CARACTERÍSTICAS DA INOVAÇÃO NAS INDÚSTRIAS LÁCTEAS DO OESTE CATARINENSE

Daniela Pesamosca[1]

Universidade Comunitária da Região de Chapecó - Unochapecó

 dani1107@unochapeco.edu.br

 

Odilon Luiz Poli[2]

Universidade Comunitária da Região de Chapecó

odilon@unochapeco.edu.br

Antonio Zanin[3]

Universidade Federal de Mato Grosso do Sul

zanin.antonio@ufms.br

Silvana Dalmutt Kruger[4]

Universidade Federal de Mato Grosso do Sul

silvana.d@ufms.br

Márcia Maria dos Santos Bortolocci Espejo[5]

Universidade Federal de Mato Grosso do Sul

marciabortolocci@gmail.com

______________________________

Resumo

O estudo tem como objetivo analisar as características da gestão da inovação nas indústrias de lácteos na região Oeste de Santa Catarina. Para isso, realizou-se um estudo descritivo com abordagem mista, junto a 27 laticínios. Por meio de 13 variáveis e 84 atributos, identificou-se o perfil dos estabelecimentos, as características das inovações e as estratégias de inovação empregadas. Para a coleta dos dados foram utilizadas a análise documental, questionário e entrevista. O tratamento dos dados, recorreu à análise de conteúdo, com a aplicação de estatística descritiva. Observou-se que a maioria dos estabelecimentos são pequenas empresas que não possuem estrutura voltada ao desenvolvimento de inovações e que suas principais fontes de inovação são os fornecedores e clientes. Observou-se que as inovações de processo se concentram na automatização do processo produtivo (40,9%), na implementação de novos processos a fim de possibilitar o lançamento de novos produtos (36,36%), na implementação de software/sistema gerencial significativamente aperfeiçoado em atividades de apoio a produção (22,72%). As demais inovações (18,18%) estão relacionadas a outros processos com vistas à melhoria da qualidade e na redução dos custos. A expectativa dos gestores sobre o planejamento futuro dos negócios evidencia que 17 estabelecimentos almejam crescimento, 8 pretendem manter a situação atual, e 2 estabelecimentos não possuem planejamento neste sentido. De forma geral, os estabelecimentos não possuem processos estruturados voltados ao desenvolvimento de inovações, bem como evidenciam-se fragilidades na gestão organizacional relacionadas ao planejamento estratégico e uso de informações gerenciais.

Palavras-chave: inovação; indústria láctea; estratégias de inovação; gestão da inovação.

CHARACTERISTICS OF INNOVATION IN THE DAIRY INDUSTRIES OF WEST CATARINENSE

Abstract

The study aims to analyze the characteristics of innovation management in the dairy industries in the western region of Santa Catarina. To this end, a descriptive study was carried out with a mixed approach, with 27 dairy products. Using 13 variables and 84 attributes, the profile of the establishments, the characteristics of the innovations and the innovation strategies used were identified. Document analysis, questionnaire and interview were used to collect data. Data processing used content analysis, with the application of descriptive statistics. It was observed that the majority of establishments are small companies that do not have a structure aimed at developing innovations and that their main sources of innovation are suppliers and customers. It was observed that process innovations focus on automating the production process (40.9%), implementing new processes to enable the launch of new products (36.36%), implementing software/management systems significantly improved in production support activities (22.72%). The remaining innovations (18.18%) are related to other processes with a view to improving quality and reducing costs. Managers' expectations regarding future business planning show that 17 establishments aim for growth, 8 intend to maintain the current situation, and 2 establishments do not have planning in this regard. In general, establishments do not have structured processes aimed at developing innovations, as well as weaknesses in organizational management related to strategic planning and use of management information.

Keywords: innovation; dairy industry; innovation strategies; innovation management.

CARACTERÍSTICAS DE LA INNOVACIÓN EN LAS INDUSTRIAS LÁCTEAS DEL OESTE CATARINENSE

Resumen

El estudio tiene como objetivo analizar las características de la gestión de la innovación en las industrias lácteas de la región occidental de Santa Catarina. Para ello se realizó un estudio descriptivo con enfoque mixto, con 27 productos lácteos. Utilizando 13 variables y 84 atributos se identificó el perfil de los establecimientos, las características de las innovaciones y las estrategias de innovación utilizadas. Para la recopilación de datos se utilizó análisis de documentos, cuestionarios y entrevistas. El procesamiento de datos utilizó análisis de contenido, con la aplicación de estadística descriptiva. Se observó que la mayoría de los establecimientos son pequeñas empresas que no cuentan con una estructura orientada al desarrollo de innovaciones y que sus principales fuentes de innovación son los proveedores y clientes. Se observó que las innovaciones de procesos se centran en la automatización del proceso productivo (40,9%), implementación de nuevos procesos para permitir el lanzamiento de nuevos productos (36,36%), implementación de software/sistemas de gestión significativamente mejorados en las actividades de soporte a la producción (22,72%). El resto de innovaciones (18,18%) están relacionadas con otros procesos con el objetivo de mejorar la calidad y reducir costes. Las expectativas de los directivos respecto a la planificación empresarial futura muestran que 17 establecimientos apuntan al crecimiento, 8 pretenden mantener la situación actual y 2 establecimientos no cuentan con una planificación al respecto. En general, los establecimientos no cuentan con procesos estructurados orientados al desarrollo de innovaciones, así como debilidades en la gestión organizacional relacionadas con la planificación estratégica y el uso de la información gerencial.

Palabras clave: innovación; industria láctea; estrategias de innovación; gestión de la innovación.

1  INTRODUÇÃO

Diferentemente do que se acreditava, o desenvolvimento econômico não é impulsionado somente pelo acúmulo de riquezas e aumento da população, mas também, por diferentes combinações dos recursos. As novas combinações, denominadas inovações, diferenciam-se dos ajustes habituais realizados nos produtos ou processos a fim de equacioná-los à demanda (Schumpeter, 1984). As inovações provocam mudanças substanciais no cenário econômico e, à medida que são implementadas, acabam substituindo as formas anteriores de utilização de tais recursos (Isaza et al., 2022).

A inovação desempenha um papel estratégico, visto que o desenvolvimento de novos produtos tem relação com o desempenho das empresas no mercado, assim como novos processos possibilitam a redução de custos (Cardoso et al., 2020). A constatação dos impactos causados pelas inovações está presente, inclusive, entre os críticos do capitalismo, como, por exemplo, no Manifesto Comunista, publicado em 1948 por Karl Marx e Friedrich Engels, no qual admitem que em meio a revolução constante de produção, empresas estabelecidas no mercado são substituídas por novas empresas (Tidd; Bessant, 2015).

