento eletrônico, ao mesmo tempo em que há um reconhecimento que esta é uma definição em construção devido a devido aos contínuos avanços da tecnologia digital. O primeiro problema é que essa definição convencional podia conduzir à assunção de que as estruturas entendidas como forma eram independentes dos dados (ou seja, conteúdo), de modo que não é possível validar o documento apenas pela sua forma, como se podia fazer no caso de documentos analógicos. Outra preocupação é se documentos podem parecer diferentes se, por exemplo, são utilizados diferentes navegadores. Mais uma vez, a questão da identidade do documento torna-se um problema crucial e levanta a problemática de como se define os critérios para a identidade de um documento eletrônico específico (retornando assim aos argumentos oferecidos por Buckland [1991,1997, 1998], Levy [1994, 2001], e Renear e Dubin [2003], quanto à distinção entre a estrutura digital básica de partes distintas e a interface que aparece para o usuário). Isso também remete à dimensão temporal dos documentos digitais; por exemplo, se os documentos XML podem ser preservados e durarem para sempre. Pode-se tornar um requisito que eles sejam atualizados regularmente, assim como os dispositivos de leitura, o hardware físico e o software e seu grau de estabilidade no futuro.

Na segunda perspectiva (que trata o documento como um texto), documentos analógicos são definidos como: inscrição + significado. “O que importa é o conteúdo, materializado pela inscrição, que transmite o significado. O sentido se constrói de acordo com o contexto de produção e distribuição do documento, que é o que determina a interpretação do conteúdo” (PEDAUQUE, 2003, online). Desta forma, a definição RTP-DOC aproxima-se às teorias semióticas sobre signo e texto.

Em Pedauque 2003, é sugerido que existem três ideias principais sobre o documento como texto, assim como signo. Primeiro, existe a ideia de classificação. Classificação é uma questão de “Documentos [que] são agrupados em grandes categorias cujos integrantes diferentes são homólogos e inter-relacionados” (PEDAUQUE, 2003, online); uma questão de coerência. Na sequência, temos a ideia de interpretação: “Que ligações o documento sugere ou estabelece e como? Um documento não tem sentido, exceto se lido ou interpretado por um leitor”(PEDAUQUE, 2003, online). A terceira ideia é sobre o próprio signo. “Qualquer objeto é potencialmente um signo e podia ser um ‘documento’” (PEDAUQUE, 2003, online). Indiretamente, isso se refere à discussão de Briet sobre o antílope como um documento: “Uma discussão, que se tornou um clássico, demonstrou, por exemplo, que um antílope em um zoológico (portanto, em um sistema de classificação social) era um documento” (PEDAUQUE, 2003, online). Isso permite uma definição muito ampla de documento. Ao mesmo tempo, Pedauque (2003, online) afirma: “Mas a grande maioria dos documentos são construídos a partir da linguagem, principalmente escrita e também falada”. Pedauque continua: “O próprio zoológico é construído em torno de um discurso e pode-se dizer que o antílope é ‘documentado’”. O mesmo argumento pode ser aplicado a documentos multimídia que são acompanhados de legendas ou notas. A estrutura da linguagem escrita, das letras do alfabeto ao discurso, organiza, portanto, a maioria dos documentos. Em outras palavras, como diz a RTP-DOC/Pedauque (2003, online) de forma mais ou menos explícita: Documentos são primariamente objetos escritos, com a linguagem natural dando signos de “muito grande plasticidade”. Disso segue-se o problema das “linguagens documentais”, empregadas para classificar os documentos para uso futuro (PEDAUQUE, 2003, online). A questão central é como utilizar essas ferramentas linguísticas de uma maneira que reconheça as diferentes formas de interpretar os mesmos documentos. Mesmo a possibilidade de processamento automático da linguagem não torna, a princípio, mais fácil extrair o significado integral dos documentos. Para fazer os documentos digitais disponíveis para uso futuro, sugere-se uma nova equação definidora: Documento eletrônico = texto informado + conhecimento. A razão para tal definição é que o texto é estruturado de forma customizada, possibilitando a adição de conhecimento na forma de metadados adequados a um específico leitor/usuário. Isso leva à Web semântica com ontologias transformando um documento em “texto informado + ontologias” ou, mais prosaicamente: “Um documento eletrônico é um texto cujos elementos podem ser potencialmente analisados por um sistema de conhecimento para sua exploração por um leitor competente” (PEDAUQUE, 2003, online). No entanto, pode-se ainda perguntar: O que é realmente o documento? Como você define os elementos do documento? Eles ainda são elementos primariamente materiais/físicos? Novos projetos de pesquisa visam dar mais importância à forma material/física. O avanço mais imediato é o uso de marcadores estruturais (e no futuro semânticos) para modular análises de texto, identificação de conhecimento ou anotações. Uma análise mais detalhada se preocuparia com a integração de elementos de formatação dos elementos materiais, como fonte, maiúsculas e minúsculas, indentação e listas. Mas ainda existem problemas, tais como: “Até que ponto um elemento significativo pode ser isolado de um conjunto que possui uma unidade de significado, ou seja, do documento como um todo?” (PEDAUQUE, 2003, online).

