O Princípio de Universalização na Teoria Discursiva de Jürgen Habermas

 

André Guimarães Borges Brandão[1]

Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro

andreborgesbrandao@hotmail.com

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Resumo

 

O presente artigo científico é parte de pesquisa destinada a investigar as implicações e interpretações advindas da transformação do posicionamento do princípio de universalização (U) operada na teoria do discurso do filósofo alemão Jürgen Habermas, sobretudo a partir de algumas de suas obras das décadas de 80 e 90. A pretensão cognitivista da ética do discurso fundamenta a moral diante da possibilidade de reconstrução racional discursiva das justificativas das normas. O teste de universalização faz parte da fundamentação, mas em que sentido? A fim de afastar o ceticismo quanto a pretensão de justificação prática, Habermas repensa a relação kantiana entre moral e direito. Mais precisamente, diante de sociedades complexas marcadas pelo Estado Democrático de Direito e pelo uso de discursos práticos diversos da moral para a justificação das práticas sociais, a legitimidade das normas passa por explicitar a relação discursiva entre direito, moral e política. É no âmbito deste desafio que o filósofo alemão vem modificando a formulação e o posicionamento de seu princípio de universalização (U) ao longo do tempo, bem como sua relação com o princípio do discurso (D) e, posteriormente, com o princípio da democracia (De). Após percorrermos este caminho, lançamos a hipótese, segundo a qual, a ênfase que Habermas confere ao direito em Facticidade e Validade junto do reposicionamento do ponto de vista moral, permite pensar de maneira dialógica a interação social como práxis comunicativa sem sujeitos.

 

Palavras-chave:Princípio de Universalização. Moral. Direito. Interesses. Práxis Comunicativa.

 

THE PRINCIPLE OF UNIVERSALIZATION IN JÜRGEN HABERMAS' DISCURSIVE THEORY

 

Abstract

 

This scientific article is part of a research aimed at investigating the implications and interpretations arising from the transformation of the positioning of the principle of universalization (U) operated in the theory of discourse by the German philosopher Jürgen Habermas, especially from some of his works from the 1980s and 90. The cognitivist claim of discourse ethics grounds morality in the face of the possibility of rational discursive reconstruction of the justifications for norms. The universalization test is part of the rationale, but in what sense? In order to dispel skepticism regarding the pretense of practical justification, Habermas rethinks the Kantian relationship between morality and law. More precisely, in the face of complex societies marked by the Democratic State of Law and the use of practical discourses other than morality to justify social practices, the legitimacy of norms involves making explicit the discursive relationship between law, morality and politics. It is within the scope of this challenge that the German philosopher has been modifying the formulation and positioning of his principle of universalization (U) over time, as well as its relationship with the principle of discourse (D) and, later, with the principle of democracy (In). After going through this path, we launch the hypothesis, according to which, the emphasis that Habermas gives to the law in Facticity and Validity together with the repositioning of the moral point of view, allows to think in a dialogical way the social interaction as communicative praxis without subjects.

 

Keywords: Principle of Universalization. Moral. Right. Interests. Communicative Praxis.

 

 

1 INTRODUÇÃO

 

Uma importante discussão atravessou a história do pensamento moderno e também contemporâneo, sobretudo no que diz respeito à filosofia prática: é possível justificar racionalmente a força normativa da moral e do direito? De outra maneira: é possível reconstruir racionalmente a legitimidade da cogência das normas jurídicas? Diante desta possibilidade e tendo em vista seu teor normativo, qual a relação que deve prevalecer entre as normas de ação moral e direito? E o princípio moral? É necessário para justificar uma teoria da justiça, por exemplo? Como ele deve se posicionar?

Diferentes interpretações dividem estudiosos e pesquisadores que ao longo do tempo tentaram apresentar soluções para estes questionamentos. Em um primeiro momento, é possível classificar as soluções apresentadas entre aqueles que acreditam e aqueles que não acreditam na possibilidade de uma justificação racional para as normas de ação. Os primeiros ficaram conhecidos como cognitivistas éticos e os segundos como céticos ou não-cognitivistas éticos. É que os primeiros defendiam que a cognição humana era capaz de reconstruir racionalmente os motivos que fundamentam a força obrigatória das normas, enquanto os segundos permaneceram defendendo que não se explica a validade das proposições normativas pela razão. Dessa forma, para os céticos, não há consenso possível diante das disputas acerca do princípio moral, motivo pelo qual seria mais producente encaminhar as investigações práticas para fora do campo da racionalidade.

Na modernidade, a questão correlata investigada é saber se os juízos morais possuem sentido a ser reconstruído racionalemente por aqueles que agem e por aqueles que buscam o fundamento da ação, ou se apenas expressam preferências subjetivas que permanecem incapazes de serem compartilhadas por todos aqueles que participam da ação. Trata-se, portanto, de saber até que ponto e em que medida se ergue um princípio de universalização a balizar as normas morais e jurídicas.

Por exemplo, embora o juízo moral tenha uma dimensão prática em Hume,  o conceito de simpatia figura como motivação interna do espírito para ação, dando-lhe conteúdo moral, não sendo possível, portanto, o compartilhamento cognitivo de sua fundamentação[2]. Hume seria, ao menos em um primeiro olhar, defensor do não-cognitivismo ético. Segundo Hume, é a partir do hábito (costume) que o ser humano confere força normativa para suas ações[3]. Dessa maneira, agimos tendo em vista conjunções necessárias que fazemos pela força do hábito. Os interesses, as preferências, os desejos explicariam mais nossas ações do que, propriamente, a justificativa apresentada por aquilo que chamamos de racionalidade. O conceito de simpatia ganha importância na motivação da ação.

Kant discorda de Hume e representaria aqui o cogitivismo ético. Entre os interesses e as preferências existem juízos que podem ser esboçados de um ponto de vista universal. Só conseguimos identificar e apontar os nossos interesses e os interesses dos outros diante da transformação que sofrem ao longo do tempo, se julgarmos esses interesses a partir de algo que não é interesse, mas juízo. Dessa forma, a moral não se faz a partir de interesses justapostos, mas levanta a possibilidade cognitiva de sua própria certificação, o que é típico da modernidade. Enquanto Hume pensa um espírito passivo que retém na memória aquilo que resgata quando de uma situação semelhante, Kant pensa um sujeito ativo que constrói conceitos a partir de juízos e assim pode regular suas ações de maneira autônoma.[4]

Até hoje essa discussão permanece em aberto e existem aqueles que se aproximam mais do cognitivismo ético e os que se aproximam mais do não-cognitivismo ético. Ou seja, aqueles que entendem as ações humanas e suas expectativas de comportamento a partir da troca de razões, portanto do diálogo e da reconstruçao racional, e aqueles que tem em vista que a disputa de interesses, o conflito entre motivações da ação, não pode ser fundamentado pela razão, especie de realismo moral. Vale ressaltar que as implicações dessas discussões impactam sobremaneira nas teorias políticas contemporâneas. Basta lembrar as diferenças existentes entre o realismo político de olhar factual que pensa a interação social através da disputa, do conflito de interesses, e o normativismo, o qual pensa a interação social a partir da possibilidade do diálogo e do consenso[5]. Isso explica parte das diferenças entre modelos empíricos e normativos de democracia.[6]

Jürgen Habermas pretende defender um cognitivismo ético a partir da reiterpretação comunicativa da razão prática kantiana. É que, embora Kant aposte no cognitivismo ético, seu conceito de cognitivo ainda se refere ao sujeito transcendental que age de maneira desinteressada tendo como referência uma figura deôntica que subordina o direito. As possibilidades comunicativas advindas da própria modernidade, as quais se encontram inseridas no próprio potencial de autocertificação da razão, sobretudo em seu aspecto intersubjetivo, não são devidamente exploradas por Kant, uma vez que não diferencia os usos da razão prática e não percebe como o poder comunicativo atravessa a cognição. Dessa forma, Kant fundamenta uma razão prática a partir de uma razão pura advinda da estrutura de um sujeito transcendental. Trata-se de pensar uma razão prática pura. Sua preocupação reside na fundamentação moral propriamente dita, portanto nas determinações da razão segundo uma lei universal. Mesmo o direito é pensado em termos da coexistência de arbítrios segundo uma lei universal[7]. Assim, o conceito de entendimento de Kant leva em conta um cognitivo puro e não um cognitivo historicizado diante da comunicação, como quer Habermas, o que de certo repercute no conceito de entendimento de ambos autores[8].

