MAPEAMENTO DA MATURIDADE E DA DEMANDA TECNOLÓGICA DA REGIÃO DO CARIRI

Elias Pereira Lopes Júnior[1]

Universidade Federal do Cariri

eliasjunior08@gmail.com

Rodolfo Jakov Saraiva Lôbo[2]

Universidade Federal do Cariri

rodolfo.jakov@ufca.edu.br

Hércules Pio da Silva[3]

Universidade Federal do Cariri

silvahercules183@gmail.com

Karoline Teixeira de Souza[4]

Universidade Federal do Cariri

karolinesousa1129@gmail.com

Resumo

A transferência de tecnologia de Instituições Científicas e Tecnológicas e de Inovação (ICTs) para o mercado é um tema que tem ganhado força e notoriedade no âmbito das publicações acadêmicas. Já existe um instrumento que tem sido muito utilizado para avaliar o nível de maturidade tecnológica dos projetos desenvolvidos pelas ICTs, que é a escala Technology Readiness Level (TRL). O objetivo dessa pesquisa é analisar o nível de maturidade tecnológica (TRL) dos projetos de instituições da Região do Cariri/CE. Foram mapeados 66 laboratórios de quatro instituições (UFCA, IFCE, URCA e UniFAP) e foi realizada a análise da TRL de 22 desses laboratórios. O tema deste trabalho é uma grande oportunidade de alavancar o crescimento das tecnologias desenvolvidas nas instituições do Cariri, pois há a possibilidade de realizar parcerias externas para continuidade dos projetos ou desenvolvimento de novas tecnologias.

Palavras-chave: Inovação. Maturidade Tecnológica. Demanda Tecnológica. Região do Cariri.

MAPPING MATURITY AND TECHNOLOGICAL DEMAND IN THE CARIRI REGION

Abstract

The transfer of technology from Scientific and Technological and Innovation Institutions (STIs) to the market is a topic that has gained strength and notoriety within the scope of academic publications. There is already an instrument that has been widely used to assess the level of technological maturity of projects developed by STIs, which is the Technology Readiness Level (TRL) scale. The objective of this research is to analyze the Technological Maturity Level (TRL) of the projects of institutions in the Cariri/CE Region. Sixty-six laboratories from four institutions (UFCA, IFCE, URCA and UniFAP) were mapped and the TRL analysis of 22 laboratories was performed. The theme of this work is a great opportunity to leverage the growth of technologies developed in Cariri institutions, as there is the possibility of carrying out external partnerships for the continuity of projects or the development of new technologies.

Keywords: Innovation. Technological Maturity. Technological Demand. Cariri Region.

1  INTRODUÇÃO

A inovação é um fator que pode ser crucial para o crescimento da economia mundial, visto que diversos investigadores (BOUCHIKH; KIMBERLY, 2001; KEMP et al., 2003; SANTOS; BASSO; KIMURA, 2010) a consideram como um fator chave para o sucesso em longo prazo para as empresas. Além disso, é um elemento que pode contribuir para a melhoria da economia nacional, através da resolução de problemas socioeconômicos, tais como o desemprego e o crescimento da produtividade.

Por sua vez, as universidades e os seus centros de pesquisa são fatores importantes para a promoção da tecnologia, que é a chave para a inovação e crescimento dos negócios. O estudo do investimento financeiro em atividades que propiciam inovação tem ganhado força na área acadêmica nos últimos anos (MAZZUCATO, 2014; KERR; NANDA, 2015; HONG et al., 2016). Contudo, o planejamento da inovação seria mais efetivo se os papéis dos setores público e privado no incentivo à inovação fossem mais claros.

Além disso, muitas pesquisas também têm mantido seu foco nas questões relacionadas à transferência de tecnologia das Instituições Científicas e Tecnológicas e de Inovação (ICTs) para as indústrias. No Brasil, o Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (SNCTI) tem o papel de tentar responder às demandas da sociedade e do setor empresarial por conhecimento, tecnologia e inovações (DE NEGRI; SQUEFF, 2016).

