A ECONOMIA SOLIDÁRIA COMO RESPOSTA À CRISE PANDÊMICA E FATOR DE OUTRO TIPO DE DESENVOLVIMENTO

 

André Ricardo de Souza[1]

Universidade Federal de São Carlos

anrisouza@uol.com.br

Fausto Augusto Júnior[2]

Departamento Intersindical de Estísticas e Estudos Socioeconômicos

fausto@dieese.org.br

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Resumo

O artigo ressalta aspectos da desigualdade e da profunda crise econômica que afeta o Brasil em face da pandemia Covid-19, apontando a economia solidária como um importante conjunto de práticas no enfrentamento dessa realidade. Discute aspectos que envolvem os empreendimentos econômicos solidários e o seu entorno, apresentando propostas não só para a preservação, mas também para o fortalecimento deles, na perspectiva de um possível outro tipo de desenvolvimento socioeconômico no cenário pós-pandemia.

Palavras-chave: Crise pandêmica. Desigualdade. Economia Solidária. Políticas Públicas. Economia de Francisco e Clara.

The solidarity economy as a response to the pandemic crisis and a factor in other type of development

 

Abstract

The article highlights aspects of inequality and the profound economic crisis that affects Brazil in the face of the Covid-19 pandemic, pointing out the solidarity economy as an important set of practices to face this reality. It discusses aspects that involve solidary economic enterprises and their surroundings, presenting proposals not only for their preservation, but also for their strengthening, in the perspective of a possible other type of socioeconomic development in the post-pandemic scenario.

Keywords: Pandemic Crisis. Inequality. Solidarity Economy. Public Policies. Economy of Francis and Clare.

1  INTRODUÇÃO

Em decorrência da pandemia do novo coronavírus, o Brasil, assim como vários outros países, mergulhou numa profunda crise econômica, com alto grau de desemprego, acirramento da informalidade e fechamento de empresas. Encerramos o primeiro semestre de 2020 com uma taxa de desemprego oficial de 13,3%, ou seja, 12,8 milhões de pessoas nessa condição. Estes números, porém, só constituem a ponta de nossa tragédia social, pois ao longo deste mesmo período, um enorme contingente saiu do mercado de trabalho, reduzindo o número de ocupados em mais de 10% em relação ao mesmo período de 2019. Isso significa que o país perdeu cerca de 10 milhões de postos de trabalho, dado que se soma à quantidade de desempregados em busca de recolocação[3].

A pandemia também explicitou a fragilidade de um mercado de trabalho estruturalmente marcado pelo fato de quase a metade da população economicamente ativa estar na informalidade, sem acesso à proteção previdenciária e aos direitos trabalhistas assegurados. No primeiro semestre de 2020, o número de trabalhadores por conta-própria e familiares sem registro no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) e de empregados sem carteira assinada, incluindo os trabalhadores domésticos, atingiu a marca de 30,1 milhões, conjunto que, em meio à necessidade de isolamento social, viu sua renda cair a quase zero num espaço de tempo muito curto.

Ademais, por causa da pandemia mais de 520 mil empresas encerraram suas atividades e 62,4% dos mais de 4 milhões de empreendimentos viram suas atividades impactadas pelas medidas de contenção do vírus. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e do Ministério da Economia, 15% das empresas reduziram postos de trabalho[4] e mais de 1,4 milhão delas suspendendo e ou reduzindo jornada e salário de cerca de 9,5 milhões trabalhadores[5].

Tudo isso reduziu a massa salarial, ou seja, a soma de todos os rendimentos dos trabalhadores em R$ 12 bilhões no trimestre em que a pandemia avançou (abril, maio e junho) em relação ao anterior, impactando decisivamente o consumo e a produção econômica no país, que, segundo estimativas do Banco Mundial, deve derrubar o Produto Interno Bruto (PIB) em 8%[6].

Diante deste cenário, uma proposta com base em experiências existentes no país já há três décadas, reaparece com força no debate a respeito do enfrentamento da crise. Trata-se de um amplo conjunto de iniciativas coletivistas de produção, comércio, consumo, poupança e crédito, pautadas por princípios igualitários e democráticos, chamada economia solidária. Ela abrange cooperativas - rurais e urbanas - empresas recuperadas ou em reabilitação de processos falimentares, pequenos empreendimentos associativos (pré-cooperativas), bancos comunitários e associações locais de troca de mercadorias e serviços mediante o uso de uma moeda social própria (SINGER; SOUZA, 2000; SINGER, 2002; CATTANI, 2003). Baseia-se na retomada dos princípios do cooperativismo europeu e pioneiro do século XIX, próprios da autogestão (SINGER, 1998).