A transição da era industrial para uma sociedade baseada no conhecimento, caracterizada pelas mudanças ocorridas nas práticas de gestão e de produção, comercialização e consumo de bens e serviços (Lastres et al., 2002), realça a importância da inovação para a competitividade e progresso das empresas. Atualmente, a sobrevivência e a competitividade das organizações estão relacionadas ao conhecimento e à sua capacidade de desenvolver e implementar inovações (Tidd; Bessant, 2015) de forma contínua.

A análise da competitividade da indústria brasileira apontou o setor de laticínios entre os setores com deficiências competitivas que, embora, apresente empresas com significativa capacidade produtiva e gerencial, a predominância da produção é decorrente de empresas com menor capacitação tecnológica para a inovação, principalmente, em médios laticínios e produtores de queijo (Coutinho; Ferraz, 1995).

A indústria possui papel central no desenvolvimento de cadeias produtivas, sendo, por muitas vezes, responsável pelo aprimoramento dos demais elos. O desenvolvimento da inovação na indústria, além de contribuir para sua própria sobrevivência, pode se estender aos demais elementos, gerando um ciclo virtuoso (Pacassa et al., 2022). No Brasil, a produção leiteira está presente em todo o território nacional. O estado com maior volume de produção é Minas Gerais, devido, dentre outros fatores, a sua relação histórica com a atividade. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2018) revelam o aumento progressivo da atividade nos estados da região Sul, com destaque para Santa Catarina.

A fim de contribuir com o crescimento econômico, desenvolvimento e o bem-estar das nações, as medidas de inovação sobre as empresas podem servir como instrumento de análise aos formuladores de políticas, visto que os resultados econômicos estão estreitamente relacionados ao desempenho empresarial, conforme destaca a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE, 2005). A disponibilidade de informações gerenciais assertivas tornam-se relevantes para conduzir a análise gerencial e o processo de tomada de decisões (Santos et al., 2023) e desenvolvimento de políticas de incentivo. Além disso, com o mesmo propósito, análises regionais têm levantado interesse entre os estudos sobre inovação (Patel et al., 2023).

Os estudos sobre as trajetórias tecnológicas dos setores industriais apresentam características diferentes entre as empresas inovadoras da indústria de alimentos e bebidas nacional e internacional (Pavitt, 1984; Campos; Ruiz, 2009; Castro, 2010; Silva; Suzigan, 2014). Outros estudos analisaram o processo de difusão da tecnologia no setor alimentício da indústria internacional (Trott; Simms, 2017) e, mais especificamente, na indústria láctea (Sanchez; Bizang, 2011; Castellanos; Díaz, 2018), demonstrando a importância dos fornecedores no processo de desenvolvimento de inovações, bem como as dificuldades de interação entre os atores e, também, em relação ao acesso a novas tecnologias e a difusão do conhecimento. Além disso, destacam implicações do porte das empresas no acesso a novas tecnologias (Sanchez; Bizang, 2011; Isaza et al., 2022), e eventos de inovação e empreendedorismo que potencializam o surgimento de novos negócios (Patel et al., 2023).

Nesse sentido, o estudo tem como objetivo analisar as características da gestão da inovação nas indústrias de lácteos na região Oeste de Santa Catarina. Para isso, realizou-se um estudo descritivo com abordagem mista, junto a 27 laticínios localizados na região Oeste de Santa Catarina, contribuindo com o conhecimento acerca das características desse fenômeno nesse setor industrial. Por meio da análise, busca-se conhecer as principais características desses estabelecimentos, as inovações implementadas e as estratégias de inovação utilizadas na gestão dos negócios.

Justifica-se a relevância do estudo considerando o aspecto econômico e social, relacionado a geração de renda e empregos, especialmente no contexto regional de atuação das empresas lácteas da amostra investigada. Ainda, espera-se que a pesquisa corrobore com evidências acerca das características das inovações, especialmente se existem investimentos em sistemas de controles e informações gerenciais, processos de redução de custos e planejamento (Veroneze; Kruger, 2021; Pederssetti; Kruger, 2020; Cardoso et al., 2020).

 

2 INOVAÇÃO E SUAS CARACTERÍSTICAS

Entre as definições conceituais que circundam a inovação, há a crença que esta é sinônimo de novas ideias, de criatividade ou de invenção. Não se discorda que elas podem fazer parte de uma inovação, mas como apontam Bes e Kotler (2011, p. 26), a diferença entre uma ideia e uma inovação é que “[...] a inovação oferece maior valor para o cliente.” Os autores ressaltam a importância de se inovar pensando no consumidor final, uma vez que é a partir da aceitação deste, que uma inovação se torna real. Tidd e Bessant (2015, p. 18) acrescentam que “[...] a inovação é mais do que simplesmente ter boas ideias; é o processo de fazê-las evoluir a ponto de terem um uso prático.”

Ou seja, a criatividade ou uma invenção, por si só, não configuram uma inovação. Esta inclui (também) outras etapas de gestão, que viabilizam a aplicação prática de uma boa ideia (Bes; Kotler, 2011; Tidd; Bessant, 2015). Assim, “[...] o verdadeiro desafio da inovação não era a invenção – ter boas ideias –, mas o processo de fazê-las darem certo técnica e comercialmente” (Tidd; Bessant, 2015, p. 18). Em outra perspectiva, a OCDE (2005) desvincula essa condição, admitindo que não necessariamente as inovações precisam lograr sucesso comercial.

Primeiramente, é importante esclarecer que uma inovação, não necessariamente, requer novas tecnologias, mas pode significar novas formas de aplicar as tecnologias existentes (Kruger et al., 2020). Outro ponto é limitar a responsabilidade pelo seu desenvolvimento a alguns setores que, assim, como a ausência de responsáveis pela inovação, também se configura um obstáculo ao seu desenvolvimento. A inovação deve estar presente em toda a organização e ter claramente definidas quais pessoas são responsáveis por ela nos diversos níveis organizacionais (Bes; Kotler, 2011).

