GESTÃO DA INFORMAÇÃO PARA PRESERVAÇÃO DA MEMÓRIA DA BIENAL DO LIVRO DE ALAGOAS

uma proposta para sua execução

Fátima Caroline Pereira de Almeida Ribeiro1

Universidade Federal de Alagoas

fcparibeiro@gmail.com

José Rodolfo Tenório Lima2

Universidade Federal de Alagoas

jrtlima@gmail.com

Milka Alves Correia Barbosa3

Universidade Federal de Alagoas

milka.correia@feac.ufal.br

 

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Resumo

A Bienal do Livro de Alagoas é uma iniciativa da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), realizada por meio de sua Editora (Edufal). Consolidada, ao longo dos anos, como o maior evento cultural do estado, é a única bienal promovida por uma Instituição de Ensino Superior (IES) pública no Brasil e que oferece atividades totalmente gratuitas. Entretanto, apesar de sua dimensão e importância para Alagoas, nota-se que existem lacunas em relação à preservação e à divulgação de informações sobre a iniciativa, implicando em dificuldades de atuação da equipe de produção e levando ao seguinte questionamento: como é feita a gestão da informação para a preservação da memória da Bienal do Livro de Alagoas? Esta pesquisa consiste em um estudo de caso de natureza qualitativa e exploratória, realizado por meio de entrevistas a partir de um roteiro semiestruturado de perguntas. Foram consultados relatórios técnicos de diversas edições do evento. Os dados obtidos foram tratados a partir da análise de conteúdo de Bardin (2011). Como resultado, constatou-se que a falta de sistematização dos registros sobre a organização da Bienal do Livro de Alagoas compromete o desempenho de profissionais envolvidos/as em sua realização no tocante a situações vividas e dificuldades encontradas e superadas.

Palavras-chave: gestão da informação; memória organizacional; bienal do livro de Alagoas.

 

 

 

 

 

 

INFORMATION MANAGEMENT TO PRESERVE THE MEMORYOF THE ALAGOAS BOOK BIENNIAL

a proposal for its implementation

 

Abstract

The Alagoas Book Biennial is an initiative of the Federal University of Alagoas (Ufal), organised through its publishing house (Edufal). Consolidated over the years as the biggest cultural event in the state, it is the only biennial promoted by a public higher education institution in Brazil that offers totally free activities. However, despite its size and importance for Alagoas, there are gaps in the preservation and dissemination of information about the initiative, leading to difficulties for the production team and the following question: how is information management carried out to preserve the memory of the Alagoas Book Biennial? This research consists of a case study of a qualitative and exploratory nature, carried out through interviews based on a semi-structured script of questions. Technical reports from various editions of the event were consulted. The data obtained was processed using Bardin’s (2011) content analysis. As a result, it was found that the lack of systematised records on the organisation of the Alagoas Book Biennial compromises the performance of the professionals involved in its organisation in terms of situations experienced and difficulties encountered and overcome.

Keywords: information management; organizational memory; Alagoas book biennial.

Resumen

La Bienal del Libro de Alagoas es una iniciativa de la Universidad Federal de Alagoas (Ufal), organizada a través de su editorial (Edufal). Consolidada a lo largo de los años como el mayor evento cultural del estado, esta es la única bienal promovida por una institución de educación superior pública en Brasil que ofrece actividades totalmente gratuitas. Sin embargo, a pesar de su dimensión e importancia para Alagoas, existen lagunas en la preservación y difusión de la información sobre la iniciativa, lo que genera dificultades para el equipo de producción y la siguiente pregunta: ¿cómo se realiza la gestión de la información para preservar la memoria de la Bienal del Libro de Alagoas? Esta investigación consiste en un estudio de caso de carácter cualitativo y exploratorio, realizado a través de entrevistas basadas en un guión semiestructurado de preguntas. Se consultaron informes técnicos de varias ediciones del evento. Los datos obtenidos se procesaron mediante el análisis de contenido de Bardin (2011). Como resultado, se constató que la falta de registros sistematizados sobre la organización de la Bienal del Libro de Alagoas compromete la actuación de los profesionales involucrados en su organización en términos de situaciones vividas y dificultades encontradas y superadas.

Palabras clave: gestión de la información; memoria organizacional; bienal del libro de Alagoas.


 

1 INTRODUÇÃO

A partir dos pressupostos de que o conhecimento é construído individualmente e de que a memória está ligada às relações sociais estabelecidas por grupos da sociedade moderna (Molina; Valentim, 2011), entende-se que a socialização de experiências entre sujeitos em uma organização é de extrema importância para a construção de sua memória e a consolidação de suas práticas gerenciais.

No entanto, observando-se a realidade de grande parte das organizações públicas brasileiras, percebe-se que, muitas vezes, não existe gestão adequada das informações a elas pertencentes, havendo escassez ou acúmulo de dados sem tratamento correto (Simeão et al., 2016).

A gestão da informação consiste em uma ferramenta essencial para o conhecimento e o gerenciamento da memória, representando “um campo onde estudos e pesquisas devem ser desenvolvidos e aprofundados de maneira contínua, de modo a gerar benefícios a todos os agentes implicados, quais sejam: organizações, funcionários, colaboradores, parceiros, clientes, governos, cidadãos, etc.” (Damian; Cabero, 2020, p. 2).

Por meio da gestão da informação, funcionários e servidores – no caso de organizações da Administração Pública – compreendem a cultura do ambiente em que estão inseridos, preparam-se para agir diante de cenários de crise e podem ter acesso a ações que geraram bons resultados, a fim de repeti-las, e também às ações com resultados negativos, a fim de evitá-las.

Com o aprendizado proveniente do registro de experiências, tempo e energia das equipes são poupados, diminuindo-se o risco de retrabalho. Desta maneira, a partir do conhecimento registrado, pode-se ter acesso a soluções para dificuldades enfrentadas e sanadas anteriormente, resultando em avanços nas práticas.

