QUESTÕES FILOSÓFICAS EM TORNO DOS ESTUDOS INFORMACIONAIS
Carlos Robson Souza da Silva[1]
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE)
crobsonss@gmail.com
Resumo
Trata das questões filosóficas relacionadas ao estudo da informação. Tem como problema: que questões filosóficas podem ser consideradas necessárias para a reflexão e a fundamentação em torno dos estudos informacionais? É objetivo geral do trabalho: identificar as questões filosóficas que cercam os estudos de informação. Possui como objetivos específicos: a) interseccionar Filosofia e Ciência da Informação; e b) discutir possibilidades filosóficas para o estudo da informação baseado em autores da área. Trata-se de uma pesquisa básica, de caráter qualitativo, que utilizou do levantamento bibliográfico como instrumento de coleta de dados. Os termos “Ciência da Informação”, “Filosofia da Informação”, “Filosofia”, “Filosofia da Ciência da Informação” foram pesquisados em sites acadêmicos, como a Base de Dados em Ciência da Informação (BRAPCI) e o Google Acadêmico. Discute o desenvolvimento da Ciência da Informação. Relaciona Filosofia e Filosofia da Informação. Apresenta questionamentos filosóficos sobre a informação trazidos por Floridi (2010), Ilharco (2005), Capurro (2003) e Frohman (2012).
Palavras-chave: Ciência da Informação. Filosofia da Informação. Informação (Categoria Filosófica)
PHILOSOPHICAL QUESTIONS ON THE STUDY OF INFORMATION
Abstract
It deals with philosophical issues related to the study of information. Its problem is: what philosophical questions can be considered necessary for reflection and reasoning around informational studies? The general objective of the work is to identify the philosophical issues surrounding information studies. Its specific objectives are: a) to intersect Philosophy and Information Science; and b) discuss philosophical possibilities for the study of information based on authors in the area. This is a basic research, of a qualitative nature, which used the bibliographic survey as a data collection instrument. The terms "Information Science", "Information Philosophy", "Philosophy", "Information Science Philosophy" were searched on academic websites, such as the Information Science Database (BRAPCI) and Google Scholar. Discusses the development of Information Science. Relates Philosophy and Philosophy of Information. It presents philosophical questions about information brought by Floridi (2010), Ilharco (2005), Capurro (2003) and Frohman (2012).
Keywords: Information Science. Information Philosophy. Information (Philosophical Category).
1 INTRODUÇÃO
O estudo da informação remonta às revoluções tecnológicas baseadas em informação que se sucederam aos eventos da Segunda Guerra Mundial e da Guerra Fria. As tecnologias da informação e da comunicação, a internet, as redes sociais, assim como o livro, os arquivos, os objetos museais, as bibliotecas e as práticas documentárias como um todo passaram a ser reavaliados sob uma nova ótica: seu caráter informacional, sua possibilidade informativa (FROHMAN, 2012).
A Ciência da Informação é resultante dessa necessidade de se estudar a informação, suas caraterísticas e os fenômenos a ela relacionados, como se pode perceber no caso da definição da área proposta por Harold Borko (1968). Os fluxos, os fenômenos, os processos, os significados, as práticas, os comportamentos relacionados à informação, seu acesso, uso e transmissão são questões que interessam à Ciência da Informação até os dias de hoje.
Entretanto, o que ainda permanece é a discussão sobre o que caracteriza a Ciência da Informação enquanto ciência e o que a diferencia de outros projetos como a Biblioteconomia, a Bibliografia, a Documentação e outras áreas que possuem a informação e/ou suas representações como objeto de estudo.
O que se vem colocando em pauta ao longo dos anos e que talvez caracterize a Ciência da Informação é um de seus anseios: tentar compreender O que é informação? Para além de uma pergunta meramente técnica, O que é informação? é uma das questões mais debatidas dentro da área e que convida aos pesquisadores a adentrarem em caminhos provenientes da filosofia.
Capurro e Hjorland (2007), Floridi (2010), Robredo (2012) e Frohman (2012) são exemplos de autores que buscam apresentar os fundamentos filosóficos para os estudos da informação, recorrendo a instrumentos e correntes da própria filosofia para responder às questões fundamentais da área, como a supracitada.
