UMA REFLEXÃO FILOSÓFICA-INTERDISCIPLINAR SOBRE ÉTICA DA INFORMAÇÃO
Gabriel Fefin Machado[1]
Universidade Estadual Paulista
Juliana Moroni[2]
Universidade Estadual Paulista
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Resumo
O objetivo deste trabalho é investigar a natureza ontológica e epistemológica do conceito de informação, focalizando inicialmente a Filosofia e Ética da Informação (EI), propostas por Floridi (1999; 2002; 2004; 2011; 2016), cujo fundamento teórico servirá de suporte para reflexões acerca da inteligência artificial generativa (IAGen), mais especificamente, o ChatGPT. O conceito de informação será abordado a partir de três vertentes na perspectiva filosófico-interdisciplinar: (1) realismo informacional, (2) ecologia informacional e (3) semântica informacional, segundo Gonzalez, Nascimento e Haselager (2004). A partir dessa abordagem, direcionamos nosso estudo para propostas de Floridi (2004), indicando os seus possíveis problemas. Procuraremos entender a Filosofia da Informação, a partir da perspectiva da Ética da Informação (EI), analisando como a EI pode contribuir para reflexões acerca do uso de IA generativa. Problematizamos a EI a fim de construir uma ponte com a Ética Intercultural da Informação (EII) proposta por Capurro (2010).
Palavras-chave: informação. filosofia da informação; ética da informação; IA Generativa; chatGPT.
A PHILOSOPHICAL-INTERDISCIPLINARY REFLECTION ON ETHICS OF INFORMATION
Abstract
The objective of this work is to investigate the ontological and epistemological nature of the concept of information in the context of Philosophy of Information (PI), focusing on the Philosophy of Information (PI) and Ethics of Information (EI), proposed by Floridi (1999; 2002; 2004; 2011; 2016), whose theoretical foundation will support reflections on generative artificial intelligence (AI), more specifically, ChatGPT. The concept of information will be approached from three strands of information studies in the philosophical-interdisciplinary perspective: (1) informational realism, (2) informational ecology and (3) informational semantics, according to Gonzalez, Nascimento & Haselager (2004). Based on this approach, we direct our study to Floridi's PI (2004), indicating its possible problems. We will try to understand the Philosophy of Information, from the perspective of Information Ethics (EI), analyzing how EI can contribute to reflections on the use of generative AI, represented, in this work, by ChatGPT.
Keywords: information. philosophy of information. ethic of information. generative AI. chatGPT.
A implementação de uma nova era tecnológica, por meio do giro informacional e do advento das Tecnologias Informacionais de Comunicação (TIC), instiga uma relação ambígua do ser humano com seu meio. Por um lado, oportunidades atraentes são criadas, por outro, as TIC criam uma dinâmica que, por sua vez, gera consequências na e para a ação humana, através de ferramentas de vigilância, controle e manipulação.
Nesse contexto, o objetivo deste trabalho é investigar os seguintes problemas: 1. Qual é a natureza ontológica e epistemológica da informação no contexto da FI? 2. Quais são os problemas para uma Filosofia da Informação, segundo Floridi (1999; 2002; 2004; 2011; 2016)? 3. Quais as contribuições da Ética da Informação (EI) para os estudos sobre a IA generativa, como o ChatGPT?
A partir desse objetivo, trataremos dos seguintes tópicos no Desenvolvimento:
2.1: A Filosofia da Informação no seu contexto geral, a partir de diversos filósofos, matemáticos, e de outras áreas interdisciplinares, com o enfoque em três tendências nas abordagens ontológicas e epistemológicas da informação: (1) realismo informacional, (2) ecologia informacional e (3) semântica informacional.
2.2: A Filosofia da Informação na perspectiva de Luciano Floridi (2004), visando esboçar uma Ética da Informação (EI), ressaltando os seus problemas.
2.3: Reflexões sobre as contribuições da EI para os estudos sobre a IA generativa.
No primeiro tópico (2.1), analisaremos as abordagens ontológicas e epistemológicas da Informação, segundo Gonzalez et al. (2004), incluindo a abordagem Matemática por meio da Teoria Matemática da Comunicação (TMC), de Shanon & Weaver (1949). No segundo tópico (2.2), expomos as hipóteses de Floridi (2004, 2013) para a constituição de uma Ética da Informação através de sua Filosofia da Informação. Floridi nos auxilia a entender os diversos problemas da FI contidos nela mesma, sem se emaranhar nas dificuldades do cânone da história da filosofia, pois ele não se limita apenas atribuir problemas exteriores a FI, mas busca tornar o campo de pesquisa da FI autônomo. No terceiro tópico (2.3), a EI é utilizada para refletirmos sobre os impactos negativos e positivos da IA generativa, como o ChatGPT. Finalizamos este texto, questionando até que ponto estudos sobre Ética Intercultural da Informação (EII) pode nos auxiliar no entendimento e controle dos impactos das TIC, como a IA Generativa, no ambiente informacional.
2.1 O QUE É A FILOSOFIA DA INFORMAÇÃO?
A Filosofia da Informação é uma área do conhecimento que aborda estudos ontológicos, epistemológicos, semânticos, pragmáticos e éticos acerca da informação, no seu viés matemático, semiótico, moral, cibernético, ecológico entre outros.
