ARTIGO
DOI: https://doi.org/10.21728/logeion.2024v11e-7396
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LOGEION: Filosofia da informação, Rio de Janeiro, v. 11, ed. especial, p. 1-12, e-7396, nov. 2024.
Análise comunicativa da pesquisa-ação pela via dos círculos argumentativos
diálogos com Habermas
Mariangela Lima de Almeida
Universidade Federal do Espírito Santo
mlalmeida.ufes@gmail.com
Bárbara Rebecca Baumgartem França
Universidade Federal do Espírito Santo
barbarabrbf@gmail.com
Gabriela Melo Santana de Oliveira
Universidade Federal do Espírito Santo
gabriela.ms.oliveira@edu.ufes.br
Letícia Soares Fernandes
Universidade Federal do Espírito Santo
fernandesletss@gmail.com
Nazareth Vidal da Silva
Universidade Federal do Espírito Santo
newpedagoga@gmail.com
Rafael Carlos Queiroz
Universidade Federal do Espírito Santo
rcqrafael@gmail.com
Rayner Raulino e Silva
Universidade Federal do Espírito Santo
raynerraulino@gmail.com
______________________________
Resumo
O texto tem como objetivo discutir acerca de uma estratégia metodológica para análise de dados em estudos de
pesquisa-ação fundamentada na teoria de Jürgen Habermas, denominada por Círculos Argumentativos. Concebe-
se a pesquisa-ação para além de uma abordagem metodológica, que tem como pressupostos centrais a relação
entre pesquisador e participante, e da ação para a mudança. Assim, a pesquisa-ação, em virtude de sua
processualidade, necessita de um método de análise capaz de explorar, em conjunto com os autores-
pesquisadores, os distintos movimentos do fazer a pesquisa, tendo a ação como condutora desse processo. Dessa
forma, a ão comunicativa de Habermas apresenta fundamentos teóricos que permitem essa construção,
considerando os conceitos de pretensões de validade, argumento, entendimento mútuo e a busca por consensos
provisórios. Assim os Círculos Argumentativos, concebidos como espaço de debate para que os enunciados do
mundo social na pesquisa educacional sejam problematizados e as pretensões de validade sejam desafiadas, se
organizam enquanto espaços de retomada dos momentos para escuta do outro, buscando o diálogo com os
autores-pesquisadores seja por meio de argumentos escritos ou pelos argumentos ditos. As contribuições deste
estudo apontam que os Círculos Argumentativos não apenas permitem uma análise crítica dos dados, como
também, promovem a autorreflexão dos autores e atores envolvidos. Portanto, o processo comunicativo, centrado
na racionalidade comunicativa, oferece uma via metodológica robusta para superar as limitações da
racionalidade instrumental predominante na pesquisa científica, especialmente em áreas como a educação.
Palavras-chave: pesquisa-ação; círculos argumentativos; análise comunicativa; Jürgen Habermas.
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1 INTRODUÇÃO
Na ciência moderna a produção do conhecimento tornou-se subordinada à
racionalidade instrumental (Habermas, 2012), pressupondo neutralidade e distanciamento do
sujeito perante o objeto pesquisado, estabelecendo uma atitude epistemológica de que apenas
aquilo testado empiricamente era verdadeiro. Deste modo, as ciências humanas foram
impregnadas por essa racionalidade, apoiada na neutralidade científica e na objetividade
(Ghedin; Franco, 2011).
Com o passar do tempo, os estudos nas áreas das ciências humanas e sociais
entenderam que a ontologia dos seus objetos diferencia-se da ontologia dos objetos das
ciências naturais, pois trata-se do ser humano e dos produtos de sua ação (Simanke, 2009), os
quais possuem subjetividades e especificidades, com enormes graus de complexidade e de
imprevisibilidade.