Questiona-se aqui, portanto: que questões filosóficas podem ser consideradas necessárias para a reflexão e a fundamentação em torno dos estudos informacionais? Nesse sentido, o presente artigo tem como objetivo: identificar as questões filosóficas que cercam os estudos de informação. E como objetivos específicos: a) interseccionar Filosofia e Ciência da Informação; e b) discutir possibilidades filosóficas para o estudo da informação baseado em autores da área.
Trata-se de uma pesquisa básica, de caráter qualitativo, que utilizou do levantamento bibliográfico como instrumento de coleta de dados. Os termos “Ciência da Informação”, “Filosofia da Informação”, “Filosofia”, “Filosofia da Ciência da Informação” foram pesquisados em sites acadêmicos, como a Base de Dados em Ciência da Informação (BRAPCI) e o Google Acadêmico.
2 OS ESTUDO SOBRE INFORMAÇÃO: REFLEXO E REFLEXÃO DA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA
Apesar da existência de que a comunicação e o registro do conhecimento sejam atividades humanas que remontam à sua própria origem e da aparição do termo “informação” ou de seus correlatos no Ocidente desde o início da Idade Média, podendo até mesmo remontar à Antiguidade Clássica, como se vê em Capurro e Hjorland (2007), é importante se destacar que a informação, enquanto categoria do pensamento teórico, só se evidenciou nos últimos cinquenta anos.
De acordo com Robredo (2012, p. 2),
[...] o surgimento e uso do termo ‘informação’ na linguagem acadêmica, filosófica, científica ou tecnológica, é extremamente recente, e que, em que pese a sua breve idade, sua inclusão generalizada na linguagem comum da sociedade contemporânea tem acontecido em um espaço de tempo ainda bem mais breve.
Esse processo de inclusão da “informação” no cotidiano das pessoas se deu por meio de diversas vias. A primeira delas, cogita-se ser os meios de comunicação de massa, que passaram a ter papel primordial na oferta de informação para a maioria do público. Em seguida, o avanço das novas tecnologias da informação e da comunicação, principalmente os computadores e a internet, apontaram para a emergência de ferramentas tecnológicas que processassem grandes quantidades de dados de maneira mais fácil e mais rápida, ao mesmo tempo em que se tornassem parte do cotidiano das pessoas, em suas casas e logo em seguida na palma de suas mãos.
Como categoria do cotidiano, a informação e suas tecnologias levaram a se pensar em formas de se identificar as práticas sociais dessa nova sociedade, denominando a própria sociedade em novos termos. Chamada também de Sociedade em Rede, Sociedade do Conhecimento, Sociedade da Mensagem, o termo mais consensualmente adotado para se referir a experiência social contemporânea foi Sociedade da Informação, principalmente pela sua possibilidade de definir uma sociedade pós-industrial, cujo modo de produção principal está pautado em torno da informação e as tecnologias e serviços a ela relacionados (MARCHI; VALENTIM; BOTEGA, 2021).
O cenário da Sociedade da Informação tornou-se assim propício para o desenvolvimento de uma ciência que estivesse preocupada com as questões fundamentais que cercam o acesso, o uso, a representação e a transmissão da informação, por exemplo. Remontante ao fim da Segunda Guerra Mundial, a Ciência da Informação surge como uma proposta de estudar os fenômenos informacionais, não mais se enfocado nos objetos que o dão forma, mas com a recuperação e disseminação dos conteúdos que representam, assim como com os fenômenos sociais que a ela estão relacionados.
De acordo com Araújo (2018), a Ciência da Informação tem como antecedentes os avanços nos estudos da Biblioteconomia, principalmente a especializada, a Bibliografia, a Documentação, os serviços de informação ofertados por cientistas e o avanço das novas tecnologias da informação e da comunicação. A área, porém, surge com a necessidade de se estabelecer enquanto ciência, tendo recorrido inicialmente ao modelo tecnicista e positivista nas Ciências Sociais que tentavam atrelar seus instrumentos, metodologias e teorias com base nas desenvolvidas no âmbito das Ciências da Natureza.
Isso ainda se refletia nas discussões sobre considerar ou não a área como Ciência, porque, apesar de possuir um objeto de estudo específico (a informação), tanto esse objeto de estudo como as metodologias para refletir sobre ele ainda eram escassas e eram em sua maioria empréstimos de outras áreas. Em contraposição a essa perspectiva, Araújo (2018) levanta três características que devem ser assumidas ao caracterizar a Ciência da Informação como Ciência: a interdisciplinaridade, a condição pós-moderna e a classificação como ciência humana e social.