No artigo intitulado Informação e Conhecimento: notas para uma taxonomia da informação, de Gonzalez et al. (2004, p.1), há o objetivo de elaborar um mapa conceitual das principais abordagens filosófico-científicas do conceito de informação, junto ao diálogo interdisciplinar. Para traçar o objetivo proposto, podemos começar analisando o conceito de informação no viés da clássica Teoria Matemática da Comunicação; logo depois, inserimos a informação nas teorias de cunho ontológico e epistemológico.
Na vertente matemática da informação, segundo Gonzalez et al. (2004, p. 3):
[...] são preponderantes os problemas formais e técnicos da engenharia sobre a aplicação de teorias no âmbito tecnológico envolvidos na transmissão e recepção de mensagens [...] giram em torno da comunicação, da mensurabilidade e da quantidade de informação gerada em uma fonte, da capacidade do canal que a transmite, bem como da sua confiabilidade e efetividade na transmissão de dados [...] no controle eficiente da comunicação entre fonte e receptor, independentemente do significado e da natureza do conteúdo informacional transmitido (Gonzalez et al., 2004, p. 3).
Segundo Gonzalez et al. (2004, p. 3), a Teoria Matemática da Comunicação, proposta inicialmente por Hartley (1928) e Szilard (1929,1972); esses autores investigam a segunda lei da termodinâmica, [e] sugerindo uma analogia entre informação, formas de organização e entropia. Nessa empreitada, a TMC focaliza essencialmente a medida da informação, relacionada à noção de ordem e ao número de decisões envolvidas no processo de redução de incerteza na escolha de mensagens. Ao focar nos aspectos objetivos em relação à quantidade de informação, a TMC acaba por não engendrar aspectos de ordem semântica.
A perspectiva ontológica e epistemológica foi desenvolvida por Wiener (1968), entre outros, através da cibernética, cuja proposta é desenvolver linguagens e técnicas para tratar do problema do controle e da comunicação, sugerindo analogias entre humanos e máquinas (Gonzalez et al., 2004, p. 4). Segundo Gonzalez et al., há três vertentes nas abordagens ontológica e epistemológica da informação: (1) realismo informacional, (2) ecologia informacional e (3) semântica informacional.
Na primeira (1) são utilizadas características da TMC, contudo, com uma diferença importante no que corresponde à ordem e à organização na constituição da informação. Para os teóricos da TMC, quanto maior a quantidade de desordem de um sistema, maior será a quantidade de informação gerada. Em oposição, os realistas informacionais entendem a organização e a ordem como matéria prima da informação que se amplia pelo universo em crescente complexidade. Para os teóricos realistas, quanto maior a desordem, menor a quantidade de informação, pois a informação tem que estar em conformidade com um todo ordenado. Como um exemplo, se pensarmos em uma floresta que foi parcialmente destruída por um incêndio: o que teremos de informação? Para os teóricos realistas, pouco se poderia ser entendido e extraído de uma floresta queimada, pois nada teria de ser organizado naquele lugar; no entanto, para os teóricos da TMC, essa circunstância carregaria mais informação do que se a floresta estivesse totalmente em ordem (ou nas suas condições normais), pois a desordem, segundo eles, gera uma quantidade de informação maior para ser investigada do que seria gerada pelas condições normais de uma floresta.
Gonzalez et al. (2004, p. 6) ressaltam que para alguns realistas informacionais, como Stonier (1990), a informação faz parte do universo como um elemento per si no mundo, assim como matéria e energia, haveria partículas denominadas infons que constituíram informação na realidade.
Na vertente da ecologia informacional (2), a informação é uma relação inerente do ser com o mundo. Segundo Gonzalez et al. (2004), para Gibson (1979) e Bateson (1999), a informação está intrinsecamente ligada à ação e à situação dos organismos no meio ambiente. Essa postura em relação à informação permite entender o padrão que liga, uma expressão de Bateson. Nessa perspectiva, “a informação guia o ser em sua existência no mundo, não sendo considerada como algo físico, mas essencialmente relacional e significativo” (Gonzalez et al., 2004, p. 7). O caráter qualitativo da informação se dá na interação entre agente e ambiente, essa relação é denominada por Gibson (1979) affordances, derivado do termo em inglês to afford (fornecer, possibilitar). As affordances fornecem ao agente possibilidades de ação em determinado contexto. Um pássaro tem affordances dinâmicas e intrínsecas, diferentes do ser humano, por ser de uma espécie diferente e viver em um contexto diferente, mesmo os dois convivendo juntos em um ambiente parecido. Affordances são padrões que podemos captar ao interagir no ambiente situado, guiando nossa ação em meios específicos constitutivos de nichos.
Como o objetivo aqui é apresentar brevemente cada tendência da informação, não entraremos em detalhes acerca das concepções acima, seguiremos indicando o essencial para a presente proposta de problemas relacionado à ética informacional. Assim, no tópico seguinte trataremos de questões relacionadas à semântica informacional.
Gonzalez et al. (2004) destacam, na abordagem da semântica informacional, tentativas de explicar a ontologia da informação e o seu significado. Na epistemologia e na semântica informacional, Dretske (1981) foi um dos pioneiros nessa empreitada, caracterizando, segundo Gonzalez et al. (2004, p. 8) a informação semântica no contexto das relações de significado do conteúdo carregado por um sinal numa dada linguagem. Eles ressaltam que, segundo Carnap, poderíamos entender, por meio de uma teoria pragmática da informação, que a mensagem expressa através de proposições não apenas teria um valor de verdade, como também, um significado que estaria atrelado à linguagem.