Finalmente, a terceira perspectiva é a do documento como meio (PEDAUQUE, 2003, online). No contexto francês, isso tem a ver basicamente com o papel social do documento – a mediação social do documento; em outras palavras, documentação como comunicação. A partir dessa perspectiva social, o documento tradicional (ou seja, analógico) é definido como: Documento = inscrição + legitimidade. Para ser um documento legítimo, “a inscrição deve ter um alcance para além da comunicação privada (entre poucas pessoas) e a legitimidade deve ser maior do que efêmera (ir além do momento de sua enunciação) e, portanto, ser registrada, inscrita” (PEDAUQUE, 2003, online). Em outras palavras, um documento, em um certo grau, precisa ser publicamente reconhecido e também requer um grau de permanência para ser reutilizado. “O status de documento não é conseguido de uma vez e para todos… É adquirido e pode ser perdido e totalmente esquecido para sempre” (PEDAUQUE, 2003, online). Isso nos conduz à discussão da economia dos documentos em duas linhas. A primeira está interessada na comunicação organizacional e estuda os documentos principalmente como um processo empresarial; a segunda analisa a comunicação na mídia e investiga o processo de publicação. Tendências contraditórias são evidentes, por exemplo, o desaparecimento de um grande número de documentos como livros de contas bancárias e o aumento concomitante de documentos digitais, que podem desaparecer se não validados e preservados. Do ponto de vista da comunicação organizacional, podemos ter identificado uma primeira mudança em nossa equação de documento = inscrição + legitimidade para documento digital = texto + procedimento. Mas essa equação não leva em conta os desenvolvimentos recentes da Web. Uma equação específica para documentos na Web poderia ser: documento = publicação + sugestão de acesso (PEDAUQUE, 2003, online). Publicar somente não garantiria legitimidade. Um status de alto escalão também é necessário para que haja sugestão de acesso. Os guardiões de documentos na Web (na realidade, provedores de documentos como, por exemplo, o Google), mais que o editor primário ou o criador, podem deter a chave principal de acesso a documentos online, transformando um documento digital em “um traço de relações sociais reconstruídas por sistemas computacionais” (PEDAUQUE, 2003, online).

Pode ser difícil ver como uma teoria geral do documento emerge dessas três perspectivas; mas talvez não seja esse o objetivo principal deste impressionante esforço da comunidade francesa de documentos, RTP-DOC. Seu trabalho pode ser visto de outra forma, como um produtivo brainstorming interdisciplinar, realizada de uma forma muito sistemática, explorando as dificuldades enfrentadas por aqueles que lidam com documentos hoje; em outras palavras, quase todos na sociedade (PEDAUQUE, 2003, 2006, 2007). Ao mesmo tempo, é um projeto otimista, buscando possíveis soluções para os desafios na teoria do documento hoje, no contexto do fenômeno da re-documentarização (um termo francófono para o movimento da neo-documentação) (PEDAUQUE, 2007), como a autoria, identidade, propriedade intelectual, recuperação de documentos, notas, princípios de preservação de documentos digitais, documentos multimídia e políticas de documentação.

 

Uma Teoria complementar do Documento

 

Em 1996, foi estabelecido um programa em Estudos de Documentação na Universidade de Tromsø, Noruega, oferecendo cursos em todos os níveis, da graduação ao doutorado. (SKARE, LUND; VÅRHEIM, 2007). Antes do início do programa, um comitê de bibliotecários e profissionais de várias disciplinas formulou a estrutura conceitual geral do programa, naquele momento sem saber muito sobre Otlet ou Briet e as antigas tradições de estudos de documentação. A principal razão para a escolha do nome “Estudos de Documentação” não foi baseada no interesse teórico de moldar um novo paradigma na BCI, mas sim em um interesse político muito mais pragmático e geral relativo à criação de uma Biblioteca Nacional na Noruega, em 1989 e ao lançamento simultâneo de uma lei de depósito legal concebida de forma ampla na Noruega, incorporando documentos de todos os tipos – material impresso, televisionado, radiofônico e cinematográfico – e, por último, mas não menos importante, a natureza constantemente mutável dos documentos digitais na Web (LUND, 1999a, 2007). Esse ato tornou o ideal otletiano explícito e desafiou o sistema de bibliotecas norueguês de duas maneiras fundamentais. Uma era como fazer todos os documentos acessíveis para todos, ao mesmo tempo, em que se respeitasse o complexo de direitos autorais dos produtores de documentos. A outra envolvia nada menos do que dedicar-se à natureza intrínseca dos documentos, ou seja, especificamente, como preservá-los e fazê-los disponíveis no momento certo para qualquer usuário no futuro.