A fim de superar o modelo deôntico forte que subordina o direito em Kant e o relaciona com um sujeito monológico (in foro interno), pois submete a máxima de sua ação a lei moral universal sem uma construção dialógica e intersubjetiva, Habermas apresenta em Facticidade e Validade uma nova formulação para o princípio do discurso (D), bem como um novo posicionamento para o princípio de universalização (U). O princípio de universalização figura como uma formulação possível do princípio do discurso, a qual se mantém ao lado da formulação do princípio da democracia advinda da aplicação discursiva à própria forma jurídica. A aceitabilidade racional que carrega um valor deôntico, portanto moral, no princípio de universalização, está ao lado da formulação discursiva do direito num princípio da democracia. Portanto, a aceitabilidade racional se posiciona junto de uma aceitação concreta das normas advinda da formação discursiva da opinião e da vontade em um Estado Democrático de Direito. Na aceitação concreta, discursos práticos diversos da moral contribuem para a fundamentação e aplicação das normas de ação. O entrelaçamento entre discursos pragmáticos, éticos e morais forma uma racionalidade jurídica que não justifica as normas jurídicas a partir da adequação a uma figura deôntica. O princípio do discurso relaciona moral e direito por uma fundamentação normativa discursiva do procedimento. Portanto, trata-se de pensar a fundamentação e aplicação normativa no Estado Democrático de Direito de uma sociedade complexa.

Contudo, para o autor alemão chegar nesse ponto teve que percorrer um caminho marcado por diferentes construções teóricas que reorganizaram a relação entre a moral e direito ao longo do tempo. Na tentativa de atualizar a reabilitação discursiva da razão prática kantiana frente à sociedades complexas marcadas pelo Estado Democrático de Direito, Habermas transforma e reposiciona o princípio de universalização em sua teoria. Os lugares que o princípio de universalização (U) ocupa em Consciência moral e Agir Comunicativo (1983),  em Comentários à Ética do Dicurso (1991) e em Facticidade e Validade (1992), são diferentes, bem como figuram dentro do movimento da própria obra do autor.

A investigação que se segue pretende reconstruir esse percurso em coerência com a ênfase que o direito ganha em Facticidade e Validade, levantando a interpretação, segundo a qual, o princípio de universalização se transforma ao longo desta parte da obra habermasiana na direção da interpretação procedimental do direito e de sua relação com a democracia. Dessa forma, ao longo do tempo, a teoria moral de Habermas se torna mais modesta, ética do discurso se transforma em teoria do discurso e o princípio de universalização figura ao lado do princípio da democracia, ambos constando como formulações possíveis do princípio do discurso. Isso quer dizer que a moral se apresenta como um ponto de vista no procedimento, moral point view. Existe um momento incondicionado no procedimento discursivo que o direito não pode contrariar, mas as justificativas da fundamentação e da aplicação do direito não se resumem a discursos práticos morais. Tanto a fundamentação quanto a aplicação das normas jurídicas têm uma racionalidade própria que mistura questões prática diversas em diferentes usos práticos da razão. Ora, isso articula direito e moral para além da ação por dever (com conotação fortemente moral), permitindo um espaço para os cidadãos justificarem suas condutas conforme o dever, portanto de acordo discursos práticos diversos da moral, desde que justificados dentro do procedimento discursivo de formação da opinião e da vontade em esfera pública.

Depois de acompanhar e dar sentido ao movimento habermasiano da década de 80 e 90 junto ao princípio de universalização, pretende-se demonstrar que o conceito de interesse generalizável vai aos poucos perdendo sua centralidade. Em 1992 e 1996 (Facticidade e Validade e A Inclusão do Outro), Habermas trata dos interesses a partir do resgate discursivo de pretensões de validade, não mais submetendo a justificativa das ações ao teste de universalização que pretende levar em conta o interesse simétrico de todos. Parece, inclusive, que pretende se distanciar desse entendimento que relaciona interesses em todo âmbito prático, intuição que vem desde Conhecimento e interesse (1968). É que a autonomia vem do direito e não da vontade da pessoa, pois o direito é ambivalente e figura não só como sistema de ação, mas também como saber cultural. Assim, pode emprestar sua forma jurídica para a moral e abrir a possibilidade de outros discursos práticos que pretendem argumentar em nome das pretensões de validade. A institucionalização com sua forma jurídica, alivia exigências que antes recaíam sobre os indivíduos. Exigências cognitivas, motivacionais e organizacionais. Com a forma jurídica complementando a moral, os indivíduos tem suas ações por legítimas sem precisar resgatar um fundamento moral e sem submeter seus interesses a argumentos morais.

Por fim, deixa-se entender que os sujeitos de direito não são indivíduos, mas participantes de uma práxis comunicativa. A autonomia ou a auto legislação é relacional, pois intersubjetiva.  Dessa forma, é possível entender as relações sociais não como o embate entre interesses ou disputa por territórios. Sequer os participantes são simplesmente possuidores de interesses em disputa diante de uma arena política pública comum. Também as interações sociais não se explicam pela correlação de forças, mas podem ser pensadas a partir de uma comunicação sem sujeitos. Claro que Kant pensa uma ação desinteressada, mas permanece com um conceito de pessoa que, ao invés de lidar de maneira discursiva e procedimental com os interesses, já os afasta de maneira apriorística quando os subordina a moral. Argumenta-se que só com o médium do direito, junto de sua ambivalência e ambiguidade a integrar a sociedade entre facticidade e validade, é possível pensar um poder comunicativo que parte desde o mundo da vida passando a integrar e pressionar o sistema. Os interesses tem papel importante numa concepção procedimental e discursiva de democracia, pois ajudam na discussão e formação dos discursos práticos que se formam em uma esfera pública informal, podendo, inclusive, ser canalizados para a esfera pública formal. Contudo, por um lado, não podem figurar como fundamento do procedimento discursivo e, por outro lado, não podem ser excluídos de antemão por uma regra da argumentação ou mesmo vinculados a um programa de generalização, pois não configuram integralmente os indivíduos e muito menos a interação social.

 

2  O MOVIMENTO DO PRINCÍPIO DE UNIVERSALIZAÇÃO

 

Em seu cotidiano o ser humano age produzindo sentidos que extrapolam a descrição daquilo que vivência de mais imediato. Portanto, não está a se preocupar apenas com o que são os acontecimentos e em descrevê-los assim como são em sua facticidade, a fim de se adaptar ao que se apresenta, mas se projeta para o território prático de como os acontecimentos poderiam ser ou mesmo deveriam ser. Isso ocorre, sobretudo, quando estamos diante de construções sociais que, pelo ângulo da ação humana, podem ser reconstruídas ou desconstruídas a qualquer tempo. Trata-se de potencial normativo que enreda as condutas humanas e suas escolhas. Em outras palavras, o ser humano constrói juízos sobre suas ações, julga suas escolhas. Valora toda vez que ergue normas que regulam sua conduta e exigem o cumprimento de expectativas de comportamento reconstruídas racionalmente pelos envolvidos no processo. Enfim, a humanidade se projeta para além do factual quando pensa a validade das normas de ação.

A tensão entre facticidade e validade está presente para o ser humano desde o uso mais corriqueiro da linguagem simbólica, pois é exatamente pela tentativa de expressão do que é que pensamos as possibilidades de sua transformação. Portanto, pensamos a ação na potência do vir a ser, em processo de validação. Duas são as principais normas de ação: a moral e o direito. Desde muito tempo, a filosofia busca ajudar a refletir as justificativas racionais que balizam a validade dessas normas. Contudo, na modernidade, diante do descolamento da razão de modelos que a antecedem, se pensa uma racionalidade capaz de se julgar a si mesma em processo de auto certificação, ou seja, sem depender de forças externas a conduzir a vontade do sujeito. Na modernidade, o cognitivismo ético é a defesa do uso prático da razão para fundamentar as normas de ação, o que se apresenta, sobretudo, tendo em vista a auto legislação ou autonomia desde Rousseau e Kant.

