Jovino Pizzi[2]
Universidade Federal de Pelotas
A teoria do agir comunicativo de Habermas resgata um déficit filosófico indis- cutível. A mudança de paradigma evidenciou não apenas as limitações da filosofia da consciência, mas realçou – e de forma irrefutável – o “conceito fenomenológico de mundo da vida” (Habermas, 2012 I, p. 4). Essa questão é tema recorrente, com o que, por um lado, é possível insistir nas formas de colonização das esferas da vida cotidiana – isto é, os bloqueios impostos pelo sistema – e, por outro, reaver e com- preender o sentido do agir comunicativo e seus diferentes plexos “de racionalidade e respectivos aspectos de validade” (Habermas, 2012 I, p. 4). Nesse sentido, creio que é preciso estudar o significado não de uma metafísica dos costumes, como previa Kant, mas de uma metafísica pós-convencional.
Em certo sentido, não dá para negar que os “imperativos do mundo da vida” (Habermas, 2012 I, p. 5) apresentam um alcance limitado, isto é, se ressentem de uma perspectiva universalista. Todavia, esses imperativos resguardam um sentido que não pode ser simplesmente rechaçado, pois suas pretensões de validade per- fazem um núcleo de sustentação capaz de justificar as decisões dos sujeitos coau- tores. Em outras palavras, a teoria do agir comunicativo representa, para a filosofia e para as ciências em geral, a certificação de que as questões da vida cotidiana têm um significado imprescindível, às vezes, com sérias antipatias à lógica do direito ou às formulações sistêmicas do poder e do dinheiro.
Com o fim de ressaltar o significado das questões relacionadas à vida cotidiana (every day life), o primeiro item deste texto mostra as duas leituras que a filosofia expõe diante do tema. Em segundo lugar...
1 O TEMA DA VIDA COTIDIANA E A MODERNIDADE FRENTE AOS ATAQUES DE LIQUEFAÇÃO CONTROVÉRSIA INTERPRETATIVA
A filosofia contemporânea sofreu e se articula em vistas às distintas transforma- ções. Em certa medida, o movimento indica uma reação frente a determinados pressu- postos da modernidade. Por isso, a maneira como esse termo vem sendo utilizado se relaciona a uma polissemia que, às vezes, é enganadora. Nesse sentido, a substantivação modernidade agrega diferentes significados, pois são muitos pensadores, concepções e interesses que estão em jogo. Às vezes, as divergências são profundas a ponto de ques- tionar se há, ou não, algo em comum entre os autores e pontos de vista. Quais são os argumentos da modernidade? Existe apenas uma modernidade? Trata-se, pois, de uma homogeneidade linear ou, então, de uma simples etapa no desenvolvimento do pensa- mento ocidental? Enfim, existe uma polissemia em torno ao próprio termo?
No melhor dos casos, pode-se advogar por diferentes acepções de modernida- des. Ao se falar de modernidade, é preciso considerar, de antemão, dois aspectos fundamentais. Em um sentido, a própria noção de modernidade enquanto um fe- nômeno uniforme, homogêneo e com sucessivas etapas até conseguir um estágio de maioridade inquestionável; e, por outro, a ideia de que seus pressupostos esmo- recem e, portanto, se liquefazem a ponto de perderem sua consistência, energia e sua lucidez. Vejamos cada um desses pontos com mais detalhe.
Na maioria dos casos, as referências filosóficas e das ciências em geral a respeito da modernidade evidenciam uma interpretação homogênea, homogeneizadora e, ainda, vinculada a um processo linear. Ela presume a sucessão de etapas em vistas a um amadurecimento necessário e, portanto, esperançoso. O adjetivo e o substan- tivo moderno refletem tendências, metodologias e estilos de vida mais avançados em relação à Antiguidade e ao período medieval e, por isso, essa etapa cumpriu os estágios de amadurecimento típico do esclarecimento. Daí, a substituição de hábitos, padrões e procedimentos considerados infantis por outros, sinônimos de avanço e perfeição em todos os aspectos: político, modos de produção e consumo, eficiência, tecnologia, comunicação etc. Enquanto sinonímia de novo, o lexema apresenta como antonímia a noção de avelhantado, infantilismo e retrógrado.
O verbo modernizar consolida sua conotação no século XIX, cuja acepção evidencia três feições: a) tornar-se moderno, no sentido de acompanhar a evolução e as ten- dências do mundo; b) efetuar mudanças e/ou substituir sistemas, métodos, equipamen- tos etc. antigos por outros modernos; c) dar ou adquirir um aspecto concernente ao mundo atual. O sentido literal evidencia o sentido literal, conquanto a substantivação lexicográfica ressalta a categoria modernidade, cujo significado é muito mais complexo e abrangedor. Por isso, além do sentido literal, o adjetivo moderno só aparece no latim tardio (modernus, a, um) e se traduz por moderado, recente, novo, contemporâneo.