Para entendermos melhor a semântica informacional, Dretske (1981) nos mostra os problemas concernentes à Teoria do Conhecimento, a partir de uma perspectiva informacional. Ele caracteriza o conhecimento como “crença fundada em informação”; A informação que justificaria a crença, por meio de um conhecimento empírico. Dretske se inspira inicialmente na TMC, mas a remodela com aspectos semânticos, com a preocupação de explicar o significado da informação engendrado nas crenças, fundamentando o conhecimento no seu vínculo à percepção.
Dretske argumenta que para ocorrer o processo de geração de informação significativa, que dará origem ao conhecimento, há a necessidade do agente possuir a capacidade de detectar a existência de erros. Em sua concepção, a detecção do erro seria essencial para caracterizar o comportamento inteligente, que envolve aprendizagem, em contraste com o comportamento meramente reflexo. Nesse sentido, Dretske ressalta a relevância da postura intencional por parte do agente; nela o agente manipula a dimensão da informação que é carregada de significado. Baseado no que foi exposto podemos entender que
[...] o erro é naturalmente possível, o organismo possuidor de conhecimento teria que, além de aprender a eliminar as crenças que não se fundam em informação, dispor de critérios de relevância que lhe auxiliem na seleção das crenças verdadeiras relevantes (Gonzalez et al., 2004, p. 12).
Em suma, a Filosofia da Informação, foi aqui brevemente abordada, em suas vertentes realista, semântica e ecológica. Três tendências foram expostas, tendo em comum o modo que a informação se relaciona com a ordem/desordem. No realismo informacional há uma relação direta entre informação e ordem; já os teóricos da semântica informacional adotam a capacidade de eliminar a desordem, o ruído e o erro como papel principal na caracterização da informação. Além disso, na ecologia informacional, segundo Gonzalez et al. (2004, p. 10), a informação é caracterizada em termos de ordem/desordem, com ênfase na dinâmica relacional organismo-ambiente em sua construção direta de informação significativa.
No próximo tópico, resumimos a Filosofia da Informação proposta por Floridi (2004), expondo os seus principais problemas, bem como o seu conceito central, infosfera. Apresentamos os cinco termos-chave que direcionam os estudos da FI floridiana: Informação; Semântica; Inteligência; Natureza e Valor.
2.2 FLORIDI E OS PROBLEMAS PARA UMA FILOSOFIA DA INFORMAÇÃO
Floridi empreende a tarefa de dar dignidade filosófica à informação ao elucidar os problemas da Filosofia “da” Informação (FI), e não “sobre” a Filosofia da Informação. Para dizer mais claramente, ele tratará os problemas da FI, nela mesma, sem anexar problemas filosóficos externos para examinar os internos da própria informação. Assim, Floridi torna a FI um campo de pesquisa autônomo, dialogando e confrontando as principais ideias tanto do pensamento contemporâneo quanto das tradições filosóficas. Nessa empreitada, segundo Gonzalez de Gomez (2013, p. 4), Floridi evitará “a mera translação a uma linguagem filosófica de problemas que sejam de outra ordem”. O filósofo em questão, por ter um olhar formado na área de ciências da computação, faz uso da filosofia analítica; contudo não incorpora premissas da lógica positivista, pois seus trabalhos se relacionam com os problemas que caracterizam a teoria clássica da informação semântica. Por isso, ele acaba limitando seu olhar para a filosofia continental, e se distancia da filosofia acadêmica ou sistemática (Gonzalez de Gomez, 2013, p. 4).
Além disso, o que podemos entender de Floridi na sua elaboração de uma FI é que seu campo de pesquisa está em construção com uma expressão reflexiva do “giro informacional”. O “giro informacional”, no mundo contemporâneo, designa as transformações que acontecem com o desenvolvimento das ciências e tecnologias da computação, da comunicação e da informação (Floridi, 2004, 2011). A FI é um campo concernente, segundo Floridi, com
(a) a investigação crítica da natureza conceitual e os princípios da informação, incluindo suas dinâmicas, utilização e ciências, e (b) a elaboração e aplicação de metodologias teoréticas, informacionais e computacionais, a problemas filosóficos (Floridi, 2004, p. 555; 2011, p. 14).
Na constituição de uma FI, é importante salientar que Floridi não pretende elaborar uma teoria unificada da informação, pois oferece uma investigação de princípios da informação, (a), de várias dinâmicas e utilizações distintas que podem ser incluídas em uma família integrada de teorias. A aplicação de metodologias diferentes, (b), propõe uma constituição dos problemas filosóficos a partir de diversas metodologias em diferentes áreas, integrando uma interdisciplinaridade.
A FI pode ser exposta em 5 termos-chave: Informação; Semântica; Inteligência; Natureza e Valor; alguns de cunho ontológico, outros epistemológicos e também éticos. Os cinco termos são expressos no texto Open Problems in the Philosophy of Information (2004), escrito por Floridi, mapeados por Maria Nélida Gonzalez de Gomez em seu texto Luciano Floridi e os problemas filosóficos da informação: da representação à modelização (2013).
