APRESENTAÇÃO

 

 

A revista Logeion - Filosofia de Informação chega ao seu oitavo ano com a certeza de estar cumprindo seu papel de divulgar e valorizar a filosofia prática, em especial a ética e a política, assim como a teoria do conhecimento e as questões da técnica. Conseguimos agregar uma constelação de autores que nos oferecem seus ensaios e seus resultados de pesquisa. Eles são o principal motivo da revista poder garantir a qualidade do que é publicado.

Estamos trabalhando desde o nascimento da revista para formar e cultivar um público leitor na área de Filosofia da Informação. É um pequeno território que se desenha entre a Filosofia e as Ciências da Informação, com relevância numa sociedade em que a informação se torna central na construção das relações intersubjetivas e na produção de bens e riquezas, incluindo as imateriais. A informação sempre suscita muitas questões filosóficas, que começam com o próprio entendimento do que é: coisa, processo, conteúdo, significado, etc.

Estamos vivendo numa época estranha, com profundas mudanças nas referências especiais e temporais, que refletem na construção da personalidade, na socialização e na formação de grupos. O isolamento social imposto durante a pandemia de Covid-19 agudizou os distúrbios na formação da personalidade e na socialização. Os distúrbios na pandemia foram agravados pela crise na produção e no consumo, com desemprego e fome. Somaram-se profundos problemas na dinâmica dos grupos sociais.

Uma revista que se propõe a divulgar Filosofia da Informação também deve enfrentar distúrbios e problemas atuais. No Brasil temos dificuldades complementares com os desgovernos no combate à pandemia de Covid-19, que deixou um rastro de 700 mil mortes, das quais estima-se que mais de metade poderia ter sido evitada. Na perspectiva da Filosofia da Informação a situação se agrava porque parte do problema aconteceu por negação de informações científicas e por desinformação.

O pano de fundo dos desgovernos no combate a pandemia é a existência de um Governo Federal que se recusou a coordenar o nacionalmente as medidas necessárias para isolamento social e as ações do Sistema Único de Saúde. Foi um governo que estimulou o uso de medicamentos sabidamente ineficazes contra a Covid-19, bem como se alinhou à mais grosseira retórica antivacina e protelou a compra e a distribuição de vacinas.

Esse contexto per si seria desafiador para o pensamento crítico, mas ele também está entremeado por intenso e profundo conflito político polarizado por um governo federal que desinforma e nega a ciência, que hostiliza o poder judiciário e que coopta uma bancada parlamentar no Congresso Nacional com benesses. Como se não fosse suficiente, o governo federal não se constrange em fazer apologia da ditadura militar. A história deste presente está por ser contada, para além das controvérsias de narrativas.

Os artigos que agora estamos publicando refletem este tempo. Aquela que deveria ser a sociedade “da informação” torna-se uma sociedade desagregada pela desinformação. Torna-se necessário defender conquistas da modernidade, como a educação e a ciência. Foram áreas profundamente afetadas pelas políticas neoliberais de equilíbrio fiscal, que entre nós chegou ao extremo da determinação legal de teto para gasto público.

Numa sociedade marcada pelo pensamento eurocêntrico é, no mínimo, curioso apresentar semelhanças entre nossa realidade social e política e a do continente africano. As perspectivas distintas para dificuldades semelhantes contribuem para a construção de análises críticas. É um enorme desafio pensar de modo crítico na América Latina colonizada e subalterna. A pesquisa reflexiva sobre ciência e tecnologia não pode abstrair nossa condição de fazenda de grãos e minérios na sociedade globalizada.

O lugar do Brasil na globalização neoliberal é causa e efeito dos cortes e contingenciamentos orçamentários. O governo federal não se inibe de impor a penúria para a educação, a cultura, a ciência e a tecnologia. As potencialidades de fazer pesquisa esbarram no muro que é a falta de recursos públicos e o desinteresse da iniciativa privada no que não serve para acumulação de riquezas. A miséria estrutural para fazer cultura, ciência e tecnologia se aprofunda com a estratégia das agências públicas de fazer concorrência controlada entre artistas, professores e pesquisadores por recursos escassos.

Cabe destacar que este número da Logeion fecha com duas interessantes discussões sobre mediação. São argumentações consistentes sobre a mediação e o papel social dos mediadores, uma delas dialogando com a Teoria do agir comunicativo de Habermas. Numa sociedade em rede devemos pensar se a informação é algo que antecede a comunicação, como no funcionalismo, ou se constrói dentro da comunicação, como no cognitivismo e no construtivismo.

Gostaria de concluir esta apresentação falando das nossas crenças iluministas no esclarecimento, na aprendizagem, na evolução. Nunca antes na história deste país foi tão necessário ser otimista, e ter esperança em dias melhores. A escuridão terrível da noite antecede o amanhecer de um outro dia, aberto para a construção social da história. Depende de todos e de cada um.

 

 

Rio de Janeiro, 08 de setembro de 2022

 

Clovis Ricardo Montenegro de Lima