A classificação da Ciência da Informação como Ciência Humana e Social localiza o seu papel dentro do mundo científico. A proposta não é criar novas tecnologias, mas entender como tais tecnologias refletem na vida humana, individual e coletivamente, assim como o fato de que elas são resultantes de processos sócio-históricos e sua distribuição é pautada em decisões políticas e econômicas.
Sua condição pós-moderna aponta para o fato de que ela “[...] estaria inserida em um ambiente de análise e revisão dos ideias iluministas de razão e evolução, em que um novo modo de produção do conhecimento mostra-se necessário [...]” (CARDOSO, 1996, apud ARAÚJO, 2018). A sociedade pós-moderna conflui com a possibilidade de uma sociedade baseada em informação, em que a produção do conhecimento é também ativo econômico e é revisada sob a perspectiva de que não existe uma possibilidade única de interpretar a realidade.
Mas, talvez o que mais diferencia a Ciência da Informação das Ciências da Natureza e das Ciências Humanas e Sociais consolidadas (História, Sociologia, por exemplo), é sua interdisciplinaridade. Por ser uma área do conhecimento que surge em um momento de crítica ao modelo compartimentalizado da ciência, ela aponta para a necessidade de transgressão das fronteiras disciplinares. A Ciência da Informação, dessa forma, pela especificidade de seu olhar informacional, ressignifica conceitos de outras áreas como, por exemplo, a psicologia, a linguística, a computação e a sociologia (ARAÚJO, 2018).
E não somente oferecer um olhar informacional para compreender e ressignificar os conceitos de outras áreas. Para compreender os seus próprios conceitos e, mais especificamente, o seu objeto de estudo (a informação) é necessário ainda recorrer às outras áreas, que lhe oferecerão fundamentos para responder a questões tecnológicas, sociais e até mesmo filosóficas. Aqui enfocaremos nas possibilidades filosóficas do estudo da informação.
3 A FILOSOFIA E OS FUNDAMENTOS DA CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO
A Filosofia Ocidental surgiu na Grécia Antiga como resultado de uma necessidade de se explicar o mundo e seus fenômenos, assim como de explicar a vida humana e seus propósitos. A proposta seria afastar-se das formas tradicionais e mitológicas de interpretação da realidade, tentando evitar recorrer a deuses ou outras figuras demiúrgicas como suas ocasionadoras, tentando fazer o mundo explicar-se a si mesmo.
Ao longo dos séculos, a Filosofia Ocidental desenvolveu-se como campo que estuda as questões fundamentais da humanidade, interessando-se em diversas áreas como, por exemplo, a realidade em si (Metafísica ou Ontologia), a possibilidade da ação moral (Ética), a formação da arte (Estética), o poder e a autoridade (Política), a análise crítica das ciências e do conhecimento (Epistemologia) (CHAUÍ, 2006). Dessa forma, tudo pode estar sob a possibilidade de se tornar objeto de reflexão da Filosofia, cujo caráter pervasivo continua a expandir-se, incluindo outras temáticas como a Mente, a Linguagem e, mais recentemente, a Informação.
Esse processo de expansão se deu ao longo da história. Autores como Marcondes (2007), Chauí (2006) e Cotrim (2006) subdividem a história da filosofia em pelo menos quatro etapas: Filosofia Antiga, que compreende todo o período clássico na Grécia e na Roma Antiga; a Filosofia Medieval, influenciada principalmente pelos ideais defendidos pelo cristianismo desenvolvido no seio da Igreja Católica; a Filosofia Moderna, que, em reação à anterior, busca propor uma nova forma de ver o mundo através da razão; e a Filosofia Contemporânea, com correntes como o positivismo, o existencialismo e a chamada virada linguística. Esta última acompanha o surgimento e o desenvolvimento da Ciência da Informação, assim como compartilha de algumas formas de pensamento consideradas pós-modernas.