A economia solidária se desenvolveu ao longo dos anos 1990 e início da década seguinte a partir de diversas experiências existentes em vários lugares do país. Tais iniciativas foram gradativamente se aglutinando através de feiras, fóruns, plenárias e atividades afins, de modo a constituir um movimento nacional. Vale dizer que nos empreendimentos econômicos solidários não há o que Marx (1975) denominou mais valia, a parte decorrente da produção do trabalhador que não lhe é paga na forma de salário ou participação nos lucros, mas sim geradora de acumulação capitalista. Na economia solidária a absoluta maioria dos trabalhadores não recebe salários, mas sim retiradas, sendo que eles, enquanto também proprietários dos empreendimentos, não têm seus excedentes chamados de lucro, mas sim de ‘sobras’. Vejamos o que se sabe da sua composição empírica no país.

Conforme dados de 2013, a economia solidária envolvia cerca de 1,5 milhões de trabalhadores em 19.708 empreendimentos distribuídos em 2.713 municípios, segundo estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) a partir dos dados do Sistema de Informações da Economia Solidária (SIES). Vale dizer que em 1999, a quantidade de pessoas engajadas em tais unidades produtivas era de aproximadamente 100 mil (SINGER; SOUZA, 2000), tendo havido em 14 anos, portanto, um crescimento de 1500%. Conforme o mapeamento realizado até 2013, a predominância dos empreendimentos encontrava-se na região Nordeste (40,8%), sendo que a maioria (54,8%) se situava na zona rural. No que se refere aos setores, 56,2% eram unidades de produção e comercialização e 20,1% organizavam o consumo e o uso coletivo de bens e serviços.

Quanto à forma de organização, os dados analisados por Silva e Carneiro (2016) indicam que 60% estavam formalizados como associações e 8,8% como cooperativas, sendo que 30,5% permaneciam operando informalmente. Em relação ao número de trabalhadores por empreendimento, 41,7% não ultrapassavam 20 sócios, 32,6% tinham entre 20 e 50 participantes e somente 25,7% abrangiam mais de 50 pessoas envolvidas na atividade, sendo que na grande maioria (69,7%) atingiam um faturamento mensal de até R$ 10 mil.

Entre as pessoas engajadas nos empreendimentos solidários, 56,4% eram homens e 43,6% eram mulheres, sendo que entre os empreendimentos informais essa proporção se invertia, com 63,2% de mulheres. Em relação à centralidade da renda obtida nos empreendimentos, para 45,8% dos trabalhadores que responderam a pesquisa (38,2% segundo o estudo) os ganhos gerados eram sua principal fonte de renda, enquanto para 54,2% tinham caráter complementar à renda familiar. Com relação às dificuldades dos empreendimentos, chamava atenção a demanda por capital de giro, relatada por 54,3% dos empreendimentos que realizavam comercialização de bens e serviços, sendo que 69,2% relataram a necessidade de crédito, algo pouco suprido devido à informalidade e também por exigências de garantia, problemas na elaboração de projetos para financiamento e altas taxas de juros, entre outras dificuldades.

Por fim, cabe destacar que do conjunto de empreendimentos analisados mediante o mapeamento 57,6% não participavam de nenhum movimento sindical ou social, o que coloca a necessidade de uma reflexão sobre como essas experiências concretas de economia solidária se organizam para além da geração de renda.

 

2  A DESIGUALDADE E A RENDA BÁSICA COMO POSSÍVEL SUPORTE À ECONOMIA SOLIDÁRIA

O Brasil é um dos países mais desiguais do mundo. Segundo o último relatório divulgado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), somente seis nações - todas africanas - são mais desiguais[7] quando comparadas pelo índice de GINI[8].

O rendimento médio real de R$ 2.500,00, conforme apontado pela Pesquisa Nacional de Amostra Domiciliar (PNAD-IBGE) diz muito pouco quando observamos como a massa de rendimento é distribuída, em que 43% do total está concentrada nas mãos dos 10% mais ricos, sendo que a soma da renda dos 10% mais pobres não chega a 1%. Quando observamos as faixas de rendimento, metade da população brasileira vive com uma renda mensal de R$ 438,00 ou R$ 15,00 por dia, sendo que 21 milhões de pessoas sobrevivem com R$ 112,00 por mês ou R$ 3,73 por dia.

Esse quadro de enorme desigualdade se agravou no atual contexto da profunda crise socioeconômica em face da pandemia do coronavírus e recolocou a bandeira da renda mínima mobilizando os movimentos sociais e sindicais, bem como as organizações da sociedade civil e os partidos de esquerda, algo que levou o Congresso Nacional a aprovar em abril de 2020 um auxílio emergencial para mais de 60 milhões de pessoas.

Vislumbra-se, no Brasil e em diversos países, a passagem dessa renda emergencial para a universal e perene renda básica da cidadania, algo que possibilite a toda pessoa ter resguardada sua sobrevivência e de sua família enquanto um direito assegurado pelo Estado (PARIIS, 1995; SUPLICY, 2013). Para tanto, deverá haver um fundo específico a ser alimentado também com recursos decorrentes de impostos progressivos contemplando a taxação condizente de grandes lucros e fortunas. A existência de uma renda básica assegurada, além de permitir que as pessoas se livrem da sujeição ao trabalho aviltante, também reforça a liberdade delas para optarem não por um emprego assalariado, mas sim pela composição de um empreendimento de economia solidária, necessariamente pautado pela autogestão.