Para uma gestão eficiente da informação, é necessário que a organização seja capaz de reter o conhecimento de sua própria história, mesmo diante da ausência de seus fundadores ou de mudanças no quadro institucional. No ambiente da Administração Pública, em particular nas universidades, como dizem Roncaglio e Simeão (2016, p. 9), “[...] estamos enfrentando problemas que se avolumam em função do crescimento exponencial da informação administrativa e acadêmica e, paralelamente, enfrentando dificuldades com a estrutura física e tecnológica”.

Silva (2020, p. 108-109) aponta que, além de ser uma ferramenta de resgate de informações, “consolidando valores, disseminando conhecimentos e gerando novos produtos [...], [permitindo] a construção de uma identidade, mesmo em meio a mudanças e turbulências”, a gestão da informação fornece subsídios para planejar ações e formular objetivos e estratégias, além de atuar como incentivadora e mantenedora da cultura organizacional.

Conhecida como o maior evento artístico e cultural do Estado de Alagoas (Lameiras, 2013), a Bienal do Livro vem se destacando, ao longo dos anos, como importante política cultural viabilizada por uma Instituição de Ensino Superior (IES) de natureza pública, que conta com o apoio de parceiros das iniciativas pública e privada.

Em 1998, a Editora da Universidade Federal de Alagoas (Edufal) realizou a 1ª Bienal do Livro e da Arte de Alagoas. Com o passar dos anos e as mudanças na gestão da Edufal, houve modificações na periodicidade e no título da iniciativa, que passou a ser denominada Salão Alagoano do Livro e da Arte, sendo realizada anualmente entre 1999 e 2004.

Em 2005, o formato de Bienal do Livro foi retomado. O número de estandes de exposição e comercialização de títulos aumentou de 25, na primeira edição, para 52. Além disso, o evento registrou visitação de cerca de 50 mil pessoas e teve como novidades a captação de recursos com organizações públicas e privadas e a presença de grupos de instituições de ensino, por meio de visitas previamente agendadas com a organização da Bienal (Silva, 2013).

Em 2007, mais de 100 mil pessoas visitaram a Bienal do Livro de Alagoas (Maluf, 2007), realizada no Centro Cultural e de Exposições Ruth Cardoso, o Centro de Convenções de Maceió, que passou a sediar o evento até 2017. Nessa edição, houve participação de quatro países: França, o país homenageado, Peru, México e Portugal. A presença de obras e/ou representantes dessas nações dentre as atrações deu ao evento a chancela de internacional.

Em sua quarta edição, em 2009, a Bienal do Livro de Alagoas recebeu a visita de mais de 150 mil pessoas nos 10 dias de programação, sendo mais de 60 mil desse total alunos das redes pública e particular de ensino do estado (Maluf, 2009). A França foi, novamente, o país homenageado, devido às comemorações do Ano da França no Brasil. O número de países da ala internacional também cresceu: além da França, estiveram presentes Angola, Cabo Verde, Colômbia, Costa Rica, Guiné Bissau, México, Moçambique, Peru e Portugal, e também nações da América Latina e do Caribe, na Exposição de Editoras Universitárias.

Dados do Relatório da 5ª Bienal Internacional do Livro de Alagoas apontam que a quinta edição da Bienal do Livro de Alagoas recebeu mais de 190 mil visitantes. Estiveram presentes no evento “mais de 500 editoras universitárias e comerciais de todo o país” (Maluf, 2011, p. 3), distribuídas em 147 estandes de exposição e comercialização de livros.

Em 2013, já sob nova direção, a Edufal realizou a 6ª Bienal do Livro de Alagoas, sendo Portugal o país homenageado. Com o mote “Descobrir nas palavras a magia dos sentidos”, o evento teve como marco conceitual o entrelaçamento entre Portugal e Brasil, promovendo “uma extensão das atividades iniciadas em 7 de setembro de 2012, Dia da Independência do Brasil, e encerradas em 10 de junho de 2013, quando se comemora o Dia de Portugal” (Lameiras, 2013, p. 2), perfazendo a trajetória literária “do trovadorismo ao cordel”. Marcaram presença na ala internacional, além de Portugal, Colômbia, França, Peru e México.

Em 2015, a 7ª edição da Bienal do Livro de Alagoas contou com 133 estandes de editoras, livrarias, órgãos públicos e privados. Micro e pequenas empresas – artesanatos, lanchonetes, pequenas livrarias e editoras – também tiveram a oportunidade de expor e comercializar seus trabalhos no pavilhão da feira. Isso proporcionou a geração de empregos temporários nos 10 dias do evento (Lameiras, 2015).

A 8ª Bienal do Livro de Alagoas, realizada em 2017, teve como tema: “Livros que envolvem, leituras que libertam”. O mote da edição foi o Bicentenário da Emancipação Política de Alagoas (1817-2017) e representou uma oportunidade “para refletirmos sobre nossa formação histórica e sobre a construção da consciência e de uma subjetividade permeados pela lente da Alagoanidade” (Maciel, 2017, p. 6). No pavilhão de exposições, 136 estandes abrigavam editoras, livrarias, órgãos públicos e privados; micro e pequenas empresas de artesãos, livreiros e suas livrarias de pequeno porte puderam, mais uma vez, expor e comercializar seus trabalhos no espaço.

Em 2019, a 9ª edição da Bienal do Livro de Alagoas saiu do Centro de Convenções para as ruas e os espaços públicos do bairro histórico de Jaraguá, em Maceió, tendo atividades realizadas na Praça Dois Leões, na Igreja de Nossa Senhora Mãe do Povo, no Espaço Armazém e em outros locais da Rua Sá e Albuquerque. A edição teve como tema: “Livro aberto: leitura, liberdade e autonomia”. Na programação,

além da tradicional feira de livros, o evento contou com lançamentos de novos títulos, oficinas, palestras, rodas de conversa, espetáculos de música, dança, teatro e outras expressões artísticas, contação de histórias, bate-papos com autores/as convidados/as, espaços de convivência e alimentação. [...] Durante os 10 dias de evento, 380 mil pessoas estiveram presentes nos distintos espaços que agregavam leitura, cultura, produção e divulgação do conhecimento. (Barretto, 2019, p. 5).