A OCDE com o propósito de orientar e padronizar conceitos, e assim formar uma base de comparação entre pesquisas realizadas em diferentes países, define: “Uma inovação é a implementação de um produto (bem ou serviço) novo ou significativamente melhorado, ou um processo, ou um novo método de marketing, ou um novo método organizacional nas práticas de negócios, na organização do local de trabalho ou nas relações externas.” (OCDE, 2005, p. 55). Cabe ressaltar que o produto, o processo, o método de marketing ou organizacional devem ser, minimamente, novos ou significativamente melhorados para a empresa, independentemente se tenham sido desenvolvidos por ela ou adquiridos de outras empresas ou organizações. E ainda, só serão inovações quando efetivamente implementados, ou seja, quando um novo produto for introduzido no mercado, ou um novo processo, método de marketing ou organizacional forem efetivamente utilizados (OCDE, 2005).

As empresas procuram inovar para manterem-se competitivas no mercado, bem como, adquirir novas vantagens (OCDE, 2005). No entanto, a inovação como uma área funcional, ainda necessita ser desenvolvida para conseguir satisfazer as necessidades atuais das organizações (Bes; Kotler, 2011). Além disso, a inovação ocorre em um ambiente em constante mudança, que apesar das organizações possuírem certa experiência, sempre estarão expostas a possíveis descontinuidades (Tidd; Bessant, 2015; Isaza et al., 2022).

Para Schumpeter (1984), cuja atenção voltava-se a explicar o processo de desenvolvimento econômico, a inovação está condicionada às rupturas no fluxo circular, ignorando as inovações incrementais. A OCDE (2005), cujo propósito é estabelecer padrões para coletar informações sobre inovação e para tal apresenta um manual, detém-se a distinguir detalhadamente os tipos inovação. Por sua vez, Bes e Kotler (2011) e Tidd e Bessant (2015) voltam-se ao processo de gestão da inovação e, nesse sentido, preocupam-se em demonstrar a necessidade de a inovação ser entendida como um processo, e como tal precisa ser gerenciado.

Tendo em vista que as inovações podem permear todas as áreas das organizações, a definição de diferentes tipologias auxilia o processo de planejamento, análise e desenvolvimento, identificação de possíveis impactos e espaços para inovar. Desse modo, diversos autores dedicaram esforços para classificar as inovações. O Quadro 1 apresenta a classificação adotada por cada autor.

Quadro 1 - Tipos de Inovações

Autor

Classificação

Schumpeter (1984)

Introdução de um novo bem

Introdução de um novo método de produção

Abertura de um novo mercado

Estabelecimento de          uma     nova organização       de

qualquer indústria

Conquista de uma nova fonte de oferta de

matérias-primas.

OCDE (2005)

Inovação de produto

Inovação de processo

 

Inovação de

marketing

Inovação Organizacional

-

Bes e Kotler (2011)

Inovação de produto e serviço

Inovação de processo

 

Inovação de mercado

Inovação de

modelo de negócios

 

-

Tidd e Bessant

(2015)

Inovação de produto

Inovação de processo

Inovação de

posição

Inovação de

paradigma

-

Fonte: Elaborado com base em Schumpeter (1984), OCDE (2005), Bes; Kotler (2011) e Tidd; Bessant (2015)

 

Embora sejam utilizadas diferentes divisões e nomenclaturas, é possível identificar semelhanças entre as classificações no que concerne a segmentação das áreas - produtos, processos, mercado e organizacional. Assim, Schumpeter (1984), descreveu cinco “casos” para “novas combinações”; a OCDE (2005) denominou quatro “tipos de inovação”; Bes e Kotler (2011) discorreram sobre os quatro “níveis de inovação”; e Tidd e Bessant (2015) abordaram as quatro “dimensões da inovação”. Cabe ressaltar, que a perspectiva de análise e o limite entre as classificações das inovações, obviamente, não são idênticos. Ao compará-las se percebe diferentes fronteiras, ou seja, o que um autor considera uma inovação de produto, por exemplo, para outro pode avançar no conceito de inovação de mercado.

A inovação de produto diz respeito à introdução de um novo produto/serviço no mercado (Schumpeter, 1984; OCDE, 2005; Tidd; Bessant, 2015), que Schumpeter (1984) condicionou ser um bem, ao qual os consumidores ainda não estivessem familiarizados. Sob outra perspectiva, a OCDE (2005) considerou novos, aqueles produtos/serviços cujas características e usos previstos, diferenciam-se substancialmente daqueles produzidos anteriormente pela empresa, conceito corroborado por Tidd e Bessant (2015).

A capacidade de implementar inovações de produtos é fundamental para a manutenção da posição das empresas no mercado, uma vez que estão expostas às mudanças nas expectativas dos consumidores, na legislação que orienta a prática empresarial, bem como, na atuação de seus concorrentes (Tidd; Bessant, 2015). A inovação de processo/métodos de produção se refere à introdução de novas formas de produzir ou distribuir os produtos/serviços (Schumpeter, 1984; OCDE, 2005; Bes; Kotler, 2011; Tidd; Bessant, 2015).

A terceira segmentação se refere às inovações voltadas à área de mercado (comercialização dos produtos/serviços), para a qual Schumpeter (1984, p. 76) definiu como inovação a “abertura de um novo mercado, ou seja, de um mercado em que o ramo particular da indústria de transformação do país em questão não tenha ainda entrado, quer esse mercado tenha existido antes, quer não.” Por sua vez, a OCDE (2005, p. 59), tratou da “inovação de marketing” como sendo “[...] a implementação de um novo método de marketing com mudanças significativas na concepção do produto ou em sua embalagem, no posicionamento do produto, em sua promoção ou na fixação de preços.” E por fim, Tidd e Bessant (2015, p.25) descreveram a “inovação de posição – mudanças no contexto em que produtos/serviços são introduzidos.” Apesar de serem relacionados à mesma área, os conceitos abordam aspectos diferentes relativos à atuação da empresa no mercado.

O objetivo das inovações de marketing é o aumento das vendas por meio do desenvolvimento e implementação de novas formas de abordar os consumidores, facilitando o acesso aos produtos, seja por meio de abertura de novos mercados, pela criação de novas maneiras de disponibilizar o produto ou ainda pela segmentação do mercado, visando o atendimento mais específico a cada tipo de consumidor (OCDE, 2005).

