APRESENTAÇÃO
v.5, n. 2, Mar./Ago. 2019
O grupo de pesquisa Economias colaborativas e produção P2P no Brasil ratifica seu compromisso com as economias colaborativas e solidárias e com as inovações da produção orientadas para o comum e o bem estar. A publicação da revista P2P&Inovação faz parte deste compromisso.
Nestes tempos em que as vozes do capital fazem coros poderosos e os refrões do cálculo econômico parecem invadir todas as esferas da vida em sociedade, torna-se necessário o contraponto da solidariedade e das economias colaborativas. As dissidências devem ir além da grande recusa e construir o sonho de um outro mundo possível.
A inovação não é apenas a produção da mercadoria, mas é principalmente a capacidade de enfrentar as ameaças e os desafios do mundo da vida. Temos que encontrar saídas onde parecem existir apenas becos e precipícios. Inovar é ir além das fronteiras e dos muros.
Os artigos desta edição compõem um tecido denso de abordagens inovadoras e criticas sobre o escopo da revista. Os autores estão sintonizados com o ar do nosso tempo e isto garante uma leitura que certamente vai agradar a quem busca referências para ir além do conhecimento estabelecido.
O artigo “Do direito da liberdade à solidariedade”, de Anderson Alencar de Menezes e Dalmo Cavalcante de Moura, traz uma reconstrução conceitual a partir da discussão da liberdade e do justo por Axl Honneth. Os autores trabalham com quatro premissas: 1. a reprodução social e a integração cultural são regulados por normas, como bem maior coletivo; 2. o conceito de justiça implica a aceitação dos valores nas práticas e instituições da sociedade; 3. a diversidade da realidade social é aceita e selecionada para assegurar os valores universas; 4. uma teoria da justiça é uma forma de análise da sociedade que pressupõe a reconstrução normativa e a crítica as várias estâncias da eticidade.
A solidariedade se converteu em tema. As forças reguladoras do poder e do dinheiro atravessam a sociedade. A resistência e a dissidência passam pelos vínculos sociais e pela construção de intersubjetividades. É necessário organizar a base da sociedade em torno da dignidade e do justo com liberdade. A solidariedade é o amálgama neste processo.
Apresentamos o primeiro capitulo do relatório “P2P Accounting for Planetary Survival”, produzido pela P2P Foundation e organizado por Michel Bauwens. É um texto visionário, que oferece a perspectiva de infraestruturas futuras. A questão central deste relatório é como mudar o sistema que incentiva e recompensa a exploração, mas não reconhece e incentiva a produção de riquezas por atividades “generativas".
O artigo traz o resultado de 10 anos de atividades da P2P Foundation e dos seus parceiros em programas de pesquisa do Commons. Ele sumariza o que se sabe da economia emergente do Commons. Destaca a importância da invenção do “blockchain" (protocolos de confiança), que traz consigo a necessidade de desenvolver contabilidades distribuídas. Finalmente, o artigo orienta as bases para construção de uma sociedade centrada na produção do Commons.
Suzana Iglesias Webering em seu ensaio “Economia social, non-profit sector, terceiro setor ou economia solidária: sentidos, diferenças e similaridades” faz uma revisão de literatura sobre conceitos, buscando evidenciar suas distinções. A autora encontra os conceitos de cooperação e autogestão como referências. Conclui destacando os aspectos organizacionais das economias colaborativas.
“Uso de bicicleta nas cidades brasileiras de pequeno porte”, de Daniel Guth e Victor Andrade Carneiro da Silva, apresenta os resultados de uma pesquisa exploratória em 10 cidades brasileiras. Seu trabalho destaca os atributos da cultura da bicicleta, apresentando os efeitos do uso de automóveis. Os resultados mostram mudanças profundas nos hábitos de locomoção, com migração modal e efeitos sobre variáveis que impactam a qualidade de vida nestas cidades. Este tipo de pesquisa é fundamental para políticas públicas de mobilidade, incluindo a promoção da qualidade de vida e da sustentabilidade socioambiental.
O artigo “Instituições científicas e tecnológicas no Brasil”, de Luana da Silva Ribeiro, Faíque Ribeiro Lima e Hugo Márcio Vieira de Almeida Andrade, discute como as interações entre Estado, Universidade e empresas contribuem para ambientes de inovação. Os autores fizeram uma revisão bibliográfica e analise de dados do governo. Nos países em desenvolvimento o Estado tem papel importante para o fomento das inovações. Os autores consideram que o Brasil possui um sistema de inovação não consolidado, dependente de tecnologia estrangeira e com infraestrutura precária. Eles afirmam a necessidade de aumentar a conexão da Universidade com o sistema produtivo. Concluem que há necessidade de investir na política nacional de inovação.