A abordagem do investimento financeiro em atividades que geram inovações tem ganhado interesse acadêmico mais recentemente (ACHARYA; XU, 2017; GRILLI et al., 2017; HOWELL, 2017; MAZZUCATO; SEMIENIUK, 2017). A clara distinção dos papéis dos setores público e privado no incentivo à inovação poderia trazer às economias mais objetividade no planejamento de ações para a promoção de um sólido desenvolvimento, no que se refere à mudança tecnológica e aprendizado organizacional necessários para uma tecnologia ter sucesso no mercado e gerar benefícios sociais (RODRIGUES, 2018).

As ICTs têm o seu papel regulamentado no SNCTI por meio do Marco Legal Brasileiro de Inovação e seus mecanismos para viabilizar a transferência de tecnologia para as empresas foram instituídos pelo Novo Marco Legal da Ciência, Tecnologia e Inovação (Lei n. 13.243 de 2016). Contudo, ainda assim existem obstáculos que dificultam as interações entres as ICTs e as empresas na questão das ofertas e demandas por tecnologias.

Um instrumento que tem sido muito utilizado para avaliar o nível de maturidade tecnológica é a Technology Readiness Level (TRL), que é uma escala criada pela National Aeronautics and Space Administration (NASA) e que no Brasil já, inclusive, possui uma norma técnica publicada pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT): que é a ISO 16290 (ABNT, 2015). A TRL já vem sendo aplicada em diversos contextos para mensurar o nível de maturidade tecnológica nos Estados Unidos e em alguns países da Europa (PERSONS; MACKIN, 2020).

Visando o apoio ao desenvolvimento tecnológico e industrial da Região do Cariri/CE, esse projeto promoveu o estudo do Mapeamento da Maturidade Tecnológica da Região do Cariri/CE. Por se tratar de uma região em desenvolvimento, e com grande potencial de crescimento, a pesquisa em questão, objetiva analisar o nível da maturidade tecnológica das Instituições de Ensino Tecnológico (ICTs) da Região do Cariri/CE. O presente trabalho apresenta o mapeamento dos laboratórios e grupos de pesquisas da Universidade Federal do Cariri – UFCA, do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará – IFCE (Crato e Juazeiro do Norte), da Universidade Regional do Cariri (URCA) e do Centro Universitário Paraíso – UniFAP.

A transferência de tecnologia tem aumentado o interesse de formuladores de políticas, profissionais e pesquisadores em todo o mundo. Mesmo dentro da comunidade acadêmica, o campo da transferência de tecnologia tem atraído estudiosos de várias disciplinas, como economia, administração, sociologia, antropologia, ciência política e engenharia. Estudiosos dessas disciplinas examinam o estado atual das atividades de transferência de tecnologia, investigam os mecanismos de transferência de tecnologia e estudam os fatores que afetam a eficácia da transferência de tecnologia (LIU; SUBRAMANIAN; HANG, 2018).

Apesar da diversidade dentro da comunidade de pesquisa de transferência de tecnologia, muitas pesquisas foram dedicadas a um único contexto: a transferência de tecnologia das universidades para empresas. No entanto, a transferência bem-sucedida de tecnologia costuma ser bastante difícil, mas isso pode ser feito combinando-se a fonte de tecnologia certa com o receptor de transferência correto.

Nesse sentido, a escala de TRL já permitiu várias análises dos processos de transferência de tecnologia e inovação tecnológica, posicionando os diversos interessados ao longo dessa escala. Por meio do uso da escala DRL, pode-se gerar um novo sistema de referência para melhor abordar a abordagem market pull, fazendo transferência de tecnologia e inovação tecnológica. Portanto, a utilização dessas duas ferramentas pode melhorar significativamente a inovação e as práticas de transferência de tecnologia da Região do Cariri/CE, permitindo uma melhor compreensão dos diferentes fatores e etapas, fazendo com que as parcerias entre ICTs e o mercado criem valor.