É importante ressaltar, porém, que no contexto da Biblioteconomia, uma das áreas do conhecimento que foram essenciais para o surgimento e o desenvolvimento da Ciência da Informação (ARAÚJO, 2018), propostas de abordagens filosóficas já eram sentidas ainda na segunda metade do século passado. Destaca-se aqui duas vertentes: a Epistemologia Social desenvolvida por Jesse H. Shera e Margaret Egan (SHERA, 1977) e a Filosofia da Biblioteconomia proposta por Souza (1986).
A Epistemologia Social foi desenvolvida no contexto americano, em meados do século passado, pelos bibliotecários Jesse H. Shera e Margaret Egan. De acordo com Lima e Gomes (2016), os propositores da Epistemologia Social apontam para a necessidade de se compreender a produção do conhecimento na sociedade, tendo em vista que se a Epistemologia
estuda os fundamentos e o processo de validação do conhecimento humano, [...] a Epistemologia Social busca o estudo dos processos por meio dos quais a sociedade como um todo gera o conhecimento, levando em conta os aspectos físicos, psicológicos e intelectuais do indivíduo (LIMA; GOMES, 2016, p. 27).
Compreender a produção do conhecimento permitiria à Biblioteconomia e a Ciência da Informação, encontrar fundamentos filosóficos e teóricos para as suas práticas. A referência a Epistemologia aproximaria a área a questionamentos como “O que é o conhecimento?”, “Quem detém o conhecimento?”, “Como o conhecimento é produzido e socializado?”, fazendo que com que os “[...] procedimentos de organização e disseminação da informação, realizadas pelas bibliotecas e arquivos, [sejam] destinados à geração do conhecimento” (LIMA; GOMES, 2016, p. 26).
Já a perspectiva de Sebastião de Souza (1986) caminha para a ideia de que o objeto de estudo da Biblioteconomia é a informação, podendo a área ser entendida como uma Informatologia ou mesmo Ciência da Informação. Em sucedâneo, ele apresenta a possibilidade de se pensar uma Filosofia da Biblioteconomia, filosofia que permitiria
a reflexão profunda [da Biblioteconomia] sobre si mesma, sobre seus conceitos, abrangência, correlações, funções; é o repensar sobre tudo o que fez, faz, fará; [...] a reflexão sobre cada uma de suas partes e divisões, sobre cada uma de suas etapas; [...] a reflexão sobre o como e o por quê de cada ação bibliotecária. (SOUZA, 1986, p, 195)
A proposta de Souza (1986) traz a possibilidade de enfim se pensar a Biblioteconomia enquanto ciência e não mais como técnica. A reflexão profunda é o mote para se pensar cada uma das propriedades e características da Biblioteconomia, seus conceitos e suas práticas, principalmente levando em consideração que estas estão relacionadas não apenas ao suporte físico, mas ao conteúdo dos materiais e mais especificamente à informação.
Tanto a Epistemologia Social quanto a Filosofia da Biblioteconomia trazem, portanto, maneiras de se transcender as reflexões para além dos objetos, considerando a produção do conhecimento, por um lado, e a informação, por outro, como fundamentos para a prática bibliotecária. E isso não será esquecido na Ciência da Informação, sendo, na verdade, muitas vezes resgatado para a reflexão sobre a área e seu objeto de estudo.
De acordo com Araújo (2018, p. 34), porém, apesar de contemporânea às correntes mais recentes e dos desenvolvimentos na Biblioteconomia, as questões filosóficas relacionadas à informação eram ainda muito incipientes no início da Ciência da Informação, quando “praticamente inexistiram consequências epistemológicas importantes para a [área] nos primeiros anos”. Será do questionamento sobre “O que é informação?” que um motor de discussões se acenderá de forma que as questões informacionais superarão formas técnica ou científicas de explicação da realidade, apelando para formulações filosóficas provenientes de campos como a ontologia, a epistemologia e a ética.
Dessa forma, diferentemente dos anos iniciais da produção da Ciência da Informação, os pesquisadores da área vêm buscando atualmente utilizar-se da sua natureza interdisciplinar para encontrar, em correntes filosóficas já estabelecidas, ferramentas para discutir as questões fundamentais que cercam o seu objeto de estudo: a informação.