Por todas as vias, o exame da locução modernidade se depara com a inter- pretação clássica da secularização, sinônimo de laicização e concernente ao não espiritual. O substantivo não tem nada a ver com o escatológico ou apocalíptico. A noção do “plenamente capaz e responsável” de sujeito implica na necessidade de eliminar todas as interferências externas. Na verdade, trata-se da capacidade de o sujeito governar-se a si mesmo desde suas próprias capacidades, de modo que ele se apresenta com o devido discernimento e orientação para fundamentar o agir.
Nesse sentido, a noção laical – secular, portanto – de sujeito esclarecido e com aptidão para conduzir seu destino evidencia duas consequências um tanto problemáticas. A primeira delas refere-se à necessidade de revisar os fundamentos externos, isto é, alheios ao próprio sujeito. A tradição ocidental utilizemprega duas expressões para dar a conhecer salientar a os classificação diferentes esferas dos saberes: a episteme e a doxa. Essa divisão pode ser examinada em vistas a uma idealidade metafísica, isto é, enquanto plenitude frente a um mundo de circuns- tancialidades contingenciais. Essa dupla noção pode também ser percebida como dois patamares que separam o nível da fundamentação de tipo transcendente e as cotidianidades do mundo habitual e do horizonte terrenal e mundano.
Atualmente com frequência, verifica-se que persiste o ponto de vista extrema- mente deficitário, nocivo ou malvisto em relação às diferentes dimensões da vida cotidiana e, inclusive, na própria relação entre filosofia e as circunstancialidades do mundo da vida. Essa dicotomia se acentua no pensamento moderno. Então, a ciência, acreditando-se já amadurecida, procura consolidar “um corpo de conheci- mentos bastante sólido e dispondo de seus próprios padrões de racionalidade [...]” a ponto de acusar “a metafísica de inconsistência, de esterilidade, de pseudoconhe- cimento, cujo método ou modo de instalar a racionalidade não satisfaz as novas normas do saber” (Domingues, 1991, p. 173).
Essa ambivalência reforça as suspeitas e consagra a desconfiança desmedi- da em relação às experiências vivenciais e ao saber relativo ao mundo da vida e das suas contingencialidades. Em outras palavras, qualquer revisão bibliográfica, por mais simples que seja, salienta que as evidências da vida cotidiana e as interações dos sujeitos com o oikos-cosmos apresentam conotações carac- terizadas pela ambivalência, o menosprezo e com fortes indícios enigmáticos; em uma palavra: indecifráveis. Em Platão, por exemplo, a ideia de um mundo efêmero e visível recomenda o descrédito e o menosprezo ao horizonte ligado ao efêmero. A realidade vinculada à doxa não passa de um horizonte inapro- priado, isto é, um pseudo-horizonte e, portanto, nada confiável e esvaziado de qualquer sentido. Por isso, ater-se à realidade mundana, segundo o filósofo grego, testifica uma vida inautêntica e, em vista disso, tias pretensões podem ser simplesmente desqualificadas.
Para Fornet-Betancourt, esse descrédito pode ser compreendido através do mito da caverna e, mais recentemente, em Heidegger, “com sua análise da cotidianidade como lugar de vida inautêntica” (2010, p. 39). Dessa maneira, não há como superar o caráter inapropriado do mundo da vida, pois se trata do “lugar de alienação, falta de verdade, de sentido e de autenticidade” e, portanto, como lugar impróprio para alcançar a “verdadeira” vida (Fornet-Betancourt, 2010, p. 41). Essa concepção alimenta uma “forte desvalorização da existência carnal e terrestre, rebaixada ao escalão de aparência ilusória da qual o homem deve buscar fugir se aspira a viver em conformidade com os impulsos superiores da alma” (Schimitt, 2006, I, p. 254). Assim, as circunstanciali- dades do mundo da vida são empecilhos relacionados ao processo de racionalização sistêmica e, pois isso, elas impedem a possível emancipação dos sujeitos.
