ARTIGO
fenômeno construído coletivamente e submetido a flutuações, transformações, mudanças
constantes” (Pollak, 1992, p.201). Ou seja, a memória é seletiva, nem tudo fica gravado e
registrado, sendo relembrado aquilo que o sujeito considera mais significativo para si.
Seguindo a concepção de Pollak, Frago (1999, p.5, tradução nossa) destaca que “A
memória humana é, portanto, um processo dinâmico. Está em reconstrução permanente. Tem
um caráter transformador, recreativo e onipresente”. Nora (1993) vai ainda mais além dizendo
que
A memória é a vida, sempre carregada por grupos vivos, e nesse sentido, ela está em
permanente evolução, aberta à dialética da lembrança e do esquecimento, inconsciente de suas
deformações sucessivas [...] A memória é um fenômeno sempre atual, um elo vivido no
eterno presente” (Nora, 1993, p.9). Pode-se dizer, assim, que a memória está em constante
(re)construção e se transformando de acordo com o que o sujeito vive, sente e experiencia em
seu cotidiano, no presente. O cotidiano está presente nas memórias e lembranças. Como
pontua Halbwachs (2013) analisamos as lembranças recordadas a partir das percepções do
presente. Logo, pode-se afirmar que o que as crianças fazem, pensam e refletem no cotidiano
altera e influencia as lembranças que elas têm da comunidade. Assim, o cotidiano se apresenta
“como fonte primeira de todo o conhecimento” (Pais, 2003, p.47) sendo a nossa memória um
lugar de registro de compartilhamento do que foi vivido e experimentado pelo sujeito ou por
meio de seu grupo social.
9
Conforme afirma Halbwachs (2013), a memória é composta por recordações e
lembranças que estão inseridas dentro de um determinado contexto social que lhes garante
particularidades. Além disso, segundo o autor, a memória deve ser pensada para além do
indivíduo, acionando os grupos sociais dos quais fazem parte, e se recorrendo à análise do
contexto no qual inserido, sendo cada memória individual um ponto de vista sobre a memória
coletiva. Assim, o indivíduo que se recorda está cercado por grupos de referência com os
quais constroi sua memória. No caso das crianças que participam da Oficina Nossa, seus
grupos de referências são seus pais, amigos, professores e vizinhos.
Dessa forma, pode-se dizer que mesmo a memória individual é construída em grupo,
visto que não está totalmente isolada, carregando marcas da memória coletiva. Como afirma
Halbwachs (2013, p.30) “[...] lembranças permanecem coletivas e nos são lembradas por
outros, ainda que trate de eventos em que somente nós estivemos envolvidos e objetos que
somente nós vimos. Isso acontece porque jamais estamos sós”. Assim, mesmo que a
lembrança tenha sido vivenciada e recordada por uma pessoa, não podemos pensar nela de
forma individual visto que o sujeito está sempre inserido em um grupo social. Indo mais além,
LOGEION: Filosofia da informação, Rio de Janeiro, v. 11, ed. especial, p. 1-21, e-7387, nov. 2024.