O ESTADO DE FLOW DURANTE O USO DE SERIOUS GAMES POR ESTUDANTES DO ENSINO FUNDAMENTAL
William Henoch Alves Pereira[1]
Faculdade de Tecnologia do Estado de São Paulo
whenoch@hotmail.com
Raquel Rosan Christino Gitahy[2]
Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul
raquelgitahy.rg@gmail.com
Sidinei de Oliveira Sousa[3]
Universidade do Oeste Paulista
sidneysiamf@gmail.com
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Resumo
O presente artigo tem como objetivo analisar o estado de flow durante o uso de Serious Games no processo educativo de estudantes do segundo ciclo do Ensino Fundamental. Para tanto, foi realizada uma investigação qualitativa, do tipo descritivo-interpretativa, a partir do uso de Serious Games por cinquenta e quatro estudantes, abordando conteúdos de Matemática e Biologia. Para a coleta de dados, utilizou-se a observação da aplicação dos jogos e um grupo focal com os estudantes a fim de compreender a influência do game no processo de ensino e de aprendizagem. A análise dos resultados foi realizada a partir do referencial teórico do Flow, estabelecendo a correlação entre desafios e habilidades, nível de ansiedade do jogador e a prevalência do entretenimento como fator motivador para engajamento. Como resultados, os estudantes afirmam ser mais interessante estudar e se divertir ao mesmo tempo em um ambiente escolar mais dinâmico e produtivo, mantendo o entretenimento como fator motivador para a aprendizagem.
Palavras-chave: aprendizagem; serious games; teoria do Flow
THE STATE OF FLOW DURING THE USE OF SERIOUS GAMES BY STUDENTS OF ELEMENTARY SCHOOL
Abstract
The aim of this article is to analyze the state of flow during the use of Serious Games in the educational process of students in the second cycle of elementary school. To this end, a qualitative, descriptive-interpretative investigation was carried out using Serious Games by fifty-four students, covering Mathematics and Biology content. Data was collected by observing the application of the games and a focus group with the students in order to understand the influence of the game on the teaching and learning process. The results were analyzed using the Flow theoretical framework, establishing the correlation between challenges and skills, the level of player anxiety and the prevalence of entertainment as a motivating factor for engagement. As a result, the students say it is more interesting to study and have fun at the same time in a more dynamic and productive school environment, maintaining entertainment as a motivating factor for learning.
Keywords: learning; serious games; flow theory.
EL ESTADO DE FLUIDEZ DURANTE EL USO DE JUEGOS SERIOS POR PARTE DE ESTUDIANTES DE PRIMARIA
Resumen
El objetivo de este artículo es analizar el estado de flujo durante el uso de Serious Games en el proceso educativo de alumnos de segundo ciclo de primaria. Para ello, se llevó a cabo una investigación cualitativa, descriptiva-interpretativa, utilizando Serious Games por cincuenta y cuatro alumnos, abarcando contenidos de Matemáticas y Biología. La recogida de datos consistió en la observación de la aplicación de los juegos y en un grupo focal con los alumnos para comprender la influencia del juego en el proceso de enseñanza y aprendizaje. Los resultados se analizaron utilizando el marco teórico Flow, estableciendo la correlación entre retos y habilidades, el nivel de ansiedad de los jugadores y la prevalencia del entretenimiento como factor motivador del compromiso. Como resultado, los alumnos afirman que es más interesante estudiar y divertirse al mismo tiempo en un entorno escolar más dinámico y productivo, manteniendo el entretenimiento como factor motivador para el aprendizaje
Palabras clave: aprendizaje; juegos serios; teoría del flujo.
1 INTRODUÇÃO
A geração atual está cada vez mais conectada e inserida no contexto de informações instantâneas, ambientes das redes sociais em que se compartilham experiências e vivências que podem ser aliadas no aproveitamento educacional. Foi, nesse sentido, que, o presente artigo partindo da premissa de que muitos jovens e adolescentes são atraídos pelos jogos digitais, apresenta a pesquisa envolvendo a temática de como esses games podem ser cooperadores para o processo de ensino e de aprendizagem. Em razão de ser oferecido ao jogador as batalhas a serem vencidas, além do retorno imediato caso haja desacertos, o cumprimento de cada missão e o avanço nas fases e etapas são elementos motivadores que, alinhados ao conteúdo e proposta pedagógica adequados, podem despertar o interesse dos estudantes e promover a aprendizagem. O historiador Johan Huizinga, em seu livro Homo Ludens, de 1938, já afirmava que
[...]o jogo é mais do que um fenômeno fisiológico ou um reflexo psicológico. Ultrapassa os limites da atividade puramente física ou biológica. É uma função significante, isto é, encerra um determinado sentido. No jogo existe alguma coisa "em jogo" que transcende as necessidades imediatas da vida e confere um sentido à ação. Todo jogo significa alguma coisa. (Huizinga,1938, p.2).
Como a escola deve ser um ambiente acolhedor, interessante e significativo, surgiu a reflexão sobre a quantidade de horas que os adolescentes e jovens ficam conectados no mundo virtual por meio dos games. Eles até já desenvolvem os jogos em redes, ultrapassam desafios, cada vez mais, audaciosos, criam suas próprias identidades a partir do momento que conseguem imergir nessas plataformas, gerando, a cada dia, mais vontade de participar desse tipo de evento. Foi, a partir dessa perspectiva, que observamos a influência dos jogos digitais nessas faixas etárias e passamos a questionar por que não utilizar essa tecnologia no processo de ensino.
