GESTÃO DO CONHECIMENTO NAS E PARA AS DISCIPLINAS

interdisciplinaridades

Dâmaris Queila Paredes Oliveira Domiciano[1]

Universidade Federal da Paraíba

            dqparedes@gmail.com

Roberto Vilmar Satur[2]

Universidade Federal da Paraíba

robertosatur@yahoo.com.br

Ludinaura Regina Silva dos Santos[3]

Hospital Universitário Júlio Bandeira - Universidade Federal de Campina Grande - Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares

reginasantosjp@hotmail.com

Raíssa Carneiro de Brito[4]

Universidade Federal da Paraíba

 raissacbrito@gmail.com

 Elaine Cristina de Brito Moreira[5]

Universidade Federal da Paraíba

elainemoreir@gmail.com

______________________________

Resumo

A Gestão do Conhecimento emerge a partir da necessidade da adoção de novas condutas de gestão com o intuito de criar as condições para potencializar a criação de novos conhecimentos e seu compartilhamento e, para tanto, une-se, desde sua gênese, a diversificadas áreas que permitiram melhor compreensão, aplicação, disseminação e uso da informação para criar, de forma inovadora, novos conhecimentos e a forma como aplicá-los nos espaços organizacionais e informacionais. O objetivo deste ensaio teórico é apresentar a Gestão do Conhecimento e seus paradigmas, enquanto disciplina, nas disciplinas e para além delas, por meio de um comparativo entre a interdisciplinaridade, transdisciplinaridade e multidisciplinaridade na organização do conhecimento. Desse modo, foram utilizados os autores tradicionais e contemporâneos de diferentes áreas com o intuito de compor o estudo bibliográfico necessário para essa análise. Isto ocorreu, através de breve contexto histórico sobre a gênese da Gestão do Conhecimento e o seu relacionamento entre diversas disciplinas científicas (e para além delas) e suas implicações na produção do conhecimento científico. Os resultados obtidos permitiram traçar o perfil da Gestão do Conhecimento como uma ciência que está ligada intimamente a outras disciplinas científicas com objetos idênticos e diferentes caracterizando sua natureza interdisciplinar e multidisciplinar, além de encontrar integração entre diferentes disciplinas que transcendem as fronteiras existentes, não se limitando a um único olhar ou área do conhecimento, características fundamentais de sua natureza transdisciplinar.

Palavras-chave: gestão do conhecimento; disciplinas; interdisciplinaridade; paradigmas.

KNOWLEDGE MANAGEMENT IN DISCIPLINES AND FOR DISCIPLINES

interdisciplinarities

Abstract

Knowledge Management emerges from the need to adopt new management behaviors with the objective of creating the conditions to enhance the creation of new knowledge and its sharing and, for that, joins, since its genesis, to diverse areas that allowed better understanding, application, dissemination and use of information to create, in a innovation, new knowledge and how to apply it in organizational and informational spaces. In this way, traditional and contemporary authors from different areas were used in order to compose the bibliographic study necessary for this analysis. This occurred, through a brief historical context on the genesis of Knowledge Management and its relationship between different scientific disciplines (and beyond them) and its implications in the production of scientific knowledge. The results obtained made it possible to outline the profile of Knowledge Management as a science that is closely linked to other scientific disciplines with identical and different objects, characterizing its interdisciplinary and multidisciplinary nature, in addition to finding integration between different disciplines that transcend existing borders, not limited to to a single look or area of knowledge, fundamental characteristics of its transdisciplinary nature.

Keywords: knowledge management; disciplines; interdisciplinarity; paradigms.