Em uma exposição breve de cada termo, a Informação, no problema que diz respeito ao que é informação (P1), pode ser vista de três formas no cunho ontológico:
[...] como realidade (por exemplo, um padrão de sinais físicos), denominando-se nesse caso informação ambiental ou ecológica; b) informação sobre a realidade, tal como seria o caso da informação semântica (que pode assim ser qualificada em relação à verdade ou falta de verdade); c) informação para a realidade, a qual teria a forma de "instruções" (e da qual a informação genética é um exemplo) (Floridi, 2004, p. 11, tradução de Gonzalez de Gomez).[3]
Na exposição dessas três visões, ressaltamos que há ainda a possibilidade das três modalidades de informação, pois são formas pelas quais a informação é direcionada na realidade pelos meios tecnológicos e de comunicação. Contudo, o que importa para Floridi são as duas primeiras (a,b), pois a última, com uma perspectiva da informação como instrução (indicando uma ausência de significação), não se manteria firme em uma abordagem semântica, na qual Floridi se debruça. A informação é carregada de semântica e é necessário seu caráter alético (verdadeiro) para, posteriormente, ocorrer o conhecimento.
O segundo termo, Semântica, mostra como o caráter de verdade de uma informação se envolve na relação entre informação, significado e verdade. Para se chegar na verdade e no conhecimento, é necessário, para Floridi, passar pelos níveis de abstração. Os níveis de abstração (level of abstraction, “LoA”) correspondem à problematização de como um dado adquire significado, e sendo significativo, como adquire seu valor de verdade, correspondente ao problema de como os dados adquirem significado e como eles adquirem valor de verdade. (Gonzalez de Gomez, 2013, p. 9). O LoA remete a relação dos processos humanos de semantização com objetos informacionais, pois “os níveis de abstração [LoA] são interfaces mediadoras da relação epistêmica entre o observado e o observador” (Floridi, 2011, p. 76). E o uso desse procedimento é necessário para alcançar o caráter alético (derivado do grego “aletheia”, que significa verdade, desvelamento) da informação. Floridi não busca um pressuposto epistêmico para indicar o caminho da verdade, e sim, utiliza o dado como fonte de conhecimento para o próprio conhecimento. Portanto, a informação precede o conhecimento e não o contrário. Segundo Floridi (2004, p. 571), "o conhecimento encapsula a verdade porque encapsula informação semântica". Para explicitar melhor a relação entre verdade, conhecimento, informação e dados precisaremos tratar dos outros termos, mostrados a seguir.
No terceiro termo, a Inteligência, os problemas e as perguntas seguirão dois caminhos, segundo Gonzalez de Gomez (2013, p. 12) em relação a Floridi: “a) relacionar a inteligência humana e o processamento computacional; b) elucidar as relações entre informação, inteligência e conhecimento”. As perguntas são segmentadas pelos seguintes problemas:
[...] pode a inteligência natural ser satisfatoriamente analisada em termos de processamento da informação? (P9); pode a inteligência natural ser satisfatoriamente e totalmente implementada de maneira não-biológica? (P10); pode a abordagem informacional solucionar o problema da relação corpo-alma? (P11) (Gonzalez de Gomez, 2013, p. 12).
Na relação entre Inteligência Artificial (IA) e a Inteligência Humana (IH) (ou Inteligência Natural), Floridi destaca que há uma distinção no processamento e identificação: a IA identifica e processa dados; já a IH identifica e processa informação.[4] Podemos entender que há uma diferença entre a informação e o dado, que pode ser explicada na constituição da relação do ser com o ambiente. Os dados e a informação estão presentes em toda a esfera informacional, Infosfera, que incorpora uma concepção modal de espaço agregando a “multiplicidade e a heterogeneidade das entidades informacionais” (Gonzalez de Gomez, 2020, p. 6).
A Infosfera engloba não só processos computacionais e tecnologias de informação, como também todas as coisas, tanto o atual quanto o virtual, o digital e o analógico. Por sermos seres presentes e agentes nessa esfera informacional, temos uma maior facilidade de engendrar informação pela abstração, identificando e processando-a. Contudo, os dados, algo mais primordial que a informação, são “brutos”, sem significado semântico intrínseco. (Gonzalez de Gomez, 2013, p. 9). Por isso, podemos dizer que as IAs conseguem identificar e processar esses dados “brutos” de maneira mais eficiente do que a IH. A IA tem a capacidade de gerenciar dados sem diferenciá-los e de maneira sistemática. Entendemos que se uma IA tivesse a necessidade de lidar com o significado, ela tanto atrasaria o processo de consolidação do dado, quanto abriria para variantes possíveis de significação. Sendo assim, a informação, que contém o significado engendrado, possibilita o ser humano, por meio do LoA, compreender e processar seu caráter informacional.
O quarto termo, a Natureza, encaminha o foco novamente para um cunho ontológico da informação em relação aos seguintes problemas: a informação pode ser natural?; a natureza pode ser informatizada?. Segundo Gonzalez de Gomez (2013, p.13), “Floridi sustenta que não seria cabível pressupor um mundo totalmente caótico e imprevisível; nele, não teria cabido a informação”. É nesse contexto, Floridi, com seu conceito de Infosfera, se mantém coerente ao afirmar a impossibilidade da informação em um mundo caótico, pois a esfera informacional necessita de uma ordem para manter sua rede de conexões, e uma totalidade de desordem faria com que essa estrutura se desequilibrasse. Vale ressaltar a perspectiva abordada por Floridi da informação como parte do mundo, uma informação ambiental. Essa perspectiva
[...] não requer para ser aquilo que é, nem uma representação cognitiva nem um processamento computacional [...] não teria tampouco como condição ter um suporte físico, já que ela é ou está inserida na própria estruturação do mundo físico ou exterior (Gonzalez de Gomez, 2013, p. 14).