4 QUESTÕES FILOSÓFICAS EM TORNO DO ESTUDO DA INFORMAÇÃO
A proposição de uma filosofia para o estudo da informação encontra uma de suas raízes na obra do filósofo italiano Luciano Floridi. De origem externa à Ciência da Informação, o filósofo Floridi apresenta uma nova interpretação dos fenômenos informacionais, sob o pano de fundo das mudanças tecnológicas vivenciadas nos últimos anos. Ela parte do pressuposto de que a Computação, a Ciência da Informação e a Biblioteconomia são, por exemplo, áreas distintas, com perspectivas distintas, que tem como objeto de estudo a informação, mas que devem ser entendidas como filosofias aplicadas da informação.
Isso porque a Filosofia da Informação funcionaria como filosofia fundacionalista dos estudos informacionais. A principal questão levantada pela Filosofia da Informação seria “O que é a informação” (FLORIDI, 2010) e a busca por uma teoria unificada da informação, ainda que o filósofo que a propõe acredite que não seja uma tarefa fácil.
Ilharco (2005) realizando uma análise da Filosofia da Informação proposta por Floridi, faz um comparativo entre a virada linguística experimentada na Filosofia no século XX com uma possível virada informacional. Nesse sentido,
No que respeita à informação, deve colocar-se o mesmo tipo de questão: se a informação não é transparente, se aquilo que informa varia o seu significado de pessoa para pessoa, de situação para situação, de contexto para contexto, isto é, o que ele mesmo é enquanto aquilo que é reconhecido como ser, então o carácter informativo da informação, a sua pressuposta transparência, deve ser colocada em questão e desse facto retiradas consequências. (2005, p. 43).
Essa gama de questionamentos irá levar Ilharco (2005) a identificar e classificar problemas que ficam em aberto com o surgimento de uma Filosofia da Informação. Esses problemas ampliam a questão “O que é informação?” para incluir problemas epistemológicos (p. ex.: terá a filosofia esquecido a questão da informação ao ter avançado para a questão do conhecimento?), problemas da realidade (p. ex.: o que é a realidade além da informação?), problema da ação (p. ex.: a informação precede a informação ou o contrário?), problema da comunicação (será a comunicação a transmissão de informação?, problemas das TIC (p. ex.: qual o caráter tecnológico da comunicação?) e problemas éticos.
Rafael Capurro é outro pesquisador de origem filosófica, mas que atua no contexto da Ciência da Informação. Suas pesquisas estiveram inicialmente voltadas à responder ao questionamento “O que é informação”, tomando como metodologia o resgate etimológico e genealógico da palavra. Ele apresenta caminhos para a proposição de uma Filosofia da Informação que fornece embasamento teórico para a Ciência da Informação, optando principalmente pela hermenêutica e mais recente abre espaço para estudos sobre a ética intercultural da informação.
Matheus (2005, p. 151) aponta ainda mais três contribuições de Capurro à construção de uma filosofia da informação: a identificação de “[....] paradigmas epistemológicos associados às diferentes abordagens presentes na CI [...]”, o trilema e a transição para a angelética (teoria da mensagem).
A identificação de paradigmas na Ciência da Informação permitiu a Capurro e também a autores posteriores (como Araújo, 2018), a começar a pensar uma história epistemológica da Ciência da Informação. De acordo com Capurro (2003), é possível encontrar pelo menos três abordagens sobre o conceito de informação nos estudos da Ciência da Informação: o paradigma físico, atrelado à teoria da informação proposta por Shannon e Weaver e trata a informação sob uma perspectiva de transmissão de um objeto físico de um emissor a um receptor; o paradigma cognitivo, cuja maior contribuição está em Brookes e sua Equação Fundamental (com influências filosóficas de Karl Popper) e desloca as discussões da Ciência da Informação para o processo de conhecimento e aquisição da informação pelos indivíduos; e o paradigma social, que tenta trazer a discussão sobre a informação para um contexto maior, com influências de filósofos como Wittgenstein e Heidegger, mostrando o fato de que a informação e os processos a ela relacionados não estão isolados do mundo, mas dele fazem parte e contribuem para a sua transformação cotidiana.
Essa multiplicidade de paradigmas ou abordagens para o estudo da informação percebidos na Ciência da Informação apontam para dificuldade de se criar uma teoria unificada da informação, o que levaria ao chamado trilema de Capurro. De acordo com Matheus (2005, p. 154),
O Trilema de Capurro, bem como conseqüentes dificuldades oriundas da busca de uma definição universalmente aceita do termo informação, pode ser assim sintetizado: ao mesmo tempo em que não é possível estabelecer um conceito único para informação em todas as áreas do conhecimento [univocidade], as diferentes disciplinas científicas buscam conceitos compatíveis a fim de permitir a interdisciplinaridade e o diálogo, o que pode levar à perda de qualidade, a analogias [analogia] inadequadas e a equívocos [equivocidade].