 

Em 2023, depois da impossibilidade de realizar o evento em 2021, devido à crise sanitária provocada pela epidemia de Covid-19, o público alagoano pôde conferir a 10ª edição da Bienal do Livro de Alagoas, entre os dias 11 e 20 de agosto. Segundo dados divulgados pela Assessoria de Comunicação da Ufal (Ascom/Ufal), 412.726 pessoas passaram pela 10ª Bienal, que teve como cenário, novamente, o Centro Cultural e de Exposições Ruth Cardoso, no bairro de Jaraguá, em Maceió, sendo 42.120 estudantes das redes pública e privada de ensino de Alagoas com visitas agendadas e grupos sociais (Pereira, 2023).

De acordo com a Ascom/Ufal (Pereira, 2023), foram lançados, durante o evento, aproximadamente 500 novos livros (obras físicas e e-books); foram realizadas 25 oficinas com temáticas variadas e 85 atividades entre mesas-redondas e palestras, além de eventos de grande porte promovidos pela Ufal, a exemplo dos seminários de Educação e de comemoração aos 90 anos da Faculdade de Direito de Alagoas (FDA).

Entre 2005 e 2019, foram produzidos relatórios técnicos das edições da Bienal Internacional do Livro de Alagoas, material onde é possível encontrar dados, em sua maioria quantitativos, relativos a cada uma delas, como: natureza e total de atividades realizadas (palestras, mesas-redondas, oficinas, apresentações artísticas e culturais e outras), programação, quantidade de estandes, estatística de visitação, clipagem de notícias e acervo fotográfico. A finalidade principal desses relatórios consistia em, ao final do evento, prestar contas para patrocinadores, bem como apresentar um resumo para a gestão da Universidade Federal de Alagoas (Ufal).

Apesar da importância para o estado de Alagoas, a Bienal do Livro apresenta uma problemática quanto à gestão de sua memória. A falta de sistematização na salvaguarda dessas informações, a não permanência de dados veiculados em meios oficiais a respeito da organização do evento e de seus desdobramentos e a alta rotatividade da equipe de trabalho comprometem o desempenho dos profissionais envolvidos em sua realização, pelo desconhecimento de processos e tomadas de decisão que deram ou não certo e que poderiam ser repetidos, adaptados ou evitados, a depender da situação.

Diante do exposto, tem-se a necessidade de investigar e propor alternativas de como a gestão da informação para a preservação da memória gerencial pode ser desenvolvida na Bienal do Livro de Alagoas. Sendo assim, este artigo está estruturado da seguinte maneira: na primeira parte, são explanados os procedimentos metodológicos da pesquisa; em seguida, é apresentado um diagnóstico de como é feita a gestão da informação da Bienal do Livro de Alagoas, apontando soluções para a problemática encontrada.

Por fim, pretende-se, neste texto, apresentar a importância da gestão da informação para preservação da memória gerencial e, com isso, sugerir estratégias de práticas gerenciais que possibilitem às equipes produtoras uma socialização do conhecimento adquirido, facilitando, desta forma, a organização e a operacionalização da Bienal do Livro de Alagoas.

2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Esta pesquisa consiste em um estudo de caso de natureza qualitativa. Para obter informações necessárias à construção deste artigo, foram consultados os relatórios técnicos das edições de 2005 a 2019 da Bienal do Livro de Alagoas. Por meio desses documentos, foi possível analisar o histórico de crescimento do evento e a proporção que ele tomou em Alagoas, principalmente nos campos da Educação e da Cultura.

Buscando obter o diagnóstico situacional da gestão da informação da memória da Bienal do Livro de Alagoas com relação à execução das atividades em todas as etapas (pré-produção, evento e pós-produção), foram realizadas entrevistas com sujeitos envolvidos no planejamento, na organização e na execução de suas diversas edições.

O perfil dos profissionais público-alvo das entrevistas que norteiam esta pesquisa foi definido por se tratarem de conhecedores e/ou protagonistas das mais diferentes experiências no evento, tendo, cada um, participado de pelo menos uma edição da Bienal do Livro de Alagoas, representando um público que pode contribuir significativamente para a construção da Bienal.

Os participantes da pesquisa – 13, no total – foram identificados pela inicial E, de entrevistado, seguida de um número cardinal. A área de atuação de cada um – organização/produção e coordenação – também foi determinada e mostrou-se importante na avaliação dos resultados: a depender do setor de trabalho no evento, há divergências entre algumas percepções sobre acontecimentos, necessidades e pontos positivos e negativos.

As perguntas da entrevista foram distribuídas entre as seguintes categorias de análise (Reátegui et al., 2015):

1)    Aquisição: obtenção de informações, que devem ser pré-selecionadas, filtrando os dados mais relevantes para a organização;

2)    Codificação: representação das informações de modo a permitir o acesso a elas;

3)    Armazenamento: classificação e armazenamento das informações já codificadas;

4)    Manutenção: revisão e adaptação dos ativos armazenados e melhoria dos mecanismos para acessá-los;

5)    Recuperação: deve permitir que as informações sejam acessadas, analisadas e recuperadas diariamente na organização, por meio de mecanismos de busca que facilitam o processo;

6)    Transferência: disseminação da informação de modo compreensível e em tempo hábil para o usuário que dela necessita.

Os dados das entrevistas foram extraídos de arquivos de áudio gravados e transcritos automaticamente em arquivo Word, por meio do software Transkiptor. Em seguida, foi feita a comparação dos arquivos em formato de texto com os áudios gravados, para eliminar possíveis inconsistências e permitir a reprodução escrita fidedigna das respostas concedidas.