Juliana Gonçalves Reis, Haydée Maria Correia da Silveira Batista, Adauto Dutra Moraes Barbosa e Martius Vicente Rodriguez y Rodriguez apresentam “Análise Bio-bibliométrica: o caso Cesar Gomes Victora” com o objetivo de mapear a evolução da rede de colaboração e o acúmulo do capital científico do medico pediatra e epidemiologista gaúcho Cesar Gomes Victora ao longo de 40 anos. Os autores usaram a base de dados bibliográficos Scopus como fonte principal para composição do corpus das redes de autores. Eles encontraram 502 artigos de periódicos, separados em quatro coleções por décadas entre 1977 e 2016. A partir deste corpo traçaram uma linha do tempo das redes de colaboração e do acúmulo de capital científico. Os resultados mostram o crescimento expressivo do número de publicações e de colaborações nas quatro décadas, com maior expressão nos últimos 20 anos. O acúmulo do capital científico conferiram a Cesar Victora uma singular autoridade internacional no campo da saúde, especialmente na saúde materno-infantil.
“A Transformação digital e a gestão do conhecimento: contribuições para a melhoria dos processos produtivos e organizacionais” é o artigo de Ricardo Alexandre Diogo, Armando Kolbe Junior e Neri dos Santos.
Os autores falam da Transformação Digital, também chamada de Indústria 4.0, que tem implementado tecnologias para melhoria e inovação dos processos produtivos e de gestão organizacional. Nesse cenário eles discutem como a Gestão do Conhecimento pode contribuir para a transformação nas organizações e, ao mesmo tempo, como esta colabora para a Gestão do Conhecimento. Os autores fizeram uma interessante revisão da literatura sobre a relação dos pilares da Indústria 4.0 e dos Sistemas Ciber Físicos com a Gestão do Conhecimento.
Ana Carolina Dantas apresenta “Problemas e riscos enfrentados em projetos de ROLLOUT global do ERP SAP”, que parte da busca das organizações para ter na gestão da informação um diferencial competitivo. Os softwares de gestão ERP (Enterprise Resource Planning) são usados como ferramenta de gestão através da integração das informações. O artigo aborda os riscos e impactos no rollout de um sistema ERP e a sua importância na tomada de decisões. Foram realizadas pesquisa contextualizando a introdução do software e estudo de caso em uma empresa. A pesquisa aborda os principais aspectos da implementação do ERP, analisando requisitos e retornos da implementação bem como funcionalidades do software SAP. Os concluem que os benefícios obtidos com o ERP são compensam.
O artigo “Competência comunicativa para problematização e aprendizagem em organizações” de Clóvis Ricardo Montenegro de Lima, Helen Fischer Günther e José Rodolfo Tenório Lima, discute a competência comunicativa na relação entre discurso e aprendizagem. Os autores usam como referencial o agir comunicativo para caracterização da competência comunicativa. Eles explicitam a convergência entre Habermas, Freire e Piaget, em que o agir comunicativo proporciona aprendizagem do sujeito como uma permanente construção. A competência comunicativa emerge como aptidão que, além de linguística, é definida pela aprendizagem que, racionalmente, critica e constrói. Conclui-se que a aprendizagem, considerada como uma reconstrução racional, pressupõe interação entre os sujeitos, e possibilita o entendimento em torno do melhor argumento.
Fazemos esta publicação com agradecimentos e uma homenagem. Agradecemos a equipe editorial da revista: Ariane Maciel, Daniela Capri, Kátia Simões, Mariângela Maia e Tirza Rodrigues. O trabalho delas é fundamental para garantir a qualidade da revista. Homenageamos a Aldo Albuquerque Barreto, pesquisador sênior da Ciência da Informação e membro do Comitê Editorial da revista, que faleceu faz um ano. Segue sendo uma referência.
Gostaria de finalizar esta apresentação desejando que nossos leitores tenham uma boa experiência com esta edição da revista. Em tempos difíceis o conhecimento é uma luz que orienta, e proporciona alegrias na alma.
Rio de Janeiro, 01 de março de 2019
Clóvis Ricardo Montenegro de Lima
Editor