Esse estudo pretende contribuir para o esclarecimento das relações existentes entre o nível de maturidade tecnológica dos projetos das ICTs e o nível de prontidão da demanda de empresas da região do Cariri, apresentando implicações acadêmicas e gerenciais capazes de auxiliar os gestores públicos e privados a alcançarem maior efetividade no desempenho de seus papéis enquanto promotores de projetos inovativos e, consequentemente, do desenvolvimento econômico local e regional. A interação entre o nível de maturidade tecnológica dos projetos e o nível de prontidão da demanda de empresas da Região do Cariri/CE pode ser um mecanismo para a promoção da transferência de tecnologia e da inovação tecnológica na região do Cariri.

 

2  REFERENCIAL TEÓRICO

Nessa seção serão abordados aspectos relacionados à inovação e à escala Technology Readiness Level (TRL).

 

2.1  INOVAÇÃO

A partir dos trabalhos de Schumpeter, a inovação começou a receber um tratamento específico, passando a ser considerada como um dos direcionadores do crescimento econômico. Desde então, as características, fontes e classificação deste termo vêm sendo bastante discutidas com intuito de entender seu papel no desenvolvimento econômico. Sob uma perspectiva teórica, os mais variados resultados das pesquisas vêm impulsionando outros trabalhos no âmbito acadêmico, no sentido de procurar um melhor entendimento das causas e efeitos da inovação dentro das organizações (SANTOS; BASSO; KIMURA, 2010, p.1).

A inovação pode ser considerada como um fator importante no crescimento da economia global. Diversos estudos ponderam que ela é uma chave de sucesso para as empresas (BOUCHIKHI; KIMBERLY, 2001; EUROPEAN UNION, 2011; FORSMAN, 2009; KEMP et al., 2003; KLOMP; VAN LEEWEN, 1999; SANTOS; BASSO; KIMURA, 2010). Além disso, a inovação pode ser considerada um elemento que pode alavancar a economia nacional, colaborando para a solução de problemas socioeconômicos, como o desemprego e aumento da produtividade.

Entre os estudos que abordam a inovação empresarial, muitos tentam explicar como se desenvolve a inovação nas companhias (BATTERINK et al., 2006; LIU; BASKARAN; LI, 2009; PORTER, 1985). Outra questão sobre inovação que promoveu pesquisas nas mais variadas disciplinas foi o estudo da influência da inovação no desempenho das empresas. O tema também gerou interesse em outras abordagens, como na sustentabilidade das companhias e no processo de decisão empresarial (KEMP et al., 2003; LAURSEN; SALTER, 2006; SAMPSON, 2007).

As atividades de inovação desenvolvidas pela empresa não devem ocorrer de maneira isolada de suas competências centrais. Pelo contrário, elas devem ser tratadas em paralelo e/ou nas ações rotineiras da empresa. Leiponen (2002) acredita que o processo de inovação deve acontecer de maneira complementar às atividades da firma, sendo embasadas não apenas em fontes internas à organização, como também a outros agentes externos vinculados à instituição.

A teoria da inovação tem recebido contribuições de diversas áreas do conhecimento e seu desenvolvimento tem sido feito a partir de inúmeros estudos empíricos e teóricos. Muitos desses trabalhos se interessam pelo fato de a inovação ser considerada uma necessidade de as empresas buscarem ou defenderem um posicionamento competitivo no ramo em que atuam.

 

2.1  Technology Readiness Level (TRL)

O desenvolvimento de capacidades tecnológicas tem sido objeto de estudo de diversas pesquisas a partir da década de 1980 (DAHLMAN; FONSECA, 1987; KATZ, 1987; PATEL; PAVITT, 1994). O principal foco era encontrar uma forma de estimular a inovação empresarial, fazendo com que as tecnologias necessárias para o desenvolvimento de uma indústria chegassem ao mercado. Alguns fatores, como o tempo e os riscos envolvidos, relacionados ao desenvolvimento de uma tecnologia podem variar de acordo com o ambiente na qual ela está inserida (SOUZA; BEAL; MOTTA, 2021).