Quanto à validade da norma moral, norma de ação de âmbito mais amplo que o direito, pois pensa os destinatários como todos aqueles capazes de razão, e não apenas como sujeitos de direito, costuma-se levantar um princípio moral capaz de abranger interesses comuns a todos. Trata-se de um princípio que leva em conta o interesse simétrico de todos[9]. Princípio de universalização que perpassa a vontade daqueles que estão atuando. Espécie de vontade universal que soma as diferenças tendo em vista a correção da ação. Segundo Rousseau, Há comumente muita diferença entre a vontade de todos e a vontade geral. Esta se prende somente ao interesse comum; a outra, ao interesse privado e não passa de uma soma das vontades particulares. Quando se retira, porém, dessas mesmas vontades, os a-mais e os a-menos que nela se destroem mutuamente, resta, como soma das diferenças, a vontade geral.[10]

O autor genebrino parte de uma teoria da correção com forte conotação moral para explicar seu conceito de vontade geral. A legitimidade da moral se dá a partir do destaque daquelas vontades particulares que podem se destruir a si mesmas, sendo o restante considerado vontade geral. Nesse sentido, a validade das normas morais depende de uma figura deôntica capaz de exigir o resgate a qualquer tempo das razões que fundamentariam determinada conduta à luz de interesses generalizáveis. Discursos práticos morais devem ser mobilizados a fim de dar legitimidade para norma. Mas como esses discursos práticos são interpretados e mobilizada é uma questão que até hoje alimenta o debate filosófico.

Immanuel Kant, por sua vez, apresenta um princípio de universalização também como princípio supremo da moralidade já a partir da primeira formulação de seu imperativo categórico: “O imperativo categórico é, portanto só um único, que é este: Age apenas segundo uma máxima tal que possas ao mesmo tempo querer que ela se torne lei universal”[11]. Devo submeter a máxima de minha ação à possibilidade de se tornar lei universal e, portanto, de se aplicar a toda e qualquer vontade, arbítrio. O sujeito deve poder utilizar de sua razão pública a fim de justificar para si mesmo sua conduta, tendo em vista um teste de universalização advindo das regras da razão prática pura.

Dessa forma, o teor normativo da modernidade, seja em Rousseau, seja em Kant,  passa pela construção de um princípio da moralidade que dê conta de fundamentar a universalização das normas morais. Refletir sobre o que pode igualmente ser considerado bom para todas as pessoas é levantar as razões para fundamentar um princípio moral a considerar os interesses a partir de um teste de universalização. Além disso, é importante sinalizar que ambos os autores citados pensam justificar a força normativa a partir da auto legislação ou da autonomia do sujeito que age. Rousseau pensa a correção, a virtude cívica de um macro sujeito, e Kant pensa um sujeito transcendental capaz de agir por dever da razão. A auto legislação tem como critério a vontade geral de um macro sujeito e a autonomia se dá a partir da vontade do sujeito que usa publicamente da razão.

Quanto à validade das normas jurídicas, ainda segundo ambos os autores, são consideradas legítimas aquelas que passam pelo teste de universalização contido no princípio moral. A moral subordina o direito a estar sempre de acordo com seu princípio supremo. O direito, portanto, reflete a figura deôntica que justifica a moral. Dessa forma, as normas jurídicas são aceitas racionalmente quando seu conteúdo pode ser averiguado segundo o princípio de universalização. A aceitabilidade racional é o critério moral fundamental para a justificação das normas.

Os conceitos, expectativas e projetos da modernidade sofreram duras críticas na contemporaneidade. Na verdade, durante a própria modernidade, ao menos desde Espinoza, o cogito cartesiano é contestado, sendo a filosofia prática pensada para além do sujeito racional. Contudo, as interpretações na contemporaneidade trouxeram inúmeros complementos a essas críticas. Complementos que, muitas das vezes, ressignificaram o conceito de sujeito e de pessoa ou mesmo o rechaçam. De qualquer forma, em geral, seja contra a modernidade, seja abrindo ainda mais suas possibilidades não esgotadas, a contemporaneidade tem em vista uma forte crítica à filosofia do sujeito ou à filosofia da consciência.

O filósofo alemão Jurgën Habermas está entre aqueles críticos que ainda confiam na continuidade de parte das possibilidades da modernidade, pois trata-se de um projeto em aberto. Entre essas possibilidades se encontra a justificativa racional da moral a partir de um conceito de autonomia que passa por um procedimento em que se insere um princípio de universalização. Entretanto, o filósofo alemão pretende dar conta das críticas que se seguiram à Kant e, portanto, oferece uma nova roupagem à razão prática kantiana, pois esta ainda depende de um conceito de pessoa relacionado a autonomia da vontade. A fim de justificar seu cognitivismo ético diante de sociedades cada vez mais complexas em que o sistema coloniza o mundo da vida a partir da racionalidade estratégica que lhe é própria, Habermas apresenta um conceito mais amplo de racionalidade. Um conceito de racionalidade que vai além da visão weberiana de motivação da ação social com respeito à fins[12], mas também vai além de um sujeito cognoscente monológico que reflete sobre suas máximas in foro interno (Kant). Esta racionalidade amplia a perspectiva sobre a cognição e o entendimento, pois imbricada na linguagem e na comunicação. Neste sentido, a universalidade é pensada a partir do uso da linguagem que tem em vista o entendimento, sua força ilocucionária. É que existem universais pragmáticos a serem considerados quando do proferimento de todo ato de fala. Pressupostos mínimos que devem se seguir a qualquer tentativa de entendimento a partir de argumentos. A interação social, portanto, tem na comunicação, télos da linguagem, sua principal engrenagem, e, apesar de Habermas se afastar de considerações acerca da natureza humana, poderíamos pensar neste sentido, que ser humano está mais para “vivente falante” do que para “animal racional”[13], pois sua racionalidade se apresenta discursivamente.

No uso dos discursos práticos diferentes da moral, diferentes motivações da ação se apresentam em sociedades complexas. Dessa forma, a racionalidade precisa se ampliar, se estender no intuito de dar conta de todo processo. Levando em conta que a realidade é mediada pela linguagem, a qual não apenas representa essa realidade, mas participa do próprio processo de sua realização a partir da produção de sentidos,  bem como constitui conhecimento, não sendo apenas instrumento de busca, é  preciso rearticular a racionalidade de modo intersubjetivo. É dando caráter discursivo à racionalidade que Habermas pretende reabilitar a razão prática kantiana em razão comunicativa. Para tanto, o autor alemão relaciona o princípio de universalização com um princípio do discurso. Enfim, para pensar o reconhecimento intersubjetivo é preciso articular a universaização com discurso prático. O imperativo categórico é reformulado por uma razão comunicativa. Citando Thomas MacCarthy em Kritik der Verständigungsverhältnisse, Habermas apresenta a releitura do teste de universalização kantiano:

Nessa perspectiva também o Imperativo Categórico precisa de reformulação no sentido proposto: “Ao invés de prescrever a todos os demais como válida uma máxima que eu quero que seja uma lei universal, tenho que apresentar minha máxima a todos os demais para o exame discursivo de sua pretensão de universalidade. O peso desloca-se daquilo que cada (indivíduo) pode querer sem contradição como lei universal para aquilo que todos querem de comum acordo reconhecer como norma”.[14]

Portanto, a legitimidade das normas não vem mais do exercício de universalização da máxima do indivíduo, mas da universalidade advinda da concordância racional de todos os concernidos. Em uma ética discursiva, o teste de universalização deve realizar-se de maneira dialógica, em exame discursivo, e não a partir da vontade do sujeito que pretende submeter sua máxima a lei universal. A discussão entra no princípio moral. Trata-se de pensar um princípio do discurso (D) em relação direta com o princípio de universalização (U).

Em Consciência Moral e Agir Comunicativo, mais precisamente no capítulo três, intitulado Notas Programáticas para a Fundamentação de uma Ética do Discurso, o princípio de universalização (U) é assim formulado:

Assim, toda norma válida deve satisfazer a condição: que as consequências e efeitos colaterais, que (previsivelmente) resultarem para a satisfação dos interesses de cada um dos indivíduos do fato de ser ela universalmente seguida, possam ser aceitos por todos os concernidos (e preferidos a todas as consequências das possibilidades alternativas e conhecidas de regragem).[15]

 Habermas estabelece que “U” é um princípio-ponte fundamentado por derivação, uma vez que deduzido de pressupostos da argumentação em uma ética discursiva.  Dessa forma, a aceitabilidade racional é referência para a validade das normas em geral. O Princípio do Discurso (D) vai de encontro a essa regra de argumentação moral.