Nesse sentido, as figuras ou representações como as do exílio ou do sofrimen- to, por exemplo, acenam para o aspecto de fragilidade e fugacidade, em sentido oposto ao da plenitude, para o “qual nos orientamos moral ou espiritualmente” (Taylor, 2010, p. 18). Nessa contraposição, há uma espécie de dilema entre o agir voltado ao modo “habitual” da vida e a projeção de um ideal transcendente e de “vida plena”. A vida plena – e, portanto, ligada a noção de eternidade – se traduz em uma linguagem ideal e reflete uma forma de vida imbricada à plenitude, à perfeição e à harmonia. A perspectiva da plenitude é o oposto da realidade cir- cunstancial e, em decorrência, modeladora e protótipo da vida terrenal. Esse as- pecto eidético exprime, pois, uma “intemporalidade” (Merleau-Ponty, 1984, p. 30). O aspecto central dessa perspectiva está na necessidade de “renunciar esse lugar” comum, esse horizonte de sentido – embora seu caráter relativamente enigmático das situações cotidianas. Enfim, a realidade cotidiana se relaciona ao perecível e, por isso, não serve como base para qualquer tentativa de fundamentação racional.
O segundo aspecto mencionado é decorrência dessa compreensão de mundo. Trata-se da propensão de buscar os fundamentos das validades em bases alheias ao mundo da vida, isto é, fora dos contextos e horizontes mundano-vivencias. O protótipo está, pois, ausente dao vida e do mundo cotidianos, de forma a negar qualquer possibilidade de realização ou de salvação. O “lugar da plenitude” é com- preendido “como fora ou além da vida humana” (Taylor, 2010, p. 29). Em Platão, por exemplo, o sentido das vivências vincula-se à preocupação em afiançar um entendimento e fundamentação que “só podem ser compreendidas por meio das ideias” (Taylor, 2010, p. 29). No caso, o verdadeiro e a plenitude só podem ser re- presentados desde o horizonte transcendente, pois a justificação pertence a outro nível, separado da realidade mundana e terráquea.
No caso, o ideal de vida se vincula ao forâneo, ou seja, a dupla representação. Nesse plano, vigora um tipo eidolon (εἴδωλον, ghost), isto é, uma disposição ideal que se sobrepõe ao sensível e ao cotidiano. Esse caráter forâneo reflete um projeto hegemônico e unilateral, anulando, portanto, a reflexividade crítica, pois a unidade do cosmos e o caráter transcendente impõe sua harmonia. Nesse sentido, o impera- tivo da submissão conduz à uniformização de um estilo de vida conforme o modelo desenhado desde fora. No caso, as historias particulares e circunstanciais, o passa- do e o presente do peculiar e do singular sofrem a condenação de um horizonte vinculado ao “desprezo e à difamação” (Fornet-Betancourt, 2010, p. 40).
Em relação a isso, é possível compreender a trajetória da tradição ocidental, e cristã e laica, que soube criar uma imagem extremamente poderosa, vigente até os dias de hoje, tanto em relação à fundamentação quanto na própria noção de mun- danidade. A projeção de vida plena é um dogma irrenunciável. Em configurações diferentes, esse ideal também se projeta na ciência como tal. De um lado, a projeção de um mundo feliz para além desta vida e, de outro, a idealização de vida enquanto possibilidade de o ser humano poder criar vida. No fundo, são duas tradições que se juntaram para formar uma ideologia que, com a influência de Platão e do neoplato- nismo, foi decisiva para a consolidação deste modelo antropocentrado de compre- ensão de mundo. É possível perceber que Descartes contribui nessa dicotomização, uma vez que a res extensa e res cogitas mantêm a dicotomia entre a idealização e a realidade circunstancial. Nessa linha, a morada terrenal não passa de um lugar de cativeiro, de encarceramento e de precariedade; um período de expiação, de sacrifí- cio e de resignação em vistas a outro espaço. Na percepção de Platão, os humanos terráqueos são prisioneiros e permanecem na insensatez de uma vida que lhes im- possibilita, inclusive, distinguir os objetos reais (Platão, 1972, p. 778).
2 O AGIR COMUNICATIVO E SUA NOÇÃO DE COTIDIANIDADE: O ANTROPOCENTRISMO MODERNO
Por mais que se possa discutir, o mundo da vida (Lebenswelt) é uma cate- goria chave na filosofia de Habermas. Esse O reconhecimento não significa que a filosofia abandonou ou se afastou da questão da fundamentação. Eu entendo que exatamente essa noção que aufere um protagonismo à própria filosofia.
Prova disso é sua popularização crescente, inclusive no Brasil.das multíplices modernidades dá outro caráter ao tema da laicização e a tese de uma filosofia mundana e profana. Essa Há, pois, uma espécie de ateísmo, rompendo com um modelo apriorístico – seja teogônico, apocalíptico ou de qualquer outra classe – para, então, procurar compreender as circunstancialidades independentemente de apriorismos ou pré-determinações alheias à mundanidade ou, então, livres dos academicismos e lógicas puramente abstratas e sem conexão com a vida prática.