Esses desafios exigiram uma abordagem complementar à teoria do documento, que foi formulada por Niels Windfeld Lund, professor fundador do programa de Tromsø. Ele sugeriu que se observasse os documentos por três ângulos complementares: físico, social e mental, em combinação que possibilitasse uma descrição completa (LUND, 1999b, 2003, 2004). Isso não significa que o documento possua cada uma dessas três características em algum grau, mas que pode ser visto simultaneamente como um fenômeno físico, social e mental. Dessa perspectiva, a questão central é como essas dimensões interagem com cada outra de maneiras diferentes. Isso depende dos ambientes físico, social e cognitivo no qual a documentação ocorre, seja se em uma biblioteca, na assistência médica, nas artes, nos negócios, em subculturas locais e virtuais, na política e assim por diante. Lund (2004), conecta os processos de documentação aos documentos, definindo esses últimos como quaisquer resultados dos processos de documentação. Qualquer processo de documentação é constituído por um ou mais agentes humanos que usam algum tipo de suporte ou instrumentos de determinadas maneiras para produzir documentos. Comparada às Teorias do Documento anteriores, Lund introduz uma importante distinção com a sua definição de um documento. Desde o início da sociedade moderna nos séculos XVI e XVII, o documento preservado tem recebido prioridade (ainda hoje, defensores como Zacklad (2004), defendem a reserva da própria definição de documento e documentação [documentarização] para os documentos persistentes). Lund vai um passo além – ou talvez atrás – ao incluir qualquer tipo de expressão ou demonstração na definição de documentos, como discurso e performance ao vivo e sem gravações. Ele se refere a uma relação complementar e enviesada entre os dois conceitos de comunicação e documentação (LUND, 2003, 2004). Embora a comunicação favoreça a partilha social de significado, a documentação favorece os meios (mentum) sendo utilizados para mostrar (doceo); mas documentação não pode existir sem comunicação e vice-versa. Essa perspectiva desafia a velha crença de que o campo profissional da documentação é restrito aos livros e outras mídias destinadas à preservação. Isso pode, de fato, ampliar e, assim, fortalecer o campo profissional da documentação, assim como os campos profissionais da mídia e da comunicação já foram enriquecidos pelo desenvolvimento de teorias gerais da mídia e da comunicação.

Numa ampla definição de documento, os teóricos do documento hoje podem focar na diversidade de documentos e estudar a vasta gama de problemas relacionados aos processos de documentação e os documentos que deles resultam. Para isso, Lund desenvolveu uma estrutura analítica de três camadas: um nível geral, com a forma da documentação (gênero do documento), um nível específico com o documento, e um terceiro nível que entra no documento e explora suas diferentes partes, os chamados docemes (LUND, 1999b, 2003, 2004).

 

A Teoria do Documento no Passado, Presente e Futuro

 

Duas significativas linhas são evidentes na teoria do documento desde a era de Paul Otlet até hoje. A primeira é se escolhe-se uma definição ampla ou restrita de documento, se consideramos quase tudo como um documento potencial ou especificar o que pode ou não ser considerado um documento. Essa questão está intimamente ligada à segunda questão, os elementos constitutivos de um documento. Ao longo desta revisão, houve alguma tensão quando se trata de definir os elementos constitutivos de um documento: as propriedades físicas de um documento, as circunstâncias sociais de um documento e a interpretação mental ou cognitiva de um documento.

Ambas as questões dependem grandemente da perspectiva a partir da qual a teoria do documento é discutida. A BCI e as comunidades da ciência da informação enfrentam uma tensão inerente entre um interesse pragmático em como lidar de forma prática com documentos (em um número crescente de formatos e diversidade de tecnologias em rápida mudança) e um interesse crítico geral em compreender o papel dos documentos na sociedade e na cultura em geral. Pode-se combinar esses interesses como Frohmann (2004, p. 245), fez:

 

Esses tipos de debates são importantes e se tornam mais complexos quando o espectro dos tipos de documentos e suas interações são expandidos. Um conjunto de problemas consiste simplesmente em identificar os vários estratos de documentação e as condições de sua existência. O que determina o tipo de um documento – disciplina, problema, estrutura organizacional ou alguns outros fatores? (FROHMANN, 2004, p. 245).

