MAPEAMENTO E VISUALIZAÇÃO DE REDES DE CONHECIMENTO NO DOMÍNIO SECA E SEMIÁRIDO

Rodriggo Leopoldino Cavalcanti I[1]

Universidade Federal de Pernambuco

rodriggo.cavalcanti@ufpe.br

Nancy Sánchez-Tarragó[2]

Universidade Federal do Rio Grande do Norte

nancy.sanchez@ufrn.br

Raimundo Nonato Macedo Dos Santos[3]

Universidade Federal de Pernambuco

raimundo.macedo@ufpe.br

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Resumo

Esta pesquisa parte do pressuposto de que o Núcleo Temático da Seca e Semiárido do Rio Grande do Norte (NUT-Seca) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte pode se recolocar como agente ativo da produção, gestão e disseminação de conhecimento no domínio da Seca e Semiárido. Para tanto, a pesquisa objetiva realizar o mapeamento e visualização de redes de conhecimento no domínio. Utiliza-se como enfoque metodológico a Análise de Domínio, ao qual se juntam as técnicas bibliométricas, de Análise de Redes Sociais e ferramentas de visualização da informação.  Como fontes de dados adotou-se a base de dados Scopus e o Diretório dos Grupos de Pesquisa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Foram mapeadas redes de coautoria, de cocitação, acoplamento bibliográfico e de grupos de pesquisa. As análises permitiram o mapeamento tanto em nível macro (da rede como um todo) quanto em nível micro (atores individuais), descrevendo, por exemplo, os componentes corporizados em documentos, atores e suas relações. Foi possível também constatar a existência de redes informais, a exemplo das redes de coautoria, e de redes formalizadas em grupos de pesquisa cadastrados no CNPq. Como resultado deste mapeamento poderão ser propostas ferramentas e práticas de gestão do conhecimento ao NUT-Seca, assim como serviços de informação que servirão como subsídios importantes para o estreitamento de laços de colaboração e de compartilhamento de conhecimento entre os atores envolvidos e o fortalecimento das pesquisas no domínio da Seca e Semiárido.

 Palavras-chave: redes de conhecimento; NUT-Seca; gestão do conhecimento; análise de domínio.

 

 

 

 

MAPPING AND VISUALIZATION OF KNOWLEDGE NETWORKS IN THE DROUGHT AND SEMI-ARID DOMAIN

Abstract

This research assumes that the Drought and Semi-Arid Thematic Center of Rio Grande do Norte (NUT-Seca) of the Federal University of Rio Grande do Norte can re-establish itself as an active agent in the production, management, and dissemination of knowledge in the Drought and Semi-Arid domain. To this end, the research aims to map and visualize knowledge networks in the domain. The methodological approach used is Domain Analysis, together with bibliometric techniques, Social Network Analysis, and information visualization tools.  The Scopus database and the National Council for Scientific and Technological Development (CNPq) Directory of Research Groups were used as data sources. Networks of co-authorship, co-citation, bibliographic coupling, and research groups, among others, were mapped. The analyses made it possible to map both at a macro level (the network as a whole) and at a micro level (individual actors), describing, for example, the components embodied in documents, actors, and their relationships. It was also possible to see the existence of informal networks, such as co-authorship networks, and formalized networks in research groups registered with CNPq. As a result of this mapping, knowledge management tools and practices can be proposed to the NUT-Seca, as well as information services that will serve as important aids for strengthening collaborative ties and sharing knowledge between the actors involved and strengthening research in the field of drought and semiarid regions.

Keywords: knowledge networks; NUT-Seca; knowledge management; domain analysis.