Nesse sentido, Habermas (2012) nos propõe uma virada de paradigma da razão, pela
via do paradigma da linguagem em sua Teoria do Agir Comunicativo, apostando na
racionalidade comunicativa como forma de estabelecer um discurso intersubjetivo com o
outro, compreendendo a subjetividade humana. Alicerçados em Habermas, apostamos na
razão comunicativa, que diferentemente da razão instrumental, “[...] não se estende a um
sujeito que se autopreserva [...] tampouco a um sistema que procura preservar sua subsistência
e se delimita em relação a um entorno” (Habermas, 2012, p. 684), ela se refere a um mundo
da vida intersubjetivamente partilhado e simbolicamente estruturado que se constitui nas
realizações interpretativas de seus participantes.
Entrementes, Habermas (2012) confere à ciência um caráter autorreflexivo, tendo por
princípio a predisposição à crítica. Desta forma, ancorados no princípio da autorreflexão, nos
propomos a realizar um ensaio acerca de um modo de análise que toma a produção do
conhecimento em pesquisa-ação como objeto de pesquisa.
Entendemos a pesquisa-ação como “[...] uma forma de investigação autorreflexiva que
os participantes realizam em situações sociais, a fim de melhorar a racionalidade e a justiça de
suas próprias práticas, sua compreensão delas e das situações em que ocorrem” (Carr;
Kemmis, 1988, p. 174, tradução nossa). Desta forma, constitui-se como uma perspectiva
teórico-metodológica a partir da qual o pesquisador busca entender o contexto sobre o qual se
pesquisa, compreender as problemáticas sociais e educacionais postas, para então refletir
acerca e propor mudanças coletivamente.
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A pesquisa-ação pressupõe o envolvimento implicado dos pesquisadores e
participantes, desta forma, “[...] essa participação cria sentidos, esse sentido é desenvolvido
pelo diálogo, pela escuta e ele se cria com o ‘estar com’ e o ‘ser mais’, esses dois elementos
são fundamentais” (Franco, 2021). É nesse contexto que a pesquisa-ação tem sido defendida
como perspectiva teórico-metodológica que nos permite romper com a lógica da racionalidade
técnica na produção de conhecimentos.
Acreditando na pesquisa-ação como forma de produção do conhecimento,
compreendemos a necessidade de empreendermos uma vigilância epistemológica acerca dela,
como nos propõe Bachelard (1989), pois, por meio dela, podemos manter o progresso
reflexivo da ciência. A vigilância epistemológica constitui-se em uma atitude reflexiva sobre
o método científico, que nos leva a “[...] submeter as verdades aproximadas da ciência e os
métodos que ela emprega a uma retificação metódica, a fim de nos libertarmos das ideologias,
das crenças, das opiniões, das certezas imediatas e chegarmos, assim, à objetividade
científica” (Japiassú, 1988, p. 19-20).
No sentido de nos libertarmos das amarras e de qualquer forma de coação imposta aos
sujeitos, Habermas (2012) nos propõe a assunção de uma ação comunicativa, que tenha
interesse e caráter emancipatório. Para o teórico, a lógica da razão instrumental encontra cada
vez mais espaço para sua expansão e entrada na ciência moderna, especialmente nos setores
culturais que não admitem ser guiados pela busca de dinheiro e poder. Esse fenômeno gera
“patologias sociais que acabam por ameaçar o sistema como um todo e podem entravar o
desenvolvimento não da lógica instrumental como da lógica da razão comunicativa ao
nível social” (Baumgarten, 1998, p. 17).
Diante disso, temos uma preocupação com relação às consequências desse fenômeno
na ciência da educação. Precisamos nos atentar para a qualidade das pesquisas e para as
contribuições dessas para o contexto educacional. Assim, Gamboa (2012) nos apresenta uma
inquietação quanto à identificação do grau de correspondência às necessidades reais da
investigação em educação, bem como quanto à importância de se detectar se as pesquisas
estão preocupadas em empreender mudanças reais nas estruturas da sociedade ou se apenas
estão orientadas na direção da conservação do status quo.