Conforme Mankins (2009), métodos ou ferramentas que ajudam na mensuração e previsão dos fatores atrelados ao desenvolvimento da tecnologia são extremamente úteis para os gestores dos projetos, pois, podem gerar informações que são cruciais para a tomada de decisão em relação à continuidade do projeto. Nesse sentido, algumas ferramentas têm sido utilizadas em nível gerencial para auxiliar na avaliação da maturidade tecnológica dos projetos. Dentre elas tem-se a Technology Readiness Level (TRL), uma escala desenvolvida pela National Aeronautics and Space Administration (NASA) que é aplicada na mensuração da prontidão tecnológica de seus projetos. De acordo com Moresi, Barbosa e Braga Filho (2017), a primeira definição da escala TRL foi feita em 1974 pelo pesquisador da NASA, Satn Sandi. Em 1989 a escala contava com sete níveis de prontidão e em 1995 foi atualizada com os nove níveis que permanecem até hoje.

A TRL tem sido aplicada e adaptada em outros contextos, além das aplicações espaciais, com intuito de indicar quando uma tecnologia está pronta para ser utilizada e comercializada (TOMASCHEK et al., 2016; BEZERRA, 2021). A escala faz uma métrica do progresso de uma tecnologia o dividindo em nove estágios, que vão desde a pesquisa básica até a sua total utilização. Embora a TRL seja uma abordagem amplamente adotada para definir a maturidade de uma única tecnologia e muito útil em comparação a duas ou mais opções de tecnologia, não se destina a representar a maturidade de um sistema geral. A TRL é também uma métrica indireta para definir o risco de desenvolvimento de tecnologia individual, quanto maior for o nível da TRL, menor o risco de desenvolvimento e vice-versa (OZDEMIR et al., 2019).

Diante da grande adesão obtida pela TRL em vários países e setores de atividade distintos, em 2013 a International Organization for Standardization (ISO) editou uma norma técnica para o Brasil na tentativa de padronizar a definição dos níveis de maturidade tecnológica e seus critérios de avaliação. Na Figura 1 tem-se uma visão geral da escala TRL na qual parte-se da pesquisa tecnológica aplicada (TRL 1) até chegar ao teste, lançamento e operação (TRL 9). Além disso, a tecnologia pode ser classificada em três estágios: Laboratório (que vai da TRL1 até a TRL 4), Ambiente Simulado (TRLs 5 e 6) e Mundo Real (TRL 7 até TRL 9).

 

                                           Figura 1 – Visão geral da escala TRL

Interface gráfica do usuário, Aplicativo

Descrição gerada automaticamente

Fonte: Rodrigues, 2018

Conforme Rodrigues (2018, p. 47), “a escala já foi adaptada e é utilizada, por exemplo, nos departamentos americanos de saúde e serviços humanos, energia e defesa com vocabulário ajustado e descrição dos níveis adequada aos contextos específicos de aplicação”. Além disso, também tem sido usada, desde 2101, como ferramenta auxiliar de políticas de financiamento pelo Horizonte 2020, programa europeu de apoio financeiro às atividades de inovação (RODRIGUES, 2018). Para Ribeiro (2019), a TRL pode ser considerada como uma ferramenta de avaliação tecnológica que auxilia na comunicação entre pesquisadores e o mercado, permitindo estabelecer os níveis de maturidade de uma tecnologia.

A Figura 2 mostra a sistemática de aplicação da mensuração da TRL pelo fluxo de determinação da TRL utilizado pela NASA. Com esse uso do fluxo pode-se observar, logo no início da entrevista, o nível de maturidade da tecnologia. Assim que o possível nível de maturidade é identificado, são realizadas perguntas para a confirmação do nível de TRL. Essas questões são oriundas da pesquisa de Nolte, Kennedy e Dziegiel (2003) e da demonstração documental prevista pela NBR 16290 (ABNT, 2015).

As universidades desempenham um papel crucial para o fomento da economia do conhecimento e, por meio dos ativos intangíveis, apresentam boas oportunidades para o desenvolvimento dos países. Contudo, infelizmente muitas universidades ainda não fazem a exposição de forma sistematizada de seus potenciais de inovações (RIBEIRO, 2020). A TRL, nesse sentido, é uma ferramenta que pode ser usada justamente para avaliar a percepção do grau de maturação da tecnologia dos projetos desenvolvidos nas universidades.

                                     Figura 2 – Fluxo de determinação da TRL

Interface gráfica do usuário, Diagrama, Texto

Descrição gerada automaticamente com confiança média

Fonte: Adaptado de NASA, 2007

3  METODOLOGIA

A pesquisa, com base em seus objetivos, pode ser categorizada por meio de uma abordagem mista, na qual foram aplicados métodos qualitativos e quantitativos. Possuirá uma tipologia descritivo-explicativa, visando descrever as características dos sujeitos e fenômenos estudados para estabelecer relações entre variáveis (GIL, 2002).

Inicialmente foram realizadas pesquisas acerca do tema e objeto que compõem a questão norteadora da pesquisa. Em seguida foi elaborada uma proposta de sistemática para registro dos dados para, a partir daí, realizar a coleta de dados primários. Para a realização da coleta de dados tentou-se o contato com diversas instituições da Região do Cariri/CE, contudo, nem todas responderam ou demonstraram interesse em participar da pesquisa.

O instrumento utilizado para a coleta dos dados referentes à classificação na escala TRL foi baseado no formulário elaborado por Ribeiro (2020), que foi elaborado de acordo com a norma ISO 16290:2013. Os dados sobre a maturidade tecnológica dos projetos foram coletados com os coordenadores de projetos cadastrados na Universidade Federal do Cariri (UFCA), na Universidade Regional do Cariri (URCA), no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE – Crato e Juazeiro do Norte), na Universidade Regional do Cariri (URCA) e no Centro Universitário Paraíso (UniFAP).

A pesquisa de campo que visava visitas presenciais nos laboratórios teve de ser substituída por uma pesquisa qualitativa com coleta de dados remota, pois a pesquisa era para ter sido iniciada em 2020, contudo, as instituições estavam operando com o ensino remoto devido às medidas de restrições impostas pela pandemia do Covid-19. Esse fato fez com que os laboratórios da UFCA, do IFCE, da URCA e do UniFAP tivessem seus projetos encerrados ou pausados, dando continuidade apenas aqueles que poderiam se adequar às atividades remotas. Em decorrência disso, foi feito um levantamento dos laboratórios e grupos de estudo de ambos os campi usando como fonte principal os sites oficiais das instituições, além da aplicação de formulários online para coleta de dados, os quais, posteriormente, foram tabulados e classificados.

Durante as coletas, os responsáveis pelos laboratórios foram sondados sobre as condições de operação dos equipamentos no que tange à capacidade de operação da tecnologia empregada nos mesmos. Após levantadas essas informações, os entrevistados eram questionados sobre quais potenciais serviços aqueles equipamentos e/ou laboratório poderiam oferecer, e se ele estava apto ou não para a oferta. Dessa forma, pode-se analisar o contexto de mapeamento tecnológico das tecnologias empregadas nos laboratórios, bem como examinar a percepção de terceiros acerca do nível tecnológico dos aparelhos.

 

4  RESULTADOS

Na tentativa de realizar um mapeamento mais amplo possível da Região do Cariri/CE, foram realizadas diversas abordagens em várias instituições de pesquisa da região, contudo, nem todas demonstraram interesse. Sendo assim, o foco foi dado em quatro instituições que se mostraram mais abertas a disponibilizarem dados: Universidade Federal do Cariri (UFCA), Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE – Crato), Universidade Regional do Cariri (URCA) e Centro Universitário Paraíso (UniFAP). Inicialmente foram mapeados 66 laboratórios nas quatro instituições e, após as tentativas de coletar os dados em todos os laboratórios mapeados, apenas 22 se mostraram dispostos a colaborar com a pesquisa (QUADRO 1).

Alguns laboratórios na UFCA apresentaram TRL 9, sendo classificados no nível Mundo Real (TRL 7 até TRL 9), porque, apesar de desenvolverem projetos inovadores, informaram apenas serviços mais básicos que já foram testados e estão disponíveis para serem oferecidos. Contudo, já existem potenciais serviços mais especializados que deverão ser oferecidos em breve e não estão sendo oferecidos atualmente em virtude de estarem em processo de registro de pedido de propriedade industrial junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial – INPI.

As outras tecnologias que estão com TRL 4 estão em processo de diferenciação da pesquisa mais simples e já se encontram na fase de análise de possibilidades de se tornarem um produto que seja passível de comercialização. Portanto, os laboratórios já podem iniciar a busca por uma parceria entre a universidade e outras instituições (que podem ser empresas, indústrias, governo ou outra universidade) com intuito de aprimorar os resultados já obtidos ou mesmo propiciar o seu processo de escalonamento (QUINTELLA, 2017; SOUZA, 2020).

Os laboratórios do IFCE possuem níveis de TRL diversificados e, em geral, possuem parcerias com outras instituições (principalmente devido à boa relação dos coordenadores dos projetos com outros pesquisadores externos). No caso das TRLs mais baixas, os motivos para tal classificação foram a não definição de processos envolvidos na fabricação; a não definição dos requisitos do desempenho operacional; e a falta de testes em ambientes operacionais. Mesmo nessas fases iniciais existem riscos, que podem surgir desde a fase de gestão (rotatividade de membros e/ou gestão dos recursos) até o desenvolvimento das provas de conceito, que devem ser analisados com cuidado porque, se confirmados, podem ocasionar um impacto significativo no projeto (SOUZA, 2020).

Quadro 1 – TRL dos laboratórios

Nome do laboratório ou grupo

Instituição

Tecnologia

TRL

Lab. Caracterização de materiais

UFCA

Síntese e caracterização de materiais

6

Laboratório de saneamento

UFCA

Análises físico-químicas da água

9

Laboratório de topografia

UFCA

Levantamentos planialtimétricos, locação e controle geométrico de edificações

4

Laboratório de polímeros

UFCA

Análises e ensaios voltados ao processamento de materiais poliméricos

9

Laboratório de Ensaios Mecânicos dos Materiais

UFCA

Análise experimental de estruturas e de componentes

9

Laboratório de Mecânica dos Solos

UFCA

Criação de Tijolos a partir dos rejeitos

4

Laboratório de Central Analítica

UFCA

Cromatografia líquida, espectroscopia de absorção atômica e espectrofotometria

4

Laboratório de Cerâmica

UFCA

Caracterização tecnológica do produto cerâmico

9

LEDS - Laboratório de Sistemas Embarcados e Distribuídos

IFCE - Crato

CompSim

9

GP4LR

4

LITE - Laboratório de Inovação em Tecnologias Educacionais

IFCE - Crato

Ecomapss

9

Gamificação no ensino de agroecologia

3

LaIS - Laboratory of Information System

IFCE - Crato

ObjectSys - Um sistema de gerenciamento e rastreio de materiais didáticos

3

Laboratório de Tecnologias e Inovações Farmacológicas

URCA

Suporte ao desenvolvimento farmacotécnico

4

Laboratório de Ecofisiologia Vegetal

URCA

Caracterização das fenofases de diferentes espécies

3

Laboratório de Biologia Toxicologia

URCA

Análises de composições fitoquímica, e de atividade antioxidante

3

Laboratório de Fisiofarmarcologia das Células Excitáveis

URCA

Eletrofisiologia

3

Laboratório de Microbiologia e Biologia Molecular

URCA

Identificação e caracterização populações microbianas do solo

4

Laboratório de Bioprospecção do Semiárido

URCA

Avaliação de Óleos essenciais e Terpenos

4

Laboratório de Pesquisa de Produtos Naturais

URCA

Bromatologia e biocatálise

3

Laboratório de Farmacologia e Química Molecular

URCA

Varredura do potencial farmacoterapêutico de compostos bioativos naturais

4

GISFAP

UniFAP

Processamento de dados espaciais de municípios

7

GEPSE3D

UniFAP

Desenvolvimento de pluviômetro de baixo custo e com RTTD

4

Laboratório de engenharias

UniFAP

Uso do RCL na confecção de concretos

2

Fonte: própria pesquisa

Quanto às TRLs mais elevadas, os coordenadores ainda informaram que existem alguns fatores que dificultam o licenciamento e/ou a transferência das tecnologias, como a burocracia nos trâmites administrativos para realização de parcerias externas e a falta de interesse do mercado. Esses aspectos são recorrentes também em outras ICTs e são pontos críticos que merecem a atenção dos gestores das instituições para que o processo de desdobramento das pesquisas científicas em ações práticas de inovação possa ocorrer (GHESTI et al., 2019; TURCHI; MORAIS, 2017)

Em relação aos laboratórios da UniFAP, todos os projetos relataram que não têm apoio ou parceria externa, seja de ajuda financeira ou de equipamentos. A aplicabilidade dos projetos se dá em áreas multidisciplinares, tais como governança, desenvolvimento regional, economia e infraestrutura. Dos três laboratórios analisados, dois estão em fase inicial (Laboratório) e um está no início da fase mais avançada (Mundo Real). No caso das tecnologias mais avançadas, foi relatado que ainda existe uma carência quanto ao estabelecimento de parceria com outras instituições (empresas, indústrias, governo ou outra universidade) para impulsionar o seu desenvolvimento.

Quanto aos laboratórios da URCA, todos apresentaram nível inicial, sendo classificados como de Laboratório (que vai da TRL1 até a TRL 4). Portanto, os produtos e serviços que estão sendo elaborados ainda precisam de mais desenvolvimento para que possam entrar na fase de Ambiente Simulado (TRLs 5 e 6). Em geral, no início e no fim do ciclo da TRL exige-se menor dispêndio de recursos financeiros (QUINTELLA, 2017) e nota-se que a URCA ainda concentra boa parte do seu foco em projetos que estão classificados como de Laboratório. Para avançar para os níveis superiores da TRL, os coordenadores de laboratórios acreditam que poderiam contar com parcerias com empresas e indústrias da região, que poderiam financiar parte dos testes e desenvolvimento de protótipos.

Na tentativa de confrontar essas competências tecnológicas das instituições da Região do Cariri/CE com o que o mercado demanda, foi realizado mapeamento das demandas tecnológicas de instituições da região. Foram realizadas visitas a algumas instituições (Fiec, Sebrae, Senai, Sesi e Prefeitura de Juazeiro do Norte) para apresentação do projeto e tentativa de coleta de dados referentes às necessidades tecnológicas delas. A tentativa de mapeamento da demanda tecnológica foi realizada por meio de consultas ao Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas – Sebrae e à Federação das Indústrias do Estado do Ceará – FIEC.

No Quadro 2 tem-se informações sobre as demandas dos setores. No geral, são 10 demandas apresentadas por 5 (cinco) setores. Fazendo um breve confronto dessas demandas com as informações dos laboratórios, percebe-se que há o potencial de atendimento dessas demandas por parte dos laboratórios das instituições que participaram dessa pesquisa. As informações do Quadro 2 foram obtidas por meio de visita técnica realizada à FIEC, na qual foram realizadas reuniões com a Diretoria de Inovação e Tecnologia e com uma analista de prospectiva estratégica do observatório da indústria.

Quadro 2 – Demandas de instituições da Região do Cariri/CE

Setor

Categoria da Demanda

Agroalimentar

Desenvolvimento de novas máquinas e adaptação de maquinário

Inovação em produto

Eletrometalmecânico

Inovação em produto

Desenvolvimento de softwares

Energia

Desenvolvimento de softwares

Plástico e Borracha

Desenvolvimento de softwares

Internet das Coisas

Produtos Químicos, Farmoquímicos e Farmacêuticos, incluindo Petróleo e Derivados

Inovação em marketing

Gestão de Resíduos e Reuso de Água e de Efluentes

Inovação de processo

Fonte: FIEC

5  CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir dos conceitos e dados podemos notar que os laboratórios apresentados, apesar de produzirem tecnologia em diferentes áreas, procurando manter uma boa qualidade, necessitam de estratégias para consolidar suas transferências tecnológicas. A partir dos dados coletados percebeu-se que os laboratórios e grupos de pesquisas têm seus objetivos bem definidos e possuem ampla capacidade de aplicação. Todavia, ainda se faz necessário um planejamento estratégico para a realização da transferência tecnológica e lançamento no mercado das tecnologias desenvolvidas.

O cenário ideal seria que as produções tecnológicas das instituições chegassem de fato ao mercado e impulsionassem o desenvolvimento da Região do Cariri/CE. Para tanto, faz-se necessário um incentivo e reconhecimento da ciência que é produzida pelos pesquisadores, promovendo um maior engajamento dos alunos nas pesquisas, bem como a divulgação das regulamentações institucionais que tratam de propriedade intelectual e transferência tecnológica.

Essa pesquisa tem como grande limitação o acesso dificultado aos laboratórios, devido às medidas de restrições impostas pela pandemia do Covid-19. Mesmo após o retorno parcial de algumas atividades nas universidades, ainda assim muitos laboratórios se mantiveram fechados e/ou com suas atividades reduzidas. Como alternativa, tentou-se coletar os dados via formulários online, contudo, a taxa de resposta foi muito baixa.

Como sugestões para estudos futuros, primeiramente seria interessante ampliar a coleta de dados dos laboratórios da Região do Cariri/CE, bem como os dados da demanda do mercado. Em seguida, é necessário fazer um confronto entre as competências das instituições e as demandas do mercado. Para tanto, pensou-se em realizar um evento congregando todos esses atores para tentar estimular parcerias para o atendimento das demandas e, consequentemente, para a geração de inovação na Região.

Os laboratórios e projetos desenvolvidos pelas instituições da Região do Cariri/CE têm grande valor comercial, contudo, ainda faltam mais incentivos e apoio para o desenvolvimento científico do que está sendo produzido. Fato é que a maioria dos laboratórios pesquisados ainda estão no nível Laboratório (que correspondem as TRLs de 1 até 4). Conforme Valenti e Bueno (2020), geralmente as tecnologias nas universidades não ultrapassam o nível TRL 3 em virtude de sua cultura, que muitas vezes prega a geração do conhecimento tecnológico apenas com base na atividade depositária do patrimônio intelectual.

A difusão do conhecimento é um processo que passa por constantes mudanças e as universidades precisam realizar adaptações para se adequarem a essas alterações. Para se tornarem mais competitivas, as Instituições de Ensino Superior precisam exercer novas funções estratégicas para modernizar sua infraestrutura e captar recursos financeiros de diferentes formas, tais como: via projetos tecnológicos em cooperação com empresas; comercializando resultados de pesquisas; e licenciando e transferindo tecnologias (SOUZA, 2021). O tema deste trabalho é uma grande oportunidade de alavancar o crescimento das tecnologias desenvolvidas nas instituições do Cariri, pois há a possibilidade de realizar parcerias externas para continuidade dos projetos ou desenvolvimento de novas tecnologias.

REFERÊNCIAS

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BATTERINK, M. H.; WUBBEN, E. F. M.; OMTA, S. W. F. Factors explaining the innovative output of firms in the Dutch agrifood industry. Anais… 7th International Conference on Management in AgriFood Chains and Networks, Ede, The Netherlands. 2006.

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[1] Professor efetivo do Centro de Ciências Sociais Aplicadas da Universidade Federal do Cariri (UFCA), Doutor em Administração de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas - FGV/EAESP (2016)

[2] Professor da Universidade Federal do Cariri (UFCA). Pró-Reitor de Graduação (UFCA). Doutor em Administração de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas (FGV-Eaesp)

[3] Técnico em Finanças, Graduação em andamento em Administração de empresas. Estudante do LEME: Laboratório de Estratégia, Marketing, Empreendedorismo e Inovação, do(a) Universidade Federal do Cariri

[4] Universidade Federal do Cariri (