Logo, compreendemos que o uso de Serious Games na educação exige a participação efetiva do corpo docente envolvido, a convergência de propostas pedagógicas para esse fim e o envolvimento dos estudantes durante esse processo. Diante desse cenário, a presente pesquisa tem como objetivo analisar o estado de flow durante o uso de Serious Games no processo educativo de estudantes do segundo ciclo do Ensino Fundamental.
2 SERIOUS GAMES E O POTENCIAL DE IMERSÃO: A BUSCA DO ESTADO DE FLOW
Desenvolvidos a partir de um propósito específico, os “serious games” como também são chamados, destacam-se pelo seu principal objetivo: o de ter uma finalidade educativa, minimamente elaborada para algum fim definido, sem a implicação que deva ser isento da diversão e entretenimento. Sua importância aponta a capacidade para treinar, desenvolver novos hábitos, ensinar e, até promover uma transformação social.
Trata-se de uma área do conhecimento com estudos recentes, porém, na década de 60, ao se utilizar dos jogos de cartas e tabuleiro, Clark Abt, em seu livro intitulado Serious Games, já garantia que,
jogos são dispositivos de ensino e treinamento efetivos para alunos de qualquer idade, e em muitas situações, porque são altamente motivadores e comunicam muito eficientemente conceitos e fatos em muitas áreas. Eles criam representações dramáticas do problema real sendo estudado. Os jogadores assumem papéis realistas, encaram problemas, formulam estratégias, tomam decisões e recebem feedback rápido da consequência de suas ações (ABT, 1968, p. 13).
O autor defendia as influências das relações de poder, as articulações sociais e as de cunho político que podem ser analisadas como jogos, por isso, classifica todo pleito eleitoral como se fosse um jogo. Também aponta as diversas relações internacionais com uma espécie de jogo, a variedade de argumento pessoal também sendo um jogo, e considerável parcela das atividades de negócios tendo uma relação com o ambiente dos jogos. Abt (1968) defendia que os Serious Games denotavam escopo educacional esquematizado, em que seu intento fundamental não seria a diversão irrestrita, claro que ponderando que o entretenimento não seja definitivamente eliminado.
Os serious games têm um potencial de imersão durante a experiência educativa do estudante. No propósito de atrair, principalmente os jovens, os serious games possuem atribuição de serem divertidos sem anular a capacidade de ensinar, treinar e gerar algum tipo de conhecimento. Ainda sobre as definições de Huizinga (1999), a conquista da atenção dos jovens para a utilização dos serious games se deve a pelo menos seis características:
1. Voluntariedade, uma forma de liberdade: nunca é imposto pela necessidade física ou pelo dever moral, tornando-se necessário apenas na medida em que o prazer por ele provocado se torna uma necessidade;
2. Fazer de conta: jogar não é vida “corrente” nem vida “real”;
3. Imersão: Jogos são capazes de absorver inteiramente o jogador;
4. Limitação, isolamento: são jogados “até o fim” dentro de certos limites de
Tempo e de espaço;
5. Regras: jogos criam ordem e são ordem;
6. Socialização: criam grupos sociais de jogadores e tendem a causar pessoas envolvidas em um tipo específico de atividade a se identificar como um grupo (Huizinga, 1999, p.19).
Destarte aos questionamentos sobre a validação no que tange ao uso dos jogos digitais no processo de ensino e de aprendizagem, resta dialogar sobre a relevância dos Serious Games em relação a um jogo comum. Para Michael e Chen (2006), os serious games têm a finalidade de ir além dos modos tradicionais de ensino e aprendizagem, como o edutainment, que mantinha foco em fatos do ensino, principalmente, por meio da memorização. Os Serious Games oferecem potencial mais amplo, pois não são direcionados a um público-alvo específico, contempla as crianças, adultos e até as pessoas da melhor idade. Sua capacidade de ensinar, treinar e educar torna eficaz sua utilização.
É salutar observar que existem vários esforços para que um estudante fique um tempo no Serious Games sem ser levada pelo tédio o cansaço. Tal interesse é explicado pela teoria do Flow (fluxo), que emergiu de mais de trinta anos de reflexão sobre os resultados das investigações sobre o que faz com que algumas experiências sejam muito gratificantes para as pessoas, que elas as fariam mesmo sem nenhuma expectativa de ganho ou recompensa externa.
De acordo com professor Csikszentmihalyi (2014, p. 01),
Artistas, músicos, atletas e pessoas comuns que muitas vezes gastam grande quantidade de tempo e energia fazendo coisas que consomem muito tempo e, por vezes, até mesmo muito arriscadas, sem nenhuma das recompensas que se diz serem necessárias para motivar o comportamento. Como isso pode acontecer? Esta foi a pergunta que fiz no início da pesquisa de Flow no final dos anos 1960. (Csikszentmihalyi, 2014, p. 01)
A primeira consideração de Csikszentmihalyi foi reconhecer que o comportamento humano deriva sua motivação de muitas fontes, e a Psicologia identificou, há muito tempo, muitas delas: necessidades fisiológicas e seus derivados, a necessidade de segurança, autoestima, autonomia, entre outras. No entanto, tem, em geral, ignorado um segmento importante dos motivos: aqueles que produzem recompensas que surgem por causa da interação efetiva da pessoa com o meio ambiente.
Segundo Csikszentmihalyi (2014), essas recompensas são a experiência de fluxo (flow experience). São consideradas saudáveis, aquelas pessoas, cuja sobrevivência e distintas penúrias iminentes estão atendidas, são determinadas a descobrir, aprender e ampliar suas habilidades ambicionando a interação com o meio. Por serem parte do rito, elas admitem satisfação no que fazem e procuram a prática para o bem próprio. O crescimento se torna a própria recompensa. Esse engajamento agradável é o que o autor classifica como Flow. Se a Teoria do Fluxo é um estudo muito recente, o autor afirma que sua descoberta não é uma ideia nova. Para Csikszentmihalyi (2014, p. 01).