Após a impressão dos arquivos com as transcrições, foi feita a análise das entrevistas, destacando e agrupando os dados obtidos de acordo com as categorias acima mencionadas, com base nos conceitos estabelecidos por Reátegui et al. (2015).

O projeto desta pesquisa foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Ufal (CEP/Ufal), em setembro de 2022, por meio da Plataforma Brasil,
e identificado pelo Certificado de Apresentação de Apreciação Ética (CAAE)
nº 63251022.6.0000.5013.

 

3 GESTÃO DA INFORMAÇÃO PARA PRESERVAÇÃO DA MEMÓRIA DA BIENAL DO LIVRO DE ALAGOAS: DO DIAGNÓSTICO A POSSÍVEIS SOLUÇÕES

No âmbito da Administração, as organizações podem ser entendidas como fontes de conhecimento histórico, identitário, de funcionamento, administrativo e humano que reúnem dados que podem representar experiências humanas ou organizacionais. Dentro desse contexto, surge o conceito de Memória Organizacional (MO) como meio de armazenar, preservar e promover o acesso a esses conhecimentos (Montoya; Teles, 2016) e, diante de seu caráter dinâmico, possibilitar o diálogo e a construção de ações de diferentes naturezas que irão impactar no funcionamento de uma organização.

A Memória Organizacional deve constituir-se em “uma fonte útil de informações e ser um parceiro ativo para o trabalho de solução cooperativa de problemas” (Silva, 2020, p. 91). Dentre seus principais objetivos está a formação de mecanismos que possibilitem o armazenamento de documentos e informações que possam ser acessadas pelos usuários sempre que necessário.

Na concepção de Santos e Valentim (2021, p. 209), “a memória organizacional é prática, pragmática, objetiva, está a serviço, tem foco em ações concretas e na construção de processos de gerenciamento e está voltada à produtividade”. Além disso, “quadros sociais em constante interação, bem como essas razões e intenções, compõem a memória do ambiente organizacional ou institucional” (Santos; Valentim, 2021, p. 217).

Segundo Silva (2020, p. 90), “A Memória Organizacional deve ter como principais objetivos a prevenção de perdas, o incremento ao acesso a todos os tipos de conhecimentos corporativos por meio de repositórios e informações atualizadas e bem estruturadas” e, levando em conta suas características, integrar todas as ferramentas que produzam dados e conhecimento dentro da organização.

A gestão da informação em instituições é muito importante e deve ser feita coletivamente, com a contribuição de cada indivíduo, sendo preservada de forma a poder ser acessada posteriormente. A partir dela, funcionários e servidores compreendem a cultura do ambiente em que estão inseridos, preparam-se para agir diante de cenários de crise e podem ter acesso a ações que geraram bons resultados, a fim de repeti-las, e também às ações com resultados negativos, a fim de evitá-las.

Para uma gestão da memória eficiente e eficaz, é necessário que a organização seja capaz de reter o conhecimento de sua própria história, mesmo que diante da ausência de seus fundadores ou de mudanças em seu quadro institucional. A Memória Gerencial refere-se ao registro de informações necessárias para a realização de um procedimento ou evento contínuo ou com periodicidade definida, independentemente de alterações no quadro de funcionários/as de uma organização.

A gestão da informação gerencial refere-se ao registro de informações necessárias para a realização de um procedimento ou evento contínuo ou com periodicidade definida, como é o caso da Bienal do Livro de Alagoas. Desse modo, por meio do registro e da recuperação de informações e conhecimentos relevantes, após filtrar dados que não serão aproveitados naquele determinado contexto, tem-se a possibilidade de efetivação dessa memória.

A partir dos processos de aquisição, codificação, armazenamento, manutenção, recuperação e transferência definidos por Reátegui et al. (2015), os Sistemas de Memória Organizacional (SMO) constituem espaços onde se preserva o conhecimento do passado, utilizando-o em atividades do presente e do futuro.

No que diz respeito à prática do gerenciamento da informação relativa à memória sob a perspectiva dos envolvidos no processo de execução das atividades produtivas do evento, os resultados das entrevistas realizadas com servidores e prestadores de serviço evidenciam lacunas. Com base nas categorias propostas por Reátegui et al. (2015), demonstra-se, nos tópicos a seguir, como essas lacunas são explicitadas.

 

 

 

 

3.1 Diagnóstico: como é feita a guarda da memória gerencial da Bienal do Livro de Alagoas

A estruturação da Gestão da Memória (GM) no processo de concepção e desenvolvimento da Bienal do Livro de Alagoas pode garantir o armazenamento das informações gerenciais mais importantes relacionadas ao evento, bem como dos processos de construção e realização de cada etapa necessária à execução do projeto, funcionando como uma espécie de “filtro” de informações relevantes para a construção da memória.

Percebeu-se, no decorrer da pesquisa, a ausência de registros do modus operandi da Bienal do Livro de Alagoas – uma espécie de modelo contendo a descrição de soluções para problemas enfrentados, bem como estratégias a serem adotadas para auxiliar a equipe de produção do evento, formada por servidores e prestadores de serviço. Esse modus operandi é aqui chamado de memória gerencial e refere-se ao registro de informações necessárias para a realização de um procedimento ou evento contínuo ou com periodicidade definida, a exemplo da Bienal do Livro de Alagoas.

A falta dessa salvaguarda de informações gerenciais faz com que a equipe conte apenas com o registro oral e a memória individual de pessoas que atuaram em edições anteriores, o que compromete a gestão da memória organizacional da iniciativa.

A seguir, são apresentados os resultados das entrevistas realizadas com servidores e prestadores de serviço que atuaram na organização da Bienal do Livro de Alagoas e também com coordenadores de edições do evento, de acordo com as categorias de análise estabelecidas pela autora com base no trabalho de Reátegui et al. (2015): 1. Aquisição das informações; 2. Codificação das informações; 3. Armazenamento das informações;
4. Manutenção das informações; 5. Recuperação das informações; 6. Transferência das informações.