Nesse contexto, o Grupo de Pesquisa “Formação, Pesquisa-ação e Gestão em
Educação Especial” (Grufopees - CNPq/Ufes), no qual estamos inseridos, vem se debruçando
acerca da constituição de um método de análise comunicativo fundamentado na teoria
habermasiana, que possa captar as racionalidades explícitas e implícitas nos modos de ação da
pesquisa-ação nas produções científicas.
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Partindo desse contexto, este artigo busca analisar a possibilidade de construção de
uma estratégia metodológica para análise de dados em estudos de pesquisa-ação
fundamentada na teoria de Jürgen Habermas, denominada Círculos Argumentativos, sobre os
quais discutiremos a seguir.
2 DISCUSSÃO
Mediante os desafios epistemológicos impostos pela pesquisa-ação ao pesquisador, e a
busca por analisar a possibilidade de construção de uma estratégia metodológica para análise
de dados em estudos de pesquisa-ação fundamentada na teoria de Jürgen Habermas,
denominada por Círculos Argumentativos, adota-se uma postura de "vigilância
epistemológica", a qual apresenta Bachelard (1996): uma atitude reflexiva sobre o método
científico, uma atitude que nos leve a apreender a lógica do “erro” para construir a lógica da
descoberta científica.
Vigilância ‘para perceber o inesperado, para aperfeiçoar o método e para vigiar a
própria vigilância’ (Bachelard, 1989). Isto é, vigilância para revisar
permanentemente os limites do próprio conhecimento e, assim, abrir novos
horizontes para o desenvolvimento do conhecimento humano (Gamboa, 2007, p.
61).
Desse modo, investimos na construção de estratégias metodológicas que possam
contribuir para com os pesquisadores que se dedicam a produzir conhecimentos a partir da
pesquisa-ação. Considerando que a pesquisa-ação tem como um dos pressupostos a relação
entre pesquisador e participante, temos na ação comunicativa de Habermas fundamentos
teóricos que nos permitem essa construção de estratégias, considerando os conceitos de
pretensão de validade, discurso, entendimento mútuo e a busca por consensos provisórios.
No processo de análise dos dados pela via dos Círculos Argumentativos, o argumento
é o pressuposto que o conduz. Desse modo, “[...] a partir dos argumentos levantados pelos
autores nos momentos de discurso, pelo entendimento mútuo, alcançamos um acordo
(Almeida, 2019, p. 31). Os argumentos são meios pelos quais o reconhecimento intersubjetivo
de uma pretensão de validade de um proponente (proponent), levantada hipoteticamente, pode
ser transformada em conhecimento (Habermas, 2012). De acordo com Bannell (2013), na
[...] correspondente pretensão de validade [...] sempre a possibilidade de se entrar
em uma forma reflexiva do agir comunicativo, o que Habermas chama de Discurso,
com o objetivo de resolver, pela argumentação, a validade da pretensão levantada. os
tipos de argumentação (Discurso) analisados por Habermas são: o Discurso Teórico,
que avalia pretensões de validade da verdade proposicional; o Discurso Prático, que
avalia pretensões de validade das normas de ação [...] (Bannell, 2013, p. 47).
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Com os dados obtidos, analisa-se de forma dialógica a partir dos pressupostos da
Teoria do Agir Comunicativo de Habermas, estratégia na qual se deu os “Círculos
Argumentativos”. Assim,
[...] na esfera do discurso os argumentos são levantados sobre os atos de fala dos
sujeitos, com vistas a fundamentar pretensões de validade. No pensamento de
Habermas (2003), o discurso é um momento filosófico privilegiado em que os
sujeitos (sociais) são atores-agentes do conhecimento com base no mundo vivido.
Na perspectiva da racionalidade comunicativa, os atos comunicativos assumem
pertinência na busca pelo entendimento e pela produção do conhecimento (Almeida,
2010, p. 65).