Desde Aristóteles os pensadores reconhecem que o desenvolvimento e a utilização de potencialidades são um dos aspectos mais gratificantes da vida. Entre psicólogos americanos modernos, Abraham Maslow foi um dos defensores mais eloquentes dessa perspectiva: seu conceito de autorrealização (sic) é bastante semelhante ao de Flow. (Csikszentmihalyi, 2014, p. 01).
Em suas investigações, Csikszentmihalyi (2014) trabalha a questão da motivação intrínseca que apareceu para elucidar os ensejos que induzem as pessoas a concretizarem verificadas atividades avaliadas sem desígnio exclusivo. Para ele, a motivação entusiasma a centralização das pessoas em exercitar uma empreitada e conservar-se concentrado nela. E, quando essa motivação é intrínseca, tendenciosamente o indivíduo passa a realizar tal ação bem mais satisfeito. O autor identifica (Figura 1), pelo menos, oito elementos classificados como fundamentais para determinar o estado do indivíduo em alguma circunstância:
Figura 1 - Elementos do Estado de flow.
Fonte: Csikszentmihalyi, 1999.
Para que ocorra o estado de flow, o autor afirma que, no mínimo, três dos referidos elementos exibidos devem se destacar em uma situação estabelecida, por exemplo, o equilíbrio entre desafio e habilidade, a clareza das metas e o rigor do adequado feedback, além da total concentração na atividade e principalmente durante o percurso dessa atividade. É, nessa perspectiva, que os Serious Games podem ser justificados como recurso colaborativo no processo de ensino. Buscar a concentração total do estudante pelo uso das novas tecnologias prevê maior aceitação devido ao fato de já viverem ambientados em uma realidade digital, conectada. Os games oferecem essa facilidade para o ingresso no estado de flow que permitirá ao estudante obter novas experiências, e, consequentemente, sua aprendizagem terá significado.
Os estudos do professor Csikszentmihalyi (2014) oportunizaram a mensuração de como as pessoas estão se sentindo a cada 10 minutos por intermédio de ferramentas de pesquisa. Suas descobertas podem ser representadas na figura a seguir.
Figura 2 - Diagrama de Csikszentmihalyi.
Fonte: Csikszentmihalyi, 1990.
Para Csikszentmihalyi (1990), os desafios e habilidades devem ser interpretados como as dimensões mais significativas de acordo com os eixos no diagrama. Sucessivamente o jogador inicializa uma atividade em que o desafio incide em sua habilidade (A1). Nesse andamento, ele, possivelmente, encontra-se em estado de flow. Não obstante, isso logo se decompõe em tédio (A2), considerando que suas habilidades aumentaram e não se enquadram ao desafio inicial. Contudo, assim como um novo desafio é proporcionado, a ansiedade (A3) passa a ser configurada como um tipo de sentimento, razão em que o objetivo é vencer seu novo desafio e impetrar, outra vez, o estado de flow (A4).
Em relação aos games e à maneira que os jogadores podem demonstrar maior interesse, a Teoria do Flow indica que, se o desafio ultrapassar as habilidades, torna-se alerta e ansioso, ao mesmo passo que, se as habilidades excedem os desafios, vem o relaxamento e, eventualmente, o tédio. Uma representação visual do panorama mostra a qualidade da experiência como uma função da proporção percebida entre desafios e habilidades (Figura 3). Mudanças no estado subjetivo fornecem feedback sobre a evolução das relações com o meio. Ansiedade ou tédio pressionam a pessoa a ajustar seu nível de habilidade e/ou desafio, a fim de escapar do estado aversivo e reinserir o Flow.
Figura 3 - Elementos da relação desafio versus habilidades.
Fonte: Csikszentmihalyi, 1990.
A Teoria do Flow contempla as ações do indivíduo em um ambiente onde ele realmente faz aquilo que tem afinidade, situação em que vence a apatia e o tédio o que seriam fatores decisivos para a ausência de motivação. Conforme a Figura 2, Csikszentmihalyi (1990) indica que o estado de flow é atingido quando o jogador não se apega a lembranças ou até com conflitos futuros que ele tenha que lidar, na verdade, ele consegue manter-se focado na ação presente, concentrado em atingir o objetivo utilizando suas habilidades e superando cada desafio. Tais aspectos o encaminham a satisfação em concluir cada etapa mantendo assim o estado de flow.
Visando encontrar a validação do uso de games no processo educativo, também observamos a percepção dos docentes frente ao uso dos jogos e como reagiram diante das aplicações.
3 A PESQUISA INTERVENÇÃO
Foi realizada uma investigação qualitativa, do tipo descritivo-interpretativa, a partir do uso de Serious Games, com o cenário de investigação de uma Escola Estadual, localizada no interior do Estado de São Paulo. Foram participantes da pesquisa cinquenta e quatro estudantes do sexto ano. Para a coleta de dados, utilizou-se a observação da aplicação do jogo e um grupo focal com os estudantes a fim de compreender a influência do game no processo de ensino e de aprendizagem. Fez-se a análise dos resultados a partir do referencial teórico de Flow relacionando-o com o engajamento dos estudantes, refletindo a luz da teoria do Flow, que apresenta a motivação e o estado de flow durante as atividades, estabelecendo a correlação entre desafios e habilidades, nível de ansiedade do jogador e a prevalência do entretenimento como fator motivador para engajamento.