De acordo com a ética do discurso, uma norma só deve pretender validez quando todos os que possam ser concernidos por ela (ou possam chegar), enquanto participantes de um discurso prático, a um acordo quanto a valide dessa norma.[16]

 É nesse sentido que o princípio de universalização é apresentado como garantia do discurso, “como uma regra da argumentação que possibilita o acordo em discursos práticos sempre que as matérias possam ser regradas no interesse igual de todos os concernidos”[17].

A validade das normas morais é reinterpretada do ponto de vista dialógico, portanto, ao largo da generalização kantiana da máxima de ação do sujeito transcendental, como se aquilo que valesse para mim pudesse ser estendido à validade de todos. Habermas assim procede a fim de amenizar a abstração da figura deôntica apresentada por Kant em seu imperativo categórico. Ao recolocar a racionalidade na interação social, na relação, amplia-se o horizonte, segundo o qual, se requer a validade das normas de ação. É só tendo em vista o princípio do discurso (D) que o autor alemão pode fundamentar o princípio de universalização (U). Todos participantes do discurso devem reconhecer racionalmente a validade da norma. “Só podem reclamar validez as normas que encontrarem (ou possam encontrar) o assentimento de todos os concernidos enquanto participantes de um Discurso prático”[18]. O Princípio do Discurso (D) é assim apresentado em decorrência direta da imparcialidade advinda do princípio de universalização (U).

O consenso é localizado no discurso prático, pois as normas são tidas como válidas quando reconhecidas por todos os participantes do discurso. Contudo, “U” é o princípo moral a ser fundamentado discursivamente. É ele que figura como base da razão prática, pois representa a vontade universal de todos. O movimento habermasiano consiste em retirar o teste de universalização do entendimento cognitivo in foro interno e movê-lo para o entendimento comunicativo advindo do reconhecimento das pretensões de validade por um outro. A possibilidade permanente de resgate de razões a partir do discurso está imbricada no princípio de universalização junto de sua fundamentação.

É importante ressaltar de passagem que a releitura da teoria weberiana que pretende retirar a legitimidade da legalidade a partir da relação de complementaridade entre direito e moral, exposta pelo autor em 1986 quando de Tanner Lectures, é desdobramento dessas relações e formulações entre os princípios traçadas em Consciência Moral e Agir Comunicativo.[19]

O princípio de universalização (U) e o princípio do discurso (D) que dele decorre - embora mantenham diferenças e não se trate de uma simples dedução - têm a mesma formulação em 1991, quando de Comentários à Ética do Discurso, embora nesse momento o autor alemão já apresente discursos práticos com pretensões de validade a serem resgatadas a partir de razões não submetidas à argumentação moral propriamente dita[20]. O princípio de universalização é assim descrito:

Todas as normas em vigor têm de cumprir a condição de que as consequências e efeitos secundários, provavelmente decorrentes de um cumprimento geral dessas mesmas normas a favor da satisfação dos interesses de cada um, possam ser aceitos voluntariamente por todos os indivíduos em causa.[21]

Nessa oportunidade, o autor alemão confirma o princípio do discurso como formulação  de “U”, bem como repete a menção à participação em apenas um discurso prático. Dessa forma, o peso da generalização de interesses de “U” recai sobre o discurso em “D”.

Se for possível derivar “U” a partir do teor normativo dos pressupostos gerais e pragmáticos da argumentação, podemos apresentar a ética do discurso sob a seguinte fórmula abreviada: (D) Todas as normas em vigor teriam de ser capazes de obter a anuência de todos os indivíduos em questão, se estes participassem num discurso prático.[22]

Embora em 1991 a questão seja levantada tendo em vista mais de um discurso prático em diferentes usos da razão: pragmático, ético e moral[23], sendo assim dissolvida a argumentação moral como base de uma razão prática, cuja validade não reflete a imparcialidade exigida pela moral, as formulações dos princípios, sobretudo de “D”, parecem não acompanhar integralmente o que parece ser a progressão do argumento, sobretudo quando pensamos na manutenção do discurso prático como lugar privilegiado de resgate discursivo diante do princípio moral. Para rearticular os princípios norteadores das normas de conduta tendo em vista a relação na esfera pública política entre discursos práticos diversos da moral, demonstrando como que a razão prática se relaciona com a filosofia do direito e da política, a fim de justificar o cognitivismo ético a partir de uma racionalidade mais ampla, o autor alemão reformula sua teoria em Facticidade e Validade (1992).

Nesta altura, a ética do discurso já passa a ser tratada como teoria do discurso. É que a ética constitui apenas um dos discursos práticos que fazem parte da formação discursiva da opinião e da vontade. Os argumentos éticos estão ao lado de argumentos pragmáticos e morais no que diz respeito à justificação da ação, sendo a validade da ação abordada por diversos ângulos e âmbitos. O princípio do discurso (D), o qual já não se identificava com o princípio da moral, mas ainda se mantinha como seu desdobramento, agora se coloca neutro quanto a moral e quanto ao direito. É que se trata de um princípio que se refere à validade das normas de ação em geral. Não sendo extraído do princípio de universalização (U) como em 1983 e em 1991, o princípio do discurso (D) se coloca num nível pós-convencional de fundamentação. Isso significa que a perspectiva do participante de discursos práticos ajuda a entender o sentido de imparcialidade requerido por juízos práticos diversos. Trata-se de uma nova relação entre os princípios.

Esse princípio - como o próprio nível pós-convencional no qual a eticidade substancial se dissolve em seus componentes - tem, certamente, um conteúdo normativo, uma vez que explicita o sentido da imparcialidade de juízos práticos. Porém, ele se encontra em um nível de abstração, o qual, apesar desse conteúdo moral, ainda é neutro em relação ao direito e à moral; pois ele refere-se a normas de ação em geral.[24]

Nesse novo cenário em que os princípios são dispostos numa configuração diferente de outrora, Habermas não pode deixar de também renovar a formulação do princípio do discurso (D). “D: São válidas as normas de ação às quais todos os possíveis atingidos poderiam dar o assentimento, na qualidade de participantes de discursos racionais” (HABERMAS, 2012a, p.142).

“D” não mais depende de “U” e de seus interesses simétricos. É que o interesse é absorvido nos discursos práticos diversos da moral. Ou seja, são levados em conta na discussão a fim de fortalecer as razões resgatadas no discurso, mas não figuram como fundamento. Portanto, o princípio do discurso (D) tem conteúdo moral ou normativo apenas de um ponto de vista procedimental. Não é um princípio moral no sentido do princípio de universalização (U) de outrora. A estratégia habermasiana consiste em apresentar as próprias condições de possibilidade do discurso como ponto de vista moral necessário para regular normas de ação em geral.

O princípio do discurso explica apenas o ponto de vista sob o qual é possível fundamentar imparcialmente normas de ação, uma vez que eu parto da ideia de que o próprio principio está fundado nas condições simétricas de reconhecimento de formas de vida estruturadas comunicativamente. A introdução de um princípio do discurso já pressupõe que questões prática em geral podem ser julgadas imparcialmente e decididas racionalmente.[25]

É que nesse momento duas são as especificações de “D”, segundo as normas de ação a que se refere. Ou o princípio do discurso (D) se desdobra em princípio de universalização (moral) quando se articula exclusivamente com questões morais, ou se apresenta como princípio da democracia (De), de onde levanta-se a possibilidade de justificação por diferentes discursos práticos canalizadores dos interesses.

Pois o princípio moral resulta de uma especificação do princípio geral do discurso para normas de ação que só podem ser justificadas sob o ponto de vista da consideração simétrica dos interesses. O princípio da democracia resulta de uma especificação correspondente para tais normas de ação que surgem na forma do direito e que podem er justificadas com o auxíliode argumentos pragmáticos, ético-políticos e morais - e não apenas com ao auxílio e argumentos morais.[26]

 Embora Habermas ainda pense nos interesses simétricos quando da especificação de “D” em “U”, não mais os coloca como elemento central na tarefa de fundamentação das normas. Os interesses generalizáveis não se destacam mais na releitura da razão prática. É que se, por um lado, os sentimentos e interesses são intragáveis de um ponto de vista da comunicabilidade universal do juízo, pois regras pressupõem publicidade[27], por outro lado, podem acrescentar as justificativas da ação que se formam a partir de diferentes discursos práticos levantados em diferentes momentos da formação da opinião e da vontade em esfera pública. Argumentos morais não mais figuram como referência deôntica a ser seguida pelos cidadãos na justificativa de suas ações. Vale lembrar-se da maneira como Habermas pensa a complementaridade entre direito e moral, sobretudo no que diz respeito ao alívio fornecido pela forma jurídica ao indivíduo quanto às exigências cognitivas, motivacionais e organizacionais da moral.[28]

Parece que a disposição, a formulação e a relação dos princípios se referem à maneira como o autor alemão desenvolve ao longo de suas obras a relação entre duas normas de ação: moral e direito.  Em verdade, trata-se da relação entre moral, direito e política. De qualquer forma, o foco da presente investigação está na transformação e no posicionamento do princípio de universalização (U), o qual se repete em 1996 quando de A Inclusão do Outro.