Deste modo, através das situações de discursos a proposta dos “Círculos
Argumentativos”, se dá pela combinação das diferentes falas e do estreito diálogo
estabelecido em conjunto com autores-pesquisadores, levando-se em conta os “atos de fala”
(Almeida, 2010), expressos nas produções. Neste sentido, os discursos e os modos com que os
argumentos vão se construindo no processo comunicativo, dependem das pretensões de
validade levantadas pelos falantes, estas pretensões compõem-se pela: pretensão do enunciado
como verdade, pretensão de que a ação de fala seja direta e esteja correta e que a intenção
proferida pelo falante representa o que realmente pensa (Habermas, 2012).
De acordo com o dicionário Michaelis, círculo (s.m.) é definido como: “[...] 4.
Movimento circular; circuito, giro, rotação. [...] 7. Grupo de indivíduos pertencentes a algum
campo de atividade ou ligados por interesses ou sentimentos comuns [...]” (Círculo, 2021).
Sendo assim, pode-se compreender os Círculos Argumentativos enquanto espaços de debate
onde os autores-pesquisadores e atores-pesquisadores e seus discursos, com diferentes
intencionalidades, expõem suas concepções, reflexões, proposições, seus conceitos,
argumentos, anseios, desejos, em busca de consensos e acordos possíveis que visem alcançar
entendimento mútuo.
Assim, o entendimento mútuo, é construído nas relações que estabelecem por meio do
diálogo entre os sujeitos envolvidos no processo comunicativo, esta dinâmica pode alcançar
os consensos, estes sempre provisórios, pois podem ser diferentes dependendo das situações e
contextos em que o levantadas as pretensões e colocadas em discussão (França, 2023).
Neste sentido, o entendimento mútuo pode ser concebido também como “[...] a realidade
complexa a que chegam os agentes de interação e que reflete a evolução social que
alcançada por meio de um processo dialético que leva a uma melhor compreensão do mundo
(Silva; Fonseca, Vicenzi, 2019, p. 4).
Evidencia-se que “[...] a meta do entendimento é chegar a um consenso [...]” (Gomes,
2006, p. 7). O consenso por sua vez, na percepção habermasiana é constituído quando “[...] os
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participantes superam suas concepções inicialmente subjetivas e parciais em favor de um
acordo racionalmente motivado [...]” (Habermas, 2000, p. 438). Sendo assim, o consenso
[...] é entendido como um acordo que ocorre à luz do reconhecimento intersubjetivo
das pretensões de validade de um discurso, ou seja, um consenso que se estabelece,
por intermédio de um exercício racional de argumentação não coercitivo, que
sempre pressupõe no processo comunicativo: a compreensão, a verdade, a
sinceridade e a justiça [...] (Gomes, 2006, p. 9-10).
Assim os Círculos Argumentativos se organizam enquanto espaços de retomada dos
momentos para escuta do outro (Almeida, 2010), buscando o diálogo com os autores-
pesquisadores seja de documentos, entrevistas ou produções científicas. Portanto, procura-se
reconhecer os argumentos colocados pelos autores-pesquisadores em seus discursos através
dos textos escritos e falados. Para isso, possibilitam desenvolver análises que ocorram por
meio de debates abertos, no sentido habermasiano, de modo que de acordo com as diferentes
necessidades de pesquisa possam ser criadas novas situações de diálogo, possibilitando a
imersão do pesquisador nos Círculos Argumentativos. Buscando apresentar de que modo
estas dinâmicas de diálogo se dão nos Círculos Argumentativos, evidenciamos figura a seguir:
Figura 1 - Movimento de análise dos Círculos Argumentativos
Fonte: Elaboração dos autores.
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A interpretação do pesquisador, principal mediador das situações de discurso,
sustenta-se no diálogo entrelaçado entre argumentos e justificativas dos autores expressos nos
textos da produção acadêmico-científica e as narrativas provenientes dos espaços discursivos
em que é possível captar a pesquisa-ação em movimento e os múltiplos contextos em que se
essa produção. Por meio dos argumentos e das justificativas apresentadas pelos autores,
permite que os dados em análise apresentem discursos relevantes para a interpretação do
pesquisador, principal mediador das discussões.