Durante a intervenção foram usados dois jogos: o Divided Word e o Vida Animal. Tais jogos foram construídos pela Faculdade de Informática de Presidente Prudente a partir da solicitação dos estudantes participantes da pesquisa, tendo em vista as maiores dificuldades de aprendizagem nos conteúdos das temáticas que os jogos envolviam.
O jogo Divided Word possui conteúdo do componente curricular de Matemática. Neste, o jogador, que assume o papel de uma raposa chamada Riley, precisa resolver vários problemas matemáticos para salvar seu mundo da vilã Hipotenusa. O game é separado em quatro mundos com desafios focados em uma área específica da Matemática, sendo eles a Floresta dos Catetos, o Deserto das Frações, a Tundra de Pitágoras e o Lar da Hipotenusa, conforme mostra a Figura 4
Figura 4 - Tela de escolhas dos mundos do jogo Divided Word.
Fonte: Fipp, 2016.
Após o jogo iniciar, é possível acompanhar cada etapa bem como suas missões. Cada mundo possui características, inimigos e puzzles para serem resolvidos. Ao final de cada fase, um relatório com acertos e erros é mostrado para apresentar o aproveitamento do jogador.
O outro jogo criado recebeu o título de Vida Animal. Na Figura 5 podemos observar a tela de abertura do jogo que contempla a imersão nos componentes curriculares do Estado de São Paulo nas áreas de Biologia e Geografia. No referido jogo, o jogador (estudante) assume o papel de um biólogo, que iniciou seus estudos sobre a Biodiversidade, ele deve encontrar os animais por meio de missões. O objetivo é fotografar os animais sem que seja percebido ou que eles fujam. Dentre as dificuldades para localizar os referidos animais, esse jogador deve saber, previamente, informações sobre a região correta, o tipo de estação do ano, seus hábitos, tipagem sanguínea.
Figura 5 - Tela de abertura do jogo Vida Animal.
Fonte: Fipp, 2016.
Ao iniciar o jogo, os estudantes têm, como missão, acertar o alvo. O jogador é direcionado a responder questões relacionadas ao conteúdo e, assim, pontua e diminui o número de missões a serem cumpridas.
Para contemplar todos os cinquenta e quatro participantes da pesquisa, foram necessários dois dias de aplicações com grupos de dezesseis e dezessete estudantes, respectivamente. Vale ressaltar a cooperação tanto da equipe gestora escolar quanto dos professores, que foi fundamental para o andamento da pesquisa, já que os estudantes que não haviam participado ainda da aplicação do game foram liberados durante o horário de aulas de outras disciplinas para colaborarem com este trabalho.
Ouvir dos estudantes que estudar Matemática com o recurso de um game estava se tornando mais divertido nos remetia ao objeto deste estudo que almeja refletir sobre a utilização dos Serious Games de forma eficiente no processo educativo. Diante das experiências que os estudantes já tinham sobre games, houve raras intervenções do pesquisador quanto à explicação da jogabilidade. Eles queriam avançar as etapas e compreendiam que, para esse feito, era necessário o cumprimento de cada missão proposta.
Na sequência, agendamos a aplicação do game Vida Animal, que aborda as questões de Geografia e Biologia. Para a efetiva participação dos estudantes, utilizamos a mesma estratégia de divisão do grupo em menores quantidades para que todos pudessem conhecer os aspectos do jogo. Como se não bastasse os imprevistos em relação à infraestrutura técnica já versada anteriormente, fomos surpreendidos, novamente, por outro problema quanto ao software dos computadores do laboratório de Informática que, após uma revisão e formatação, não aceitava outros aplicativos além dos já instalados nas respectivas máquinas.
Após contato com técnicos da área, fomos informados sobre a possibilidade de algum tipo de restrição relacionada ao tipo de aplicativo executável do jogo Vida Animal, já que o game Divided World funcionou normalmente. Visto o compromisso com os prazos estipulados, julgamos necessária a adesão de outros meios que pudessem avançar essa nova etapa. Obtivemos a ajuda de parceiros que concordaram em emprestar seus notebooks para que aplicássemos o jogo.
Devidamente de posse de quatro notebooks, iniciamos a aplicação do jogo Vida Animal, dessa vez, na Sala de Leitura, direcionando uma dupla para cada computador. No primeiro dia, utilizamos o período de três aulas de cinquenta minutos, e cada grupo de oito estudantes jogou por uma aula, perfazendo o total de vinte e quatro participantes na primeira aplicação.
Buscando a efetiva participação de todos os participantes, dividimos os estudantes restantes para participarem no dia seguinte, oferecendo liberdade para o estabelecimento de toda crítica e análise do jogo em questão, considerando as habilidades com os jogos digitais. Foi de forma organizada que todos os cinquenta e quatro estudantes tiveram a oportunidade de praticarem o jogo, conhecerem as funções disponíveis na plataforma.
A constatação, durante as aplicações dos jogos, foi sobre o aspecto do engajamento dos estudantes em relação aos jogos. Eles se mostraram interessados e sempre descobrindo novas possibilidades de acertos e conclusão dos desafios que os levavam ao avanço das missões. A vivência com outros tipos de jogos demonstrou ser item importante para a relação com os Serious Games, em que o estudante foi conduzido à experiência do entretenimento aliada à aprendizagem e à assimilação dos conteúdos.
Destacamos que toda a intervenção aplicada foi baseada na aprovação do comitê de ética do CEP/CONEP, da Plataforma Brasil, sob o número 70875217.2.0000.5515.