 

Tendo sido considerado como um conceito flagrantemente autoevidente ou mesmo um conceito fora de moda durante as duas últimas décadas, o conceito do documento foi novamente reconhecido como uma importante categoria analítica. Tornou-se um conceito crescentemente disputado e, como tal, frutífero para a pesquisa documental, da mesma forma que os conceitos de informação, comunicação e signo desempenharam um papel produtivo por muitos anos na pesquisa científica, bem como terem sido úteis em muitas atividades de design e inovação a partir de pesquisa. Pode ser importante, ao concluir, admitir que talvez nunca cheguemos à teoria final do documento, à própria essência do documento. Como afirmou o físico dinamarquês Niels Bohr em uma carta destinada a um amigo, em 1935: “Nossa tarefa não é penetrar na essência das coisas, cujo significado não conhecemos de maneira alguma, mas sim desenvolver conceitos que nos permitam falar de forma produtiva sobre os fenômenos da natureza.” (PAIS, 1991, p. 446).

O tempo dirá quão duradouro será o papel do conceito de documento, não apenas na BCI e nos serviços de informação e tecnologia, mas também na pesquisa, nos projetos, no planejamento e na sociedade em geral.

 

 

Agradecimentos: Agradeço a Blaise Cronin, ex-editor da Annual Review of Information Science and Technology – ARIST, pelo apoio.

 

 

 

 

 

 


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REFERÊNCIAS UTILIZADAS PARA A TRADUÇÃO:

 

BRIET, S. O que é a Documentação? . trad. Maria de Nazareth Rocha Furtado. Brasília, DF: Briquet de Lemos, 2016.

GUEDES, Emanuel Ferreira; MARTINHO, Noemi; MORAES, João Batista E. de. O ‘assunto’ na ciência da informação: a questão do aboutness. In: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO, 10., 2009, João Pessoa. Anais [...] João Pessoa: UFPB, 2009.



[1]     Originalmente publicado sob o título: “Document Theory” - LUND, Niels Windfeld. Document theory. Annual Review of Information Science and Technology, v. 43, n. 1, p. 1–55, 2009. Tradução para o Português: Me. Asy Pepe Sanches Neto, Ma. Gabriela Fernanda Ribeiro Rodrigues e Dr. Vitor Manoel Marques da Fonseca.

[2]    Nota de Tradução (N.T.): Cabe apontar, o contexto da Library and Informations Science (LIS) no escopo anglo-americano possui contornos de aproximação ligados ao contexto em que se insere. Não cabendo aqui uma discussão sobre o assunto, optamos por adotar a terminologia atualmente utilizada no Brasil: BCI.

[3]     N.T.: No Brasil, o livro foi traduzido por Maria de Nazareth Rocha Furtado e publicado pela editora Briquet de Lemos, em 2016, sob o título " O que é a Documentação?" . Embora existam conflitos entre alguns outros textos traduzidos para o português e as citações em outros idiomas adotados por Lund, no caso do Tratado, as citações aqui apresentadas e as traduções propostas na versão brasileira eram bastante próximas. Por esse motivo, optamos por utilizar a forma adotada por Maria de Nazareth Rocha Furtado. Destaque-se que esse recurso é possível apenas nas citações diretas, as indiretas não permitem uma análise precisa do trecho do texto utilizado, motivo pelo qual não indicaremos ou faremos relação com a versão brasileira. Assim, optamos também por não alterar as citações no corpo do texto, indicando em “Notas de Rodapé” a paginação na versão brasileira.

[4] (BRIET, 2016, p. 1)

[5] (BRIET, 2016, p. 1)

[6] (BRIET, 2016, p. 1)

[7] (BRIET, 2016, p. 21)

[8] Ranganathan, 1963, p. 41

[9]     N.T. A tradução de Aboutness suscita dúvidas pois no universo da BCI se refere, de alguma forma, à representação temática entre um documento e seu conteúdo, eventualmente chama-se esse tipo de representação de “Assunto”, mas de forma mais geral refere-se ao trabalho intelectual sobre o estabelecimento de certos códigos linguísticos e a utilização desses códigos para subordinar um conjunto complexo de discussões que são, por definição, mais amplas.

Diante do exposto, optamos por utilizar algumas das traduções utilizadas na literatura nacional, para uma melhor compreensão da discussão. Cf. GUEDES, Emanuel Ferreira; MARTINHO, Noemi; MORAES, João Batista E. de. O ‘assunto’ na ciência da informação: a questão do aboutness. In: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO, 10., 2009, João Pessoa. Anais... João Pessoa: UFPB, 2009.

[10]N.T.: Ressalte-se que utilizamos as citações conforme constavam no texto original, apenas adaptando-as às normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT).