TEORIA CRÍTICA E PATOLOGIAS SOCIAIS
suas esferas e análises dos impactos
Jovino Pizzi[1]
Universidade Federal de Pelotas
jovino.pizzi@ufpel.edu.br
Lara Emmile Evangelista Valença[2]
Universidade Federal de Pelotas
laraufpel@gmail.com
Monize Affeldt [3]
Universidade Federal de Pelotas
monizeaffe@gmail.com
Nicoli Pereira Presa[4]
Universidade Federal de Pelotas
nick.pereira.presa.2005@gmail.com
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Resumo
A análise das patologias sociais fundamenta-se na Teoria Crítica, especialmente em Axel Honneth (2016), que utiliza os termos “diagnóstico” e “patologia” em analogia à medicina. Com base nessa perspectiva, o grupo do Observatório Global de Patologias Sociais da Universidade Federal de Pelotas, criado em 2018, dedica-se a investigar e definir o conceito de patologia social. O Observatório reúne pesquisadores de diferentes áreas das ciências humanas, sociais e da saúde, com foco na produção de diagnósticos, análises conceituais e propostas de intervenção voltadas à qualidade de vida. A transversalidade das ações é orientada pelos fatores C+T: o “C” refere-se ao fazer coletivo, baseado em cooperação e coautoria entre pesquisadores; o “T” representa a transversalidade, que promove a interconexão entre distintas áreas do conhecimento. As patologias são analisadas em três esferas, individual, coletiva/social e institucional, considerando aspectos clínicos, psicológicos e de políticas públicas. Os dados obtidos, a partir de produções como o Glossário de Patologias Sociais (PIZZI et al., 2021) e de plataformas de pesquisa, revelam a contribuição do Observatório na articulação interdisciplinar entre filosofia, sociologia, saúde e educação. A proposta de inclusão de uma quarta esfera, ambiental-ecológica, amplia o alcance das análises, permitindo compreender os sofrimentos sociais como fenômenos complexos que demandam abordagens múltiplas e integradas.
Palavras-chave: Teoria Crítica. Patologias sociais. Vícios institucionais.
CRITICAL THEORY AND SOCIAL PATHOLOGIES
their spheres and impact analyses
Abstract
The analysis of social pathologies is based on Critical Theory, especially on Axel Honneth (2016), who uses the terms "diagnosis" and "pathology" in analogy to medicine. Based on this perspective, the Global Observatory of Social Pathologies group at the Federal University of Pelotas, created in 2018, is dedicated to investigating and defining the concept of social pathology. The Observatory brings together researchers from different areas of the human, social and health sciences, focusing on the production of diagnoses, conceptual analyses and intervention proposals aimed at quality of life. The transversality of actions is guided by the C+T factors: "C" refers to collective action, based on cooperation and co-authorship among researchers; "T" represents transversality, which promotes the interconnection between different areas of knowledge. Pathologies are analyzed in three spheres: individual, collective/social, and institutional, considering clinical, psychological, and public policy aspects. The data obtained from publications such as the Glossary of Social Pathologies (PIZZI et al., 2021) and research platforms reveal the Observatory's contribution to the interdisciplinary articulation between philosophy, sociology, health, and education. The proposed inclusion of a fourth sphere, environmental-ecological, broadens the scope of the analyses, allowing for an understanding of social suffering as a complex phenomenon that demands multiple and integrated approaches.
Keywords: Critical Theory. Social pathologies. Institutional vices.
TEORÍA CRÍTICA Y PATOLOGÍAS SOCIALES
sus ámbitos y análisis de impacto
Resumen
El análisis de las patologías sociales se fundamenta en la Teoría Crítica, especialmente en la obra de Axel Honneth (2016), quien emplea los términos «diagnóstico» y «patología» por analogía con la medicina. Desde esta perspectiva, el Observatorio Global de Patologías Sociales de la Universidad Federal de Pelotas, creado en 2018, se dedica a investigar y definir el concepto de patología social. El Observatorio reúne a investigadores de diversas áreas de las ciencias humanas, sociales y de la salud, centrándose en la elaboración de diagnósticos, análisis conceptuales y propuestas de intervención orientadas a la calidad de vida. La transversalidad de las acciones se guía por los factores C+T: «C» se refiere a la acción colectiva, basada en la cooperación y la coautoría entre investigadores; «T» representa la transversalidad, que promueve la interconexión entre diferentes áreas del conocimiento. Las patologías se analizan en tres ámbitos: individual, colectivo/social e institucional, considerando aspectos clínicos, psicológicos y de políticas públicas. Los datos obtenidos de publicaciones como el Glosario de Patologías Sociales (PIZZI et al., 2021) y plataformas de investigación revelan la contribución del Observatorio a la articulación interdisciplinaria entre filosofía, sociología, salud y educación. La propuesta de incluir una cuarta esfera, la ambiental-ecológica, amplía el alcance de los análisis, permitiendo comprender el sufrimiento social como un fenómeno complejo que exige enfoques múltiples e integrados.
Palabras clave: Teoría crítica. Patologías sociales. Vicios institucionales.
1 INTRODUÇÃO
Em um cenário de assimetrias profundas, a normalização da violência e intensificação cotidiana de sofrimento social, emergem esforços acadêmicos e políticos para compreender tais dinâmicas a partir de abordagens críticas. As chamadas “patologias sociais”, vinculadas a autores da tradição da Teoria Crítica renovada, como Axel Honneth (2016). Os esforços para estudar e compreender o significado e as incidências das patologias sociais refletem em novas análises a respeito do “social”. Por um lado, as patologias são entendidas como desvios individuais, mas, por outro, elas aparecem como anomias inerentes às contradições do capitalismo, do colonialismo e de formas persistentes de dominação. Para Honneth, a sociedade patológica alimenta patologias, pois quando entidades representativas não concedem que um indivíduo seja ouvido e valorizado, o que resulta em uma desorientação nos membros de tal sociedade. Em outras palavras, trata-se de um desacoplamento entre as reivindicações sociais e a realizações estruturais do sistema social.
Nesse contexto, torna-se fundamental construir instrumentos conceituais que identifiquem, interpretem e resistam às múltiplas formas de sofrimento social. O Observatório Global de Patologias Sociais (OGPS) vem dedicando-se a estudar e interpretar o significado de patologia social. Desde sua criação, em 2018, o Observatório se esforça, através de pesquisadores de diferentes áreas do conhecimento, na produção de diagnósticos, análises conceituais e propostas de intervenção voltadas à qualidade de vida da população (Cenci; Pizzi, 2021). O objetivo é articular pesquisa e articulação de alternativas voltadas a redefinir políticas públicas em vistas a novas formas de convivência mais saudáveis.
A sua dimensão metodológica distinta inicia com o levantamento bibliográfico, cujo destaque é o Glosario de Patologías Sociales (Pizzi et al., 2021), com distintas categorizações de patologias sociais. A busca também se ateve a suportes de artigos, dissertações e teses, além de livros dos temas principais. O objetivo é mostrar as recorrências de investigações com esses descritores, chegar a possíveis considerações sobre as patologias sociais enraizadas no cotidiano buscando correlacionar a diferentes áreas de estudos que se utilizam de conceitos semelhantes.
O segundo aspecto diz respeito às esferas das patologias (individual, coletiva/social e institucional). Dessa maneira, é possível compreender de que forma as patologias sociais se relacionam com o campo da saúde e quais tendências podem ser identificadas a partir dessa análise. No caso, foram considerados os aspectos clínicos, psicológicos, coletivos e de políticas públicas (institucionais), abrangendo tanto dimensões de cuidado quanto de bem-estar físico e mental.
Até o momento, pode-se concluir que a principal contribuição está na capacidade de articular diferentes áreas do conhecimento, como, por exemplo, filosofia, sociologia, saúde e educação, em torno de um esforço interdisciplinar que rompe com o uso restrito dos termos “patologia” e “diagnóstico” no campo da medicina. A classificação dos verbetes em esferas individuais, coletivas e institucionais, somada à proposta de uma nova esfera ambiental-ecológica, vai aumentar o alcance do projeto e permite uma leitura mais integrada. Com isso, podemos compreender que os sofrimentos sociais não são apenas problemas isolados, mas fenômenos complexos que exigem abordagens múltiplas, que conseguem dialogar tanto com a saúde pública quanto com os desafios éticos, políticos e ambientais da atual geração.
2 A METODOLOGIA TRANSVERSAL
O presente trabalho se debruçou em três metodologias as quais serão apresentadas a seguir. O projeto foi dirigido e vinculado ao Glossário de Patologias Sociais (Pizzi et al., 2021), considerando a esfera multidisciplinar com estudantes de graduação e pós-graduação de odontologia, educação, biologia, pedagogia e filosofia. A diversidade de áreas favoreceu o diálogo transversal entre diversos campos, facilitando uma abordagem crítica sobre patologias sociais. Como foi destacado o dossiê temático (Cadernos de Educação, 2025) congregou diversos artigos a respeito das patologias sociais, no qual destaca-se o artigo a respeito dos vícios institucionais nas Universidades (Nunes; Pizzi, 2025). Com base nesse texto, ampliamos o debate a respeito desse tipo de patologia, salientando quatro pontos chaves.
2.1CONSIDERAÇÕES SOBRE PATOLOGIAS SOCIAIS E VÍCIOS INSTITUCIONAIS
Como já foi destacado, a primeira incursão foi desenvolvida a partir de análise documental e bibliográfica acerca do Glossário de Patologias Sociais (Pizzi et al, 2021). Após quatro anos, buscou-se, no site Guaiaca da UFPel, quais países e profissionais contribuíram, quantificando os acessos e quais países apresentaram visitantes. As tabelas e gráficos mostram as visualizações relativas ao Glossário. Ao mesmo tempo, tratamos de mostrar a consulta ao artigo Vícios Institucionais nas Universidades: uma forma de Patologia Social (Nunes, 2025). Em contraponto, o glossário oferece um instrumental metodológico para reconhecer e conceituar diferentes expressões do sofrimento social, enquanto o artigo mostra, na forma mais reflexiva, o contexto institucional no qual as patologias contaminando ambiente cotidiano da esfera acadêmica. A comparação conjugou o referencial teórico com as aplicações práticas do trabalho desenvolvido pelo Observatório.
Nesse sentido, destaca-se a conformação metodológica, fundamentada nos Fatores C+T, promovendo a prática coletiva do grupo do Observatório de Patologias Sociais em duas dimensões, como aparece a continuação:
1. O fator C se apoia no quefazer coletivo, em vistas a agrupar significados com elementos substantivados que começam com “c”, como: coparticipação, cooperação, colaboração, cordialidade e comunicação, de modo a assegurar a coautoria entre pesquisadores de diversas áreas;
2. o T inclui a noção da transversalidade, permitindo a análise desenvolvida a partir da interconexão entre diferentes áreas das Ciências Humanas, Sociais e da Saúde.
Essa junção consolida a prática transdisciplinar e solidária, intensificando o uso coletivo de instrumentos, o compartilhamento de conhecimentos, organização e proposição de políticas saudáveis. De fato, as produções em conjunto e o feedback contínuo garantiu a compreensão dos impactos acadêmicos e sociais. Com isso, a metodologia não apenas ampara o conceito e o aproveitamento crítico sobre patologias sociais, mas também deixa mais latente a proposta do Observatório de operar com um espaço de cooperação frente aos desafios da sociedade atual.
2.2 CLASSIFICAÇÃO DOS VERBETES CONFORME AS ESFERAS DESENHADAS
Considerando o processo, em primeiro lugar, destaca-se que todos os registros foram lidos e colocados em uma planilha, nos seguintes termos: título, autor e conteúdo central. O segundo movimento foi classificar, de acordo com a proposta metodológica apresentada pelo Observatório, a base de estruturação a respeito das esferas das patologias sociais. Em seguida, foi realizada a classificação, fazendo recortes sobre a área da saúde, identificando os verbetes que fazem menção direta ou indireta com essa área. Foram avaliados os aspectos clínicos, psicológicos, coletivos e de políticas públicas, considerando dimensões de cuidado e de bem-estar físico e mental. Contudo, foi realizado um quadro com os dados que foram obtidos, com o intuito de evidenciar a distribuição das esferas com os verbetes que tinham relação à saúde, viabilização da análise de tendências e predominância. O quadro a seguir demonstra e detalha essa representação.
Quadro 1 – Os verbetes e suas relações

Fonte: Autoria própria.
2.3 METODOLOGIA QUALITATIVA À LUZ DAS TEORIZAÇÕES DE HONNETH
Essa metodologia se baseia na intrínseca questão das patologias, a partir da perspectiva teórica de Axel Honneth (2016). Desse modo, a metodologia qualitativa consegue atender e aprofundar as críticas do filósofo alemão.
Frente a isso, a pesquisa foi dirigida com um levantamento bibliográfico no Google Acadêmico, com o objetivo identificar discussões existentes sobre o tema com diferentes áreas do conhecimento. Realizou-se, então, uma investigação a respeito do tipo estado do conhecimento, de acordo com Morosini e Fernandes (2014). Ele se constitui na “[...] identificação, registro, categorização que levem à reflexão e síntese sobre a produção científica de uma determinada área, em um determinado espaço de tempo” (p. 102).
Ao iniciar a pesquisa, foi inserido dois descritores: patologias sociais e Axel Honneth, totalizando 2.410 resultados. Foi preciso restringir, então se preferiu buscar somente pelo ano de 2024 e 2025, com os mesmos descritores, totalizando em 66 resultados.
Como a pesquisa se mostra vinculada ao Observatório, considerou-se fazer a mesma busca, com os mesmos descritores no ano de 2018, ano do início do projeto, somando, ao final, 56 resultados. Foram selecionados, dentre eles: artigos científicos, teses, dissertações, revistas e livros, que falavam sobre o conceito de patologias sociais à luz das teorizações de Honneth. A seleção inicial levou em consideração a relevância do título, autor, ano, assunto e resumo. Após isso, um segundo movimento foi identificar as áreas que o conceito estava sendo mais discutido.
Tabela 1- Número de trabalhos em suportes de artigos científicos, teses e dissertações, livros dos descritores- ano de 2024 a 2025.
|
Artigos científicos |
Teses e dissertações |
Livros |
Trabalho de conclusão curso |
Revista e jornal |
Dossiê |
Evento |
|
25
|
11 |
3 |
5 |
19 |
2 |
1 |
Fonte: Autoria própria.
Tabela 2- Número de trabalhos em suportes de artigos científicos, teses e dissertações, livros dos descritores- ano de 2018.
|
Artigos científicos |
Teses e dissertações |
Livros |
Trabalho de conclusão curso |
Revista e jornal |
Dossiê |
Evento |
|
20
|
18 |
2 |
3 |
11 |
2 |
- |
Fonte: Autoria própria.
Como o conceito de Patologias Sociais é atravessado por elementos interdisciplinares latentes, ficou claro que nesse levantamento ele circulou em diferentes áreas das ciências sociais, humanas e da saúde. Abaixo a tabela com as recorrências dos descritores e as diferentes áreas.
Tabela 3- Número de trabalhos nas áreas do direito, filosofia, sociologia, educação, saúde, ciências sociais e comunicação social, ano de 2024 a 2025.
|
Direito |
Filosofia |
Sociologia |
Educação |
Saúde |
Ciências Sociais |
Comunicação Social |
|
19 |
28 |
5 |
8 |
3 |
2 |
1 |
Fonte: Autoria própria.
Tabela 4- Número de trabalhos nas áreas do direito, filosofia, sociologia, educação, saúde, ciências sociais e comunicação social, ano de 2018.
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Direito |
Filosofia |
Sociologia |
Educação |
Ciências Políticas |
Ciências Sociais |
Relações Públicas |
Gestão Social |
Relações Interna- cionais |
|
11 |
26 |
5 |
2 |
2 |
6 |
1 |
1 |
2 |
Fonte: autoria própria.
Como é possível perceber, área da Filosofia com maior número de recorrências, se destaca o artigo “A crise Filosófica-Intelectual e Comportamental do Estudante Causadas pelo Consumo Excessivo das Novas Tecnologias da Informação na Perspectiva de Axel Honneth” de autoria de Leite (2024) o texto mostra que a crise do uso desmedido das tecnologias da informação causa uma tributação na formação dos docentes, uma ameaça à construção da identidade do estudante, atrapalhando radicalmente a maneira particular do pensar e agir, em especial na área filosófico-educativa. O trabalho de Silva (2025) reflete a formação docente tendo como fundamento a teoria de Honneth sobre patologias sociais e ainda se entrelaçando as patologias socioeducacionais, se considerando a formação educacional e pedagógica.
Na área do direito com 19 recorrências, o artigo de Santos (2024) relata a complexa liberdade do direito a partir da ótica da filosofia. A tese relata que a liberdade não se restringe apenas no âmbito jurídico, mas se evidência em outras três extensões, liberdade jurídica: que se refere aos direitos e deveres garantidos por lei; liberdade moral: nasce nas ligações de afeto e cuidado mútuo e liberdade social: está relacionada com a comunidade e na sociedade civil, Honneth argumenta a liberdade social é obtida através do reconhecimento das contribuições individuais.
A área da saúde teve poucas recorrências, mas merece destaque por ter envolvimento com o observatório de Patologias Sociais. Marques (2025) faz uma análise sobre a perspectiva da filosofia e saúde, como a divisão de tarefas durante tempos pandêmicos, concentrando na primeira fase nas mulheres criadoras e continuadoras de empresas familiares e em segundo momento relatando o retrocesso do trabalho pós-covid 19.
Para Hober (2025) et al abordam a questão do capacitismo no âmbito escolar. Ressaltando que o capacitismo contemporâneo desenvolvido através das ideias de Axel Honneth que entende as crenças incertas em forma com teor de desrespeito. No eixo da sociologia, para Maia (2024) e da Hora (2024) os dois exploram uma linha de pensamento que inicialmente parecem ser antagônicas, que podem fazer conclusões de forma considerável.
2.4 OS RESULTADOS DA PESQUISA
A contribuição dos três métodos de metodologia leva a resultados surpreendentes, o conceito de Patologias Sociais é atravessado por elementos interdisciplinares latentes. No caso, ficou claro que nesse levantamento ele circulou em diferentes áreas das ciências sociais, humanas e da saúde, atrelados ao filósofo Axel Honneth.
No levantamento realizado dos verbetes, é evidente que não são homogêneos, podendo ser organizados em três esferas: individual/psíquica, coletiva/social e institucional/sistêmica (Pizzi et al., 2021). Na dimensão individual/psíquica, destacam-se verbetes como bovarismo e não-resiliência, que revelam formas de sofrimento ligadas à subjetividade, mas que possuem impacto coletivo. A literatura em saúde mental coletiva já mostrou como experiências individuais de sofrimento são moldadas por contextos socioculturais mais amplos (Kleinman, 1988). A esfera coletiva/social concentra verbetes que sintetizam experiências de exclusão, discriminação e violência simbólica. O conceito de dor social crônica, por exemplo, aproxima-se das análises de Mbembe (2018) sobre necropolítica, evidenciando como racismo, machismo e desigualdade estruturam formas de sofrimento coletivo duradouro. Outros termos, como intolerância intercultural e posverdade, apontam para crises de convivência democrática, próximas às reflexões de Habermas (1981) sobre a erosão dos espaços comunicativos racionais.
Já a dimensão institucional/sistêmica abrange verbetes que problematizam os mecanismos de poder das estruturas políticas, econômicas e acadêmicas. Fenômenos como totalitarismo ou neuroneoliberalismo pedagógico mostram como instituições podem cristalizar formas de adoecimento coletivo. Quando relacionamos o glossário da área da saúde, alguns verbetes se destacam pela ressignificação biomédica. O conceito de autoimunidade, por exemplo, é tomado como metáfora social, revelando processos em que a sociedade se volta contra si mesma, de forma análoga ao corpo, que ataca seus próprios tecidos. É importante destacar que tais patologias não se distribuem de maneira uniforme: elas emergem e ganham força em contextos históricos e culturais específicos.
No que se refere ao alcance e relevância do Glossário de Patologias Sociais (Pizzi et al.,2021), o material eletrônico no site Guaiaca (UFPel) revela evidências a respeito da amplitude da produção e da circulação da ferramenta de consulta eletrônica. A rede internacional com 23 autores, 13 instituições de ensino e pesquisa, bem como oito países envolvidos na elaboração do glossário, o que confirma o caráter colaborativo e internacional da publicação. Na Tabela 5, é possível ver as visualizações.
Tabela 5 – Visualizações totais

Fonte: Autoria própria.
Esta tabela mostra que existem procuras e, por isso mesmo, a necessidade de um material que descreva e trate de Patologias Sociais de uma forma clara e acessível, para um fácil entendimento do conteúdo por pessoas com diversos níveis de formação acadêmica.
No gráfico a continuação, destaca-se as visualizações por país. Nele, é possível identificar as visitas que ocorreram e os continentes diferentes.
Gráfico 1 - Visualizações por país

Fonte: Autoria própria
O Gráfico destaca o Brasil como principal origem dos acessos, com uma porcentagem de 70%, seguido pelos EUA com 14%, China com 5%, Espanha com 4%, Chile com 3%, Argentina com 2%, e, por fim, México, França, Ucrânia e Holanda, todos com 1%, revelando a inserção e interesse internacional do glossário.
Gráfico 2 – Visualizações por cidade

Fonte: Autoria própria.
Complementarmente, o Gráfico de distribuição por cidades permite identificar centros urbanos de maior concentração de acessos, com destaque para capitais e cidades universitárias. No caso, Pelotas lidera com 77% dos acessos, logo a seguir aparece o Central District com 9,2%, Santiago com 2,1%, Ashburn com 1,9%, Oakland com 1,6%, Buenos Aires com 1,5%, Castellón com 1,4%, Valdivia com 1,3%, Houston com 1,1% e, por fim, Ann Arbor com 0,8%. Isso reforça o vínculo da obra com comunidades acadêmicas e científicas de diferentes regiões do planeta.
Esses resultados (Guaiaca, UFPEL, 2025) em conjunto, atestam a relevância acadêmica e social do glossário, bem como a demanda por um material didático que forneça informações acerca do conceito de patologias, de seu campo de abrangência e sua capacidade de fomentar diálogos interinstitucionais e transnacionais.
Além disso, a comparação com o artigo “Vícios Institucionais nas Universidades: uma forma de Patologia Social” (Nunes, 2025) evidencia que tais patologias se materializam no cotidiano acadêmico, em práticas como a burocratização, que fragiliza a autonomia de docentes e estudantes; o silenciamento de vozes críticas, que restringe a pluralidade de ideias; a precarização das condições de trabalho e o produtivismo acadêmico, que transforma a pesquisa em mera exigência quantitativa (Sguissardi, 2009). Assim, a integração entre glossário e artigo permite compreender tanto os fundamentos teóricos quanto suas dinâmicas em rotinas institucionais, produzindo impactos sobre a saúde mental coletiva, as relações interpessoais e a qualidade da formação universitária.
3 CONCLUSÃO
Diante do exposto, conclui-se que a atuação do OGPS configura-se como uma prática metodológica e política que articula teoria e ação, ao mesmo tempo em que oferece um referencial crítico para interpretar e transformar realidades sociais atravessadas por desigualdades. Os resultados (Guaiaca UFPEL, 2025) apontam para a ampla difusão e utilização do Glossário de Patologias Sociais (Pizzi et al., 2021) em âmbito nacional e internacional, o que reforça sua relevância acadêmica e impacto social.
O Glossário representa, pois, uma inovação ao propor um novo vocabulário para nomear formas de sofrimento coletivo que até então permaneciam difusas ou restritas a análises parciais. Sua principal contribuição está na capacidade de articular diferentes áreas do conhecimento, como por exemplo filosofia, sociologia, saúde e educação, em torno de um esforço interdisciplinar que rompe com o uso restrito dos termos “patologia” e “diagnóstico” no campo da medicina, ademais o Glossário (2021), ao integrar categorias oriundas da tradição da Teoria Crítica e de sua atualização na terceira geração da Escola de Frankfurt (Honneth, 2009), mostra que o material não apenas sistematiza conceitos, mas também amplia a capacidade de comunidades de identificar e enfrentar contradições estruturais vinculadas ao capitalismo e ao colonialismo (Safatle, 2006).
A classificação dos verbetes em esferas individuais, coletivas e institucionais, somada à proposta de uma nova esfera ambiental-ecológica, nos faz compreender que os sofrimentos sociais não são apenas problemas isolados, mas fenômenos complexos que exigem abordagens múltiplas, que conseguem dialogar tanto com a saúde pública quanto com os desafios éticos, políticos e ambientais de nosso tempo.
Contudo, na análise qualitativa dos artigos que fazem menção a Axel Honneth, pode-se concluir que o filósofo mantém uma referência central até os dias de hoje. As pesquisas demonstraram uma notável diversidade nas diferentes áreas e em seus conceitos, que nos proporcionam um arcabouço robusto para os conflitos sociais e culturais. O estudo mostrou que a aplicação dos conceitos de Honneth transcende aos dias atuais, essa contínua apropriação e expansão de seu pensamento nos relata a relevância do alemão até os tempos atuais.
REFERÊNCIAS
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