4 ANÁLISE DOS DADOS: O ENGAJAMENTO DOS ESTUDANTES E HABILIDADES DESENVOLVIDAS COM BASE NA TEORIA DO FLOW
4.1 AS HABILIDADES DOS JOGADORES
Compreender os níveis de concentração das pessoas em algum tipo de atividade específica fez parte das investigações de Csikszentmihalyi (1990), que buscava identificar os fatores que levam o indivíduo ao estado de felicidade em sua vida diária. Seus estudos e experimentos permitiram desenvolver um padrão que ele rotula como “experiência ótima”, sendo definido como “uma atividade realizada sem expectativa de algum benefício futuro, mas por que realizá-la é a própria recompensa” (Csikszentmihalyi, 1990, p. 67).
Para o notável autor, a Teoria do Flow é admitida pela razão como os indivíduos delineiam seu estado de espírito quando a consciência está em equilíbrio e ordem e, ainda assim, prosseguem na realização de ações exclusivamente por vontade própria.
Nesse aspecto de engajamento, temos as habilidades que, assim como, em seu campo semântico, representam a qualidade daquele que é hábil ou, ainda, a capacidade e inteligência, aptidão ou a destreza para solucionar potenciais desafios e manter-se na interação da atividade ou dos contextos em que esteja inserido.
Na relação dos jogos, é primordial que o jogador não tenha a sensação de que os desafios são razoáveis ou simples demais, mas também, não podem ir ao extremo da complexidade, prescrevendo uma fatídica desistência dos jogos pelo fato de não promover o engajamento. Não se trata de aliciamento do jogador com tarefas sem objetivos definidos, em que poderiam ser apresentados games exclusivo para diversão. O que esta pesquisa identifica, por entre os dados obtidos, é que a habilidade em avançar cada etapa, concluir as missões, a relação com o retorno imediato, no que tange aos conteúdos abordados nos jogos são pertinentes e colaborativos para o processo educativo.
No transcorrer da observação da prática docente, constatamos a apresentação do docente sobre a ação do pesquisador e o intuito da pesquisa e percebemos o entusiasmo que o docente explanava sobre a oportunidade dos estudantes conhecerem um novo tipo de metodologia que iria auxiliá-los futuramente, já que o uso das habilidades individuais como o conhecimento prévio sobre o ambiente de games, domínio da linguagem, uso adequado do teclado e mouse como interface para jogabilidade e principalmente a busca pela solução dos desafios propostos no game, facilitariam o aprendizado de modo divertido.
Na visão dos participantes E1, E2, E6, E9 e E10, os jogos se apresentaram com visual agradável e bem semelhante aos demais jogos já praticados. Buscar associar a ideia da jogabilidade e mecânica de outras plataformas apontou para a habilidade com a interface notebook e ambiente do jogo e, consequentemente, compreender os desafios e atingir os objetivos propostos, conforme descritas respectivamente suas expressões:
[...] que legal saber que o mesmo jeito que jogo na minha casa, dá pra fazer o soldado atirar na raposa [...].
[...] não acredito que é igual os outros jogos, achei que tinha que saber de todas as contas de matemática para passar para próxima fase [...].
[...] o gráfico parece com outros jogos de RPG, mas esse aqui aprendi que consigo mudar a continha de matemática, quando não a conta de “vezes” posso colocar da de “mais” e acho mais fácil a raposinha que vou atirar [...].
[...] consegui usar o mouse e ver o lago por cima, e se você aproximar a câmera a gente consegue ver onde é mais fácil pular e sair para continuar encontrando o alvo, o bichinho[...].
[...] consegui sair jogando nem li todas as instruções da primeira tela, o jogo é bem legal e fácil de jogar, só estou tentando fazer as continhas certas para matar mais raposas que eu conseguir [...].
Foi, durante a aplicação do jogo Divided World que, inicialmente, duas estudantes relataram a dificuldade que tinham para iniciar o jogo de conteúdos matemáticos. Respectivamente, tratavam-se das participantes E2 e E3, em que a primeira não apresentava dificuldades de aprendizagem dos conteúdos, porém tinha experiência com jogos digitais. A segunda participante, além de constar com o indicador de dificuldade de aprendizagem, também relatou não ter tido experiência anterior com outro tipo de game.
Nesse sentido, a E2 passou a oferecer ajuda e auxiliar E3 a utilizar as operações matemáticas sugeridas no jogo para atingir o alvo com o referido resultado operacional, conquistando o acerto pretendido no jogo. Conforme Csikszentmihalyi (1990), tais estudantes com aparente redução do nível de habilidades devem passar a ser exploradores, situação em que passam a investigar as características do ambiente do jogo e arriscam na descoberta dos desafios aventados.
Os estudos de Valente (2014) indicam que a utilização de novas tecnologias para a educação aponta que o processo de significação, de compreensão e de apropriação da informação não é objeto da comunicação, para o autor, o receptor-sujeito pode construir seu próprio conhecimento, fruto do autodidatismo, como expresso pelo participante E6 quando afirma que aprendeu uma maneira de alterar formato da operação matemática e concluir o objetivo que foi de acertar o alvo com o respectivo resultado correto da operação. Esse engajamento demonstra alinhamento das estratégias defendidas por Csikszentmihalyi (1990), em que mesmo o estudante tendo menores habilidades para aprendizagem, o game oportunizou novas descobertas, a autonomia de conferir seus resultados e, principalmente, de se sentirem satisfeitos, enquanto desenvolvem a prática do jogo.
4.2 OS DESAFIOS DOS JOGOS
Sobre os desafios, empenhamo-nos a avaliar como os estudantes desenvolviam a jogabilidade e se comportavam diante das missões propostas nos jogos. Na observação do jogo Vida Animal, prevaleceu uma abordagem dos estudantes que questionavam como vencer o primeiro desafio, quando o personagem cai em um lago do cenário, sendo considerado difícil, a priori, vencer esse tipo de desafio.