 

3  DEMOCRATIZAÇÃO DE FINANÇAS

O problema do crédito é uma das amarras do desenvolvimento econômico e social no Brasil. As altas taxas de juros e a dificuldade de acesso dos pequenos empreendimentos e da população mais pobre, em geral, têm, de um lado, transferido renda dos mais pobres aos mais ricos e, de outro, do setor produtivo ao setor financeiro. Na atual crise sanitária, econômica e social essa realidade tem como causa o fechamento de um conjunto enorme de micro e pequenas empresas que não conseguem acessar crédito de capital de giro. Segundo estudo realizado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), as 17,3 milhões de unidades produtivas desse tipo no país demandam para enfrentar a atual crise um volume de crédito da ordem de 472 bilhões de reais. Porém, segundo o Ministério da Economia, as micro e pequenas empresas tomaram emprestado tão somente 17,69 bilhões de reais junto ao sistema financeiro, o que significa apenas 8,75% do valor necessário para elas.

É neste perfil econômico de micro e pequenas empresas, especialmente vinculadas aos segmentos mais pobres, que estão organizados os empreendimentos de economia solidária, que, com garantias documentais e monetárias muito limitadas, estão excluídos dos mecanismos tradicionais de crédito do setor financeiro, demandando, portanto, o desenvolvimento de um novo sistema bancário solidário.

Na perspectiva de outro modelo de crédito e finanças - pautado não pela lógica do lucro e da acumulação, mas sim pela solidariedade e a autogestão - encontram-se os bancos comunitários. Estes constituem organizações que, ao contrário dos bancos convencionais, oferecem crédito e demais serviços financeiros exclusivamente a pessoas e grupos de produção e serviços localizados em áreas bastante periféricas das cidades. Tais organizações decorrem de agrupamentos populares e associações de moradores de bairro de periferias urbanas. A primeira e também a mais conhecida organização desse tipo no país é o Banco Palmas, surgido em 1998 no Conjunto Palmeira, situado na periferia de Fortaleza (SEGUNDO; MAGALHÃES, 2009). A partir do grupo Palmas, liderado por Joaquim Melo, foi formada uma Rede de Bancos Comunitários composta por 115 unidades fixadas em 90 municípios de 22 unidades federativas, com destaque para o Ceará. Cada banco desse tipo conta com sua moeda social específica - em substituição e complementação ao real - tendo um nome próprio e circulação local.

Uma unidade desse tipo oferece crédito solidário e serviços financeiros, como recebimento de contas e pagamento de subvenções e aposentadorias. Seu papel nas regiões onde se inserem tem sido importante pelo grande estímulo à economia local e, no contexto da pandemia, por fazer adiantamentos na forma de moeda social aos trabalhadores que recebem o governamental auxílio emergencial, de modo que estes possam fazer suas compras, também localmente. Basicamente, reivindicam: favoráveis parcerias com instituições financeiras públicas (superando o que já houve em relação ao Banco do Brasil); facilitação normativa dos procedimentos e incentivo governamental para a abertura de vários novos bancos comunitários; e que a atual renda emergencial e a futura renda básica da cidadania venham a ser pagas aos indivíduos através deles. Os bancos comunitários já financiam trabalhadores autônomos e pequenos comerciantes, assim como empreendimentos econômicos solidários e pleiteiam poder fazer isso de modo mais robusto.

Outra iniciativa condizente e bastante relevante tem o nome de Financiamento Popular (Finapop) e surgiu em maio deste ano através de uma parceria entre o ex-banqueiro Eduardo Moreira e o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). A inspiração para isso foi a prática do holandês Banco Triodos, existente desde 1980, através do qual correntistas escolhem onde seus recursos são investidos, considerando, sobremaneira, critérios ambientais. Através do Finapop, houve financiamento de R$ 1 milhão à nova indústria de beneficiamento da gaúcha Cooperativa de Produção Agropecuária Nova Santa Rita (Coopan), maior produtora de arroz orgânico da América Latina. No mês seguinte, junto com Moreira e MST, nove governadores nordestinos de partidos de esquerda - com anunciaram o propósito de criação do Finapop Nordeste, com previsão de captação de R$ 25 milhões, priorizando as atividades de produção de mel, frutas, ovelhas e cabras. Uma parceria estratégia foi estabelecida com o Sistema Cresol de cooperativas de crédito[9]. A Finapop - ainda mais contando com recursos adicionais de governos estaduais progressistas - constitui uma alternativa bastante importante de financiamento para cooperativas de trabalhadores rurais, que, antes, contavam apenas com a possiblidade de empréstimos junto ao Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf - Agroindústria), cujas exigências burocrátivas, efetivamente, dificultavam bastante o acesso[10].

A expressiva proliferação de bancos comunitários e o surgimento do Finapop são partes de algo fundamental para o desenvolvimento da economia solidária e também da nacional distribuição de renda: a democratização das finanças. Enquanto no Brasil há apenas dez grandes bancos, nos Estados Unidos, o país mais liberal do mundo, tal quantidade é multiplicada por nada menos que mil e isso faz, de fato, muita diferença. Entre os cinco maiores e muito prevalentes bancos, que movimentam 85% das finanças do país - Itaú, Bradesco, Santander, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal - os dois últimos são públicos, porém muito subordinados à lógica dos três primeiros, funcionando, em grande medida, como se fossem instituições financeiras privadas também. Além dos recursos dos bancos públicos deverem ser muito mais acessíveis aos empreendimentos econômicos solidários, bem como aos microempresários e aos trabalhadores por conta própria, tal democratização das finanças passa pela ampla facilitação legal-normativa da formação de cooperativas de crédito, que são ainda poucas no país.

 

4  APOIO TÉCNICO E POLÍTICO

Para que a economia solidária se expandisse e desenvolvesse, entre as décadas de 1990 e 2010, foi imprescindível o apoio concreto de algumas organizações e redes, responsáveis diretamente pela formação, assessoria e certa representação política dos empreendimentos coletivistas guiados pelo ideal da autogestão. Neste rol estão entidades religiosas, muito prevalentemente católicas, com destaque para a Cáritas Brasileira (BERTUCCI; SILVA, 2003; SOUZA, 2013). Estão também aquelas com origem sindical, apoiadoras de complexos cooperativos e fábricas recuperadas pelos próprios trabalhadores: a já extinta Associação Nacional de Trabalhadores de Empresas de Autogestão e Participação Acionária - Anteag, a Agência de Desenvolvimento Solidário, da Central Única dos Trabalhadores (ADS-CUT) e a União e Solidariedade das Cooperativas do Estado de São Paulo - Unisol (ODA, 2000; NAKANO, 2000; MAGALHÃES; TODESCHINI, 2000; VALLE, 2002; PIRES, 2016). É também o caso das organizações surgidas em universidades, sobremaneira públicas e articuladas nacionalmente: a Rede de Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas Populares - ITCPs (GUIMARÃES, 2020) e a Rede Interuniversitária de Estudos e Pesquisas sobre o Trabalho - Unitrabalho. Fora do ambiente universitário também surgiram incubadoras públicas de empreendimentos econômicos solidários, vinculadas principalmente a prefeituras (FORTE, 2019). E por fim, fazendo parte desse amplo conjunto, estão determinadas organizações não-governamentais com abrangência nacional, dentre elas a Federação dos Órgãos de Assistência Social - FASE e o Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas – Ibase (SOUZA, 2013, p. 113).

Para que muito mais empreendimentos econômicos solidários possam surgir e se manter – no contexto da profunda crise econômica – e que também possam se tornar perenes, bem como se desenvolver na saída dela, outras coisas mais precisam ocorrer, além do apoio das organizações acima apontadas. Em primeiro lugar, o investimento público por parte de prefeituras municipais e governos estaduais mediante suas secretarias, subdivisões departamentais e demais órgãos públicos. Isso já vem ocorrendo em determinadas cidades, muito destacadamente na fluminense Maricá[11] e, timidamente ainda, em alguns estados do Nordeste que contam com governadores de partidos de esquerda. Em segundo lugar, claro, espera-se que haja novamente uma política pública nacional - ocorrida no Brasil entre 2003 e 2016 - no contexto de um governo democrático e progressista. Cabe lembrar que a relação dos empreendimentos organizados a partir do ideal autogestionário com o poder público, muitas vezes, foi e deve ser realmente mediada por fóruns: locais, regionais e também nacional de economia solidária, através de conselhos de representação, previstos por governos democráticos.

Mas, além do imprescindível e prioritário apoio governamental nas três esferas de poder, o avanço dos empreendimentos solidários deveria ter um impulso bastante importante através de parcerias com relevantes instituições da sociedade civil. Essas parcerias deveriam ser também mediadas, tanto quanto possível, pelos fóruns de economia solidária, de modo a resguardar a identidade autônoma e a independência política dos empreendimentos econômicos solidários. Dentre essas instituições com potencial para apoio efetivo aos empreendimentos, citamos duas do chamado Sistema S: o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI)[12] e o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC).

 

5  A FUNDAMENTAL INTERCOOPERAÇÃO

Além do absolutamente legítimo auxílio governamental e do fundamental apoio das organizações mencionadas, os empreendimentos econômicos solidários carecem também do desenvolvimento da articulação entre eles próprios. Isso começou a ocorrer em meados dos anos 1990 quando a identidade coletiva economia solidária passou a ser construída através de feiras, plenárias, redes e fóruns. Em termos das maiores cidades, os primeiros fóruns de cooperativismo popular e economia solidária foram organizados em Porto Alegre, no Rio Janeiro e em São Paulo (SINGER; SOUZA, 2000). Gradativamente, formaram-se também fóruns estaduais, algo que impulsionou uma articulação em âmbito nacional de modo a ser constituído, em 2003, o Fórum Brasileiro de Economia Solidária - FBES[13], mesmo ano que, no âmbito do Ministério do Trabalho do então governo Lula, foi instituída a Secretaria Nacional de Economia Solidária (SENAES) para ser coordenada pelo principal ideólogo e militante dessa causa, o saudoso professor de economia da USP Paul Singer, que esteve à frente dela de 2003 a 2016 (FORTE, 2019).

Uma das atividades da SENAES foi apoiar a realização de feiras de economia solidária. A maior delas - de abrangência até internacional - vem ocorrendo anualmente desde 1993, em Santa Maria - RS, no âmbito da diocese católica homônima, organizada pela Cooesperança, uma cooperativa de segundo grau que abrange mais de duzentos grupos de produtores (em maioria rural), envolvendo cerca de quatro mil pessoas (SARRIA; FREITAS, 2006). Denominada Feicoop, esta e outras feiras afins ocorrem junto com seminários e plenárias, sendo eventos não apenas de comércio, mas também de organização e fortalecimento político do movimento de economia solidária.

Após a experiência da Anteag nos anos 1990, o engajamento significativo na busca da intercooperação entre empreendimentos econômicos solidários, visando à formação de complexos cooperativos, foi feito de modo significativo pela ADS-CUT, formada em 2002. E foi com tal propósito que a entidade sindical começou, em 2004, a dialogar conjuntamente com a cooperativa de tecelagem Textilcooper, de Santo André-SP; a CONES (Cooperativa Nova Esperança), de Nova Odessa-SP; a empresa autogestionária produtora de cordões e roupas artesanais Fio Nobre, de Itajaí-SC e a Univens (Cooperativa de Costureiras Unidas Venceremos), de Porto Alegre. Essa interlocução levou ao surgimento, no ano seguinte, da cooperativa de segundo grau Justa Trama, uma cadeia produtiva que vai da produção de algodão agroecológico no interior do Ceará e do Mato Grosso do Sul à confecção de roupas e jogos pedagógicos na capital gaúcha, passando pela fiação e tecelagem no interior mineiro e a produção de utensílios de tecidos em Porto Velho. Ao todo, são cerca de seiscentos trabalhadores engajados e distribuídos em três associações e três cooperativas fixadas em cinco municípios das cinco regiões do país.

Igualmente com origem sindical, além da ADS-CUT, a Unisol também passou a exercer protagonismo na busca de integração de empreendimentos econômicos solidários, com ênfase em fábricas recuperadas de processos falimentares, inicialmente apenas na região do ABC Paulista, afinal ela surgiu no seio do regional Sindicato dos Metalúrgicos. A entidade adaptou seu nome para Central de Cooperativas e Empreendimentos Solidários (Unisol) e se articulou com outras também nacionais e importantes organizações formadas a partir de empreendimentos atuantes em diferentes ramos: a União Nacional de Cooperativas da Agricultura Familiar e Economia Solidária (Unicafes); a Confederação das Cooperativas de Reforma Agrária do Brasil (Concrab/MST); e a União Nacional de Catadores e Catadoras de Materiais Recicláveis do Brasil (Unicatadores). Tal articulação fez surgir, em 2014, a Unicopas. Em seus documentos e no discurso de seus dirigentes, a Unicopas costuma reforçar o valor do termo cooperativismo[14].

 

6  PARA A VIABILIZAÇÃO DA ECONOMIA SOLIDÁRIA

Pode-se dizer que a economia solidária é, em parte, herdeira de um conjunto de práticas e organizações presentes, destacadamente na Europa, que tem o nome de economia social (DEFOURNY; FAVREAU; LAVILLE, 1997; JEANTET, 2001; MONZON, 2006) e abarca principalmente cooperativas de: consumo, educação e habitação, bem como associações mutuárias de seguro. Elas constituem organizações orientadas por uma lógica diferente daquela própria do capitalismo, assentada na acumulação elitizada dos ganhos econômicos.

Como sabemos, o desenvolvimento capitalista, ainda mais em sua vertente neoliberal, é marcado pela supremacia do grande capital conectadamente ao individualismo exacerbado e ao enaltecimento do livre mercado em face do Estado mínimo. Já o desenvolvimento da economia social e principalmente da economia solidária é orientado pela proliferação de cooperativas e associações coletivistas de produção, consumo e crédito nos mais variados ramos e, tanto quanto possível, interconectadas economicamente entre si em conglomerados cooperativos. Desse modo, basicamente, se dá o desenvolvimento solidário (SINGER, 2004) que convive com o desenvolvimento capitalista, mas é moralmente bastante superior a este por priorizar a inclusão de trabalhadores.

Porém, evidentemente, não basta o valor moral. Os empreendimentos autogestionários precisam ganhar força econômica para que possam se manter e, tanto quanto possível, se expandir e então integrar mais trabalhadores que queiram fazer parte deles. Nessa lógica dos conglomerados cooperativos[15], vislumbra-se efetivamente a replicação do exemplo da Justa Trama em outros ramos de atividade. Por exemplo: a conexão entre a produção agroindustrial de alimentos por cooperativas do MST e restaurantes autogeridos, bem como o fornecimento alimentar para a composição de merendas escolares; ou entre a coleta seletiva de latas de alumínio por cooperativas de catadores à produção de janelas com o mesmo metal, vendidas em lojas autogestionárias e também fornecidas para casas populares construídas por governos democráticos, sendo que nos dois casos o transporte poderia ser feito também por cooperativas de caminhoneiros. Enfim, há realmente inúmeras possibilidades de formação, em vários ramos, de empreendimentos econômicos solidários e da conexão efetiva entre eles compondo conglomerados cooperativos.

As chamadas compras públicas, feitas por órgãos de governos nas três esferas de poder, têm um grande potencial de alavancar a economia solidária, como parte de uma política mais ampla (DAGNINO, 2020). Para que isso ocorra na escala ideal é necessária a formação de um aparato legal-jurídico-político condizente e, claro, governos verdadeiramente comprometidos com o desenvolvimento solidário aqui delineado. Neste sentido, a economia solidária deverá se tornar efetivamente uma política de Estado, sendo que este não pode ser reduzido a um aparelho diminuto conforme o ideário neoliberal e tampouco à maximizada burocracia centralizadora dos regimes autoritários. Alguns projetos de leis municipais, estaduais e federais já foram aprovados e estão em tramitação nesse sentido, com destaque para a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 69/2019, apresentada pelo senador petista da Bahia Jaques Wagner, que inclui a economia solidária entre os princípios de Ordem Econômica da Carta Magna.

Conforme uma tradicional literatura já comentada (BERNSTEIN, 1961; LUXEMBURGO, 1961; SOUZA, 2011), aponta, há muito tempo os empreendimentos solidários costumam se disseminar, com fragilidade, nos contextos de crise como este pelo qual estamos passando. O grande desafio é mantê-los e desenvolvê-los nessa conjuntura e posteriormente, quando a relevante oferta de empregos assalariados ressurgir, embora vale lembrar que isso já ocorreu entre 2004 e 2011, quando novos empreendimentos solidários surgiram no contexto de crescimento econômico e oferta de empregos (SOUZA, 2011, p. 182).

Diferente do que se diz muitas vezes, os empreendimentos solidários têm seus trunfos. Como tais unidades de trabalho, orientadas por princípios igualitários e democráticos, se diferenciam das empresas capitalistas na maneira estrutural como se dão as relações sociais nelas, isto acaba por se constituir como uma vantagem específica. Qual seja: por ser sentirem mais respeitas e também valorizadas mutuamente, parte das pessoas opta pelo trabalho num empreendimento solidário em vez de um emprego assalariado, desde que as diferenças de ganho num e no outro não sejam muito grandes. Em geral, indivíduos com experiências comunitárias e de ativismo em grupos religiosos e movimentos sociais são bem mais propensos a fazer tal escolha (GAIGER, 2004; GUIMARÃES; KOROSUÊ; CORRÊA, 2006).

Espera-se que as unidades de economia solidária tenham efetivamente força econômica, de modo que os ganhos por elas auferidos possam ser ao menos equivalentes à remuneração como trabalhadores autônomos ou assalariados. Mas enquanto isso não ocorre, a satisfação pessoal por fazer parte de um coletivo de trabalho com destacados traços comunitários compensa, muitas vezes, as moderadas diferenças de ganho monetário e impulsiona algo pouco tratado na literatura econômica: os rendimentos não monetários[16]. Segundo a POF-IBGE 2017-2018, para as famílias que vivem com rendas inferiores a dois salários mínimos a participação da renda não monetária chega a 28,8% do total de seus rendimentos, sendo mais significativa quanto menor o rendimento médio familiar[17]. É uma economia pouco considerada, sendo em valores monetários, correspondente a cerca de R$ 650 bilhões por ano, que não entram nas estatísticas de geração de riqueza, mas que são fundamentais para a manutenção da vida de muitos brasileiros e um suporte para a expansão da economia solidária.

Se os empreendimentos de economia solidária se conectarem economicamente entre si, articularem os rendimentos monetários e não monetários - gerados por eles próprios - e também se puderem contar com políticas governamentais e de Estado condizentes, conforme aqui delineadas, há de fato um grande potencial para eles se fortalecerem e se desenvolverem, incluindo cada vez mais trabalhadores e apontando para uma nova economia, capaz de promover desenvolvimento socioeconômico efetivamente includente.

 

7  CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os históricos e contemporâneos críticos da economia solidária (BERNSTEIN, 1961; LUXEMBURGO, 1961; MENEZES, 2007; CASTRO, 2010), grosso modo, afirmaram que ela efetivamente não tem potencial de transformação social, sendo os empreendimentos que a compõem muito constrangidos pela acirrada competição mercantil, afinal se colocam subalternamente em cadeias produtivas, algo que acaba por dificultar a permanência deles ou então sua fidelidade aos princípios autogestionários. Conforme essa intepretação não seriam mais que meros paliativos ou subprodutos do próprio capitalismo.