O princípio universalizam-te “U” certamente está inspirado em “D”, mas por enquanto não passa de uma sugestão obtida por abdução. Ele afirma:  que uma norma só é válida quando as consequências presumíveis e os efeitos secundários para os interesses específicos e para as orientações valorativas de cada um, decorrentes do cumprimento geral dessa mesma norma, podem ser aceitos sem coação por todos os atingidos em conjunto.[29]

Além disso, com a especificação do princípio do discurso (D) em princípio da democracia (De), a “aceitabilidade racional” de “U” é colocada lado a lado da “aceitação concreta” advinda do resgate discursivo de questões práticas diversas quando da justificação das normas jurídicas pelos cidadãos e quando da aplicação das mesmas normas jurídicas. É que, quando se tem em vista cidadãos participante da formação intersubjetiva da opinião e da vontade, bem como da aplicação das normas no caso concreto, é preciso levar em consideração outras nuances daquilo que entendemos por validade de normas. Trata-se de levar em conta cidadãos em um Estado Democrático de Direito a partir da forma jurídica aplicada ao princípio do discurso e, assim, diferenciar a validade requerida entre parceiros de direito da validade requerida por um princípio moral. É que a legitimidade das normas jurídicas não pode mais passar pela autonomia da vontade de um indivíduo, mas por uma autonomia relacional que se ergue da ênfase dada ao direito de um ponto de vista discursivo.

A fim de obter critérios precisos para a distinção entre princípio da democracia e princípio moral, parto da circunstância em que o princípio da democracia destina-se a amarrar um procedimento de normatização legítima do direito. Ele, significa, com efeito, que somente podem pretender validade legítima das normas jurídicas capazes de encontrar o assentimento de todos os parceiros do direito, num processo jurídico de normatização discursiva. O princípio da democracia explica, noutros termos, o sentido performativo da prática e autodeterminação de membros do direito que se reconhecem mutuamente como membros iguais e livres de uma associação estabelecida livremente. Por isso, o princípio da democracia não se encontra no mesmo nível que o princípio moral.[30]

Enfim, uma coisa é investigar a validade das normas a partir da aceitabilidade racional, portanto levando em conta que toda e qualquer justificação deve passar por refletir a figura deôntica do interesse simétrico de todos. Outra coisa é pensar a validade das normas para participantes da construção intersubjetiva de normas jurídicas, portanto membros de uma comunidade jurídica. Enfim, aplicação das normas tem que ver com argumentos pragmáticos e a fundamentação têm que vem com questões ético-políticas e morais. Passemos à discussão sobre os efeitos das mudanças operadas pelo autor alemão em sua teoria.

 

3  RECONSTRUÇÃO DO PRINCÍPIO DE UNIVERSALIZAÇÃO

 

O método reconstrutivo que o autor alemão utiliza em seu percurso filosófico lhe permite depurar o lugar mesmo do princípio de universalização (U). Em um primeiro momento, todas as possibilidades de consenso via discussão racional passavam pela imparcialidade própria da consideração do interesse de todos. Toda ação, para ser tida como legítima, deveria ser atravessada pelo teste de universalização, ou seja, pela concordância de todos os posicionamentos racionais. Daí que o princípio do discurso (D) seria uma formulação mais resumida de “U”. São princípios distintos e não existe dedução de um para outro. Contudo, o resgate de argumentos no discurso prático ainda tem em vista a figura deôntica de uma imparcialidade própria do teste de universalização. A força normativa do discurso tem por base um argumento transcendental. Na verdade, em 1983, o princípio moral ainda tem demasiada força de referência para o discurso prático. É neste sentido que, na formulação de “D” àquela altura se fala em “discurso prático” e não em “discursos práticos”. O discurso prático moral é base da razão prática.

Dessa forma, apesar do autor alemão e seu ímpeto discursivo ter conseguido proceder a releitura da razão prática kantiana a partir de uma crítica da filosofia da consciência - a qual retirava a força cognitiva da ética e a fundamentação das normas da generalização da máxima de ação, afastando-se de qualquer interesse, - seu princípio do discurso (D) ainda dependia do modelo dado pelo princípio da universalização. Daí que o resgate discursivo teria que passar, necessariamente, pela aceitabilidade racional do discurso prático moral representada pelo princípio de universalização (U). Dessa forma, permanece a subordinação do direito à moral. Immanuel Kant é precursor dessa subordinação quando pensa um princípio moral como princípio de universalização na base da razão prática pura. Trata-se do imperativo categórico que pretende seguir uma lei universal da razão a partir do uso público da razão a que o sujeito submete sua máxima. A legitimidade da legalidade vem da figura deôntica própria da imparcialidade requerida pela justificação moral.

Max Weber, como neokantiano, pretendeu reformular a relação entre direito e moral em favor da autonomia do direito. Contudo, ao retirar a legitimidade da legalidade, deu mais valor para o potencial fático da cogência das normas. A moral é completamente desconsiderada no cenário em que o direito retira sua legitimidade de sua força de imposição, de coerção. A forma jurídica carrega a possibilidade de fazer valer seus mandamentos. Executa aquilo que pretende. Daí sua legitimidade. A validade vem da facticidade do direito.

Habermas dá nova roupagem para a tese da legitimidade advinda da legalidade tentando não se aproximar nem da moralização do direito (Kant) e nem do positivismo jurídico (Weber). É que, no que pese o fomento de importante discussão, Kant e Weber se equivocaram ao desconsiderar elementos importantes do procedimento de justificação das normas. Nesse sentido habermasiano, Kant desconsidera uma validade que é própria ao direito e que não pode se submeter à moral, embora se relacione sim com um momento incondicional. É que Kant pensa a razão prática a partir da lei universal da razão. Em termos habermasianos, a validade teria aqui primazia moral diante da facticidade do direito. Já Weber acaba levantando a legitimidade do direito sem sequer se relacionar com algum elemento incondicional presente no procedimento de resgate de discursos práticos diversos. Portanto, Weber quer fugir da moralização do direito feita por Kant, mas acaba invertendo os pólos e absorvendo a moral. A validade é absorvida pela facticidade do direito e a legitimidade das normas jurídicas vem puramente da confiança em sua força de imposição. Ora, nesse sentido, a concepção weberiana acaba se aproximando do positivismo jurídico, embora saibamos que, de um ponto de vista sociológico, o autor se localiza no historicismo e não no positivismo, pois apresenta múltiplas motivações para ação.

Enfim, relendo ambos autores, Habermas resgata a ideia da legitimidade advinda da legalidade a partir de uma nova concepção do direito em relação complementar com a moral. Trata-se de duas normas de ação, uma ao lado da outra. Isso começa a ser desenhado em Tanner Lectures (1986), mas se consolida em Facticidade e Validade (1992), justamente quando a relação entre os princípio que dão sustentação para a teoria do discurso (não mais ética do discurso) se coloca de uma outra maneira. A tensão entre facticidade e validade presente na linguagem e no direito moderno já pode ser vista quando das críticas feitas tanto à Kant quando à Weber. Todavia, apenas em 1992, passando pelas discussões de 1991 em Comentários à Ética do Discurso, as quais já tratam de discursos práticos diversos da moral, portanto de usos práticos da razão, é que Habermas consegue articular direito e moral a partir de sua cooriginariedade. Não vamos aqui trabalhar as teses apresentadas em Facticidade e Validade. Entretanto, é importante sinalizar que a relação entre autonomia privada e pública, bem como entre direitos humanos e soberania popular em uma democracia deliberativa, são decorrentes da maneira como passa a entender a tensão entre facticidade e validade que consta do próprio potencial do direito moderno. Em verdade, trata-se da relação entre direito e moral e direito e democracia.