Acompanhando essas dificuldades encontradas na navegação do jogo, buscamos motivar os estudantes a fazerem mais tentativas até vencer o desafio e prosseguir no jogo. Como característica da Teoria do Fluxo, quando as habilidades não são compatíveis com os desafios, a tendência é de o jogador entrar em estado de ansiedade e, consequentemente, perder seu estado de flow.
Para os participantes E1, E4 e E6, os desafios de fazer com que o personagem pulasse do lago foi interessante e fez descobrir uma nova tática no jogo, como declaram os participantes, respectivamente:
[...] fiquei pensando como teria que fazer para dar o pulo e sair do rio, aí lembrei que tem uma tecla que o caçador corre bem mais rápido, então eu dei um pouco mais de espaço, ele pegou velocidade e pronto, pulei a margem bem rápido [...].
[...] ah, eu pulei de todos os lados e achei que da outra margem era mais baixo o degrau do riozinho, mas também não deu certo, até que lembrei que voltando um pouco para trás dava certo [...].
[...] nossa, foi moleza depois de tentar e descobri que usando a tecla shift o homenzinho tem impulso e aprendi isso jogando, foi muito legal porque agora sei que todas as vezes posso pular e não perco tempo com isso [...].
De acordo com os relatos dos estudantes aqui apresentados, compreendemos que mesmo as dificuldades que, inicialmente, surgiram no aspecto da jogabilidade foram superadas, considerando, assim, como desafio vencido e condições de avançar nas missões. O fato da busca da solução desse problema mantinha o entusiasmo do jogador, o que fazia com que ele atentasse para as informações relacionadas com a aprendizagem do conteúdo disciplinar em estudo.
Nesse sentido, de acordo com a perspectiva de Dewey (2010), a compreensão da experiência estética verdadeira passa pela consideração de seu “estado bruto”, quanto às formas de ver e ouvir como geradoras de atenção e interesse, como ocorreu durante a aplicação dos jogos, que comprovaram tal concepção. As expressões dos estudantes representam o quanto foi significativo vivenciar cada etapa do jogo, cada descoberta, o ato experiencial de se engajar em uma jogabilidade e sentirem-se parte de um processo evolutivo, onde em razão de estarem se divertindo e concentrados em suas tarefas, consequentemente, o conteúdo curricular está sendo aplicado.
4.3 O ESTADO DE FLOW NA CORRELAÇÃO ENTRE DESAFIOS E HABILIDADES E NÍVEL DE ANSIEDADE DO JOGADOR
Em conformidade com a Teoria do Flow, ressaltamos o que foi prevalente na maior parte da observação sobre o estado fluxo que se apresenta quando o indivíduo busca objetar as experiências, ou seja, ele entra em harmonia com o ambiente do jogo e passa a vivenciar aquele momento ao longo de uma estrutura seletiva no funcionamento psicológico, que promove o crescimento por meio das relações em torno da diversão e aprendizagem baseadas na motivação.
Para Csikszentmihalyi (1990), as pessoas benfazejas, aquelas que se consideram realizadas pela oportunidade da qualidade de sobrevivência, geralmente são entusiasmadas a explorar, aprender e desenvolver as suas habilidades interagindo de maneira eficiente com o ambiente. E, por se envolverem neste procedimento, elas gostam daquilo que fazem e procuram a sua própria experiência. O desenvolvimento se torna a oportuna gratificação. Esse engajamento agradável é o que chamamos de Flow.
Foi o que testemunhamos durante a observação em que os participantes E5, E7, E8 e E9 relataram, quando discursaram no grupo focal, e durante a aplicação que foi observada de maneira minuciosa por este pesquisador, como descritas as falas adiante, respectivamente:
[...] professor está muito legal aqui, não queria nem voltar para sala... aqui é muito mais divertido e estou aprendendo sobre o tipo de sangue das aves, eu nem sabia que tinha sangue quente ou frio [...].
[...] vou falar para todo mundo que estou curtindo um jogo que ainda me ensina sobre geografia e a gente consegue brincar de atirar e saber bastante coisa sobre os animais, a gente não pode ter todas as aulas aqui?
[...] sabe, fiquei pensando porque a escola não libera esse jogo na “PlayStore”, aí eu iria ficar aprendendo lição no meu celular, brincando e aprendendo e iria falar para minha mãe que o celular agora tem matéria da escola, muito da hora! [...].
[...] você tem certeza que algum dia vamos ter esse jogo aqui na escola mesmo? É muito bom saber que os jogos não servem só para diversão, mas que se divertindo a gente aprende muitas coisas, não queria que acabasse, mesmo eu que já brinquei com outros joguinhos no celular e achei difícil no começo, agora que aprendi não queria parar [...].
Diante das manifestações dos estudantes, destacamos a prevalência do estado de flow, em que eles se mantiveram engajados e sempre almejando conhecer mais sobre o jogo e ávidos na busca das soluções dos problemas propostos no ambiente digital. Os pressupostos teóricos estudados indicam que o jogador quando atinge um estado de imersão capaz de atingir seu nível de consciência ele permanece concentrado ao ponto de se manter em estado de flow, exatamente por estar praticando uma ação que lhe oferece prazer.
Sua vontade em romper com os desafios que lhes foram apresentados na plataforma do jogo permite que este continue atento aos detalhes de cada etapa, aos recursos disponíveis, as tentativas que oportunizam novos caminhos para alcançar o objetivo do jogo. São esses os momentos em que de acordo com a Teoria do Flow ocorre a sensação de satisfação que corrobora com a ideia de fuga ao tédio, da prevalência da realização em praticar uma atividade exitosa.