É oportuno salientar o fenômeno da secularização como uma forma de ateísmo que não rechaça o âmbito religioso, nem as religiões em si. No entanto, as conse- quências do antropocentrismo sobre o pensamento moderno foi crucial. Por certo, a sobrevalorização do humano não é tema exclusivo da modernidade. Por isso, não há como negligenciar o completo abandono do aspecto ecológico. Essa discussão está relacionada com a concepção iluminista de sujeito; antropocentrada, portanto. Por um lado, essa moral iluminista e laica é pertinaz na sensibilização dos sujeitos diante das injustiças, mas, por outro, não impulsiona o agir solidário, e sequer se preocupa com a ecologia. Em outras palavras, ela é exitosa em comover os sujeitos diante da “injustiça social”, a marginalização de grupos, a perda da consciência de classe social de muitas categorias e, inclusive, avivar a sensibilidade em relação à extrema pobreza. No entanto, essa propensão ou sensibilidade se ressente de um déficit motivador e, em grande parte, não consegue fazer com que os sujeitos assumam a responsabilidade pelas ações coletivas e na luta contras as injustiças.
Nesse sentido, vale insistir no fato de que a compreensão moderna do mundo suplantou cosmovisões míticas, religiosas e metafísicas (Habermas, 1988, p. 101). Com a “dissolução” das justificativas mítica-narrativas, o sujeito assumiu a total responsabilidade pela “validez das pretensões suscetíveis de crítica” (1988, p. 107). O nível pós-convencional dos estágios morais pressupõe como válidas normas que todos possam querer (Habermas, 1999). No âmbito das condições concretas, a racionalidade comunicativa conduz a inserção do sujeito no mundo (nos diferen- tes contextos do mundo da vida), de modo a unir e articular fala e ação. Esse é o horizonte no qual Habermas admite um espaço para o bom na teoria do justo, não enquanto submetida à lógica do direito positivo, mas concernente às “liberdades de sujeitos inalienáveis que se auto determinam “(1999, p. 70). As antinomias da racio- nalidade ilustrada e da moral laica revelam uma progressiva perda de solidariedade entre as pessoas e grupos, principalmente diante de situações de injustiça. Como já foi tema em outros momentos, em Habermas, a solidariedade é considerada como um conceito limite. Ele supõe uma abstração em relações às questões do bem viver, e conseguir reduzir as questões normativas a questões de justiça (1989, p. 432). No entanto, ao definir a justiça como a outra face da solidariedade, Habermas parece dirimir a justiça dos âmbitos da vida prática, isto é, ao horizonte do mundo da vida cotidiano. A garantia das liberdades individuais e a busca por justiça retrai o sujeito e limita o agir ao âmbito antropocêntrico, desconsiderando o ecossistema como tal. Além das “debilidades motivacionais”, essa perspectiva antropocentrada acaba gerando uma desconfiança na própria ética, consequência dessa antinomia interna. Se, por um lado, ela assegura a autonomia do sujeito diante das prerrogativas e dos deveres individuais, por outro, evidencia-se um déficit diante das exigências normativas frente ao meio ambiente e, inclusive, em relação à economia. O fato de a solidariedade ir se tornando cada vez mais escassa, parece indicar que a ética normativa, neutra e voltada a uma sociedade completamente laicizada, sente os efeitos de sua própria presunção.
3 O ABRASILEIRAMENTO DA MODERNIDADE OCIDENTAL
Como afirma Demenchonok, modernidade e o próprio a própria caracte- rização do Ocidente parece exibir mais de um protótipo, ou seja, o projeto da modernidade apresenta diferente nuances. Por isso, as críticas à modernidade são, muitas vezes, ineficientes, porque não especificam qual das modernidades está em questão. Além do mais, a substantivação necessita também de uma con- textualização, sem o que se corre o risco de esvaziar a própria análise crítica. Nesse sentido, gostaria de propor um quadro típico do contexto brasileiro com vistas a introduzir uma caracterização peculiar do estilo cultural que, às vezes, identifica o jeito brasileiro. Nesse sentido, quero apropriar-me do vocábulo de Ulrich Beck que, em seu livro Un nuevo mundo feliz (publicado na Alemanha em 1999, sem tradução ao português), utiliza a expressão “o abrasileiramento do Ocidente”. Beck trata do panorama relacionado à passagem da sociedade do trabalho para a sociedade do saber em escala mundial (2000, p. 9). As políticas liberalizantes do mercado afetam não apenas o âmbito econômico, mas o polí- tico, social e cultural. Não se trata, pois, de um problema regional, mas de um assunto que interfere na própria noção de Ocidente. Para o sociólogo alemão, a “consequência involuntária da utopia neoliberal do livre mercado é o abrasi- leiramento do Ocidente” (Beck, 2000, p. 9).