Embora já inscrita no cenário de diferentes usos da razão em 1991, a formulação do princípio do discurso (D) continua apontando para o discurso prático como derivação da argumentação moral. A ênfase no direito, inserindo-o como norma de ação ao lado da moral a sugerir razões próprias para a discussão sobre a validade das normas jurídicas, ganha corpo em 1992. É quando muda o lugar e a formulação dos princípios. Primeiramente, é importante notar que Habermas levanta uma formulação de “D” que pretende abranger tanto as normas morais quanto a normas jurídicas, mas sem confundi-las quanto a validade. Assim, apresenta “U” como uma formulação de “D” ao lado de “De”. Dessa forma, o princípio do discurso trataria das normas de ação em geral separando o âmbito próprio da moral e do direito, mas os ajustando no mesmo procedimento. Aceitabilidade racional e aceitação concreta fazem parte do procedimento de criação do direito, portanto do procedimento que se destina à institucionalização da soberania popular como direitos humanos. O princípio do discurso (D) pode se aplicar ao princípio moral ou à forma jurídica, se desdobrando em princípio da democracia (De). Em outras palavras, o direito não pode contrariar o ponto de vista moral do procedimento, mas não se subordina a exclusiva referência de uma figura deôntica.

Além disso, é preciso levar em conta que os interesses não são subjulgados pela moral. Os interesses aparecem não como generalizáveis, mas como elementos presentes nos discurso práticos a engrandecer os argumentos. É que existem discursos práticos diversos da moral que mantêm uma validade própria. Validade de normas tendo em vista parceiros de direito. Os parceiros de direito em discussão sobre a fundamentação, bem como a figura da aplicação do direito, não precisam justificar suas ações a partir de argumentos morais. É por isso que “D” é neutro e mantém dois desdobramentos diversos a depender da especificidade das normas de ação. Leva apenas um ponto de vista moral, um momento incondicional, um sentido próprio de imparcialidade que permita pensar a legitimidade das normas de ação em geral. Dessa forma é possível lidar com os interesses e não excluí-los de maneira apriorística.

Na própria formulação que Habermas apresenta em Facticidade e Validade, o princípio “D” se mantém distante de “U”, pois quando se refere à “participantes de discursos práticos” pressupõe também argumentações ético-políticas e pragmáticas. Trata-se de argumentos que levantam validade tendo em vista não aquilo que é igualmente bom para todos, pois em consideração simétrica dos interesses (moral), mas aquilo que pode ser racionalmente aceito como “bom para nós” ou como “bom para mim”. Dessa forma, a aceitação é concreta e prescinde da generalização de interesses de outrora para validar as norma jurídicas.

Em Facticidade e Validade, o autor alemão mitiga o caráter deontológico de sua ética. Ao colocar a relação entre direito e democracia ao lado da imparcialidade própria da moral, propõe uma moral mais modesta, pois parte do procedimento discursivo e não da referência dada pela regra transcendental da argumentação em geral. É que existem interesses que, por mais que não possam ser universalizados, contribuem para as razões levantadas nos discursos práticos. O consenso não pode ser pensado apenas tendo em vista “U”, principalmente quando se tem em vista uma racionalidade ampliada.

Em verdade, é preciso retomar mais uma vez a discussão entre os conceitos de Hume e de Kant apresentados na introdução do trabalho. Habermas é neokantiano e não está disposto a abandonar o cognitivismo ético em nome da força do hábito. É que não existem interesses sem juízos. A imbricação entre facticidade e validade mostra sua face. Todo interesse, para ser designado como interesse, passa pelo julgamento discursivo. Por entre interesses existem juízos que os interpretam, de maneira que o consenso não pode apenas considerar interesses justapostos, como se, para tanto, fosse possível partir de interesses generalizáveis e não da própria argumentação. Ora, isso pressuporia um compartilhamento entre interpretações uníssonas antes da discussão. A justificação deveria, de antemão, abranger todos os interesses, uma espécie de vontade geral que antecipa o sentimento de todos os participantes, tal como aparece na teoria da correção de Rousseau.

Como os interesses são sempre interpretados, para que um interesse geral fosse causa de um consenso, seria necessário, no mínimo, presumir uma interpretação unânime dos interesses antes da discussão. Seria presumir uma vontade geral acima da vontade de todos em termos de Rousseau. Aliás, Rousseau é um bom interlocutor para esclarecer esse ponto. Ele diz que a vontade geral presume uma só vontade.[31]

Os interesses não podem aparecer como destacados das várias discussões sobre a justificação das normas. É que todo interesse está enredado na discussão. Não é possível interpretar um interesse sem passar pelo processo discursivo. Dessa forma, o que é preciso levar em conta a fim de justificar as normas de conduta é o compartilhamento de significados, sentidos, e não a generalização de interesses. Mais que isso. A própria práxis comunicativa não pode ver os participantes pelo ângulo dos interesses em conflito. A preocupação habermasiana não está em sanar conflitos de interesse, mas possibilitar o consenso racional em ambiente marcado pelo pluralismo de concepções de bem. O aprendizado não vem quando incutimos interesses por cima de interesses, levando em conta a vontade do sujeito, mas quando publicamente compartilhamos regras. É por isso que Wittgenstein critica a existência de uma linguagem privada que dependeria de aferição empírica. É que o pensamento já está imbricado na linguagem, nos obrigando a assumir papéis argumentativos quando se tem em vista o entendimento.

Segundo Wittgenstein, o conceito de seguir uma regra implica um caráter público. Não se pode fazê-lo privadamente. (...) A recusa habermasiana das fundamentações empíricas é que elas não dão conta do caráter da moralidade que se define a partir da noção de seguir uma regra. (...) Ora, a experiência, a sensação, é sempre privada, portanto não pode dar conta da comunicabilidade universal do juízo, ou seja, da objetividade.[32]

Para se pensar a produção de normas a partir da autonomia é preciso não levar em consideração a interação social a partir de sujeitos portadores de interesses em conflito na esfera pública. É que a autonomia não é do sujeito, mas do médium do direito. O processo de formação da opinião e da vontade é intersubjetivo. Trata-se de uma comunicação sem sujeitos. Participantes de discursos práticos diversos não são sujeitos cognoscentes portadores de interesses generalizáveis, o que faz com que a autonomia seja relacional. O cognitivo se mistura com a comunicação e o entendimento não passa pela confluência de opiniões, mas pela produção compartilhada de sentidos.

Dessa forma, o argumento habermasiano passa por entender que o poder comunicativo surge do pano de fundo comum das interações sociais cotidianas. Trata-se da formação da opinião pública a partir do processo discursivo. O fluxo comunicativo sai do mundo da vida, passa por esferas públicas informais até ganhar espaço na esfera pública formal. A periferia pressiona o centro a levar em consideração as demandas que surgem na interação social. A aproximação entre Estado e Sociedade Civil se realiza quando entendemos a produção discursiva do direito em um Estado Democrático de Direito. Apenas levando em conta diversos usos práticos da razão, ou seja, considerando que a validade das normas é discutida em vários âmbitos a partir de argumentos pragmáticos, éticos e morais, e não só levando em conta o interesse simétrico de todos, é que é possível canalizar os interesses na discussão. Sem tolher os interesses de maneira apriorística e levantar interesses generalizáveis como núcleo da razão prática, mas permitindo que adentrem discursivamente a esfera pública, Habermas desinflaciona a moral e pode efetivamente pensar o direito em sua ambiguidade. É que o poder que atravessa o direito não é constituído apenas de violência. Trata-se do poder comunicativo que, ao institucionalizar as condições próprias da troca normativa, relaciona mundo da vida e sistema. O direito e sua ambiguidade entre facticidade e validade figura como saber cultural e como sistema de ação e pode, portanto, realizar a ligação necessária entre mundo da vida e sistema em uma teoria da circulação de poder. Assim, o autor alemão pode se descolar da ideia de sitiamento do mundo da vida contra a colonização do sistema apresentada em Teoria do Agir Comunicativo (1981), passando à teoria das eclusas quando de Facticidade e Validade (1992). A teoria da circulação do poder político pode, a um só tempo, combater modelos empíricos e realistas de democracia que advogam a ideia de que a legitimidade das normas de ação tem como diretriz a correlação de forças por trás do diálogo, sendo o consenso uma quimera.