Em âmbito de comparação entre os teóricos, Valente (2014) ressalta que a questão fundamental no processo educacional é conhecer de qual forma levar informação, esperando que o aprendiz tenha condições suficientes de compreender quais ações ele deve realizar para que a informação seja convertida em conhecimento. A Teoria do Flow, portanto apresenta que no instante em que o referido jogador está engajado, seu nível de concentração é tão alto que o faz manter-se em equilíbrio entre a ansiedade e a busca pelo uso das habilidades que o ajudarão a vencer os desafios, logo, ele foge do tédio prejudicial para sua aprendizagem.
4.4 PREVALÊNCIA DO ENTRETENIMENTO COMO FATOR MOTIVADOR PARA ENGAJAMENTO NO JOGO
Em consonância aos pressupostos que definem os Serious Games, pode-se classificar essa modalidade como os jogos que não foram elaborados exclusivamente para o entretenimento – eles contêm diversão, mas também oferecem a oportunidade educativa que colabora diretamente para a aquisição de conhecimento. Há de se reiterar que os Serious Games mantêm a harmonia entre esses dois aspectos e têm sido utilizados com a finalidade educacional, mas com características relevantes em relação aos demais games tradicionais, pois esse formato considera o envolvimento do jogador de maneira divertida, com vistas ao aprendizado.
Dois estudantes reagiram de forma mais atenuada quanto ao engajamento. Na verdade, os participantes, em sua maioria, esboçaram, durante a maior parte das aplicações, envolvimento espontâneo com o jogo, porém os estudantes E9 e E10 afirmaram o seguinte:
[...] professor, esse jogo é tão da hora que dá para acelerar a velocidade do meu homenzinho e encontrar os animais mais rápido e estou conseguindo acertar todas as perguntas, quanto mais eu acerto está ficando mais legal, não quero mais estudar a não ser neste game [...].
[...] eu não consigo responder todas as perguntas porque tem algumas coisas de geografia que me confundo, só que já estou dominando pegar os bichinhos pelas coordenadas que o professor Beto [personagem do jogo] nos dá, está muito legal, e estou aprendendo assunto da lição que eu não sabia [...].
Observando essas explanações, ficou evidente que a aprendizagem é facilitada pelo fato do estudante estar motivado a superar os desafios, e, ao passo que ele caminha entre as etapas do jogo, esse tipo de imersão caracteriza a cooperação dos Serious Games no processo educativo.
Vale salientar um dado importante que, durante as aplicações, o docente não teve nenhum tipo de problema com indisciplina dos estudantes, considerando ser uma turma que está habituada a conversar até de maneira excessiva em sala de aula. Foi notado que o entretenimento, articulado à uma situação de aprendizagem, fez tornar perceptível essa mudança no comportamento dos estudantes.
4.5 QUANTIDADE DE TEMPO NO AMBIENTE DE JOGO
Essa foi uma das categorias em que mais ficou evidente o que a Teoria do Flow assevera, quando Csikszentmihalyi (1990) recomenda que a pessoa, em estado de flow, passe a experienciar as seguintes condições:
· Perda de autoconsciência reflexiva, ou seja, perda de consciência de si mesmo como um ator social;
· Sensação de que se está no controle de suas ações, isto é, uma sensação de que se pode, em princípio, lidar com a situação, porque sabe como responder a tudo o que pode acontecer;
· Distorção da experiência temporal, tipicamente, a sensação de que o tempo passou mais rápido do que o normal.
Dentre outras características, atemo-nos à última, sobre a sensação de que o tempo passou muito rápido, o que registramos na fala de seis participantes – E1, E4, E5, E9, E9 e E10 – que se expressaram dizendo:
[...] não acredito que já terminou minha vez, parece que nem joguei direito, posso ficar só um pouquinho a mais [...].
[...] eu já combinei com meu colega, ele vai deixar eu ficar um minutinho a mais do tempo dele, está muito legal não quero parar agora [...].
[...] espera eu encontrar só mais uma tartaruga, por favor [...].
[...] agora que eu entendi o jogo já acabou, quando estou do lado demora e quando é minha vez de jogar vai rápido [...].
[...] eu vou ficar mais um pouco, porque foi rápido demais quase nem joguei, é gostoso esse jogo de matemática [...].
[...] quero pontuar para chegar no final, deixa eu ficar depois que todo mundo sair da sala, eu aprendi bastante coisa, mas é muito rápido [...].
Reconhecer o aspecto teórico sendo evidenciado na prática foi um aspecto gratificante na pesquisa, pois os estudantes demonstravam a constante expectativa de desejarem continuar jogando. É como se perdessem a noção do tempo, estavam tão envolvidos que julgavam terem sido prejudicados pelo tempo em que jogavam.
Nesse contexto, observamos a prevalência dos conceitos que preceituam a Teoria do Flow, no qual os jogadores se sentiram à vontade, se mostraram satisfeitos, além disso, o comportamento deles não indicou a constância na apatia ou na ansiedade, ao contrário, o engajamento na atividade ocorreu durante a intervenção.
4.6 ENGAJAMENTO DOS ESTUDANTES E HABILIDADES DESENVOLVIDAS
O envolvimento dos participantes da pesquisa foi essencial para o êxito desta pesquisa. A familiaridade com os jogos digitais em diferentes vertentes permitiu que os estudantes não criassem nenhum tipo de barreira que os impedissem de inicialmente conhecer o jogo e suas características.
Conforme os estudos de Csikszentmihalyi (1999), quando ele aproxima suas concepções de outros teóricos otimistas que afirmam que uma sociedade cuja população está intensamente engajada e comprometida por tudo aquilo produz, ela passa atingir o estado de flow e consequentemente se sentir altamente feliz pelas atividades que desenvolve.