 

3.1.1 Aquisição das informações

Conforme a definição de Reátegui et al. (2015), aquisição é o processo de obtenção de informações sobre uma organização. Essas informações devem ser pré-selecionadas, filtrando-se as mais relevantes. A partir disso, a Memória Organizacional (MO) poderá ser criada.

O que eu tive dificuldade com isso foi que a gente não tinha muita referência [...] dos resultados que a gente tava tendo, né? E também não tinha muito do que tinha sido. Assim, das outras edições, a gente contava muito com a memória, memória mesmo [memória individual], né? Do que cada um que participou das outras edições lembrava. Como tinha feito em alguma situação. (E1, grifo nosso).

Existe, sim, registro, registro escrito, relatórios, registro fotográfico, né? Imagético, da identidade visual, e a gente acessa esse material. Agora é um registro cuja guarda não é feita de forma sistematizada e da maneira mais adequada, com sistemas de informação [...]. Ele é feito meio que de forma relativamente espontânea, digamos assim, em função das atribuições administrativas das secretarias, da editora, etc. [...]. (E10, grifo nosso).

 

A partir das falas de E1 e E10, pode-se inferir que a principal forma de aquisição das informações sobre a produção e a execução da Bienal do Livro de Alagoas dá-se por meio do contato com servidores mais antigos, contando com a memória individual de cada um com relação ao funcionamento do evento.

Arasaki, Steil e Santos (2016) denominam redes sociais o processo de obtenção de informações e conhecimento por meio de pessoas. Segundo elas, as redes sociais utilizam-se, principalmente, do conhecimento tácito, definido por Fleury (2002, p. 139) como aquele que “possui uma qualidade pessoal, tornando-se mais difícil de ser formalizado e comunicado”.

Embora representem facilidade para a obtenção das informações, as redes sociais possuem uma falha justamente pelo conhecimento estar concentrado nas pessoas e depender da rememoração individual dos eventos ocorridos, não havendo um registro que possa ser consultado para confirmar o que foi dito ou sanar possíveis dúvidas.

Além dos relatórios técnicos, E7 levanta a necessidade de existir compilação, organização e transferência das informações de produção executiva do evento, corroborando para a construção do que aqui chamamos memória gerencial, que seria uma parte da MO da Bienal do Livro de Alagoas:

É um trabalho de explorar, né? [...] de procurar as pessoas que já trabalharam, de acessar esses documentos. [...] Se você tem um projeto antigo, se você tem ali registrada a programação, tentar ter acesso, né? A essa memória, porque você nunca tá inventando a roda, né? É muito importante você ter uma história, acesso a esse material pra balizar a sua atuação, né? (E7, grifo nosso).

Segundo a maioria dos entrevistados, embora ocorram reuniões de pré-evento, não há registro formal. Nesses encontros, são passadas informações referentes à dinâmica de atuação profissional na Bienal. A elaboração e o arquivamento de atas que pudessem ser acessadas posteriormente pela equipe seriam mais uma medida de preservação da memória da Bienal do Livro de Alagoas.

Na edição de 2019, houve, pela primeira vez, uma reunião de pós-evento, momento em que os coordenadores de cada comissão de trabalho apresentaram suas dificuldades de atuação. Essa iniciativa foi recebida com muito entusiasmo pela equipe.

[...] a gente teve uma avaliação [em 2019]. Foi a primeira vez que a gente fez uma reunião de um pós-dificuldades, então. É, e foi até documentado por e-mail, se não me engano. [...] Eu lembro de, ao final do evento, a gente ter feito. Cada um ficou responsável por um setor, né?, de atuação, e a gente fez um relatório daquele setor. Aí eu lembro que, nessa reunião, a gente apresentou esse relatório. Aí, eu não lembro se foi feita a ata dessa reunião. (E3, grifo nosso).

Na reunião mencionada por E3, os registros feitos pelos coordenadores das comissões de trabalho na Bienal do Livro de Alagoas foram compartilhados com a coordenação-geral do evento – a direção da Edufal – e apresentados à gestão da Ufal juntamente com outras informações que compuseram o Relatório Técnico da 9ª Bienal Internacional do Livro de Alagoas. No entanto, esse relatório não chegou a ser compartilhado com toda a equipe de produção.

No tocante às reuniões no decorrer do evento, a maioria dos entrevistados relatou haver apenas conversas entre os membros das comissões ou entre uma e outra comissão cujo trabalho estivesse interligado. Não há relatos de registros escritos desses momentos.

São feitas as reuniões no final do dia, né? Mas não tem esse registro de, digamos, não tem uma ata de reunião, né? É mais uma reunião acho que [...] operacional, pra ver o que houve de problema pra, no outro dia, não repetir o problema [...]. (E1, grifo nosso).

A comunicação entre as equipes de trabalho também ocorre por ligações telefônicas ou pelo uso de rádios-comunicadores. Todos esses aspectos contribuem para a falta de registros que possam ser acessados posteriormente, pois até mesmo as conversas em grupos de WhatsApp, por mensagens de texto ou áudios, não são sistematizadas depois do evento, uma vez que existem muitas demandas de pós-produção e não há um setor ou pessoas designadas para fazer esse levantamento, a filtragem e o armazenamento dos aspectos relevantes.

De acordo com os dados obtidos nas entrevistas, a maioria dos entrevistados concorda que existem dificuldades quanto à aquisição de informações sobre as edições da Bienal do Livro de Alagoas, sendo a falta de registros escritos e compartilhados um dos principais entraves relatados.

 

3.1.2 Codificação das informações

O processo de codificação das informações diz respeito à representação do conhecimento de forma que possa ser acessado (Reátegui et al., 2015). O conhecimento explícito é também denominado conhecimento codificado e define as informações compartilhadas em linguagem formal, de modo sistemático (Fleury, 2002).

Como sugestão para a codificação das informações sobre a memória gerencial da Bienal do Livro de Alagoas, pode-se pensar na criação de um glossário que reúna as principais palavras-chaves relativas às atividades desempenhadas, para que sejam compartilhadas com toda a equipe e não se percam.