Paul Singer (1998), por sua vez, afirmou serem os empreendimentos de economia solidária, assim como outras experiências econômicas com traços igualitários e democráticos, “implantes socialistas” na sociedade capitalista[18]. Compreendia o professor ser o socialismo algo necessariamente construído de baixo para cima na sociedade, evidentemente, sem subestimar o papel do Estado em tal processo, mas tampouco sem conferir-lhe mais importância e atribuições do que, de fato, lhe cabem, tal como é o caso dos regimes totalitários. Compreendemos ser o principal desafio, em face da grande crise que enfrentada, multiplicar os implantes socialistas e desenvolvê-los com fortalecimento mediante a conexão econômica e política entre a maior quantidade possível deles. Tal desenvolvimento, como visto, passa por mudanças legais e normativas e pelas condizentes políticas governamentais e de Estado, bem como pelo apoio efetivo de determinadas instituições.

Vislumbramos também a integração crescente das iniciativas de economia solidária num conjunto mais amplo de experiências socioeconômicas, também contrapostas ao capitalismo liberal. Trata-se da Economia de Francisco, uma proposta lançada pelo papa Francisco na emblemática data de 1º de maio de 2019 - Dia dos Trabalhadores - convocando jovens de até 35 anos de idade para um encontro em Assis, Itália, com renomados ativistas e intelectuais, sobremaneira da área econômica, visando à elaboração de outro paradigma de desenvolvimento econômico e social para o mundo. Tal evento, marcado inicialmente para março de 2020, foi adiado para novembro, em face da pandemia, havendo grande probabilidade de ser postergado novamente pelo mesmo motivo. No Brasil, a partir de tal proposta e de uma rede de pessoas e entidades, foi organizada a Articulação Brasileira pela Economia de Francisco e Clara (ABEFC), considerando-se a importância de “homem e mulher caminharem lado a lado, sem primazia”[19] (SOUZA, 2020). São organizações, entre outras, interlocutoras da ABEFC, pois compreendidas como fazendo parte desse conjunto mais amplo de experiências socioeconômicas: a Unicopas, o FBES, a Rede Brasileira de Renda Básica da Cidadania, a Rede Brasileira de Bancos Comunitários a Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) e a Articulação Semiárido Brasileiro (ASA).

Como se vê, a economia solidária, devidamente apoiada e articulada nessa frente mais ampla, tem um potencial expressivo, não só de resposta à crise do emprego, decorrida da pandemia, mas de ser uma importante base para outro tipo de desenvolvimento socioeconômico, apontando para a superação do capitalismo.

 

REFERÊNCIAS

AZEVEDO, Alessandra Bandeira A. & GITAHY, Leda. The Cooperative Movement, self-management, and cooperativeness: the case of Mondragón Corporación Cooperativa. Working USA: The Journal of Labor and Society, v. 13, 2010, p. 5-29.

BATEMAN, George Robert. The Transformative potential of Participatory Budgeting: creating an ideal democracy. Abingdon: Routledge, 2019.

BERNSTEIN, Edward. Evolutionary socialism: a criticism and an affirmation. Nova York: Schocken Books, 1961.

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[1] Professor associado do Departamento de Sociologia e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e membro da Associação Brasileira de Pesquisadores de Economia Solidária (ABPES).

[2] Diretor técnico do Departamento Intersindical de Estísticas e Estudos Socioeconômicos (DIEESE).

[3] Dados da Pesquisa Nacional de Amostra Domiciliar (IBGE - Pnad), disponíveis em https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/trabalho/9127‑pesquisa‑nacional‑por‑amostra‑de‑domicilios.html?=&t=o‑que‑e, acessados em 6 de agosto de 2020.

[4] IBGE - Pulso empresas, disponíveis em https://covid19.ibge.gov.br/pulso-empresa/, acessado em 6 de agosto 2020.

[5] Ministério da Economia - Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, disponível em https://servicos.mte.gov.br/bem/, acessado em 6 de agosto 2020.

[6] Word Bank, Pandemic, Recession: The Global Economy in Crisis, june/2020 disponível em https://www.worldbank.org/en/publication/global‑economic‑prospects#:~:text=Global%20Outlook,‑Download%20highlights&text=The%20baseline%20forecast%20envisions%20a,economies%20will%20shrink%20this%20year, acessado em 16 de agosto de 2020.

[7] Em ordem decrescente de desigualdade: África do Sul, Naníbia, Zâmbia, República Centro-Africana, Lesoto, Moçambique.

[8] Criado pelo matemático italiano Conrado Gini, o Índice de Gini é utilizado para medir a concentração de renda entre os rendimentos dos mais pobres e dos mais ricos. Varia de zero a um, sendo zero a situação de igualdade e um a concentração absoluta.