A compreensão desencadeada a partir da apresentação e diálogos promovidos,
necessita de um amplo e forte embasamento teórico-conceitual sobre a temática. Estes
movimentos possibilitam perceber intencionalidades implícitas e explícitas que se dão no
decorrer do processo de pesquisa.
À medida que os entendimentos internos e externos ocorrem, evidenciam-se
perspectivas sobre o mundo e sobre o homem, podendo revelar assim estes elementos.
Sobretudo, a forma de se abordar e lidar com o conhecimento que se produz, possibilita captar
aquilo que está para além da escrita, ou seja, os sentidos que orientam a vida do próprio
sujeito-autor (Gamboa, 2018).
No Grufopees (CNPq/Ufes) foram defendidas uma tese (Almeida, 2010) e três
dissertações (França, 2023; Fernandes, 2024; Prederigo, 2024) que tomaram os Círculos
Argumentativos especialmente como forma de análise dos dados produzidos nas pesquisas.
No caso da tese de Almeida (2010), a autora teve como intuito analisar os pressupostos
teórico-metodológicos e epistemológicos usados em dissertações e teses produzidas no Brasil
entre os anos de 1999 a 2008, considerando os estudos que tomam a pesquisa-ação como
forma de investigação em estudos na área de Educação Especial na perspectiva da inclusão
escolar. Com o estudo, chegou a um consenso provisório com os quarenta e cinco (45)
autores-pesquisadores de que podem existir diferentes racionalidades nas pesquisas-ações, ou
seja as abordagens que sustentam a pesquisa-ação quanto os diferentes “tipos” em um mesmo
estudo, tendem a constituir um movimento da pesquisa considerando as relações estabelecidas
entre os sujeito-objeto-sujeito na realização de ações no processo investigativo.
A pesquisa de França (2023) teve como objetivo discutir com as produções científicas
do Grufopees/CNPq-Ufes considerando a pesquisa-ação na interface com a formação
continuada na área de educação especial na perspectiva da inclusão escolar, elencando
principais elementos epistemológicos e pressupostos filosóficos que compõem a construção
de conhecimentos. Portanto, por meio da análise chegou ao entendimento de que o grupo se
destaca pela aposta na pesquisa-ação colaborativo-crítica sobre a possibilidade de criar
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espaços para transformação social emancipatória, no empoderamento e fortalecimento das
ações dos sujeitos envolvidos, tendo ações efetivas por meio da oficialização de políticas
formativas expressas em documentos, projetos e produções científicas que apontam para a
potencialidade de pensar a formação continuada na perspectiva de inclusão escolar.
O estudo de Fernandes (2024) objetivou compreender, a partir dos círculos
argumentativos, a articulação das demandas formativas dos participantes da pesquisa às ações
realizadas nas pesquisas-ações. A autora teve como foco as produções no âmbito do mestrado
no Brasil e em Portugal e no principal círculo argumentativo realizado, promoveu um diálogo
entre os argumentos escritos dos autores presentes nas dissertações de mestrado (Brasil) e nos
relatórios de estágio (Portugal), bem como os argumentos ditos dos autores que participaram
dos espaços discursivos em grupo e os elementos de contexto (educacionais e institucionais).
Fernandes (2024) enquanto mediadora do círculo argumentativo chegou a um
entendimento mútuo, por meio da argumentação dos autores-pesquisadores e da própria
autora, de que as necessidades formativas dos sujeitos (estudantes, professores, gestores) são
consideradas em todos os momentos do processo da pesquisa-ação, perpassando a
compreensão do contexto de pesquisa, a constituição do problema de pesquisa, o
planejamento das ações, o empreendimento das ações e a reflexão sobre as ações realizadas.