GESTIÓN DEL CONOCIMIENTO EN Y PARA LAS DISCIPLINAS

interdisciplinaridades

Resumen

La Gestión del Conocimiento surge de la necesidad de adoptar nuevos comportamientos de gestión con el objetivo de crear las condiciones para potenciar la creación de nuevos conocimientos y su intercambio y, para ello, reúne, desde su génesis, diversas áreas que permitieron una mejor comprensión, aplicación, difusión y uso de información para crear, de manera innovadora, nuevos conocimientos y cómo aplicarlos en espacios organizacionales e informativos. El objetivo de este ensayo teórico es presentar la Gestión del Conocimiento y sus paradigmas, como disciplina, en las disciplinas y más allá de ellas, a través de una comparación entre la interdisciplinariedad, la transdisciplinariedad y la multidisciplinariedad en la organización del conocimiento. De esta manera, se recurrió a autores tradicionales y contemporáneos de diferentes áreas para componer el estudio bibliográfico necesario para este análisis. Esto se dio a través de un breve contexto histórico sobre la génesis de la Gestión del Conocimiento y su relación entre las diferentes disciplinas científicas (y más allá de ellas) y sus implicaciones para la producción de conocimiento científico. Los resultados obtenidos permitieron delinear el perfil de la Gestión del Conocimiento como una ciencia que está estrechamente vinculada a otras disciplinas científicas con objetos idénticos y diferentes que caracterizan su carácter interdisciplinario y multidisciplinario, además de encontrar integración entre diferentes disciplinas que trascienden las fronteras existentes, sin limitarse. a una única perspectiva o área de conocimiento, características fundamentales de su carácter transdisciplinario.

Palabras clave: gestión del conocimiento; disciplinas; interdisciplinariedad; paradigmas.

1  INTRODUÇÃO

É de relevada importância iniciar este estudo ratificando que a Gestão do Conhecimento (GC) não se trata de um conteúdo para manipular mentes com a finalidade de robotizá-las para uso e serviço das organizações.

A Gestão do Conhecimento “[..] não se trata de preparar gestores para manipular e ‘engarrafar’ ideias extraídas direto do cérebro de outras pessoas ou transformar os seres humanos em máquinas ou robôs que produzem conhecimento” (Satur; Duarte, 2020, p. 32). Na verdade, a GC trata-se da arte, técnica, método e ciência de fazer gestão para que sejam criados ambientes com contextos, climas e culturas propícias, onde as pessoas possam pensar, produzir e compartilhar ideias, bem como aprimorá-las. Por meio do compartilhamento mútuo do conhecimento, todos possam ensinar (individual) e, ao mesmo tempo, serem ensinados (coletivo), através de um processo de análise, estudos e reflexões de suas ações. É o que acontece, por exemplo, na relação entre o mestre e o discípulo e/ou o profissional e o aprendiz.

A fim de compartilhar, gerenciar e obter novos conhecimentos, a Gestão do Conhecimento relaciona-se com outras especialidades que denotam conhecimentos distintos, mas que devidamente articulados promovem novos conceitos, métodos e técnicas que resultam na produção, por exemplo, do conhecimento científico. Embora reconheça-se que existem vários tipos de conhecimento, pode-se afirmar que o conhecimento científico seja o mais relevante dentre os demais. Por esta razão, neste estudo a Gc será limitada dentro do campo do conhecimento científico, ainda que seja a sua promoção também seja possível de ser feita em todos os outros tipos de conhecimento existentes (filosófico; científico; teológico e religioso diverso; milenar, popular, empírico e cultural; etc.).

Entre essas áreas, cita-se a Administração, a Engenharia, a Psicologia, a Educação, a Ciência da Informação, a Ciência da Computação e seus desdobramentos em Sistemas de Informação e Tecnologia da Informação, inclusive a Inteligência Artificial. Como essas áreas focam na necessidade de suas ideias e criações, além de transformar insights em inovação, elas precisam recorrer a gestão do conhecimento para que isso aconteça, tanto as novas ideias e invenções, que resultam em criação, como a inovação que é essa criação sendo transformada efetivamente em produto ou serviço concreto registrado, patenteado e/ou publicado, portanto produzido e sendo disponibilizado para o mercado ou sociedade.

No Brasil, a GC é mais difundida junto às Ciências Sociais Aplicadas com ênfase para a Ciência da Informação (CI), enquanto que em Portugal, por exemplo, está mais interligada às Engenharias, ficando a CI mais focada na Gestão da Informação (GI), porém isso não significa que as outras áreas não a utilizem.

Dessa forma, a Gestão do Conhecimento reúne várias disciplinas com objetos diferentes – multidisciplinar, objetos iguais – interdisciplinar, e promove uma integração entre essas disciplinas que transcende, vai além das fronteiras existentes entre elas – transdisciplinar – com o intuito de compreender e compartilhar o conhecimento e saberes científicos, não se limitando a uma única disciplina ou área do saber.

Este ensaio teórico irá reunir autores tradicionais e contemporâneos de diferentes áreas que abordam a Gestão do Conhecimento com o intuito de compor o estudo bibliográfico necessário para essa análise. Para tanto, será realizado um relato do contexto histórico em que surge a Gestão do Conhecimento, entre diversas disciplinas científicas e como elas se unem à GC, enfatizando suas implicações na produção do conhecimento científico.

Diante deste contexto, este estudo tem como objetivo apresentar a Gestão do Conhecimento e seus paradigmas enquanto disciplina, nas disciplinas e para além das disciplinas, por meio de um comparativo entre a interdisciplinaridade, transdisciplinaridade e multidisciplinaridade na organização do conhecimento.

 

2 GESTÃO DO CONHECIMENTO: ENQUANTO DISCIPLINA, NAS DISCIPLINAS E PARA ALÉM

Já não são novos os estudos e debates acerca da interdisciplinaridade, multidisciplinaridade e transdisciplinaridade no estudo das ciências, não sendo diferente nos estudos acerca da Gestão do Conhecimento, cujo interesse pode ser notado em diversas áreas do conhecimento. Mas antes de falar sobre cada um desses conceitos, faz-se necessário um levantamento sobre a constituição da Gestão do Conhecimento para entender como ela emerge e suas principais características e os paradigmas que foram criados neste processo.

Ao falar sobre a constituição e princípios da GC, Alvarenga Neto (2002, p. 2) considera:

[...] o conhecimento só existe na mente humana e entre as mentes.  O conhecimento fora desse contexto é visto como informação e a GC ganha terreno a partir da compreensão de que sua terminologia é metafórica, uma vez que o conhecimento é inerente aos seres humanos e não se transfere ou se compartilha com facilidade ou espontaneidade.

 

O fato de distintos campos do conhecimento estarem entrelaçados com a Gestão do Conhecimento caracterizam e fortalecem sua natureza multidisciplinar e permitem sua identificação, compreensão e o domínio na prática de suas ações (Dalkir, 2011). Essa diversidade pode gerar alguns conflitos e desafios e, portanto, faz-se necessário a correta definição entre os termos utilizados.

Alvares et al. (2020) mencionando Sagsan (2009) apresenta a Gestão do Conhecimento como uma ciência interdisciplinar que se ampara em várias disciplinas e com o intuito de se estabelecer e avançar, enquanto ciência gera algumas estruturas para fortalecer sua comunidade científica. Essas estruturas são chamadas de paradigmas e dividem-se em: paradigma humanista, paradigma sociotécnico, paradigma organizacional e paradigma tecnológico.

Do ponto de vista do paradigma humanista, a GC aporta-se numa visão cognitiva e subjetiva no tratamento do conhecimento tácito, individual e subjetivo do indivíduo, analisando sua capacidade e suas estruturas cognitivas. Dessa forma, interliga-se com algumas disciplinas do conhecimento como a Filosofia, a Pedagogia e a Psicologia com o intuito de promover o conhecimento e discussões inerentes a essas disciplinas científicas e à Gestão do Conhecimento (Alvares et al., 2020).

Enquanto isso, o paradigma sociotécnico na Gestão do Conhecimento une-se a disciplinas como Estatística, permitindo a produção do conhecimento necessário, diante da necessidade da compreensão dos processos e de suas relações, visualizadas por meio de métodos quantitativos. Além da possibilidade da compreensão das informações estruturadas, não estruturadas ou semiestruturadas, através da compreensão do conhecimento discutido nas disciplinas de Arquivologia, Biblioteconomia, Ciência da Informação, Comunicação, Estatística, Linguística e Sociologia, entre outras (Alvares et al., 2020).

O paradigma organizacional aborda a forma como o conhecimento tácito é produzido e disseminado pelos empregados no âmbito organizacional. Destacam-se as áreas da Administração, Contabilidade, Marketing e da Psicologia unidas à GC com intuito de visualizar as relações, as estruturas organizacionais e tratar sobre a organização, produção e compartilhamento do conhecimento em ambientes adequados e favoráveis para a geração de novos conhecimentos (Choo, 2006; Nonaka E Takeuchi, 1997).

Neste sentido, cita-se Polanyi (1958; 1983), um dos precursores da abordagem de que o conhecimento dotado pelo indivíduo, em sua totalidade, está implícito e há dificuldade do indivíduo em tornar esse conhecimento explícito. Desse modo, alguns estudos apontam que o conhecimento que está implícito é infinitamente superior ao conhecimento explícito.

No âmbito organizacional, quando o indivíduo não compartilha nem registra o conhecimento que ele detém, tanto o conhecimento que lhe é inerente como aquele que foi desenvolvido durante o desenvolvimento de suas ações e relações pessoais e profissionais, ao ser demitido ou ao se demitir ou quando uma geração é substituída por outra ou até mesmo quando a pessoa morre, o indivíduo leva consigo todo o conhecimento que detém e os prejuízos são irreparáveis para a organização.

Partindo desse pressuposto, o desafio constante das organizações e da gestão é o de garantir as condições necessárias para que o máximo do conhecimento implícito seja compartilhado e explicitado. Para isso, é preciso que as condições e o ambiente sejam adequados para criação do clima e da cultura organizacional propícios para o compartilhamento, a explicitação e a criação de novos conhecimentos por insights.

O caso do ambiente ba proposto por Nonaka, Toyama e Konno (2000) e Nonaka e Takeuchi (2008; 1997), ao se referir a um ambiente de qualidade com espaço adequado para a criação, o compartilhamento e a utilização do conhecimento como essencial para a transformação daquilo que é individual em movimento, como é o caso do conhecimento implícito e os processos para torná-lo explícito (Nonaka, Toyama e Konno, 2000 apud Cruz e Nagano, 2006).

O ambiente ba, portanto, pode ser entendido como um contexto dinâmico que aplicado à educação, pode-se citar a organização de uma sala de aula e a forma como ela deve ser pensada para que haja a promoção da aprendizagem e esta ocorra de forma fluida, contestando a forma tradicional da sua organização.

Portanto, novas formas são pensadas com o intuito da criação de um clima propício que afetará diretamente o comportamento das pessoas, desde a sua concentração até a criação de novos conhecimentos. É desse ponto de vista, que surgem as salas-laboratórios, as salas temáticas, as salas para metodologias ativas, dentre outras. Em geral, o ambiente ba sugere que o indivíduo possa construir e produzir muito além do esperado quando está inserido num ambiente em que o clima organizacional contribui para tal.

A atmosfera do marketing pensada por Kotler (1973), em uma das suas contribuições relevantes, explica também parte do que se trata o ba, embora com outro foco. Afinal, não é porque um indivíduo vai ao shopping ou a algum tipo de feira que sua intenção é a de comprar e gastar dinheiro, entretanto ao chegar naquele local, todo o ambiente, o clima e a atmosfera que foram criados e pensados para o incentivo às compras se apresentam àquele indivíduo, e este, ao adentrar ao ambiente, possivelmente, acabará comprando algo, mesmo que originalmente não tivesse essa pretensão.

São por estas razões, que as organizações cada vez mais enfatizam a questão da aprendizagem e do conhecimento, o pensar em novas ideias (insights), as reuniões sugerindo as tempestades de ideias (brainstorming) com a finalidade de gerar novos conhecimentos.

Para a área da Gestão (Administração), mas não exclusiva a esta, pois também cita, por exemplo, a Psicologia, Fernandes e Alvarez (2019, p. 32) destacam Peter Drucker, Davenport e Pruzak, e Nonaka e Takeuchi ao abordar a aplicação do conhecimento como vantagem estratégica nos ambientes organizacionais. De forma que, o conhecimento possa ser organizado e sejam criadas as condições ambientais adequadas e favoráveis para que ele possa ser compartilhado, criado e a inovação ocorra. Assim, a aprendizagem pode ser assegurada por meio da construção e apreensão do conhecimento individual e coletivo. É nessa perspectiva que a Gestão do Conhecimento e as disciplinas de Administração, Marketing e Educação, por exemplo, relacionam-se para agregar conhecimento, complementarem-se e gerar novos conhecimentos a partir dessa interdisciplinaridade.

Ao se unir a Psicologia à Gestão do Conhecimento, utiliza-se dos conceitos sobretudo da análise comportamental do indivíduo, a fim de entender o comportamento e do conhecimento produzido pelo indivíduo, principalmente, o conhecimento tácito. Visto que, o comportamento desse indivíduo influenciará nas suas ações, no clima do ambiente em que está inserido e consequentemente, refletirá nos seus usos e costumes individuais e coletivos, que também se aplica à cultura organizacional em que está inserido. Neste sentido, a GC alia-se à Psicologia para a compreensão dos processos mentais e cognitivos do indivíduo ao processar dados e novas informações e no compartilhamento dessa informação com o intuito de gerar conhecimento (Fernandes; Alvarez, 2019).

Por fim, o paradigma tecnológico trata-se do relacionamento da GC com o uso das tecnologias de informação e comunicação e seus avanços, sobretudo no que tange à segurança da informação, seu compartilhamento e disseminação. Uma vez que, a intensa transformação digital promove altos riscos de gerenciamento do ambiente cibernético e demanda constante monitoramento para controle de potenciais vulnerabilidades e criação de políticas para seu uso (Alvares et. al., 2020).

Por meios desses paradigmas propostos por Sagsan, é possível enxergar as interfaces da Gestão do Conhecimento por meio das diversas disciplinas científicas já destacadas, entre elas e para além delas, não se limitando as que foram aqui citadas, pois entende-se a amplitude da GC e da diversidade em seus fundamentos teóricos.

A Gestão do Conhecimento evoluiu de tal maneira que no ano de 2018 recebeu o padrão internacional de qualidade por meio da International Organization for Standardization (ISO). Trata-se da ISO 30.401:2018 que é constituída por dez componentes, de acordo com a estrutura padrão dos sistemas de gestão da ISO (Santos, 2021).

2.1 Interdisciplinaridade, Transdisciplinaridade e Multidisciplinaridade

A relação da Gestão do Conhecimento com todas as disciplinas científicas aqui discutidas reflete em sua interdisciplinaridade, transdisciplinaridade e multidisciplinaridade. Desta forma, para entender melhor essa relação, é preciso entender cada terminologia de forma isolada para melhor compreensão.

Segundo Schimitt et al. (2006), a interdisciplinaridade promove a interação entre as disciplinas, ou seja, elas se misturam e estão relacionadas uma à outra, gerando novos conhecimentos e isso não vem de hoje nem é exclusivo da Gestão do Conhecimento. Neste sentido, “Há algum tempo, a Ciência vem fazendo caminhos entrelaçados, especialmente no que se chama de interdisciplinaridade e transdisciplinaridade, visando melhorar o desempenho em relação à busca de respostas convincentes que inquietam os pesquisadores” (Satur; Neves; Duarte, 2015, p .1).

Em contrapartida, Tarapanoff (2006, p. 21) afirma que a relação da GC com outras disciplinas pode gerar uma problematização, uma vez que elas mudam constantemente, e acompanhar essa evolução é um processo contínuo e dinâmico. Entretanto, Satur (2018, p. 12), ratifica que “O caminho interdisciplinar de determinada ciência ou das ciências é fruto da inquietude de seus pesquisadores, insatisfeitos com as respostas internas de sua ciência para questões novas que surgem, ou velhas, que ressurgem com uma nova roupagem”.

Ao abordar acerca da base da interdisciplinaridade no campo científico, Varela (2010, p. 53) enfatiza que não se trata da unificação de saberes, visto que a essência da interdisciplinaridade se caracteriza pelos vários saberes em diversas áreas do conhecimento e acrescenta que “Os saberes têm aspectos históricos e epistemológicos da construção do conhecimento, além da estrutura singular e específica de cada saber/área do conhecimento, o que se constitui a princípio da máxima exploração das potencialidades de cada ciência”.

Dessa forma, a interdisciplinaridade incorpora disciplinas de diversas áreas com o intuito de, por meio da diversidade, compreender fenômenos considerados complexos por determinada área do conhecimento. Isso ocorre na GC e é fundamental na sua compreensão, pois a da interdisciplinaridade permite uma abordagem mais ampla e uma visão mais completa para encontrar os meios mais adequados para que a organização alcance suas metas e objetivos, conforme as especificidades de cada organização. A convergência de diversas visões, pode contribuir significativamente para a busca de soluções mais eficazes e inovadoras e também pode ser um desafio, quando se busca compreender sua interdisciplinaridade.

A produção científica sobre GC tem conexões com diversificadas disciplinas científicas como já foi exposto aqui. Cada uma dessas disciplinas contribui com abordagens específicas que fomentam a prática da GC, a qual, nos últimos anos, cresceu de maneira significativa, conforme o volume de publicações nessas áreas (Barbosa, 2020).

O termo transdisciplinaridade foi cunhado por Piaget ao referir-se à uma fase que sucede à interdisciplinaridade. Sommerman (2003, p. 100) apud Piaget (1972) destaca que “não se contentaria em encontrar interações ou reciprocidades entre pesquisas especializadas, mas situaria essas ligações no interior de um sistema total, sem fronteira estável entre essas disciplinas”. O que difere a transdisciplinaridade da interdisciplinaridade e da multidisciplinaridade é a competência da GC em compreender outras disciplinas e a partir delas, criar uma nova unidade de conhecimento, sem deixar de lado as experiências vivenciadas pelo indivíduo. Trata-se da integração do conhecimento tácito, a partir do conhecimento científico.

Através da transdisciplinaridade, torna-se possível solucionar problemas sociais e científicos que estão interligados. Neste processo, são trocadas informações entre os pesquisadores e acadêmicos da área e de áreas interligadas para que seja possível gerar novos conhecimentos, permitindo que as diferenças, quer sejam cultural, científica, política, econômica e social, tornem-se elos entre a comunidade científica, ao invés de abismos.

Apesar de Nicolescu (2001) considerar este conceito vago, ratifica sua relevância, visto que atribui e propicia um novo olhar acerca do conhecimento, permitindo que as fronteiras até então estabelecidas em um campo e outro fossem desfeitas. Quer dizer, a transdisciplinaridade vai além da interdisciplinaridade e pode gerar novo conhecimento, a partir do estudo de diversas disciplinas, de forma que as áreas sejam contextualizadas e organizadas, na medida em que o pensamento vai sendo construído, dentro de uma visão mais ampla e global.

Corroborando com essa ideia, Corrêa (2023, p. 65) afirma que “a Gestão do Conhecimento dialoga com outras disciplinas (multidisciplinar) interativamente (interdisciplinar), o que lhe imprime entrelaçamento inerente, para além da gestão em si”. Neste caso, a multidisciplinaridade estuda um assunto abordado em diferentes e diversas disciplinas, sendo cada uma discutida conforme a sua realidade e especificidade.

Alvares et al. (2020) considera uma ciência multidisciplinar quando recebe contribuições das ciências a ela interligadas. Interdisciplinaridade, transdisciplinaridade e multidisciplinaridade justifica a necessidade de gerenciar o conhecimento, visto que a informação está presente nas mais variadas disciplinas, podendo ser interligadas, contextualizadas e especificadas conforme a sua área, e para que o conhecimento seja criado, organizado e disseminado, é preciso que exista a gestão da informação.

Segundo Vieira (2016, p. 5), “a informação é um produto criado pelo homem, e está inserida em diferentes áreas do conhecimento científico, tecnológico, educacional, cultural, e pode ser considerada como um requisito imprescindível para se adquirir conhecimento”. Para o autor, o conhecimento dividido e/ou compartilhado é passível de ser expandido, tornando-se um recurso interminável por meio de equipes e vantagem competitiva, visto que a gestão do conhecimento envolve profissionais e disciplinas que na sua interdisciplinaridade produzem informação, gerando conhecimento.

 

3 PROCEDIMENTO METODOLÓGICOS

Este trabalho culminou por meio de uma visão reflexiva e interpretativa que reuniu autores tradicionais e contemporâneos que tratam acerca da Gestão do Conhecimento e sua diversidade de disciplinas científicas desde sua origem até os processos atuais. Metodologicamente, trata-se de um ensaio teórico baseado em coleta de dados bibliográficos e discussões levantadas a partir da bibliografia consultada. Justifica-se sua relevância para o entendimento das relações interdisciplinares, multidisciplinares e transdisciplinares na Gestão do Conhecimento.

Conforme considera Gil (2002, p. 48), a pesquisa bibliográfica “[...] é desenvolvida a partir de material já elaborado, constituído principalmente de livros e artigos científicos” e, de acordo com Prodanov e Freitas (2013, p. 54) é “elaborada a partir de material já publicado, constituído principalmente de: livros, revistas, publicações em periódicos e artigos científicos, jornais, boletins, monografias, dissertações, teses, material cartográfico, internet“ e, portanto, permite uma imersão teórica a respeito do assunto discutido por meio da análise de livros, artigos e teses, por exemplo, que tratam dessa temática.

 

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Gestão do Conhecimento entrelaça-se com outras disciplinas científicas, utiliza e é utilizada por estas, ratificando sua interdisciplinaridade. De forma que, pode-se afirmar que a GC está presente em todas as áreas do conhecimento e tem como propósito gerar ciência, seja em uma determinada área específica, seja em diversas áreas, seja em áreas que se completam mutuamente entre si e/ou para além dessas disciplinas.

Para tanto, foram utilizados autores tradicionais e contemporâneos de diferentes áreas que se relacionam com a GC para este estudo bibliográfico, necessário para essa análise. Os resultados obtidos permitiram traçar o perfil da Gestão do Conhecimento como uma área da ciência interdisciplinar que está ligada intimamente a outras disciplinas científicas com objetos idênticos e distintos, caracterizando sua natureza interdisciplinar e multidisciplinar, além de encontrar integração entre diferentes disciplinas que transcendem as fronteiras existentes. Dialoga com todas as áreas que a procuram em prol da criação, compartilhamento e inovação de qualquer que seja o conhecimento, não se limitando a um único olhar ou área do conhecimento, características fundamentais de sua natureza transdisciplinar.

Neste aspecto, a Gestão do Conhecimento, enquanto campo científico, acontece por meio do entendimento dos seus processos ou pela otimização deles que resultem no alcance dos seus objetivos, que podem ser identificados, compreendidos e alcançados por meio dos vários campos interdisciplinares, transdisciplinares e multidisciplinares que compõem a GC.

A interação com múltiplas disciplinas associado às diversas áreas do conhecimento corrobora para que a interdisciplinaridade, a transdisciplinaridade e a multidisciplinaridade sejam uma forte característica nesse campo que envolve a GC.

 

REFERÊNCIAS

ALVARES, Lillian Maria Araujo de Rezende. et al. Interfaces disciplinares selecionadas da gestão do conhecimento: características, contribuições e reflexões. Em Questão, vol. 26, n. 2, p. 132-160, 2020. UFRGS. Disponível em: https://www.redalyc.org/journal/4656/465662940007/html/. Acesso em: 20 jun de 2023.

BARBOSA, R. R. Gestão da informação e gestão do conhecimento: evolução e conexões. Perspectivas em Ciência da Informação, Belo Horizonte, v. 25, n. esp., p. 168–186, fev. 2020.  Disponível em: https://periodicos.ufmg.br/index.php/pci/article/view/22287. Acesso em: 12 jun. 2023.

CHOO, C. W. A Organização do Conhecimento: como as organizações usam a informação para criar significado, construir conhecimento e tomar decisões. São Paulo: Editora Senac, 2006.

CORRÊA, Fábio. Gestão do conhecimento: uma abordagem para a ação. Belo Horizonte: Universidade FUMEC, 2023. Disponível em: https://repositorio.fumec.br/xmlui/handle/123456789/964. Acesso em: 19 jun. 2023.

FERNANDES, J. A. C.; ALVARES, L. M. A. de R. Gestão do conhecimento e Psicologia: uma interface entre duas ciências. Informação & Sociedade, v. 29, n. 1, 2019. Disponível em: https://periodicos.ufpb.br/ojs2/index.php/ies/article/view/43919. Acesso em: 8 mar. 2024.

GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. São Paulo: Atlas, 2002.

KOTLER, Phillip. Atmospherics as a Marketing Tool. Journal of Retailing, 49. Winter, 1973, p. 48–64.

NICOLESCU, B. O manifesto da transdisciplinaridade. São Paulo: Trion, 2001. 168 p.

NONAKA, I.; TAKEUCHI, H. Criação de conhecimento na empresa: como as empresas japonesas geram a dinâmica da inovação. Rio de Janeiro: Elsevier, 1997.

NONAKA, I.; TOYAMA, R. & KONNO, N. SECI, ba and leadership: a unified model of dynamic knowledge creation. Long Range Planning, 33, p. 5-34, 2000.

PIAGET, J. A tomada de consciência. São Paulo: Edições Melhoramentos; Editora de São Paulo, 1977.

POLANYI, M. Personal knowledge: towards a post-critical philosophy. Chicago: The University Press, 1958.

POLANYI, M. The tacit dimension. Gloucester: Peter Smith, 1983.

PRODANOV, C. C.; FREITAS, E. C. Metodologia do trabalho científico: métodos e

SANTOS, Ana Cristina Carneiro dos. Redes de compromissos organizacionais: uma abordagem voltada para aprendizagem e geração de resultados. 2021. 358 f., il. Tese (Doutorado em Ciência da Informação) - Universidade de Brasília, Brasília, 2021. Disponível em: http://repositorio2.unb.br/jspui/handle/10482/41158. Acesso em: 08 mar. 2024.

SATUR, R. V; DUARTE, E.N. Negociadores Internacionais: atuação profissional com competência. João Pessoa: Editora do CCTA, 2020. Disponível em: http://www.ccta.ufpb.br/editoraccta/contents/titulos/administracao/negociadores-internacionais-atuacao-profissional-com-competencia. Acesso em: 08 mar. 2024.

SATUR, R. V. A pesquisa interdisciplinar na Ciência da Informação. Informação em Pauta, v. 3, n. 1, p. 9-25, 29 jun. 2018. Disponível em: http://repositorio.ufc.br/handle/riufc/38006. Acesso em: 08 mar. 2024.

SATUR, R. V.; SOUZA, E. D.; DUARTE, E. N. O desenho do campo da Ciência da Informação e suas relações: a metáfora dos mapas. In: ENCUENTRO IBÉRICO EDICIC, 7., 2015, Madrid, Spain. Universidad Complutense de Madrid e Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, 16-17 de noviembre, 2015.

SCHMITT, Valdenise et al. A Interdisciplinaridade no Programa de Pós-Graduação em Engenharia e Gestão do Conhecimento. 2006. Trabalho apresentado à disciplina Epistemologia e Ciência (Programa de Pós Graduação em Engenharia e Gestão do Conhecimento) - Universidade Federal de Santa Catarina, 2006.

SOMMERMAN, A. Formação e transdisciplinaridade: uma pesquisa sobre as emergências formativas do CETRANS. 2003. Dissertação (Mestrado Internacional em Educação) Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Nova de Lisboa; Départment des Sciences de l'Education et de la Formation, Université François Rabelais de Tours, Lisboa, 2003. 2 v.

TARAPANOFF, Kira. Inteligência, informação e conhecimento em corporações. Brasília: IBICT, UNESCO, 2006. Disponível em: https://livroaberto.ibict.br/handle/1/465. Acesso em: 19 jun. 2023.

técnicas da pesquisa e do trabalho acadêmico. Novo Hamburgo, RS: Feevale, 2013.

VARELLA, A. Dimensão das relações entre a Ciência da Informação e as ciências cognitivas: caminhos percorridos e a percorrer. Inf. & Soc.: Est., João Pessoa, v.20, n.2, p. 51-64, maio/ago. 2010. Disponível: https://repositorio.ufba.br/handle/ri/3711. Acesso: 08 mar. 2024.

VIEIRA, Ronaldo da Mota. Gestão do conhecimento: introdução e áreas afins. Rio de Janeiro: Interciência, 2016.



[1] Doutoranda em Ciência da Informação pelo Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação (UFPB). Mestre em Políticas Públicas, Gestão e Avaliação da Educação Superior (UFPB-PPGAES).
Graduação em Secretariado Executivo Bilíngue (UFPB). Participante do Grupo de Pesquisa, Informação, Aprendizagem e Conhecimento (GIACO). Secretária Executiva na Universidade Federal da Paraíba.

[2] Professor Adjunto do Departamento de Mediações Interculturais da UFPB. Professor do Programa de Pós-Graduação em Gestão de Organizações Aprendentes (MPGOA) e do Curso LEA-Negociações Internacionais em que também é coordenador. Possui graduação em Economia e em Administração, especialização em Comércio Exterior, mestrado em Economia, linha Economia da Empresa, Doutorado em Ciência da Informação, linha Ética, Gestão e Política da Informação, revalidado em Portugal como Doutoramento em Informação e Comunicação em Plataformas Digitais. Fez Pós-Doutorado em Informação e Comunicação pela Universidade do Porto, em Portugal.

[3] Doutoranda em Contabilidade (PPGCC/UFPB). Mestra em Gestão nas Organizações Aprendentes (UFPB-MPGOA). Graduada em Direito. Auditora-Chefe do Hospital Universitário Júlio Bandeira - Universidade Federal de Campina Grande (HUJB/UFCG) - Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH). Participante do Grupo de Pesquisa, Informação, Aprendizagem e Conhecimento (GIACO).

[4] Doutora e Mestre em Ciência da Informação (UFPB). Graduada em Biblioteconomia (UFPB). Participante do Grupo de Pesquisa, Informação, Aprendizagem e Conhecimento (GIACO). Bibliotecária da Universidade Federal da Paraíba (UFPB - Campus IV).

[5] Mestre em Gestão nas Organizações Aprendentes (MPGOA- UFPB). Especialista em Gestão de Unidades de Informação. Graduação em Biblioteconomia (UFPB). Participante do Grupo de Pesquisa, Informação, Aprendizagem e Conhecimento (GIACO).