Durante a observação, ressaltamos episódios que atestam a concentração e engajamento dos respectivos jogadores, através do uso de suas habilidades para superar os desafios propostos no jogo, como apresentamos abaixo o depoimento dos participantes- E3, E5 e E7
[...] na verdade, estou achando muito interessante esse jogo porque a tela abre inteira e é possível ver toda a parte dessa floresta e do mesmo jeito do Minecraft vou conseguindo fazer ponto, eu não quero parar de jogar, posso jogar mais[...].
[...] eu só acho que vou ter que ficar mais tempo porque estou aprendendo sobre os tipos de sangue dos bichos, e tem coisa que eu nem sabia, quero continuar aqui, acho que iria me dar bem até na prova [...].
[...] acho que as pessoas iam acreditar mais em mim, quando falo em casa que tem jogos legais e que a gente até aprende bastante coisa. Esse jogo de matemática nem parece que a gente está fazendo a matemática, só sei que quanto mais número acerto, mais raposa estou matando e fazendo muitos pontos, pena que passa rápido [...].
As comparações com outros jogos, indicaram que os estudantes se interessavam por ser um recurso inerente a respectiva faixa etária, porém quando percebem que estão absorvendo algum tipo de conhecimento devido a disposição dos conteúdos curriculares abordados, eles demonstram maior autonomia e satisfação o que requisitavam sempre a continuidade no ambiente do jogo.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O principal objetivo dessa pesquisa foi analisar o estado de flow durante o uso de Serious Games no processo educativo de estudantes do segundo ciclo do Ensino Fundamental.
Com base nos dados observados, concluímos a relevância dos Serious Games, que são jogos fundamentados em uma proposta que possibilita a aprendizagem do estudante, enquanto ele também se diverte. A temática dos Serious Games perpassa a ótica linear do jogo meramente em caráter de entretenimento, de modo que buscamos contemplar a existência de pressupostos teóricos convincentes, de que é promissora a utilização do game, devido a própria característica social, às demandas da geração conectada.
Entendemos que os Serious Games podem contribuir durante o processo educativo e a referida temática pode oferecer contribuições expressivas devido ao fato de atuar sempre com a perspectiva de o jogador estar motivado e concentrado naquilo que faz. Trata-se da prática do ensino em um cenário cujo estudante está determinado, sua espontaneidade e envolvimento permitem maiores experiências.
Compreender que os games vai muito além da diversão e que eles oferecem ampla possibilidade do estudante se desenvolver, fazer suas próprias assimilações e se tornarem sujeitos críticos e reflexivos, foi a experiência mais latente.
Enfim, nas perspectivas de pesquisa futura, considera-se a importância de desenvolvimento de análises mais apuradas, buscando comprovar, cada vez mais, a eficiência quanto ao uso dos games no processo de ensino. Aos próximos pesquisadores, que poderão atuar na mesma temática, recomendamos que os pressupostos teóricos elencados ofereçam subsídios e tragam sustentação para estudos futuros. No entanto, eles são amplos e abrangem aspectos que podem colaborar para a continuidade da pesquisa.
Também esclarecemos que o principal desafio é desvencilhar das antigas práticas de ensino que perpetuam um modelo que não promove a autonomia do estudante. Nesse sentido, almejamos que o delineamento desenvolvido e analisado nesta pesquisa seja capaz de produzir estímulos a elaboração de novos projetos, de maneira que se incorporem ao exercício de práticas pedagógicas como propostas de inovação que visem, a cada dia, mais qualidade no processo de ensino e de aprendizagem.
REFERÊNCIAS
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CSIKSZENTMIHALYI, Mihaly. Flow: the psychology of optimal experience. New York: Harpercollins, 1990.
CSIKSZENTMIHALYI, Mihaly. Teoria do Flow, pesquisa e aplicações. ComCiência, Campinas, n. 161, set. 2014. Disponível em http://comciencia.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1519-76542014000700010&lng=pt&nrm=iso. Acesso em: 15 fev. 2023.
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HUIZINGA, Johan. Homo ludens: Versuch einer Bestimmung des Spielelements der kultur.1938. Publicado originalmente em 1944. Tradução para língua portuguesa: Homo Ludens: o jogo como elemento da cultura. São Paulo, SP. Perspectiva, 1999.
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VALENTE, José Armando. A comunicação e a educação baseada no uso das tecnologias digitais de informação e comunicação, 2014. Revista UNIFESO – Humanas e Sociais, Teresópolis, v. 1, n. 1, p. 141-166. Disponível em: http://www.revista.unifeso.edu.br/index.php/revistaunifesohumanasesociais/article/view/17/24. Acesso em: 23 jan. 2023.
[1] Mestre em Educação. MBA em Gestão Educacional em Docência para o Ensino Superior . Licenciando em Pedagogia. Graduado em Jornalismo. Licenciado em Letras - Português e Inglês . Atualmente é Professor de Ensino superior da Faculdade de Tecnologia de Presidente Prudente, Professor de Gramática e Redação - Colégio Educar – Objetivo.
[2] Doutora em Educação, Pedagoga, Bacharel em Direito. Avaliadora do MEC-INEP. Docente da Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul (UEMS) e Universidade do Oeste Paulista (UNOESTE).
[3] Bacharel em Sistemas de Informação. Licenciado em Informática. Mestre em Educação. Doutor em Educação. Atualmente é professor no Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza e na Faculdade de Informática de Presidente Prudente FIPP/UNOESTE. Lotado no programa de Mestrado e Doutorado em Educação da UNOESTE como Professor Permanente.