Na compreensão da informação como ambiental, a relação agente e ambiente ocorre dinamicamente na Infosfera. Além disso, é por essa informação estar na própria estruturação do mundo que ela se torna parte da organização da rede da Infosfera, e por sua vez, a sustentação para relações entre agente e ambiente. Assim, impossibilitando, nessa perspectiva, uma totalidade caótica do mundo.
O quinto termo, o Valor, é pode ser entendido também em relação aos problemas éticos que abarcam; “questões normativas e orientadas por valor [...] as quais [evidenciam] que as tecnologias de informação e comunicação são capazes de afetar os sistemas e as formas de vida” (Gonzalez de Gomez, 2013, p. 15). As Tecnologias Informacionais de Comunicação direcionam o novo tipo de organização da sociedade que advém do já comentado giro informacional. Questões éticas se voltam para os problemas surgidos a partir da constituição do giro informacional como também das suas consequências atuais, ressaltando os pontos positivos e negativos dos novos recursos informacionais. Para tratar de problemas éticos, Floridi argumenta que é importante olhar de um ponto de vista estratégico e global, não enfatizando análises microéticas, as quais favorecem uma solução a curto prazo e parcial, que não levam em conta a totalidade do problema (Gonzalez de Gomez, 2013, p. 15).
Os problemas contemporâneos da ética podem ser vistos por um agente moral do ponto de vista “micro” das seguintes formas: “(a) informação (informação como recurso) para gerar alguma outra (b) informação (informação como produto) e, ao gerar [outra informação], afetar seu (c) ambiente informacional (informação como alvo)” (Floridi, 2013, p. 20, tradução nossa)[5]. Para tornar compreensível as microéticas, o agente pode entender a informação como recurso quando: (i) precisa escolher e tomar alguma decisão ou ação; (ii) é considerado produtor, o qual se vê responsável pela informação gerada e seus efeitos, necessitando ou da confiança em alguma informação ou sentindo as consequências do seu uso; (iii) pode ter “como alvo a informação, como variável dependente, afetando o ambiente informacional” (Gonzalez de Gomez 2020, p.10).
As três possibilidades indicadas acima são complexas e não podem ser entendidas de forma isolada; para Floridi, as microéticas não são suficientes para tratar os problemas éticos, pois “focalizam em cada caso tecnologias específicas a uma linha de ação, dissociando os complexos ciclos de vida da informação e suas mediações tecnológicas”. A informação é tomada pelo seu ciclo de vida que envolve geração, processamento, distribuição, armazenamento, proteção, uso e destruição/preservação. (Gonzalez de Gomez, 2020, p. 111)
Com a inadequação das microéticas, Floridi abarca as macroéticas como a alternativa viável para analisar questões éticas. Segundo Floridi,
do ponto de vista da meta-ética, EI [ética da informação] é uma macro-ética “naturalista” e “realista”: as características ontológicas e o “bem-estar” da infosfera proveem bases “objetivas” (orientadas ao objeto) para o julgamento do correto e do errado e geram razões “objetivas” para a ação [...] (Floridi, 1999, p. 49, tradução de Gonzalez de Gomez, 2020, p. 10-11).[6]
A macroética está relacionada à ecologia da informação, com o agente situado dinamicamente no ambiente. Para essa relação não ampliar a entropia, ela necessita de um aumento do “bem-estar” da Infosfera. Esse aumento de “bem-estar" restringe a entropia, caracterizada como lei da termodinâmica que mede os graus de desordem de um sistema físico, que na visão de Floridi, significa a destruição, corrupção ou poluição de um objeto informacional. Para ter esse aumento, a Infosfera precisa de:
[...] quatro “leis morais” que determinariam o que é certo e errado, do ponto de vista da maximização e excelência da infosfera, evitando a entropia, e promovendo o bem-estar informacional pelo aumento em extensão (quantidade de informação), o aperfeiçoamento (qualidade da informação) e o enriquecimento (variedade da informação) da infosfera (Gonzalez de Gomez, 2013, p. 18-19).
O aumento significativo e constante de elementos que maximizam o bem-estar da Infosfera contribui para a ação do indivíduo, pois ele terá mais informações pelas quais se basear e agir de forma correta, conforme a moralidade vigente. Floridi caracteriza o valor intrínseco da informação através de uma abordagem ontocêntrica, que carrega em si e nos indivíduos que interagem com ela sua significação. Contudo, “as coisas, naturais ou artificiais, são nelas mesmas sem valor, assim como o homem por si mesmo não é plausível de valoração, é in-valuáble - já que ele é quem assume os julgamentos de valor” (Gonzalez de Gomez, 2013, p.19). Entendemos que o indivíduo gera, a partir de sua interação com o ambiente, a faculdade de julgar o valor da informação, processando o seu significado. Ele engendra em si mesmo o “olhar” moral para os objetos do mundo, circulando a informação com o ambiente. O indivíduo carrega consigo cada vez mais dados impressos na realidade como informação, desenvolvendo uma maior estruturação de pensamento e compreensão para lidar com as questões éticas.
Em síntese, até aqui ressaltamos a importância da natureza da Ética da Informação (EI):
[...] ontologicamente ao invés de epistemologicamente modifica a interpretação do alcance de uma EI. Não só uma EI ecológica pode obter uma visão global de todo o ciclo de vida da informação, superando, assim, os limites de outras abordagens micro-éticas, mas também pode reivindicar um papel como macroética, isto é, como uma ética que diz respeito a toda a esfera da realidade (Floridi, 2013, p. 50, tradução de Gonzalez de Gomez).[7]
Ressaltamos também a importância da análise de problemas em uma perspectiva macro, não só da ética, mas da Filosofia da Informação em geral que:
[...] coloca o dado como condição da informação (ex ante), e a informação como condição constitutiva do conhecimento e de sua validade (ex post), de modo que as condições aléticas da informação (que ela seja verdadeira) dependem numa primeira instância da constituição alética do dado, e não de sua decodificação e aferimento pelo conhecimento (GONZALEZ de Gomez, 2013, p. 19).
Diante do exposto em 2.1 e 2.2, salientamos que é importante entender as concepções de informação nas perspectivas ontológica, epistemológica e semântica, na medida em que elas são a base da Filosofia e Ética da Informação. As vertentes ontológicas e semântica da informação sustentam os fundamentos da FI, voltando-se para a compreensão da Infosfera. Os cinco termos-chave: Informação, Semântica, Inteligência, Natureza e Valor são relevantes para o entendimento da Ética da Informação (EI) e da Filosofia da Informação (FI). No que se segue, buscaremos entender a contribuição da ética informacional floridiana nos estudos sobre IA Generativa.
2.3 IA GENERATIVA: CHATGPT E AS IMPLICAÇÕES DA ÉTICA INFORMACIONAL
A IA Generativa (IAGen) é caracterizada como um tipo de IA que é capaz de aprender padrões sofisticados de comportamento, utilizando algoritmos, a partir de uma base com gigantesca variedade de dados. Baseada em redes neurais artificiais, utilizando métodos como os de aprendizagem de máquina (machine learning) e processamento de linguagem natural (PLN), a IAGen capta e aprende a informação existente, indicativa de padrões, reproduzindo informação e padrões, bem como gerando informação e padrões exclusivos. Isso se deve ao fato de que a IAGen é capaz de absorver e processar enorme quantidade de dados advindos de textos, vídeos e imagens, entre outros. Exemplos de IAGen são o Bing Chat (Microsoft), Google Bard e o ChatGPT (OpenAI), os quais são treinados com trilhões de palavras. (Lisboa, Ciriaco, 2023; Generative AI, S. D.). Nas palavras de Musiol (s.d.)
IA Generativa (IAGen) é um tipo de Inteligência Artificial que pode criar uma ampla variedade de dados, tais como imagens, vídeos, áudios, textos e modelos 3D. Ela faz isso aprendendo padrões de dados existentes e, em seguida, usando esse conhecimento para gerar resultados novos e exclusivos. AIGen é capaz de produzir conteúdo altamente realista e complexo que imita a criatividade humana, tornando-se uma ferramenta valiosa para muitos setores, como jogos, entretenimento e design de produtos (Musiol, s.d., tradução nossa)[8]
O desenvolvimento de tecnologias como o ChatGPT e sua utilização levantam questionamentos éticos referentes à transparência, ao enviesamento na aprendizagem gerado por diferentes tipos de preconceitos, os quais são transmitidos por dados gerados por humanos, à privacidade, confiabilidade, autonomia, ao processo de desumanização da comunicação, uso indevido da tecnologia, ocultamento de fontes de onde foram retiradas as informações, sem compromisso com a verdade etc. (Almenara, 2023; Higa, 2023).
Segundo Higa (2023), no que se refere aos preconceitos, as respostas do ChatGPT podem ser parciais, expressando textos com conteúdo estereotipado e discriminatório, contribuindo para causar violência verbal e física, bem como reforçando, naturalizando e perpetuando desigualdades em nossa sociedade. Em relação à privacidade, apesar do ChatGPT não armazenar, em princípio. dados de interações com os usuários pode revelar dados pessoais. Já o uso indevido do ChatGPT pode gerar informação enganosa com o objetivo de conduzir a opinião pública, causando danos aos sistemas democráticos, principalmente em épocas de eleições. Além disso, o ChatGPT pode promover a desumanização da comunicação ao ser usado, por exemplo, como um sistema de recomendação, cujos usuários confiam de modo acrítico na informação gerada, sem esboçar julgamentos mais aprofundados.
No âmbito deste trabalho, seguindo a concepção de Filosofia da Informação e Ética Informacional proposta por Floridi (2004), questionamos, no que concerne à IAGen, especificamente ao ChatGPT:
1 – A relação entre informação e conhecimento.
2 – A diferença entre inteligência humana e artificial.
3 – A necessidade de uma ética global alinhada às microéticas.