Por fim, há as inovações relativas à área organizacional. A OCDE (2005, p. 61) descreveu: “inovação organizacional é a implementação de um novo método organizacional nas práticas de negócios da empresa, na organização do seu local de trabalho ou em suas relações externas”, exemplificando que novos métodos organizacionais nas práticas de negócios, incluem a implementação de novas práticas para o compartilhamento do conhecimento na empresa, para o desenvolvimento e permanência dos funcionários, ou então, a implementação de sistemas voltados ao gerenciamento da qualidade, da cadeia de suprimentos e adoção do sistema de produção enxuta.

As inovações organizacionais voltadas às relações externas abarcam mudanças no relacionamento da empresa com outras empresas e instituições, como por exemplo, “[...] o estabelecimento de novos tipos de colaborações com organizações de pesquisa e consumidores, novos métodos de integração com fornecedores e o uso de outsourcing ou a introdução da subcontratação das atividades de negócios na produção, no aprovisionamento, na distribuição, no recrutamento e em serviços auxiliares” (OCDE, 2005, p. 63). Nesse sentido, as inovações organizacionais podem proporcionar a redução dos custos administrativos ou dos custos de transação, estimular a satisfação no local de trabalho, bem como possibilitar o acesso a conhecimentos externos e reduzir os custos (OCDE, 2005; Cardoso et al., 2020).

Nessa perspectiva, os investimentos em inovações requerem análise e planejamento, bem como o uso de instrumentos de controles e sistemas de controles gerenciais, visando auxiliar no processo de gerenciamento dos recursos (Veroneze; Kruger, 2021), bem como no processo de gestão e tomada de decisões (Santos et al., 2023). Dessa forma, visando sua continuidade no mercado as organizações buscam por diferenciais competitivos, quer seja por mudanças em processos, nos produtos, na execução de atividades, na redução de custos,  no planejamento, sistemas de informações ou novas tecnologias (Kruger et al., 2020; Cardoso et al., 2020; Pacassa et al., 2022).

 

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICO

Em relação aos objetivos, essa pesquisa caracteriza-se como descritiva, realizada por meio de levantamento junto a uma amostra de estabelecimentos lácteos da região oeste catarinense. Quanto à abordagem do problema, essa pesquisa procura integrar métodos quantitativos de coleta e análise dos dados, a fim de atender, de forma mais abrangente, a problemática proposta e o objetivo do estudo.

Quanto aos procedimentos, consiste num levantamento, visto que objetivou reunir as informações do maior número de participantes possíveis. A população contemplou 57 estabelecimentos industriais em atividade, situados na mesorregião Oeste de Santa Catarina, cuja atividade econômica principal compreende a Preparação do leite ou a Fabricação de laticínios. A amostra totalizou 27 respondentes que aceitaram participar deste estudo. A coleta dos dados ocorreu por meio de questionário aplicado em loco, seguido de entrevista estruturada, as quais foram gravadas. Os dados foram tabulados por meio da estatística descritiva, utilizando-se as entrevistas como complemento da análise, bem como para identificar as características das inovações, o planejamento e as estratégias projetadas para o futuro dos respectivos estabelecimentos da amostra.

 

4 ANÁLISE DOS RESULTADOS

As 27 empresas participantes da amostra totalizam tempo de atuação de aproximadamente 14 anos. Os estabelecimentos mais recentes estão com três anos, enquanto o estabelecimento mais longevo está com 34 anos. Com relação ao número de funcionários diretos, 37,0% dos estabelecimentos possuem até 10 funcionários, 40,7% entre 11 e 50 funcionários, 7,4% entre 51 e 100 funcionários, enquanto 14,8% possuem acima de 100 funcionários.

No que tange ao processamento diário de leite, 63,0% processam até 50.000 litros; 11,1% entre 50.000 e 100.000 litros, sendo o mesmo percentual para o intervalo entre 200.000 e 250.000 litros/dia, outros 14,8% estão na faixa intermediária de processamento. Questionou-se os respondentes sobre os motivos que os levaram a empreenderem nesta área, conforme apresentado na Tabela 1.

Tabela 1 - Origem dos estabelecimentos industriais

Principal motivo

Frequência Absoluta

Frequência Relativa

Desejo de empreender

12

44,4%

Pequenos agricultores que passaram a industrializar o leite de suas propriedades

8

29,6%

Incentivo público

4

14,8%

Expansão de um grupo de empresas

3

11,1%

Total

27

100%

Fonte: Dados da pesquisa.

De acordo com a Tabela 1, o desejo de empreender de pessoas não vinculadas à atividade rural é a principal motivação que originou os estabelecimentos estudados, representando 44,4% da amostra. Na sequência, observa-se a presença de pequenos produtores rurais que passaram a industrializar o leite produzido em suas propriedades, totalizando 29,6%. Em relação à gestão, 21 estabelecimentos (77,8%) são geridos pelas famílias proprietárias, enquanto nos demais (22,2%) a gestão é realizada por outros profissionais. Sobre o nível de instrução formal dos gestores, percebe-se a concentração entre aqueles que possuem ensino médio ou fundamental (37%), seguidos pelos que possuem graduação (55,5%), outros 7,4% dos gestores possuem curso técnico.

Sobre a forma utilizada para definir o planejamento futuro dos negócios, foram identificadas quatro categorias, conforme apresentado na Tabela 2.

Tabela 2 - Forma de planejamento utilizada pelos estabelecimentos

Forma de Planejamento

Frequência Absoluta

Frequência Relativa

Não possui qualquer forma de planejamento para o futuro

10

37,0%

Possui planos, mas estão na “cabeça do gestor”

13

48,1%

Possui planejamento estratégico formalizado

3

11,1%

Não soube responder

1

3,7%

Total

27

100%

Fonte: Dados da pesquisa.

Por meio da Tabela 2, visualiza-se que a maioria dos estabelecimentos revelou não possuir planejamento formal acompanhado por metas e indicadores, visto que para 48,1% dos estabelecimentos os planos estão na “cabeça do gestor” e para 37,0% não há qualquer forma de planejamento. Dentre os estabelecimentos que possuem planejamento estratégico formalizado, dois se constituem filiais de outras empresas.

Na sequência, buscou-se identificar os produtos que são produzidos pelas empresas respondentes, conforme se verifica na Tabela 3.

Tabela 3 - Produtos ofertados pelos estabelecimentos

Produto

Freq. Absoluta

Freq. Relativa

Produto

Freq. Absoluta

Freq. Relativa

Queijo mussarela

21

77,8%

Queijo processado cremoso

2

7,4%

Queijo colonial

14

51,9%

Queijo tropical

2

7,4%

Creme de leite (uso industrial)

12

44,4%

Achocolatado

1

3,7%

Manteiga

10

37,0%

Creme de leite

1

3,7%

Ricota

8

29,6%

Fondue de queijo

1

3,7%

Nata

7

25,9%

Iogurte

1

3,7%

Queijo prato

7

25,9%

Leite condensado

1

3,7%

Queijo Minas

6

22,2%

Leite pasteurizado tipo C

1

3,7%

Queijo provolone

6

22,2%

Leite UHT

1

3,7%

Queijo tipo Parmesão

5

18,5%

Queijo pecorino

1

3,7%

Bebida láctea

3

11,1%

Queijo reggianito

1

3,7%

Doce de leite

3

11,1%

Queijo Caccio Cavalo fresco

1

3,7%

Requeijão

3

11,1%

Soro de leite (concentrado)

3

11,1%

Queijo gorgonzola

1

3,7%

Soro de leite (fluído)

3

11,1%

Queijo gouda

1

3,7%

Queijo coalho

2

7,4%

Queijo tipo grana

1

3,7%

Queijo montanhês

2

7,4%

Queijo Gruyère

1

3,7%

Fonte: Dados da pesquisa.

Os queijos mussarela e colonial figuram entre a maioria dos estabelecimentos, seguidos pelo creme de leite destinado ao uso industrial e manteiga. A composição do mix também está relacionada ao aproveitamento da matéria-prima.  A partir da fabricação do produto principal são extraídos “subprodutos”, tais como, o creme de leite para uso industrial, a manteiga, a ricota, a bebida láctea, entre outros. Por meio do questionário, identificou-se os produtos mais representativos em termos de faturamento, conforme demonstrado na Tabela 4.

Tabela 4 - Principal produto em termos de faturamento

Produto

Frequência

Absoluta

Frequência Relativa

Queijo mussarela

17

63,0%

Queijo colonial

4

14,8%

Queijo tipo Minas meia cura

2

7,4%

Queijo prato

1

3,7%

Leite UHT (Ultra Higth Temperature)

1

3,7%

Queijo tipo grana

1

3,7%

Queijo tipo parmesão

1

3,7%

Total

27

100%

Fonte: Dados da pesquisa.

Pode-se verificar por meio da Tabela 4, que o principal produto se constitui no queijo mussarela (63,0%) seguido do queijo colonial representando 14,8%.  Identificou-se também por meio dos dados coletados, que a comercialização ocorre principalmente no mercado regional (40,7%), sendo que 11,1% é comercializado nas demais regiões de Santa Catarina, e 11,1% para o estado do Rio Grande do Sul, e 14,8% é comercializado na região Sudeste e 22,2% nas demais regiões brasileiras.

A investigação sobre as inovações, demonstrou que dos 27 estabelecimentos que compõem a amostra, 22 estabelecimentos implementaram algum tipo de inovação durante os últimos dois anos, ou seja, de acordo com o conceito dado pela OCDE (2005), entende-se que 81,5% da indústria de lácteos demonstrou-se inovadora. Considerando os estabelecimentos que apresentaram inovação, em média foram implementadas 5,7 inovações por estabelecimento, sendo, no mínimo uma inovação (dois estabelecimentos) e no máximo 15 inovações (um estabelecimento). A Tabela 5 apresenta a frequência de estabelecimentos em relação ao número de inovações implementadas.

Tabela 5 - Número de inovações implementadas

Nº de inovações implementadas

Frequência

Absoluta

Frequência Relativa

Nº de inovações implementadas

Frequência

Absoluta

Frequência Relativa

0

5

18,5%

6

1

3,7%

1

2

7,4%

7

1

3,7%

2

2

7,4%

8

1

3,7%

3

3

11,1%

10

2

7,4%

4

3

11,1%

11

2

7,4%

5

4

14,8%

15

1

3,7%

Total

-

-

-

27

100%

Fonte: Dados da pesquisa.

Em consonância com a concepção dos instrumentos de coleta dos dados, a caracterização das inovações segue as orientações dadas pela OCDE (2005). Sendo assim, foram classificadas de acordo com o tipo, com o grau de novidade e difusão e em termos técnicos se derivam do aprimoramento de algo já existente ou se constituem algo completamente novo. A frequência de estabelecimentos por tipo de inovação revela que as inovações em processos estão presentes entre o maior número de estabelecimentos, característica comum nesse setor industrial. As inovações organizacionais apresentam-se como segunda característica.

Sob outra perspectiva, o número de inovações implementadas demonstra que as inovações de produto representam o maior número das inovações – 36,8% das 125 inovações elencadas. As inovações de marketing figuram entre o menor número de estabelecimentos e menor quantidade de inovações implementadas, conforme demonstrado na Tabela 6.

Tabela 6 - Tipo de inovação e o respectivo número de inovações implementadas

Tipo de Inovação

Frequência

Absoluta

%

Estabelecimentos

Total de Inovações

% Inovações

Inovação de processo

17

63,0%

31

24,8%

Inovação organizacional

16

59,3%

31

24,8%

Inovação de produto

14

51,9%

46

36,8%

Inovação de marketing

11

40,7%

17

13,6%

Total

-

-

125

100%

Fonte: Dados da pesquisa.

Complementarmente, distinguiu-se o número de áreas nas quais os estabelecimentos inovaram, permitindo verificar se eles estão focados em uma área específica ou se estão buscando inovar em áreas diferentes. Na sequência, buscou-se informações acerca de novos produtos implementados pelos estabelecimentos e o respectivo número de inovações que representam, conforme se verifica na Tabela 7.

Tabela 7 - Descrição das inovações de produto

Inovação de produto

Frequência Absoluta

Frequência Relativa

Inovação de produto

Frequência Absoluta

Frequência Relativa

Produtos zero lactose

8

17,4%

Fondue de queijo

1

2,2%

Creme de leite para uso

industrial

4

8,7%

Queijo Tipo Caccio Cavalo

1

2,2%

Nata

4

8,7%

Queijo Reggianito

1

2,2%

Queijo tipo Minas

4

8,7%

Manteiga

1

2,2%

Queijo coalho

3

6,5%

Queijo Tipo Gorgonzola

1

2,2%

Queijo colonial

3

6,5%

Queijo Tipo Gouda

1

2,2%

Queijo mussarela

3

6,5%

Queijo Tipo Gruyère

1

2,2%

Bebida láctea

2

4,3%

Queijo tropical (tipo parmesão)

1

2,2%

Queijo processado cremoso

2

4,3%

Queijo provolone

2

4,3%

Requeijão cremoso

1

2,2%

Doce de leite

1

2,2%

Ricota

1

2,2%

Total

-

-

-

46

 

Fonte: Dados da pesquisa.

Nesse sentido, foram relacionados 21 produtos diferentes, dos quais se destacam os novos produtos destinados a um público específico, como é o caso dos produtos sem lactose. Percebe-se que 26,1% das inovações de produto constituem-se subprodutos do processo, ou seja, também representam um aproveitamento de matéria-prima, que em alguns casos estava sendo descartada. Essa informação é corroborada pelos principais motivos que impulsionaram a implementação de tais inovações. Dentre eles destacam-se: ampliação do mix de produtos; aproveitamento da matéria-prima existente e solicitação do mercado.

De acordo com as características, observa-se que, dentre os novos produtos, não há novidades para o mercado mundial, dado inferior ao identificado para o setor de alimentos e bebidas no Brasil (Silva; Suzigan, 2014). Por fim, 89,1% das inovações são novidades somente para os próprios estabelecimentos, e para estes, a maioria (78,3% das inovações), representa algo completamente novo. Essas informações indicam a busca dos estabelecimentos por novidades, mas revelam também algum retardamento a respeito das possibilidades já existentes.

Outra informação relevante refere-se ao principal responsável pelo desenvolvimento das inovações de produto. Constata-se a atuação individualizada dos estabelecimentos, visto que em 71,7% dos casos o próprio estabelecimento foi indicado como principal responsável pelo desenvolvimento das inovações. O estabelecimento de cooperação com outros estabelecimentos ou instituições figura como o segundo responsável pelo desenvolvimento das inovações de produto.

As inovações de processo revelam a concentração dos estabelecimentos entre aqueles que implementaram até duas inovações. Conforme dados da pesquisa, as inovações de processo concentram-se na automatização do processo produtivo (40,9%), na implementação de novos processos a fim de possibilitar o lançamento de novos produtos (36,36%) e na implementação de software significativamente aperfeiçoado em atividades de apoio a produção (22,72%). As demais inovações (18,18%) estão relacionadas a outros processos com vistas à melhoria da qualidade e redução dos custos.

Na sequência, questionou-se os participantes da amostra em relação às inovações organizacionais, conforme se verifica na Tabela 8.

Tabela 8 - Descrição das inovações organizacionais

Inovações organizacionais

Frequência Absoluta

Frequência Relativa

Mudanças significativas nas relações com outras empresas

9

40,90%

Novas técnicas de gestão ambiental para tratamento de efluentes, redução de resíduos, etc

8

36,36%

Novos métodos de organização para distribuir responsabilidades e poder de decisão, mudanças em rotinas ou práticas

5

22,72%

Sistemas de informações gerenciais, sistemas de formação e treinamento

5

22,72%

Sistemas de controle de qualidade total e redução de custos

4

18,18%

Total

22

100%

Fonte: Dados da pesquisa.

Dentre as inovações organizacionais destacam-se as mudanças significativas nas relações com outras empresas, representando 40,90%. Essas inovações dizem respeito à terceirização ou à subcontratação de atividades pela primeira vez. Na sequência, tem-se 36,36% referente a novas técnicas relacionadas à gestão ambiental, seguido de novos métodos de organização para distribuir responsabilidades e poder de decisão, mudanças em rotinas ou práticas, representando 22,72% das inovações, bem como mudanças em sistemas de informações gerenciais, sistemas de formação e treinamento (22,72%), além de sistemas de qualidade total com 18,18% das respostas.

Outro tipo de inovação refere-se ao marketing, dentre as 11 inovações de marketing identificadas, nove (81,8%) referem-se a mudanças substanciais no design dos produtos, quatro (36,4%) são novas mídias ou técnicas para a promoção dos produtos, três (27,3%) referem-se à adoção de novos canais de vendas e um (9,1%) consiste na mudança no posicionamento dos produtos. As características das inovações indicam que, os estabelecimentos estudados não figuram entre os responsáveis por rupturas no cenário mundial de lácteos. Em decorrência às características das inovações, nenhum estabelecimento fez requisição de patente durante o período em análise.

Entre os estabelecimentos que implementaram inovações, 54,5% declararam não utilizar nenhum método de proteção, os demais declaram utilizar métodos estratégicos não formais para proteger suas inovações.  Se sequência, questionou-se quais métodos estratégicos não formais da inovação são utilizados, conforme apresentado na Tabela 9.

Tabela 9 - Número de estabelecimentos por método estratégico não formal de proteção

Método de proteção não formal

Frequência

(nº estabelecimentos)

%

Segredo industrial

9

40,90%

Complexidade desenho/fórmula do produto

4

18,18%

Tempo de liderança sobre os competidores

2

9,10%

Fonte: Dados da pesquisa

Dentre os 15 respondentes que utilizam método de proteção não formal, destaca-se que o segredo industrial foi respondido por 40,90% da amostra, seguido de complexidade desenho/fórmula do produto representado por 18,18%, enquanto 9,1% optam pelo tempo de liderança sobre os competidores. Como complemento à questão, os estabelecimentos que declaram utilizar esse método, afirmam orientar formalmente seus funcionários a não divulgar os processor e fórmulas utilizadas.

 

5 Discussão dos resultados e estratégias futuras

As perspectivas dos estabelecimentos refletem que 19 deles (70,4%) pretende crescer em relação ao volume de produção e à estrutura produtiva e 20 estabelecimentos (74,1%) intencionam lançar novos produtos e aumentar sua participação no mercado. Ao compilar as respostas, percebe-se que 12 estabelecimentos (44,4%) vislumbram crescer em todos os quesitos e três pretendem manter a situação atual, os demais têm pretensões diferentes de acordo com a área, conforme detalhado na Figura 1.

Ao confrontar esses dados com as formas utilizadas para o planejamento, identificou-se que dentre os estabelecimentos que desejam crescer em todos os aspectos, nove (75,0%) possuem planos não formalizados, ou seja, pretendem crescer, mas não estão estipuladas as metas ou formalizadas as ações para alcançar tais objetivos. Em todos os estabelecimentos que pretendem manter a situação atual, não há qualquer forma de planejamento para o futuro. Em relação aos estabelecimentos que possuem pretensões diferentes dependendo da área, seis (50,0%) não possuem qualquer forma de planejamento, quatro (33,3%) possuem planos não formalizados e dois (16,7%) trabalham com planejamento estratégico formal.

A expectativa do gestor sobre o futuro do negócio como um todo também revela importantes distinções entre os estabelecimentos. De forma geral, a expectativa do gestor em 17 estabelecimentos (63,0%) é de crescimento, em oito estabelecimentos (29,6%) é de manter a situação atual, e, em dois estabelecimentos (7,4%) o gestor não tem qualquer ideia sobre o futuro. Mesmo que, os estabelecimentos possuam diferentes características (idade, porte, etc.) e formas de planejamento, é possível identificar expectativas comuns entre eles, como por exemplo, aumento do volume de produção, estabilidade financeira, ampliação da área de atuação comercial, busca por produtos mais rentáveis, melhorias na qualidade dos produtos e ampliação da capacidade fabril.

Figura 1 - Frequência de estabelecimentos de acordo com suas perspectivas de futuro


 


Fonte: Dados da pesquisa.

De forma geral, tanto as expectativas dos gestores sobre o futuro, como as perspectivas quanto às questões específicas, demonstram o desejo de permanência e crescimento dessa atividade industrial. No entanto, cabe destacar, que entre os estabelecimentos, não há planejamento voltado ao desenvolvimento da inovação para os próximos anos. O questionamento sobre a importância atribuída pelo gestor à inovação foi realizado ao final das entrevistas, sendo assim, os entrevistados que demonstraram convicção sobre a importância da inovação e aqueles que afirmaram ser importante, mas ficaram em dúvida, podem ter sido induzidos, involuntariamente, a tal resposta.

Por outro lado, tendo em vista que 85% dos estabelecimentos implementaram algum tipo de inovação durante o período em análise e a manifestação dos gestores sobre a importância da implementação de melhorias, é possível inferir que há preocupação com a inovação, reforçando a percepção sobre a existência de um distanciamento conceitual dos entrevistados em relação à inovação, conforme mencionado anteriormente.

Os resultados do estudo remetem a importância da análise e do planejamento, especialmente para os estabelecimentos gerarem vantagens competitivas, bem como do uso de instrumentos de controles e sistemas de controles gerenciais, como subsídio para a tomada de decisões (Pederssetti; Kruger, 2020; Veroneze; Kruger, 2021). Ainda, o reconhecimento de estratégias de inovação pode contribuir com a continuidade das organizações e favorecer diferenciais competitivos (Cardoso et al., 2020; Pacassa et al., 2022; Isaza et al., 2022).

 

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A indústria de lácteos da mesorregião Oeste de Santa Catarina está em expansão e predominam estabelecimentos que possuem acima de oito anos de fundação. Por outro lado, é crescente abertura de novos estabelecimentos, devido ao desempenho da produção de leite na região que, além de atrair a instalação de filiais de empresas sediadas em outros estados agrega a expansão de empresas catarinenses, devido ao volume de produção leiteira.

Os estabelecimentos, em sua maioria, possuem menos de 50 funcionários, processam até de 50.000 litros de leite por dia e estão restritos, comercialmente, ao estado de Santa Catarina devido ao tipo de inspeção sanitária que possuem. Ainda assim, a principal atuação comercial desses estabelecimentos é regional, sendo que os principais produtos, em termos de faturamento, são considerados commodities, o que direciona o foco das empresas para a redução de custos e melhoria da qualidade.

Constatou-se que existem fragilidades na gestão das organizações, o planejamento relativo ao futuro dos estabelecimentos, não é formalizado e não é acompanhado por metas e indicadores. Os estabelecimentos não possuem processos estruturados voltados ao desenvolvimento de inovações ou setor de P&D, ou ainda, alguém voltado especificamente a essa atividade. Suas principais fontes de informação são os fornecedores e os clientes. Os fornecedores representam o principal elemento no estabelecimento de projetos de cooperação para o desenvolvimento de inovações.

De forma geral, as indústrias procuram melhorar seus processos, ampliar o mix de produtos ofertados, estabelecer novas formas de se relacionar com outras empresas e de divulgar seus produtos. No entanto, as características das inovações demonstram que esses estabelecimentos fazem parte de um processo de difusão de tecnologia e não da geração de novidades para o mercado. Embora a maioria dos estabelecimentos (81,5%) tenha apresentado algum tipo de inovação durante o período em análise, a indústria de lácteos da mesorregião Oeste de Santa Catarina caracteriza-se como pouco inovadora, dado o perfil das inovações, bem como o contexto que envolve a sua implementação.

Em relação aos estabelecimentos que implementaram inovações, observa-se o predomínio da estratégia tradicional de inovação (81,8% - 18 estabelecimentos), com exceção de um estabelecimento (4,5%) que, com frequência, utilizada a estratégia oportunista, implementado inovações para o mercado nacional, por meio do contato com fontes internacionais de informações técnicas. Além disso, três estabelecimentos (13,6%) empregam a estratégia dependente, visto que, pertencem a grupos empresariais e, dessa forma, desenvolvem inovações a partir da difusão de tecnologias existentes em sua matriz ou por meio da solicitação de seus clientes que subcontratam suas atividades.

Dentre as inovações organizacionais identificadas destacam-se as mudanças significativas a respeito à terceirização ou à subcontratação de atividades pela primeira vez (40,90%), novas técnicas relacionadas à gestão ambiental (36,36%), seguido de novos métodos de organização para distribuir responsabilidades e poder de decisão, mudanças em rotinas ou práticas (22,72%) e inovações em sistemas de informações gerenciais, sistemas de formação e treinamento (22,72%). As demais inovações (18,18%) estão relacionadas a outros processos com vistas à melhoria da qualidade e na redução dos custos.

Essas informações levantam inquietações quanto ao futuro desses estabelecimentos na região, uma vez que, além de dependerem de seus fornecedores para implementar inovações, não se observa a existência de planejamento sobre o assunto. Dada a baixa incidência de inovação entre essas empresas, bem como a falta de interação mais efetiva com as universidades e outras instituições de pesquisa, as empresas se encontram numa situação de vulnerabilidade.

Esta pesquisa encontra limitações quanto à composição da amostra, que não abrange as empresas de maior porte instaladas na região em estudo, justificada por acessibilidade. Além disso, a inexistência de registros quanto aos dispêndios e retornos das inovações, não permitiu a comparação com estudos anteriores que utilizaram essa métrica. A partir deste estudo, identifica-se a possibilidade de futuras pesquisas, quanto à formação de um sistema setorial de inovação voltado ao desenvolvimento da cadeia de lácteos na mesorregião Oeste de Santa Catarina, considerando as características identificadas e a importância da interação entre os diferentes atores que compõem a cadeia produtiva.