A análise de Ulrich Beck relaciona a primeira modernidade com a ambição do “pleno emprego”, um dos bastiões defendido com unhas e dentes pela sociedade do trabalho. A esse ideal se juntava o Estado nacional e assistencial, o pacto social e o amordaçamento na exploração sem limites da natureza. No entanto, a “segunda modernidade” já não se caracteriza através da relação direta entre trabalho e emprego, mas pela crise ecológica, a involução do trabalho remunerado, a indivi- dualização, a globalização e a revolução sexual (Beck, 2000, p. 25). Para o autor, o próprio capitalismo foi oportunizando outras atividades, consideradas ocupações relacionadas a atividades produtivas e tarefas criativas. A diversidade de afazeres vai do rol familiar ao campo da prestação de serviços em organizações sem fins lucrativos e/ou com o ecologicamente limpo (Beck, 2000, p. 18). Na verdade, o ethos do trabalho (p. 23) perfaz o leque de atividades que rompe com a estabilidade da primeira modernidade para dar espaço ao provisional, temporário, ao migratório e sem lugar determinado. Essa mudança dá origem à perda de confiança e de auto- nomia da maioria das instituições. Enfim, a passagem da primeira para a segunda modernidade desmantelou pressupostos básicos e os fundamentos da modernida- de tradicional e, inclusive, fez desaparecer as pretensões de presumido monopólio dos países europeus ocidentais (Beck, 2000, p. 31).
Sem adentrar muito mais na discussão, eu gostaria de fazer uso da expressão para mostrar uma tendência muito forte nos dias atuais e destacar, de modo espe cial, a forma como ela se apresenta no Brasil. Trata-se, pois, de realçar uma tradi- ção político-cultura e econômica que perfaz o ethos de nossa gente e encontra-se, por assim dizer, instalada no ideário de um estilo de vida profícuo e sonoramente individualista. No sentido negativo, o vocábulo mais adequado seria brasileirice ou brasileirismo. Para explicar o significado dessa tendência, vou deixar de lado Ulrich Beck e utilizar a denominação para redesenhar o quadro filosófico brasileiro atual. Como já é conhecido, a ética habermasiana situa-se no contexto pós-metafísico e, por isso, se insere no horizonte de uma sociedade com sinais profundos de secularização. A razão secular consegue se apropriar, através dos recursos do pensamento pós-metafísico, dos conteúdos semânticos das tradições, sem renun- ciar jamais a autonomia que lhe é inerente. Esse é o sentido de uma metafísica pós-convencional, ou seja, de uma fundamentação capaz de garantir às circuns- tancialidades da vida cotidiana enquanto horizonte de interação e lugar privilegiado para o agir.
A noção de agir comunicativo tem, entre outras, um vínculo com a fenomeno- logia de Husserl (Pizzi, 2010, p. 130-134). Nesse sentido, vale a pena insistir que a compreensão das manifestações simbólicas e as vivências pressupõe um mundo com um plexo de sentido comum compartilhado entre os sujeitos coautores. Nes- te sentido, a contribuição do Lebenswelt à teoria do agir comunicativo assegura que as normas admitidas consensualmente e a autonomia dos sujeitos podem ser aplicados em uma comunidade de sujeitos emancipados. A perspectiva do sujeito participante oferece a possibilidade de uma representação linguística do mundo, sem a qual não poderíamos falar de pretensões de validez suscetíveis de crítica. Por isso, o fato de permanecer a tergo não significa que as vivências sejam secundárias ou se diluam em um universalismo abstrato, formal e idealizado.
Além disso, o mundo da vida é horizonte, com o qual o sujeito coautor se articula e articula seus interesses. Na verdade, trata-se de desmistificar a ideia da imagem enquanto mera representação dos fenômenos. A mera representação reforça as suspeitas e consagra a desconfiança frente à simples representação dos fenômenos. Na verdade, a representação está vinculada ao uma idealização que, às vezes, desqualifica as evidências da vida cotidiana. Essa ambivalência apresenta conotações que, no processo compreensivo do fenômeno, provoca o menosprezo e acaba gerando indícios enigmáticos a respeito da contextualidade vivencial das representações. Por um lado, há a referência idealizada do próprio fenômeno e, por outro, uma desconfiança desmedida. Nesse caso, a experiência vivencial cotidiana não passa de representações indecifráveis. Em Platão, por exemplo, a ideia de um mundo efêmero e visível indica o descrédito e o menosprezo ao mundano, isto é, ao horizonte ligado às circunstancialidades vivenciais. A realidade vincula- da à doxa, para utilizar a expressão mais pertinente, não passa de um horizonte inapropriado, isto é, um pseudo-horizonte e, portanto, completamente deslocado e esvaziado de qualquer sentido. Por isso, os que se detêm à realidade mundana vivem, segundo o filósofo grego, uma vida inautêntica e, em razão disso, suas pretensões podem ser simplesmente desqualificadas.