Com o princípio de universalização (U) não constando mais como referência dos argumentos a serem considerados para efeito de validação das normas de ação, se posicionando ao lado da aceitação concreta do princípio da democracia (De) advinda da formação intersubjetiva da opinião e da vontade em um Estado Democrático de Direito, sendo portanto apenas uma formulação do próprio princípio do discurso (D) que se mantém equidistante da moral e do direito, se evita, por um lado, a subordinação do direito à moral e, por outro lado, o positivismo jurídico que pretende resumir a força do direito à coerção da forma jurídica. Dessa forma, a possibilidade de se aferir a legitimidade das normas de ação, seja o direito, seja a moral, a partir do discurso racional, é resguardada, e o Estado Democrático de Direito pode ser melhor fundamentado na relação entre direitos humanos e soberania popular.

 

4  CONCLUSÃO

 

O presente artigo científico pretendeu apresentar brevemente o lugar do princípio de universalização (U) no movimento habermasiano que começa nos anos 80, mas que em Facticidade e Validade (1992) acaba por enfatizar o direito no procedimento discursivo de formação da opinião e da vontade. Na verdade, articula-se alguns elementos da trajetória da relação entre direito e moral nas obras habermasianas dos anos 80 e 90 para destacar a defesa de um cognitivismo ético que não é reflexo de uma figura deôntica, mas produto de uma nova relação entre os princípios. Geralmente, quando o assunto é trabalhado, a ênfase recai sobre aquele princípio que sustenta a razão prática, pois faz a ponte com o uso cotidiano da linguagem em discursos práticos diversos. O princípio do discurso (D) e sua formulação está mesmo em destaque na teoria do discurso e também é investigado neste artigo. Contudo, vale aqui destacar o posicionamento e as relação traçadas em torno do princípio de universalização (U). É que a própria ideia do Estado Democrático de Direito passa por entender seu lugar. Trata-se da escolha mais didática no intuito de demonstrar que em 1992 e 1996 (Facticidade e Validade e A inclusão do outro), “U” se encontra como formulação de “D”, e que isso faz parte do amadurecimento das investigações do autor sobre a relação complementar entre direito e moral.

Apesar da formulação de “U” continuar a mesma em todo o processo que pretendemos reconstruir da obra habermasiana, seu posicionamento, sua importância, seus atravessamentos portanto, se transformaram. A aceitabilidade racional não figura mais como argumento transcendental a fundamentar a razão prática, mas aparece junto da aceitação concreta que articula discurso com forma jurídica no princípio da democracia (De). O núcleo de validade das normas não advém do teste de universalização que considera interesses generalizáveis. Dessa forma, para justificar uma norma num Estado Democrático de Direito não é preciso antecipar interesses generalizáveis ou mesmo pretender considerar o interesse simétrico de todos os envolvidos. Em verdade, a interação social não pode ser mais apresentada como relação de sujeitos cognoscentes portadores de interesses. A práxis comunicativa é muito mais que um conflito incessante de interesses. É que o consenso não é a confluência de opiniões como resultado de uma regra da argumentação em geral, mas fruto do entendimento, télos da própria linguagem. Portanto, tem que ver com a produção de sentidos. A percepção intersubjetiva da relação social impõe que por entre interesses existe aquilo que posiciona simbolicamente os interesses. Habermas lida com os interesses em um procedimento discursivo que se pretende neutro e, portanto, não os subordina a um princípio moral que exige uma ação desinteressada. Os interesses não são excluídos de maneira apriorística, pois ajudam a compor o cenário em que o poder comunicativo atravessa todo processo de justificação intersubjetiva e validação das normas de ação. É que a defesa de um cognitivismo ético passa por levantar uma autonomia que se relaciona não mais com um sujeito cognoscente portador de interesses, mas com os participantes do discurso, membros de uma comunidade jurídica em um procedimento de criação de direitos. A validade das normas de comportamento tem em vista um procedimento discursivo que se desdobra em argumentos a serem resgatados em discursos práticos pragmáticos, éticos e morais.

A partir da relação entre os princípios apresentada em 1992 e ratificados em 1996 é possível reconstruir racionalmente os motivos que justificam as normas de conduta. A validade das normas se desdobra em formulações do princípio do discurso (D). É que “D” se refere às normas em geral e “U” acaba por perder sua centralidade quando discursos práticos pragmáticos e ético-políticos entram em cena na teoria do discurso. Numa concepção procedimental de direito e de democracia, “D” assume um ponto de vista moral que guarda uma imparcialidade específica num momento incondicional. Contudo, trata-se de uma imparcialidade diferente daquela requerida por um princípio moral. Assim, se relaciona as normas de ação de maneira a não subordinar o direito à moral e muito menos desconsiderar discursos práticos morais que possam fortalecer a argumentação. Ética do discurso se transforma em teoria do discurso para abranger uma legitimidade mais complexa. O direito não pode contrariar o ponto de vista moral contido no procedimento de formação da opinião e da vontade, mas tem sua validade aferida de maneira autônoma. Habermas se posiciona entre Kant e Weber para pensar um Estado Democrático de Direito que não permaneça em um abstracionismo normativo dependente da moral e nem se confunda com realismo ou positivismo jurídico. Dessa forma, a aposta na discussão e na deliberação pode afastar a ideia de interesses que competem por território. A política como uma disputa de interesses e o direito como violência cedem lugar para a ambiguidade entre facticidade e validade presente no próprio uso ordinário da linguagem. É que se a política, o direito e o estado representassem interesses hegemônicos em disputa não restaria lugar para o aprendizado, sobretudo o aprendizado de paradigmas ao longo do tempo. O repúdio à escravidão vem da discussão ao longo do tempo. As razões que permitem normatizar a escravidão não se resumem à descrição dos fatos sociais. É que a correlação de força que incentivou e incentiva a normatização não impede a porosidade das discussões.

Enfim, a emancipação não pode vir a ser desconsiderada tendo em vista um diagnóstico unilateral que entende a política como território em disputa. É por isso que precisamos perceber que a circulação do poder político se dá desde o mundo da vida até o sistema, sendo atravessado pelo poder comunicativo em todo processo. Com isso, não podemos proteger o mundo da vida do sistema, pois é só com marcos institucional em aprendizado filogenético que a razão comunicativa pode enredar as possibilidades de emancipação. O potencial de auto certificação contido na modernidade oferece as condições para pensar a tensão entre facticidade e validade no procedimento de criação do direito. Nesse sentido, direitos humanos e soberania popular são originários. Enfim,  a relação discursiva e procedimental entre direito, moral e política fundamenta a criação de normas jurídicas em um Estado Democrático de Direito.

 

REFERÊNCIAS

 

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WITTGENSTEIN, L. Investigações Filosóficas. Tradução: José Carlos Bruni. São Paulo: Editora Nova Cultural, 1999. (Coleção Os Pensadores: Wittgenstein)

 

 

 

 

 

 

 

 



[1]Mestre em Filosofia pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (PPGFIL- UFRRJ)      Especialista em Filosofia Política e Jurídica pela Universidade Estadual de Londrina (UEL). Pós-Graduando em Educação em Direitos Humanos pelo IFRJ

 

[2] Cf. HUME, David. Investigação sobre o entendimento humano e sobre os princípios da moral. Trad. José Oscar de Almeida Marques. São Paulo: Editora Unesp, 2004, p. 367.

[3] Cf. HUME, David. Investigação sobre o entendimento humano e sobre os princípios da moral. Trad. José Oscar de Almeida Marques. São Paulo: Editora Unesp, 2004, p. 95.

[4] Cf. KANT, Immanuel. Fundamentação da Metafísica dos Costumes. Trad. Paulo Quintela. Lisboa: Ed. 70, 2007.

[5] Herdeiros de  Maquiavel, Hume, Marx, Carl Schimitt. V. HUME, David. História da Inglaterra Da invasão de Júlio César à Revolução de 1688. São Paulo: Editora Unesp. 2017. As instituições da Inglaterra apresentas por Hume buscam responder a fatos sociais. Portanto, se relacionam de tal maneira com os acontecimentos da inglaterra da época que não podem ter suas experiências reconstruídas mundo a fora. As instituiçoes, assim, não se inserem em um cenário de aprendizado paradigmático ao longo do tempo. Essa poderia muito bem ser uma crítica kantiana à Hume, pois pensa o aprendizado no uso prático da razão na direção da emancipação. Conferir também uma visão agonística da democracia que pretende se contrapor a certo idealismo liberal dos autores da democracia deliberativa, embora ainda aboste na deliberação ao final. MOUFFE, Chantal. Democracia, cidadania e a questão do pluralismo. In: Política e Sociedade – Revista de Sociologia Política, vol.1, n.3, Florianópolis: EDUFSC, 2003.