Prederigo (2024), por sua vez, teve como intuito compreender as teses defendidas a
partir da perspectiva teórico-metodológica de pesquisa-ação que se voltam para a temática de
formação de profissionais da educação e inclusão escolar. Para tanto, realizou espaços
discursivos individualmente com autores-pesquisadores da Universidade Federal do Espírito
Santo (Ufes) e da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), bem como a
análise das pesquisas realizadas por esses autores. Ao desenvolver dois círculos
argumentativos que buscaram entender como os autores-pesquisadores se apropriaram dos
aspectos teóricos, metodológicos e epistemológicos da pesquisa-ação, e os processos
formativos desencadeados durante o percurso de desenvolvimento do doutorado.
Assim, chegou a um consenso provisório de que no movimento de ação no campo
pesquisado, valorização da figura dos participantes em suas pesquisas, e a busca pela
inserção nos processos da investigação. sobretudo os autores indicaram diferentes
aprendizados diante a disposição de abertura para troca com o outro, e na ampliação do seu
olhar para outras realidades, neste sentido a imersão e participação no campo pesquisado
possibilitam processos reflexivos e formativos para o próprio pesquisador que realiza o
processo.
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Desta forma, a partir das pesquisas realizadas vemos que os círculos argumentativos
têm se tornado espaços de argumentação com os autores-pesquisadores que realizam
pesquisas-ações, evidenciando a importância de estarmos atentos, especialmente, aos aspectos
teóricos, metodológicos e epistemológicos que perpassam essa metodologia de pesquisa.
Ademais, vemos a possibilidade de construir conhecimento em diálogo com o outro pela via
da argumentação.
3 CONSIDERAÇÕES
Este estudo teve como objetivo discutir acerca de uma estratégia metodológica para
análise de dados em estudos de pesquisa-ação fundamentada na teoria de Jürgen Habermas,
denominada por Círculos Argumentativos. À luz da Teoria do Agir Comunicativo, os
Círculos Argumentativos oferecem um espaço dialógico onde as pretensões de validade o
continuamente desafiadas e reconstruídas através da interação entre autores-pesquisadores e
atores-pesquisadores. Isso ocorre por meio da troca de argumentos, com o intuito de alcançar
consensos provisórios, essenciais para a construção de conhecimentos mais profundos e
coletivamente significativos.
As contribuições deste estudo apontam que os Círculos Argumentativos não apenas
permitem uma análise crítica dos dados, como também, promovem a autorreflexão dos
autores e atores envolvidos. Portanto, o processo comunicativo, centrado na racionalidade
comunicativa, oferece uma via metodológica robusta para superar as limitações da
racionalidade instrumental predominante na pesquisa científica, especialmente em áreas como
a educação. Logo, ao trabalharmos com os Círculos Argumentativos em investigações
baseadas na pesquisa-ação, foi possível observar que esse método analítico cria um ambiente
colaborativo, onde a escuta sensível e o reconhecimento das diferentes perspectivas
contribuem para um entendimento mais profundo das problemáticas investigadas. Assim, essa
abordagem demonstra seu potencial não apenas para a análise de dados, mas também como
um processo formativo que transforma tanto os autores-pesquisadores quanto os atores-
pesquisadores investigados, ao promover a emancipação e a justiça nas práticas sociais e
educacionais em busca da transformação da realidade.
Chegamos à conclusão que a construção de uma metodologia de análise de dados pela
via dos Círculos Argumentativos, fundamentada na teoria habermasiana, é altamente crítica-
emancipatória. Essa metodologia possibilita uma investigação mais dialógica e reflexiva,
capaz de gerar conhecimento emancipatório e de desafiar as estruturas sociais e
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epistemológicas que sustentam as práticas educacionais tradicionais. A continuidade dos
estudos sobre os Círculos Argumentativos permitirá o aperfeiçoamento dessa estratégia
metodológica e sua ampliação para outros campos da ciência, especialmente aqueles que
lidam com o complexo entrelaçamento de subjetividades, como a educação. Dessa forma,
reafirma-se a importância da vigilância epistemológica na pesquisa-ação, garantindo que o
processo de produção de conhecimento seja reflexivo, crítico e voltado para a transformação
social.
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