De acordo com Fornet-Betancourt, esse descrédito vai de “Platão, com o mito da caverna, até Heidegger com sua análise da cotidianidade como lugar de vida inautêntica” (2010, p. 39). Em vista disso, não há como superar o caráter alienador do mundo da vida, pois se trata do “lugar de alienação, falta de verdade, de sentido e de autenticidade” e, portanto, como lugar impróprio para alcançar a “verdadeira” vida (Fornet-Betancourt, 2010, p. 41).
Essa concepção alimenta uma “forte desvalorização da existência carnal e terrestre, rebaixada ao escalão de aparência ilusória da qual o homem deve buscar fugir se aspira a viver em conformidade com os impulsos superiores da alma” (Schimitt, 2006, I, p. 254). Assim, as circunstancialidades do mundo da vida não passam de empecilhos relacionados ao processo de racionalização sistêmica e, pois isso, elas bloqueiam a possível efetivação da justiça entre os sujeitos, permanecendo, portanto, em uma mera representação formal – quando não quantitativa e midiática.
Desta forma, é possível superar a dicotomização das representações da vida cotidiana e de suas relações. Por exemplo, a judicialização dos procedimentos, isto é, a hipertrofia do Judiciário e sua invasão das atribuições dos demais Poderes indica que, atualmente, a noção de justiça e injustiça não passa de conceituações, recusando o aspecto deliberativo que envolve o “quem” são os sujeitos (da justi- ça e da injustiça) e “como” ela pode conseguir uma efetividade prática enquanto compromisso social. Na verdade, o que temos hoje são procedimentos entre casos particulares, sem que isso resolva os problemas de fundo.
O abrasileiramento apresenta uma conotação bastante positiva no sentido de manifestar o modo de ser e o caráter de nossas gentes. Com frequência, esse ethos se vincula a uma tipologia oriunda do “jeitinho”, uma malfadada expressão cuja origem está ligada a práticas empenhadas em “levar vantagem em tudo”. Não há como negar a influência desse tipo de ideário, concebido a partir do estilo de vida eminentemente elitista. No decorrer do tempo, ele vai se alastrando e se consoli- dando nas diferentes esferas da vida pública e privada, solidificando a maneira ar- dilosa, esperta e astuciosa de conseguir algo através de procedimentos astuciosos e nada recomendáveis. Embora a habilidade em conseguir vantagens, a versão pode também ser vinculada ao conhecido conto do vigário, outro arremedo caricatural que manifesta o brasileirismo ou a brasileirice inerente a nosso ethos cotidiano. O item a continuação trata de aclarar isso.
4 O CONTO DO VIGÁRIO: ANTINOMIAS DE UM ETHOS ABRASILEIRADO
No Brasil, o ser moderno parece ser algo elegante, original, contemporâneo e, por isso, uma característica nitidamente atual. A minha indagação é a seguinte: O que temos de moderno? Qual seria a adjetivação de moderno na nossa tradição cultural? Então, se a modernidade europeia se reflete na Revolução Francesa, o desenho da cultura consolida um ethos com variantes díspares. Na verdade, são diferentes fontes originárias que vão conformando o estilo brasileiro. Nesse sentido, fora da afluência de ideais europeus, o resquício da modernidade bra- sileira encontra, no Conto do Vigário, um significado léxico congruente com a versão abrasileirada da modernidade brasileira. Ele pode ser considerado com um jeito brasileiro de prometer e não conceder a vantagem ou o benefício implícito à promessa manifesta.
Evidentemente, o ethos brasileiro se apresenta repleto de caricaturas, ao tem- po que é forte a incorporação de figuras exógenas e, portanto, alheias às nossas raízes histórico-culturais. Embora as diferentes versões da origem do termo conto do vigário, há em todas elas, um denominador comum evidenciando esperteza e a forma fraudulenta ligada à resolução de problemas. O nascimento dessa epopeia remonta ao século XVIII, traduzida como uma forma de encaminhar a resolução de um problema peculiar. A partir de então, a expressão reflete o agir utilizando a forma inteligentemente maliciosa, quase sempre com sutilezas em vistas a conse- guir algum benefício particular. No Brasil, o Conto do Vigário está relacionado com esperteza, atividade específica do malandro, no sentido de resolver situações ou disputas litigiosas. Em suma, uma narrativa breve e concisa, voltada a solucionar um conflito, cujos personagens têm em vista as vantagens individuais.