Dessa forma, para além do questionamento sobre “O que é informação?”, em Capurro, podemos perceber o aparecimento de outras questões subjacentes, como: “Como criar uma teoria unificada da informação?”, “Qual o conceito de informação para a disciplina x ou y?”, “Como superar analogias inadequadas e equívocos relacionados ao uso do termo informação em diversas áreas?”.
Por isso, segundo Matheus (2005), Capurro decide trilhar o caminho da Angelética, ou teoria das mensagens. Ou seja, deixar um pouco de lado a reflexão sobre a informação para reflexão sobre a mensagem. De acordo com Capurro (2003), a transição de “O que é informação” para “O que é mensagem” permite superar as dificuldades encontradas no trilema e apontar para a possibilidade de se entender o estudo da informação, como o estudo da oferta de sentido e não apenas como seleção de sentidos, sendo essa a diferença crucial da Ciência da Informação.
Por último, decidiu-se apresentar aqui, a proposta de Frohman (2012) de um prolegômeno a uma outra filosofia da informação. A proposta é um retorno às práticas documentárias, uma possibilidade de se ressignificar a questão “O que é a informação”, entendendo que não existe alguma coisa específica que responda de maneira sólida a essa pergunta. Uma possibilidade que exorcize a informação de seu “caráter” metafísico de “nobre substância”, aproximando-se principalmente da fenomenologia e da filosofia da linguagem.
Ocorre aqui um retorno à ideia de produção do conhecimento, presente em Shera (1977), principalmente à ideia de que a informação não é “[...] uma substância nobre indiferente à transformação de seus veículos” (FROHMAN, 2012, p. 241). É importante discutir questões relacionadas à sua materialidade, às instituições às quais ela está relacionada, à disciplina social e até mesmo às questões históricas como categorias úteis “[...] para uma filosofia da informação cujo ponto de partida é o conceito de práticas documentárias”, entendendo que [...] um documento torna-se informativo somente quando sofre certos tipos de práticas documentárias” (FROHMAN, 2012, p. 237).
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Desde as primeiras discussões sobre os efeitos que as mudanças causadas pelas tecnologias da informação e da comunicação provocaram na sociedade, o questionamento sobre “O que é informação” passou a fazer parte de inúmeras disciplinas acadêmicas, gerando o surgimento de uma área específica sobre a temática (a Ciência da Informação), mas também do dia a dia das pessoas comuns.
A filosofia, dentro e fora da Ciência da Informação, logo passou a discutir sobre a temática, tentando encontrar respostas para “O que é a informação”, recorrendo às suas diversas ferramentas metodológicas e campos de atuação, principalmente a ontologia, a epistemologia e a ética.
Autores como Luciano Floridi, Rafael Capurro, Bernd Frohman e seus comentadores foram responsáveis por fazer com que esses questionamentos interagissem com os questionamentos já presentes nas áreas que historicamente atuavam com a informação (Bibliografia, Biblioteconomia, Documentação, Arquivologia, Museologia), mas também com a mais recente Ciência da Informação.
Talvez ainda hoje não possamos encontrar uma resposta ou uma teoria unificada para a questão “O que é informação”, mas percebe-se que inúmeros outros questionamentos surgiram, surgem e surgirão para o debate sobre o que é informação, qual o seu caráter, a sua estrutura e seus efeitos na sociedade.
Considera-se aqui a necessidade de se realizar estudos mais atualizados e mais ampliados sobre os aspectos filosóficos da informação para a ampliação do debate teórico da Ciência da Informação.
REFERÊNCIAS
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[1] Bibliotecário no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE), campus Cedro. Bacharel em Biblioteconomia pela Universidade Federal do Ceará. Mestre em Ciência da Informação pelo Programa de Pós-graduação em Ciência da Informação da Universidade Federal do Ceará (UFC). Doutorando em Ciência da Informação pelo Programa de Pós-graduação em Ciência da Informação da Universidade Estadual de Londrina (UEL).