Agora mesmo, eu estava lembrando, tipo: ah, tem algumas pessoas que não estão adicionadas no grupo [de WhatsApp], então perdem a informação. Cê compartilha a imagem, cê não tem, tipo, uma lista de e-mails, né? Que você faz a ata, cê compartilha, mas fica meio que fragmentada, né? Cê não sabe se chegou, né? A todo mundo. (E7, grifos nossos).

Para Spiller e Pontes (2007, p. 99), “[...] as experiências pelas quais passa uma organização são acumuladas, ao longo dos anos, nas suas pessoas, cultura, processos e em seus documentos, e esse conjunto de conhecimentos forma a sua memória”.

De acordo com Silva (2020, p. 91), “a Memória Organizacional demonstra sua efetividade ao disponibilizar conhecimentos relevantes, sem que o requerente seja inundado por dados inúteis”. Assim, percebe-se que existe a necessidade de filtrar e armazenar as informações, transformando-as em dados codificados, para que se possa definir o que e para quem é fundamental ser repassado ou publicizado.

 

3.1.3 Armazenamento das informações

O armazenamento das informações consiste na classificação e na guarda do conhecimento já codificado (Reátegui et al., 2015). Essa etapa busca encontrar soluções para armazenar os ativos já filtrados, de maneira impressa (como os relatórios técnicos da Bienal do Livro de Alagoas) ou virtual (dados em e-mails e pastas do Google Drive).

E1 aponta a dificuldade de encontrar informações:

[...] não acho nada oficial, acho algumas matérias [em sites de notícias], né? Alguns links que até não funcionaram [...]. A gente não tem acesso ao que foi que aconteceu na edição passada. [...], o próprio compartilhamento de relatórios das [edições] passadas também é um pouco complicado, assim. [...]. Seria uma grande ajuda, esse suporte de informação. (E1, grifo nosso).

 

Isso se deve, principalmente, ao que já foi mencionado: a supressão de informações ou dos sites do evento sem uma prévia organização sistemática dos dados que possibilitasse acesso a eles a qualquer tempo.

Não tinha um lugar pra acessar essas informações [...], um espaço onde todo mundo pudesse ver tudo. No e-mail, por exemplo. Mas isso também é relativo, porque assim, cada um acaba ficando numa comissão. E não necessariamente tudo precisa ser visto e acompanhado por todos. Quando você chega numa reunião, você filtra e traz aquilo que precisa, de fato, ser compartilhado, mas não as coisas mais específicas daquela minha área de produção. (E11, grifos nossos).

 

Embora “não necessariamente tudo precisa ser visto e acompanhado por todos”, E11 aponta, em sua fala, a falta de um lugar para acessar as informações. O lugar pode ser entendido como uma referência, física ou virtual, onde as informações pudessem ser obtidas.

Desse modo, o correto armazenamento é visto, cada vez mais, como fundamental para estruturar a MO da Bienal do Livro de Alagoas, bem como para o desenvolvimento do trabalho da equipe de produção do evento, “pois a falta de lembranças e de estruturação da memória pode fazer com que informações e conhecimentos potencialmente competitivos ou legitimados se percam” (Santos; Valentim, 2021, p. 216).

 

3.1.4 Manutenção das informações

A manutenção das informações é a revisão e adaptação dos ativos armazenados, buscando melhorar os mecanismos para acessá-los. A interação e a colaboração do capital humano são fundamentais para essa etapa, pois, no momento da criação dos Sistemas de Memória Organizacional (SMO), o conteúdo da MO é incompleto, sendo necessário um ciclo contínuo de alimentação e tratamento dos dados disponibilizados (Reátegui et al., 2015).

Apesar de reconhecer que há, em alguma medida, um esforço para a preservação da MO da Bienal, E10 afirma que

A forma de cuidar [da MO] da Bienal não tem sido satisfatória. Primeiro, é preciso dizer que existe uma memória, que existe um cuidado. E que ele segue alguns ditames e algumas práticas e orientações administrativas da Administração Pública. [...] em função da própria cultura administrativa e da gestão da ciência da informação, da gestão da informação que a gente tem no Estado, na Universidade, em particular. [...] Isso termina refletindo na forma como a memória da Bienal é registrada e guardada. (E10, grifos nossos).

 

Na opinião de E4,

O acesso às informações e divulgação da Bienal no interior também não é bem executado. O site não está disponível, e nas redes sociais não percebi links que levem para os eventos dos anos anteriores, nem na página da Ufal. Atualmente, só sei do evento por ter amigos que divulgam a participação. (E4, grifos nossos).

 

Como afirma Silva (2020, p. 90), “A Memória Organizacional deve ter como principais objetivos a prevenção de perdas, o incremento ao acesso a todos os tipos de conhecimentos corporativos por meio de repositórios e informações atualizadas e bem estruturadas”. Para que haja manutenção na MO, é preciso que os passos anteriores, da aquisição ao armazenamento, tenham sido executados adequadamente.

No caso da Bienal do Livro de Alagoas, por se tratar de um evento com periodicidade definida, que ocorre a cada dois anos, toda edição traz novas informações – que vão precisar de codificação e armazenamento adequado até chegar à etapa de manutenção.

 

3.1.5 Recuperação das informações

A recuperação das informações deve permitir que elas sejam acessadas e analisadas diariamente na organização, por meio de mecanismos de busca que facilitem o processo (Reátegui et al., 2015). As informações sobre edições anteriores da Bienal, como visto, são disponibilizadas em relatórios técnicos – para aqueles que têm conhecimento de sua existência –, reuniões pré-evento e conversas informais entre os membros da equipe.