Esta seria uma das características da tradição moderna brasileira? Porque esse conto se transformou no uso de artimanhas que parecem ser inerentes ao ethos da vida cotidiana. Essa forma de jeitinho pode ser considerada, então, uma das caras da modernidade brasileira que ainda não desapareceu do imaginário e da cotidianidade de nossos mundos da vida. Na verdade, o Conto do Vigário se traduz atualmente nas diferentes maneiras de conduzir a política e de justificar padrões de comportamento. Em outras palavras, existe um abrasileiramento que perfaz o estilo de vida de nossa gente, a ponto de reforçar a malandragem (no seu sentido mais negativo) como procedimento propalado como “normal”. Ele persevera como a antípoda das exigências normativas.
Essa forma abrasileirada de conseguir vantagens se verifica nas mazelas políticas, recheadas de promessas não cumpridas. No conjunto da obra, participam instituições dos diferentes credos e partidos, revestidas de boas intenções, mas que, no fundo, buscam apenas o lucro e os benefícios próprios. Ela está presente nos diversos setores da sociedade, seja na política, na religião e vida cotidiana. Em outras palavras, a modernidade brasileira assume um viés sui generis, pois não consegue sequer converter as ofertas em benefícios para a coletividade.
Na prática, o abrasileiramento da cultura ocidental significa, segundo Beck, a passagem do mundo do trabalho para a sociedade do saber, é possível perceber também uma espécie de massificação cultural, cujo ethos tem relação não somente com o âmbito econômico, pois é concernente também ao político, ao social e ao cultural. No fundo, esse espírito aceita a liberalização do consumo – e da produção como tal – conquanto que, na outra ponta, se impõe um controle aos que excedem determinados limites. Neste caso, as restrições obedecem ao setor “serviços”, numa espécie de visibilidade invisível que controla e exige o cumprimento de normas relacionadas a estes setores. Quando ocorre a transgressão, há uma espécie de reeducação, cujas medidas se relacionam a pagamentos de taxas e nas distintas formas de reabilitação dos direitos suspensos.
Nesse processo de liberalização e, ao mesmo tempo, de aumento do controle, não há reação diante da exploração da mão de obra (alienação do trabalho), mas essas mesmas pessoas – que aceitam conviver com a injustiça – exigem acesso aos produtos a qualquer hora, em qualquer momento. Essa dicotomia é naturalizada sem qualquer ressentimento ou escrúpulo. O controle é reiterado sistematicamente Exemplo disso se relacionaao sistema viário de nossas cidades e estradas. Ao invés de garantir a acessibilidade e a segurança, o jeito é criar mais leis e multiplicar os controladores (pedágios, câmeras e pardais, etc.). Não há uma política sistemática de facilitação das pessoas e de adequação das vias, mas, simplesmente, a imposição de medidas restritivas, punitivas e controladoras dos sujeitos para, de maneira os- tensiva, multiplicar a vigilância em vistas a castigar quem ousar infringir a lei. Essa falsa “maneira hábil e madura” não visa o benefício coletivo, pois se traduz em uma forma astuciosa de garantir dividendos a grupos privados que exploram esse tipo de serviços e de muitos outros.
Em razão disso, a inquietude se relaciona a uma espécie de ataraxia, no sentido de propalar um ethos ligado a um ordenamento livre de perturbações ou de inquietações. Na verdade, o Conto do Vigário, transfigurado em jeitinho, nada mais é do que o oposto do espírito da modernidade “adulta” e consciente do processo emancipatório do sujeito através de sua própria iniciativa. Esse ethos da brasileirice pode ser substantivado por infantilismo, ou seja, a persistência sistemática em cultivar características comportamentais próprias de um sujeito dependente e, portanto, incapaz de agir responsavelmente e, inclusive, impotente diante dos compromissos coletivos e solidários.
Nesse sentido, creio na possibilidade de reescrever o ideal kantiano da ilustra- ção e, ainda, a reelaboração de Foucault a respeito do mesmo tema. A modernidade brasileira está longe de seu refazimento enquanto pro-jeção de si mesma, isto é, a faculdade do sujeito capaz de governar-se a si mesmo. Existe, isto sim, a projeção personificada de indivíduos tratados como exemplares, ou seja, há uma diviniza- ção daqueles que são tratados como os redentores. Tais sujeitos são beatificados e transformados em espécie de heróis, cuja meritocracia é propalada através da mídia ou de rituais e símbolos desse tipo de brasileirice. No fundo, isso significa apenas a massificação de um ethos deficitário, pois cria dependência e sujeição, sem jamais pensar em mudanças.