[9] Iniciado no interior do Paraná em 1995 (Bittencourt, 2000), o Cresol conta com 210 mil famílias cooperadas, estando presente em dez estados das regiões Sul e Sudeste, e começa a dar os primeiros passos também no Nordeste.

[10] Informações disponíveis em https://www.brasildefato.com.br/2020/06/03/conheca‑o‑finapop‑um‑projeto‑inedito‑de‑financiamento‑para‑pequenos‑agricultores, bem como em https://www.pi.gov.br/noticias/finapop‑nordeste‑preve‑captacao‑de‑r‑25‑milhoes‑para‑investimentos‑na‑regiao/, acessados em 19 de agosto de 2020.

[11] Contemplada com 4,8 bilhões de reais em royalties de petróleo recebidos nos últimos cinco anos, que compõem 70% da receita municipal, Maricá vem tendo tal posicionamento desde o início da primeira gestão petista em 2009. Além de auxiliar diretamente na formação de empreendimentos econômicos solidários e no comércio de seus produtos, a prefeitura implementou, em 2013, uma renda básica municipal a pessoas que vivem com renda familiar mensal de até 3 salários mínimos. A transferência é feita por meio do banco comunitário municipal através da moeda social chamada mumbuca, que circula amplamente na cidade, abrangendo inclusive redes de fast food. Ver: https://brasil.elpais.com/sociedade/2020-07-19/marica-no-rio-preserva-empregos-e-negocios-na-pandemia-e-coloca-a-renda-basica-no-centro-do-debate.html (Acessado em 21/07/2020).

[12] Cuja regional paulistana chegou a oferecer curso gratuito a grupos de costureiras de nascentes empreendimentos solidários de São Paulo entre os anos 1999 e 2000.

[13] O início de sua formação havia ocorrido durante o primeiro Fórum Social Mundial em 2001, reunindo entidades e redes nacionais ligadas à temática da economia solidária.

[14] Nesse sentido, defende o autenticamente autogestionário, portanto, oposto ao tradicional cooperativismo da Organização das Cooperativas do Brasil (OCB), formada sobremaneira por grandes empresas agroindustriais, compostas, proporcionalmente, por poucos gestores cooperados e muitos trabalhadores assalariados.

[15] A principal experiência no século XX foi a Corporação Cooperativa de Mondragón, iniciada em 1956 na cidade basca homônima, ao norte da Espanha, por iniciativa do padre José Arizmendiarreta. A partir de ex-alunos de uma escola técnica e da mobilização comunitária, ele liderou a aquisição de uma falida fábrica de fogões. Logo, outras cooperativas foram organizadas e integradas, de modo que a corporação se tornou uma das maiores produtoras espanholas de eletrodomésticos de linha branca e de carrocerias para ônibus (Whyte; Whyte, 1988). O complexo de Mondragón se expandiu para outros países, vindo a envolver mais de 50 mil trabalhadores. Sua estrutura é vista, por um lado, como burocraticamente verticalizada, semelhante, em boa medida, a de outra empresa multinacional qualquer (Kasmir, 1996). Por outro lado, Mondragón também é vista como uma experiência democrática e positivamente inovadora (Azevedo; Gitahy, 2010).

[16] Rendimento não monetário, segundo a classificação da Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) do IBGE, é aquele oriundo de bens e serviços sem pagamento monetário, ou seja, obtido através de doação, retirada financeira de um negócio, troca, produção própria, pescado, caçado e coletado. Para sua contabilização são considerados os preços vigentes no mercado local dos bens e serviços. Contabiliza-se também como renda não monetária o valor do aluguel atribuído ao domicílio cuja condição de ocupação é diferente do alugado, deduzidas do valor do aluguel estimado as despesas com manutenção e reparos, impostos, taxas de serviços e seguros.

[17] Por classes de rendimento, as famílias que recebiam até 2 salários mínimos, 41% vinham do rendimento de trabalho; 28,8%, das transferências; 0,3%, dos aluguéis; 0,6%, de outras rendas; 28,2% era não monetário e 1,1% se referia à variação patrimonial (POF‑IBGE 2017/2018: https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia‑sala‑de‑imprensa/2013‑agencia‑de‑noticias/releases/25598‑pof‑2017‑2018‑familias‑com‑ate‑r‑1‑9‑mil‑destinam‑61‑2‑de‑seus‑gastos‑a‑alimentacao‑e‑habitacao, acessado em 16/08/2020).

[18] Surgido no Brasil, no âmbito da gestão petista de Olívio Dutra em Porto Alegre no ano de 1989, o Orçamento Participativo se espalhou para algumas outras grandes cidades grandes brasileiras e cerca de mil e quinhentos municípios de outros países, sendo outro exemplo de implante socialista (Dutra; Benevides, 2001; Bateman, 2019).

[19] Conforme a Carta Brasileira pela Economia de Francisco e Clara http://www.ihu.unisinos.br/78‑noticias/594766‑carta‑de‑clara‑e‑francisco‑direto‑do‑brasil‑para‑o‑encontro‑mundial‑em‑assis. Acesso em: 28/07/2020.