De forma geral, os resultados destacam que os estabelecimentos não possuem processos estruturados voltados ao desenvolvimento de inovações, bem como constatou-se fragilidades na gestão organizacional relacionadas ao planejamento estratégico e uso de informações gerenciais. Neste sentido, espera-se que os achados possam corroborar com novas pesquisas acerca da temática e incentivar os gestores na implementação de investimentos em sistemas de controles e informações gerenciais, considerando-os como processos que favorecem o planejamento de estratégias de gestão, a redução de custos e as inovações.

 

REFERÊNCIAS

BES, F. T.; KOTLER, P. A bíblia da inovação. São Paulo, Leya, 2011.

CAMPOS, B.; RUIZ, A. U. Padrões Setoriais de Inovação na Indústria Brasileira. Revista Brasileira de Inovação, v. 8, n. 1, p. 167-210, 2009.

CARDOSO, F. A.; FAORO, M. F.; BRANDALISE, L. T.; BERTOLINI, G. R. F. Abordagens das práticas de eco inovação: uma revisão sistemática de estudos de casos aplicados em empresas de manufatura. Gestão & Planejamento-G&P, v. 21, p. 267-278, 2020.

CASTELLANOS, T. F. S.; DÍAZ, M. L. A. Innovation in companies operating in the foodstuffs sector of Colombia: an analysis from the perspective of open innovation. Cuadernos de Administración, v. 34, n. 61, p. 31-44, 2018.

CASTRO, D. F. Padrões setoriais da inovação tecnológica na indústria brasileira: uma análise de Cluster a partir da PINTEC (Dissertação de Mestrado). Pontifícia Universidade Católica de

COUTINHO, L.; FERRAZ, J. C. Estudo da competitividade da indústria brasileira. Campinas, Papirus, 1995.

FREEMAN, C.; SOETE, L. A economia da inovação industrial. Campinas, Unicamp, 2008.

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA - IBGE. Indicadores IBGE: estatística da produção pecuária. Rio de Janeiro, 2018. Disponível em:  https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/periodicos/2380/epp_2017_4tri.pdf

ISAZA, J. F.; KRUGER, S. D.; ZANIN, A.; MÁRQUEZ, V. J. B.; COA, L. M. D.; ZANELLA, C.; CONTE, A. (2022). Caracterización en la gestión de innovación de pymes por efecto del Coronavirus: estudio comparativo Colombia y Brasil. Revista Estrategia Organizacional, v. 11, n. 1, p. 87-109, 2022.

KRUGER, S. D.; LINK, C. P.; POLI, O. L.; JACOSKI, C. A. Inovação como ferramenta competitiva no desenvolvimento econômico das atividades rurais. Latin American Journal of Business Management, v. 11, n. 2, p. 1-15, 2020.

LASTRES, H. M. M.; ALBAGLI, S.; LEMOS, C.; LEGEY, L. R. Desafios e oportunidades da era do conhecimento. São Paulo em Perspectiva, v. 16, n. 3, p. 60-66, 2002.

ORGANIZAÇÃO PARA A COOPERAÇÃO E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO - OCDE. (2005). Manual de OSLO: diretrizes para coleta e interpretação de dados sobre inovação. Disponível em:  http://www.finep.gov.br/images/apoio-efinanciamento/manualoslo.pdf

PACASSA, F.; ZANIN, A.; KRUGER, S. D.; SANTOS, E. A. Análises dos fatores condicionantes da gestão de custos interorganizacionais em uma indústria de queijos. Organizações Rurais & Agroindustriais, v. 24, p. e1798-e1798, 2022.

PATEL, K. K.; ZANELLA, C.; KRUGER, S. D. Efetividade dos eventos de inovação e empreendedorismo. Revista Pensamento Contemporâneo em Administração, v. 17, n. 2, p. 159-176, 2023.

PAVITT, K. Sectoral patterns of technical change: Towards a taxonomy and a theory. Research Policy, v. 13, n. 6, p. 343-373, 1984.

PEDERSSETTI, W. C.; KRUGER, S. D. Análise dos sistemas de controles gerenciais e a interface com o ciclo de vida de uma indústria de alimentos. Revista ABCustos, v. 15, n. 3, p. 1-15, 2020.

SANCHEZ, G.; BISANG, R. Learning networks in innovation systems at sector/regional level in Argentina: winery and dairy industries. Journal of Technology Management & Innovation, v. 64, p. 15-32, 2011.

SANTOS, C. N.; ZANIN, A.; KRUGER, S. D.; SANTOS, E. A. Fatores contingenciais e as influências para internacionalização das empresas familiares: um estudo no setor industrial. International Journal of Scientific Management and Tourism, v. 9, n. 2, p. 850-874, 2023.

SCHUMPETER, J. A. A teoria do desenvolvimento econômico. São Paulo, Nova Cultura, 1984.

SILVA, C. F.; SUZIGAN, W. Padrões setoriais de inovação da indústria de transformação brasileira. Estudos Econômicos, v. 44, n.2 , p. 277-321, 2014.

TIDD, J.; BESSANT, J. Gestão da inovação. Porto Alegre, Bookman, 2015.

TROTT, P.; SIMMS, C. An examination of product innovation in low and medium technology industries: cases from the UK packaged food sector. Research Policy, v. 46, n. 3, p. 605-623, 2017.

VERONEZE, S.; KRUGER, S. D. Uso de controles e informações gerenciais por empresas startups incubadas. Revista ABCustos, v. 16, n. 1, p. 144-173, 2021.



[1] Mestre em Ciências Contábeis e Administração da Unochapecó.

[2] Doutor em Educação pela Universidade Estadual de Campinas; Professor do Mestrado em Educação da Unochapecó.

[3] Doutor em Engenharia de Produção (UFRGS); Professor do Mestrado em Ciências Contábeis da UFMS.

[4] Doutora em Contabilidade (UFSC); Professora do Curso de Ciências Contábeis da UFMS; Professora do Mestrado em Gestão de Organizações, Liderança e Decisão da UFPR (PPGOLD).

[5] Doutora em Contabilidade (USP); Professora do Mestrado em Ciências Contábeis da UFMS.