De alguma forma, essas socializações nas reuniões são importantes, porque cobrem um pouco das lacunas e já revelam um certo sentido valorativo do que foi a experiência que deu certo e qual foi a experiência que deu errado na tomada de decisão [...]. Então, tudo isso contribui, mas, ao mesmo tempo que é uma facilidade, a forma como essa facilidade é acessada termina virando também uma dificuldade, termina virando uma lacuna nessa transmissão da informação, nesse acesso à informação [pela falta de registros formais]. (E10, grifos nossos).

 

[...] No decorrer das reuniões, você vai partilhando essas experiências, né? Reavivando aí, da memória. Olha, isso aqui deu certo, aí você cruza um evento com outro, né? Ó, aqui deu porque era assim o formato. Então, as mudanças do local também vão fazer essa variação, né? [...] O que foi bom aqui nessa que a gente pode levar, né isso? (E12, grifos nossos).

 

Embora as dificuldades de atuação dos setores na Bienal do Livro de 2019 tenham sido sistematizadas no relatório técnico apresentado à Reitoria da Ufal, parte da equipe não se recorda ou desconhece a existência desse documento, assim como dos relatórios técnicos das edições anteriores do evento, produzidos com a finalidade de prestar contas aos patrocinadores e à universidade. Isso reforça que as informações, embora estejam registradas em alguma escala, não têm circulado entre todos os envolvidos.

Sobre facilidades e dificuldades de recuperar informações sobre as atividades da Bienal do Livro de Alagoas, em determinado momento, chegou-se a um ponto de saturação nas entrevistas. Para evitar a repetição das falas, optou-se por listar as principais respostas:

 

 

 

 

 

 

Quadro 2 - Facilidades e dificuldades na busca de informações sobre a Bienal do Livro de Alagoas

FACILIDADES

DIFICULDADES

     Trabalhar com pessoas que participaram de outras edições da Bienal;

     Bom relacionamento da equipe;

     Saber onde buscar as informações;

     Informações acessíveis por meio das pessoas;

     Estar lotado, enquanto servidor ou funcionário, em setores diretamente vinculados à organização do evento;

     Pessoal capacitado;

     Ter experiência de participação em outras edições da Bienal.

    Informações dispostas de maneira dispersa;

    Falta de registro formal de edições anteriores;

    Dificuldade no processo de produção dos livros a ser publicados;

   Atraso nos prazos de entrega da gráfica, por conta da alta demanda;

   Falta de um repositório com informações sobre a Bienal;

    Captação de recursos;

    Equipe pequena para trabalhar em um evento de grande porte.

Fonte: Elaborado pelos autores com base nas respostas obtidas nas entrevistas (2023).

 

Deste modo, percebe-se que o registro formal faz-se necessário para orientações futuras, a fim de que se possam recuperar informações pertinentes à atuação no evento e compartilhá-las devidamente, sendo esse registro “uma fonte útil de informações e um parceiro ativo para o trabalho de solução cooperativa de problemas” (Silva, 2020, p. 91).

 

3.1.6 Transferência das informações

A transferência das informações consiste na disseminação do conhecimento de modo compreensível e em tempo hábil para o usuário que dele necessita (Reátegui et al., 2015).

Almeida (2006) considera a memória como uma função que traz benefícios aos seres humanos, permitindo que experiências passadas sejam utilizadas para solucionar novos problemas. Para isso, é necessário que a memória esteja fundamentada em habilidades de quatro pilares: aquisição, armazenamento, recuperação e reuso de informação.

Devido ao ponto de saturação nas entrevistas, assim como ocorreu quanto às facilidades e dificuldades na busca de informações com relação ao evento, apontadas na seção anterior, aqui construiu-se uma lista das principais respostas identificadas. Deste modo, tem-se que a transferência de informações e conhecimentos provenientes de experiências ou práticas durante o evento ocorre, principalmente, por meio de:

       Conversas informais;

       Troca de experiências entre as pessoas que participaram do evento;

       Reuniões de pré e pós-produção;

       Aproveitamento de procedimentos adotados anteriormente, mantendo o que deu certo e melhorando o que não funcionou, de acordo com as condições oferecidas.

 

Quanto à preocupação de colegas na busca de registros anteriores quando precisam resolver problemas, a maioria dos entrevistados declarou que percebe esse sentimento. No entanto, esbarra-se na mesma questão da dificuldade de obtenção de registros formais para a transferência de conhecimentos.

[...] sempre essa preocupação dos meus colegas, quando vão montar uma nova Bienal, pra ver o que deu certo e o que não deu. Aí, falta esse registro e essa circulação, né? Da informação. (E2, grifo nosso).

 

Uma vez ou outra, a gente procura: como é que a gente fez na outra Bienal? Mas não tem isso registrado, então a gente procura “mentalmente”. [...] Sempre nessa questão do contato com as pessoas, né? Com os colegas. (E3, grifo nosso).

 

Santos (2003) afirma que somos constituídos pela memória que temos – e não se trata apenas de pensamento, imaginação e construção social –, formada por nossa experiência de vida, sendo capaz de modificar outras experiências ao entrar em contato com elas.

 

3.2 Um possível novo caminho para salvaguardar a memória gerencial da Bienal

Diante do que foi demonstrado nesta pesquisa, percebe-se a necessidade de estabelecer processos de salvaguarda do conhecimento da memória individual de participantes da produção da Bienal do Livro de Alagoas por meio de um procedimento institucionalizado, filtrando informações e retendo apenas os dados necessários, para que sejam sistematizados e compartilhados, utilizando as Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC), somadas ao capital humano, como aliadas nesse processo.

A seguir, o Quadro 3 apresenta um resumo da gestão da informação da memória da Bienal do Livro de Alagoas, inter-relacionando-o com as etapas dos SMO e apresentando sugestões de melhorias obtidas através das entrevistas:

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Quadro 3 - Gestão da memória da Bienal do Livro de Alagoas

PROCEDIMENTO

COMO É FEITO

SUGESTÕES

Aquisição

das informações

Redes sociais (conversas com servidores e funcionários); relatórios técnicos e reuniões pré-evento

Estabelecer uma comissão ou um núcleo específico e permanente para realizar a gestão documental desses registros

Codificação

das informações

Há uma tentativa, mas não existe sistematização institucionalizada

Criação de um portal ou repositório de informações sobre os eventos da Universidade Federal de Alagoas

Armazenamento
das informações

E-mails dispersos; relatórios técnicos na Edufal

Utilizar e-mails específicos para cada comissão, com drive virtual contendo os documentos de cada edição; relatórios técnicos; relatórios de execução (memória gerencial); site oficial do evento com informações de todas as edições

Manutenção

das informações

E-mails dispersos; relatórios técnicos na Edufal

Atualização constante do drive virtual contendo os documentos de cada edição; relatórios técnicos e de execução (memória gerencial) de cada edição; site oficial do evento com informações de todas as edições

Recuperação

das informações

Redes sociais (conversas com servidores); relatórios técnicos e reuniões pré-evento

Acessar os dados no portal ou repositório de informações sobre os eventos da Universidade Federal de Alagoas

Transferência das informações

Reunião pós-evento (2019)

Publicização de relatórios; conversas e trocas de experiências entre as pessoas que participaram do evento; reuniões pré e pós-produção; aproveitamento de procedimentos adotados anteriormente, mantendo o que deu certo e melhorando o que não funcionou, de acordo com as condições oferecidas

Fonte: Elaborado pelos autores (2023).

 

A estruturação da gestão da informação no processo de concepção e desenvolvimento da Bienal do Livro de Alagoas pode garantir o armazenamento das informações gerenciais mais importantes relacionadas ao evento, bem como dos processos de construção e realização de cada etapa necessária à execução do projeto, funcionando como uma espécie de “filtro” de informações relevantes para a construção da memória.

Um possível caminho para contornar a gestão inadequada das informações da Bienal do Livro de Alagoas é apresentado na Figura 3. Tem-se, com esta proposta de atuação, o fluxograma com uma série de atividades a serem realizadas no intervalo a partir do final de uma edição do evento até o início da próxima.

 

 

 

 

 

Figura 3 - Fluxograma de Procedimentos para a Gestão da Memória gerencial da Bienal do Livro de Alagoas

Fonte: Elaborado pelos autores (2023).

 

1)    Reunir equipes: compartilhar informações sobre as áreas de atuação e as atribuições de cada equipe durante o evento. Responsáveis: todas as comissões de trabalho;

2)    Elaborar relatório: reunir as informações levantadas em um relatório contendo as descrições dos problemas, soluções e recomendações para situações vivenciadas durante o evento. Responsáveis: todas as comissões de trabalho;

3)    Compartir relatório: compartilhar relatório com os coordenadores das comissões. Responsável: coordenação-geral;

4)    Avaliação: realizar reunião de avaliação com os coordenadores das comissões, levantando os principais problemas vivenciados na última edição do evento. Responsáveis: todas as comissões de trabalho;

5)    Consolidar informações: reunir as informações levantadas na reunião de avaliação. Responsável: pessoa designada como responsável pela ata da reunião;

6)    Elaborar novo relatório: elaborar novo relatório, a partir da reunião com os coordenadores das comissões. Responsáveis: coordenadores das comissões de trabalho.

 

Trata-se de um processo cíclico, composto por etapas não necessariamente sequenciais, que se retroalimenta e possibilita a circulação das informações ao gerar dados de uma edição para a outra, incentivando a organização, o compartilhamento e o armazenamento desses dados e promovendo a rápida resolução de situações que possam se repetir.

Ao fim do evento, as equipes de trabalho devem preencher um formulário simples de ocorrências e procedimentos, a ser enviado pelo coordenador de cada comissão e a ele devolvido até uma data definida e divulgada anteriormente, de modo que as informações constantes nesses formulários possam ser codificadas em um documento a ser estruturado e disponibilizado, posteriormente, para a equipe de produção da edição seguinte.

Cabe a cada coordenador de comissão enviar e recolher os formulários preenchidos por sua equipe, armazenando-o em uma plataforma de acesso coletivo a todos os coordenadores que poderá ter, também, uma versão impressa, apresentando contribuições esperadas para a prática de Gestão da Memória gerencial da Bienal do Livro de Alagoas.

 

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Para manter a memória de uma organização viva, é preciso aderir a um sistema de preservação e alimentação de seu histórico de realizações. Assim, faz-se necessário haver um registro formal das ações e das melhores práticas adotadas pelas instituições, acionando filtros de tratamento das informações, sistematizando e compartilhando o que foi levantado com as equipes de trabalho, para evitar a perda de informações relevantes e dados essenciais, sendo esse processo um organismo vivo, sempre em movimento.

A ausência de um plano institucionalizado de tratamento e armazenamento de registros compromete o trabalho da equipe de produção da Bienal do Livro de Alagoas e, muitas vezes, precisa-se partir do zero e pensar em soluções para conflitos possivelmente já experienciados – e superados. Por outro lado, uma gestão da informação bem articulada permite acesso a documentos de experiências anteriores, auxiliando na elaboração de novos projetos e possibilitando êxito diante de situações que podem, invariavelmente, repetir-se.

Por meio desta pesquisa, percebeu-se a necessidade de estruturação, armazenamento e divulgação adequada do conhecimento adquirido em uma organização para facilitar o acesso de pessoas que dele necessitem. Esse processo de armazenamento e estruturação tem caráter dinâmico, encontrando-se em constante movimento, pois a informação não é estática e, a cada edição, podem surgir novos registros de procedimentos a serem compartilhados.

Além disso, entende-se que é de suma importância estabelecer canais de comunicação para o compartilhamento de informações, garantindo que elas cheguem aos usuários no tempo devido, aliando o capital humano às Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) e demais procedimentos para salvaguarda e estrutura da Gestão da Memória (GM), pois a tecnologia, embora seja um dos componentes essenciais para a implementação e o desenvolvimento de Sistemas de Memória Organizacional (SMO), necessita andar em equilíbrio com outros fatores.

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