Como indicamos em 2.2, Floridi (2004) sugere que o dado pode ser utilizado para obter conhecimento a partir do próprio dado. Nesse sentido, diferindo da relação epistêmica entre observador e observado, na qual o conhecimento precede a informação, no caso do ChatGPT, bem como de outras tecnologias de informação e comunicação, a informação precede o conhecimento. Um dos pontos importantes e problemáticos dessa precedência é que a informação veiculada no ChatGPT não tem necessariamente vínculo com a verdade. E isso pode causar danos individuais e coletivos, a depender de que tipo de informação, sem compromisso com a verdade, foi disseminada, sua abrangência e impactos na sociedade.
Ainda, como ressaltamos em 2.2, Gonzalez de Gomez (2013) questiona se a inteligência natural e humana pode ser codificada e analisada por uma máquina; ela também indaga se a inteligência natural pode ser implementada em uma máquina. Segundo ela, Floridi distingue processamento e identificação: a IA identifica e processa dados; já a inteligência humana identifica e processa informação. No caso do ChatGPT, ele identifica e processa dados que são disseminados para os usuários, os quais processam a informação, tornando-a significativa. Uma diferença relevante entre o ChatGPT e o ser humano é que o primeiro não diferencia significativamente os dados que estão sendo processados; já o ser humano diferencia, através de diversos planos de abstração. Os planos de abstração atuam como mediadores da relação epistêmica entre aquele que conhece e o que pode ser conhecido.
Nesse sentido, tecnologias de informação e comunicação, como o ChatGPT, suscitam problemas éticos na medida em que têm grande impacto nas diferentes formas de vida que constituem a sociedade. Na concepção floridiana há a necessidade de desenvolver uma ética global que não se perca em análises microéticas, as quais não levam em conta a totalidade do problema. (Gonzalez de Gomez, 2013). No caso do ChatGPT, como indicamos em 2.2, a microética abordaria casos específicos contendo informação veiculada pelo Chat, sem vínculo com a verdade, contextualizando-a em situações e ciclos que estão fora de ciclos mais complexos da informação. A ética global é mais abrangente, contribuindo para equilibrar e melhorar o bem-estar da Infosfera, da qual humanos e máquinas fazem parte. Um exemplo de abordagem da ética global, em relação à informação gerada pelo ChatGPT, pode ser pensado quando algoritmos enviesados (algorithm bias), os quais refletem valores humanos, aparecem nos textos gerados pelo ChatGPT. A ética global proposta por Floridi focaliza o problema dos algoritmos enviesados, de forma ampla, extrapolando os limites da ética, abrangendo a sua base, a Filosofia da Informação.
Neste ensaio, apresentamos tópicos da Filosofia da Informação e seus problemas na perspectiva de Floridi. Introduzimos brevemente a FI nas abordagens ontológica e epistemológica, segundo Gonzalez et al. (2004), para, consequentemente, adotar os cinco termos-chave (Informação, Semântica, Inteligência, Natureza e Valor) como norteadores dos problemas para uma FI, segundo Floridi. Ilustramos aplicações da FI e EI floridiana com a IAGen, focalizando o ChatGPT.
Ainda há muito caminho pela frente para explicitar o que é a Filosofia da Informação e em quais processos podemos adequá-la. O que foi exposto até aqui aborda, em certa medida, questões e problemas para uma Filosofia e Ética da Informação. Podemos considerar os caminhos para uma Ética da Informação nas relações informacionais que abarcam a pluralidade de acontecimentos possíveis, sendo a Infosfera a forma de ligação entre os sujeitos informacionais e sua relação com os seus nichos. Diante disso, podemos afirmar a importância da Ética Informacional para compreendermos a ação dos indivíduos nas suas relações dinâmicas com as novas TIC.
Salientamos que a Infosfera é um conceito que se restringe às ações e interações humanas, em contraste com a Ecologia Informacional que abrange a interação agente-ambiente, através de affordances, não se limitando apenas ao âmbito das relações humanas. Quando consideramos a esfera informacional, não é viável, se quisermos ampliar as possibilidades de ação, reduzir as ações éticas em uma perspectiva apenas humana. A humanidade é o principal fator para gerar e extrair informação? Se pensarmos a fundo no que nossas relações proporcionam como informação, a humanidade não chega aos pés, nos dias atuais, do que pode ser gerado por outras formas de comunicação e informação. As próprias tecnologias geraram um ciclo de transição informacional que se adequa a diversos ambientes para, justamente, gerar informação diferente em cada interação.
Uma instância informacional não se restringe à humanidade que a instancia, mas é devido, atualmente e não necessariamente, às próprias TIC que se instanciam a si mesmas. Estamos perdendo como humanidade a capacidade, em graus, de gerar informação própria, por interferência da tecnologia de comunicação e informação. Através de ações morais, que não resultam necessariamente em mudanças drásticas no mundo, podemos tornar a informação que geramos e transmitimos, na esfera informacional, influência para cada indivíduo, cabendo a cada um de nós termos a consciência para influenciarmos o bem-estar da Infosfera.