[6] HABERMAS, Jürgen. Direito e Democracia: entre facticidade e validade (v. 2). Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro. 2012. p. 10.

[7]  “Uma acção é conforme ao direito quando permite ou quando sua máxima permite fazer coexistir a liberdade do arbítrio de cada um com a liberdade de todos segundo uma lei universal”. Cf. KANT, Immanuel. A metafísica dos costumes. 3 Ed. Tradução. José Lamego. Lisboa: Calouste Gulbenkian, 2017, p.43.

[8] Cf. Siebeneichler, Fávio Beno. Nota do Tradutor, p.34. In: Habermas, Jürgen. Entre Naturalismo e Religião: estudos filosóficos. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2007, p. 34. “é importante atentar para a diferença entre dois conceitos de ‘entendimento’, isto é, para o conceito de Verstand, de Kant, que se citua inteiramente no nível cognitivo da razão, e para o conceito de ‘entedimento’(Verstandigung), que é fundamental no pensamento habermasiano, e cujo sentido não é apenas cognitivo, mas também comunicativo.”

[9] Mais para frente relacionaremos de maneira breve o presente conceito de moral com a teoria dos interesses generalizáveis de Habermas em Conhecimento e Interesse, levando em conta que o interesse aparece na formulação do princípio de universalização que consta em Consciência Moral e Agir Comunicativo e segue nos anos 90 com a mesma formulação.

[10] ROUSSEAU, Jean-Jacques. Contrato Social. Capítulo III do Livro II. 1973. p.52. (Os Pensadores)

[11] KANT, Immanuel. Fundamentação da Metafísica dos Costumes. Trad. Paulo Quintela.Lisboa: Edições 70. 2007. p.59.

[12] Cf. WEBER, Max. Economia e Sociedade: fundamentos da sociologia compreensiva. Trad. De Régis Barbosa e Karen Elsabe Barbosa. 4 edição. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2015, p.17.

[13] Vale a pena mencionar de passagem a discussão sobre a tradução da expressão em Aristóteles. “Todo mundo sabe que Aristóteles definiu o homem como zôon lógon échon. A tradução desta expressão, porém, é muito mais ‘vivente dotado de palavra’ do que ‘animal dotado de razão’ ‘animal racional’. Se há uma tradução que realmente trai, no pior sentido da palavra, é justamente esta de traduzir Logos por Ratio. E a tranformação de zôon, vivente, em animal. O homem é um vivente com palavra. E isto não significa que o homem tenha a palavra ou a linguagem como uma coisa, ou uma faculdade, ou uma ferramento, mas que o homem é palavra, que o homem é enquanto palavra, que todo humano tem a ver com palavra, se dá em palavra, está tecido em palavras, que o modo de viver próprio desse vivente, que é o homem, se dá na palavra e como palavra. (...) Quando fazemos coisas com as palavras, do que se trata é de como damos sentido ao que somos e ao que nos acontece, de como correlacionamos as palavras e as coisas, de como nomeamos o que vemos ou o que sentimos ou de como vemos ou sentimos o que nomeamos.” BONDIA, Jorge Larrosa. Notas sobre a experiência e o saber de experiência. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, ANPEd, n. 19, p. 20-28, Abr. 2002.

[14] HABERMAS, Jürgen. Consciência Moral e Agir Comunicativo. Tempo Brasileiro: Rio de Janeiro. 1989, p.88.

[15] HABERMAS, Jürgen. Consciência Moral e Agir Comunicativo. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro. 1989. p. 86.

[16] HABERMAS, Jürgen. Consciência Moral e Agir Comunicativo. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro. 1989. p. 86.

[17] HABERMAS, Jürgen. Consciência Moral e Agir Comunicativo. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro. 1989. p. 87.

[18] HABERMAS, Jürgen. Consciência Moral e Agir Comunicativo. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro. 1989. p. 116.

[19] Cf. HABERMAS, Jürgen. Direito e Democracia: entre facticidade e validade (v. 2). Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro. 2012. p. 193. Vale lembra nessa altura que, seguindo a pretensão do presente artigo científico, deixamos de lado as fomulações principiológicas habermasianas apresentandas em Teoria do Agir Comunicativo (1981)e em Estudos Preliminares e Complementações para a Teoria da Ação Comunicativa, espécie de pósfácio a sua obra maior. Embora façam parte da movimentação do argumento do autor alemão, é suficiente remeter o leitor a investigação realizada por Delamar Volpato Dutra em  Kant e Habermas: A reformulação discursiva da moral kantiana. Sobretudo, o que aparece no capítulo 03 O Fato da Comunicação. Cf. DUTRA, Delamar Volpato.  A Reformulação Discursiva da Moral Kantiana. Porto Alegre: EDIPUCRS. 2002. p. 145.

[20] Habermas apresenta  três usos práticos da razão. São argumentos práticos mobilizados tendo em vista questões práticas diversas, com justficações próprias. Três são os discursos práticos: pragmáticos, éticos e morais. Discursos práticos pragmáticos mobilizam razões que tem em vista o resultado, o sucesso. São razões calculistas mobilizadas ara destacar os melhores meios para fins predispostos. Trata-se daquilo que é “bom para mim”. Discursos práticos ético-políticos tem em vista valores compartilhados por uma comunidade. É aqulo que poderíamos dizer ser “bom para nós”. Discursos práticos morais são aqueles que possuem um peso deontológico forte, pois pretendem levar em conta o interesse simétrico de todos os envolvidos. Cf. HABERMAS, Jürgen. Acerca do uso pra´gmático, ético e moral da razão prática. In: Comentários à ética do discurso. Lisboa: Instituto Piaget, 1999. p. 101.

[21] HABERMAS, Jürgen. Comentários a Ética do Discurso. Lisboa: Instituto Piaget, 1999. p.34.

[22] HABERMAS, Jürgen. Comentários a Ética do Discurso. Lisboa: Instituto Piaget, 1999. p.34.

[23] HABERMAS, Jürgen. Comentários a Ética do Discurso. Lisboa: Instituto Piaget, 1999. p.101.

 

[24] HABERMAS, Jürgen. Direito e Democracia: entre facticidade e validade (v. 1). Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro. 2012. p. 142.

[25] HABERMAS, Jürgen. Direito e Democracia: entre facticidade e validade (v. 1). Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro. 2012. p. 143.

[26] HABERMAS, Jürgen. Direito e Democracia: entre facticidade e validade (v. 1). Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro. 2012. pp. 142-143.

[27]WITTGENSTEIN, L. Investigações Filosóficas. Tradução: José Carlos Bruni. São Paulo: Editora Nova Cultural, 1999. (Coleção Os Pensadores: Wittgenstein). No início do texto, Wittgenstein menciona livro I, caítulo 8 de Confissões, onde Santo Agostinho em diálogo com seu filho, Adeodato, levanta a discussão sobre uma linguagem referencial. Wittgenstein afirma que Adeotado é que tinha razão. Assim faz para argumentar a favor de termos que não possuem referencialidade e a favor da não existência de uma lingagem privada. De qualquer forma, é importante registrar que o próprio Agostinho levata problemas para a lingugem referencial em De magistro.

[28]  HABERMAS, Jürgen. Direito e Democracia: entre facticidade e validade (v. 1). Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro. 2012. p. 150.

[29] HABERMAS. Jürgen. A Inclusão do Outro: estudos de teoria política. São Paulo: Edições Loyola, 2002. p. 58.

[30] HABERMAS, Jürgen. Direito e Democracia: entre facticidade e validade (v. 1). Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro. 2012. p. 145.

[31] DUTRA, Delamar Volpato.  A Reformulação Discursiva da Moral Kantiana. Porto Alegre: EDIPUCRS. 2002. p. 204.

[32] DUTRA, Delamar Volpato.  A Reformulação Discursiva da Moral Kantiana. Porto Alegre: EDIPUCRS. 2002. p. 216.