Enfim, as antinomias da modernidade brasileira, além do antropocentrismo personalista e devocionístico, reafirmam o caráter infantilizado e sem qualquer indicativo que contribua no projeto emancipatório. Trata-se, pois, de alimentar a dependência e persuadir na tentativa de massificar a dependência. Esse foi o gran- de mote de nosso filosofar. Afinal de contas, o conto do vigário reflete o jeitinho brasileiro, um ideal coletivo que preza o forâneo e, em boa medida, despreza tudo o que diz respeito às tradições e valores autóctones.
5 O IMPERATIVO DA COTIDIANIDADE MODERNIDADE LIGADA AO SUJEITO NOMINATIVO
Na tentativa de avançar, é preciso mais um giro filosófico. O tema não é recorrente. Na verdade, a filosofia nunca abandonou seu aspecto antropocentrado, com o que não há como fugir do sentido das expressões gramaticais. Por isso, a pergunta a respeito do significado de qualquer locução demanda sempre um esforço por responder “o que é”. As alegações envolvem não apenas a análise gramatical e semântica dos lexemas, pois a compreensão do sentido implica também na discussão a respeito de seu aspecto pragmático. Em outras palavras, qualquer fenômeno não pode limitar-se às definições, pois há, em qualquer ato de falta ou expressão gramatical, requer uma referência prática ao agir. Por isso, além de ater-se à pergunta o que é a ideia remete a quem são os verdadeiros concernidos e como eles compreendem as designações nominativas no seu sentido prático. Nesse sentido, o fenômeno não é um fato, um acontecimento que possa ser considerado bom ou mau, mas pressupõe uma relação entre partes diferentes e diferenciadas, ou seja, desde uma relação dialógica entre sujeitos coautores. Tanto o eu-sujeito coautor como o outro-sujeito também coautor são partícipes da interação.
Então, o sentido das expressões gramaticais e dos atos de fala deve partir do como e não simplesmente ater-se ao que. Nesse sentido, é preciso não só averiguar o teor gramatical e semântico das expressões, mas ver sobremaneira quem são os coautores e como seu sentido está carregado de exigências normativas. Desta for- ma, os ideais da Ilustração ganham outra dimensão. Esse delineamento nos leva a insistir que as exigências de justiça deixam de ser uma questão apenas vinculada ao aspecto semântico (isto é, à sua definibilidade), mas ao aspecto pragmático. Essa pragmática pressupõe uma “neutralidade do procedimento” (Habermas, 1998, p. 386), porque ninguém pode garantir, por si só, sua autonomia moral. Ela de- pende da interação comunicativa, ou seja, dos esforços cooperativos que ninguém pode ser obrigado através das normas jurídicas, mas que todos são conclamados a seguir (ou obedecer). A ideia do sujeito coautor significa que todos podem contri- buir. O fato de saber quem são os sujeitos, e os próprios concernidos pela justiça, remete inclusive às futuras gerações.
Então, o fenômeno da laicização, desde uma moral secular, deve salientar o como se pode fundamentar o ponto de vista moral e como, de fato, os sujeitos coautores podem delinear uma sociedade secular. No caso, a filosofia não deve ape- nas averiguar o que significa laico ou secular, mas estudar também quem e como são configuradas as políticas de reconhecimento dos sujeitos coautores frente à na- tureza e aos não humanos. Assim, será possível uma educação comprometida com a justiça e a solidariedade, não somente em uma intersubjetividade antropológica, mas em uma relação entre todos os seres.
REFERÊNCIAS
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[1] PIZZI, Jovino. Metafísica pós-convencional e o imperialismo da vida cotidiana. In: COLÓQUIO HABERMAS, 9.,2013, Rio de Janeiro. Anais [...]. Rio de Janeiro: Salute, 2014. Disponível em: https://coloquiohabermas.files.wordpress.com/2013/09/ebook_anais_ix_coloquio_habermas.pdf Acesso em: 25 abr. 2023.Artigo apresentado originalmente no 19º Colóquio Habernas (2023).
[2]Graduação em Filosofia e em Comunicação Social -Jornalismo; mestre em Filosofia (PUCRGS, 1992) e doutor em Ética y Democracia pela UJI (Espanha, 2002). Pós-doutorado na Universidade Federal de Santa Catarina (2015).