As limitações da Infosfera suscitam alternativas à Ética Informacional floridiana. Entre estas alternativas, destacamos a Ética Intercultural da Informação (EII), proposta por Rafael Capurro (2010, p. 12, tradução nossa) que a caracteriza como “[...] a relação entre normas morais universalizáveis ou universalizadas e tradições morais locais”[9]. Nesse sentido, Capurro amplia a perspectiva da Ética da Informação na medida em que engendra o universal e o local na Infosfera, diferenciando e destacando particularidades culturais e aspectos universais. Por isso, a EII se encarrega de tratar a totalidade e particularidade da esfera informacional da realidade como duas faces da mesma moeda. Por exemplo, de uma moral universalizada, podemos adotar a Declaração Universal dos Direitos Humanos que foi constituída após a Segunda Guerra Mundial, a qual tem raízes em eventos que expressam moralidades e particularidades culturais locais, como a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, na França, em 1789; ou ainda, nas lutas de povos escravizados por liberdade e direitos ao longo da história. Capurro (2010, p. 13, tradução nossa) ressalta que “A EII surge no momento em que o questionamento teórico da(s) moral(is) se torna cada vez mais urgente dado o profundo impacto prático das TIC na sociedade”[10].
Entre os impactos práticos da TIC, podemos citar os conflitos, antes em níveis locais, mas que se transformam em conflitos globais por meio das tecnologias. Exemplo desses conflitos é a guerra entre Rússia e Ucrânia que envolve a disputa pelos meios de comunicação, via internet, através de gigantes corporativos como Meta, Google e Apple. Enquanto essas empresas tomaram posição política no conflito, declarando-se anti-Rússia, o governo Russo bloqueou o Facebook e Twitter. A disputa ainda envolve pedidos de líderes de setores de alta tecnologia para que a Rússia seja desligada da Internet Global. Tais pedidos foram negados pela ICANN (Corporação da Internet para Atribuição de Nomes e Números), organização que controla a internet no mundo. Essa disputa tecnológica gera impactos nos setores que abrangem a economia, comunicação, política e a sociedade em geral. (Wakefield, 2022).
No contexto do que propomos aqui, há a fragmentação da sociedade, influenciando a Infosfera de modo que ações se tornem reações, não apenas locais, mas com abrangência global. Sendo assim, as TIC carregam duas possibilidades de Infosfera, uma que se relaciona com o universal por meio do particular, e a outra do particular por meio do universal, afetando-se mutuamente. Além do exemplo da guerra entre Rússia e Ucrânia, indicando a fragmentação de vínculos sociais, através da disseminação em ampla escala de informação, a qual suscita a globalização de ações e reações, citamos o nosso breve estudo teórico de caso, no tópico 2.3, o ChatGPT. Como indicamos, o ChatGPT pode influenciar ações no ambiente, gerando impactos negativos, por exemplo, àqueles veiculados aos algoritmos enviesados.
Entendemos que o conceito de Infosfera no âmbito da Ética da Informação de Floridi, conjugada à Ética Intercultural da Informação proposta por Capurro, permite construir uma ponte para novas perspectivas no entendimento de diversos problemas que as TIC estão trazendo para o mundo globalizado.
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[1] Graduando em Filosofia. Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” - UNESP, Marília, SP. Apoio: PIBIC – CNPq.
[2] Pós-doutoranda em Filosofia. Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” - UNESP, Marília, SP. Apoio: PROPe-UNESP.
[3] Information as reality (e.g. as patterns of physical signals, which are neither true nor false), also known as ecological information; information about reality (semantic information, alethically qualifiable); and information for reality (instruction, like genetic information). (Floridi, 2004, p. 11, tradução de Gonzalez de Gomez).
[4]One of the major dissimilarities between current generation artificial intelligence systems (AIs) and human natural intelligences (NIs) is that AIs can identify and process only data (uninterpreted patterns of differences and invariances), whereas NIs can identify and process mainly information (in the weak sense of well-formed patterns of meaningful data). (Floridi, 2004, p.22).
[5] “a) information (information as a resource) to generate some other (b) information (information as a product), and in so doing affect her (c) informational environment (information as target)”. (Floridi, 2013, p. 20).
[6] From a metaethical view, IE is a ‘naturalist’ and ‘realist’ macroethics: the ontological features and well-being of the infosphere provide an ‘objective’ (i.e. object-oriented) basis for judgements of right and wrong and generate ‘objective’ reasons for action [...]. (Floridi, 1999, p. 49, tradução de Gonzalez de Gomez, 2020, p. 10-11).
[7] Understanding the nature of IE ontologically, rather than epistemologically, modifies the interpretation of its scope and goals. Not only can an ecological IE gain a global view of the whole life-cycle of information, thus overcoming the limits of other microethical approaches, but it can also claim a role as a macroethics, that is, as an ethics that concerns the whole realm of reality, at an informational level of abstraction. (Floridi, 2013, p. 50, tradução de Gonzalez de Gomez).
[8] Generative AI (GenAI) is a type of Artificial Intelligence that can create a wide variety of data, such as images, videos, audio, text, and 3D models. It does this by learning patterns from existing data, then using this knowledge to generate new and unique outputs. GenAI is capable of producing highly realistic and complex content that mimics human creativity, making it a valuable tool for many industries such as gaming, entertainment, and product design. (Musiol, s.d.).
[9] “[...] la relación entre normas morales universalizables o universalizadas y tradiciones morales locales”. (Capurro, 2010, p. 12).
[10] “La EII surge en el momento en que el cuestionamiento teórico de la(s) moral(es) se vuelve cada vez más urgente dado el profundo impacto práctico de las TIC en la sociedad”. (Capurro, 2010, p. 13).