 

MAPEO Y VISUALIZACIÓN DE REDES DE CONOCIMIENTO EN EL DOMINIO SEQUÍA Y SEMIÁRIDO

Resumen

Esta investigación se basa en el supuesto de que el Centro Temático de la Sequía y el Semiárido de Rio Grande do Norte (NUT-Seca) de la Universidad Federal de Rio Grande do Norte puede reposicionarse como un agente activo en la producción, gestión y difusión de conocimientos en el dominio de la Sequía y el Semiárido. Para ello, la investigación tiene como objetivo mapear y visualizar las redes de conocimiento en el dominio. El enfoque metodológico utilizado es el Análisis de Dominio, junto con técnicas bibliométricas, Análisis de Redes Sociales y herramientas de visualización de información.  Como fuentes de datos se utilizaron la base de datos Scopus y el Directorio de Grupos de Investigación del Consejo Nacional para el Desarrollo Científico y Tecnológico (CNPq). Se mapearon redes de coautoría, co-citación, acoplamiento bibliográfico y grupos de investigación, entre otros, tanto a nivel macro (la red como un todo) como a nivel micro (actores individuales), describiendo, por ejemplo, los componentes plasmados en los documentos, los actores y sus relaciones. También se ha podido constatar la existencia de redes informales, como las redes de coautoría, y de redes formalizadas en grupos de investigación registrados en el CNPq. Como resultado de este mapeo, se pueden proponer al NUT-Seca herramientas y prácticas de gestión del conocimiento, así como servicios de información que servirán de ayuda importante para estrechar la colaboración y el intercambio de conocimientos entre los actores implicados y para reforzar la investigación en el dominio de la sequía y las regiones semiáridas.

Palabras clave: redes de conocimiento; NUT-Seca; gestión del conocimiento; análisis de dominio.

1  INTRODUÇÃO

Sacudidas pelas transformações provocadas pelo chamado “mundo moderno globalizado”, as instituições da informação e do conhecimento se deparam com um necessário aprofundamento e direcionamento de suas funções e passam a ter que repensar as missões e objetivos a elas adscritas. Cada vez mais esses espaços extrapolam a tarefa de apenas organizar, difundir e salvaguardar os conteúdos contidos em seus fundos documentais; hodiernamente estão chamadas a desempenhar papel central na produção, compartilhamento e disseminação de informação e conhecimento, no cenário de intercâmbio e internacionalização da ciência. Nesse contexto encontra-se o Núcleo Temático da Seca e do Semiárido (NUT-Seca), integrado ao Centro de Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e concebido como um centro de documentação cujo fim é o de sistematizar os estudos e as pesquisas sobre a seca, especialmente os problemas do impacto dela na vida do pequeno produtor rural (Aranha, 1989). Portanto, com mais de 30 anos de existência, o Nut-Seca necessita se reposicionar no domínio da seca e do semiárido para então servir como locus privilegiado de conexões entre instituições de pesquisas no tema.

Assim, esta pesquisa parte do pressuposto de que uma das possíveis ações voltadas para a dinamização da atuação do NUT-Seca no contexto atual é realizar o mapeamento e visualização das redes de conhecimento no domínio Seca e Semiárido.

As redes de conhecimento podem ser definidas sumariamente como uma comunidade de pessoas e de organizações que trabalham formal ou informalmente sobre um tema específico e até mesmo ao redor de um objetivo comum. As redes “primam pela interação, mas o objeto de compartilhamento é, principalmente, a informação e o conhecimento. É através dessas redes que conhecimentos, experiências e vivências individuais são compartilhados, visando benefícios recíprocos” (Oliveira; Cianconi, 2013, p. 228).

Na atualidade, as redes de conhecimento são uma das formas de suportar e se adaptar às transformações que impactaram as instituições em nível mundial, dado o aceleramento nas conexões das cadeias produtivas e da vertiginosa produção de conhecimento que o acompanhou, impondo o desafio de gerenciamento desses fluxos (Tomaél, 2008). O mapeamento e a visualização dessas redes também permitiriam a criação de novas ferramentas e práticas de gestão do conhecimento, entendida esta como conjunto de atividades estratégicas para facilitar a captura, comunicação, colaboração, partilha e aplicação do conhecimento (Souza, 2017).

Portanto, a presente pesquisa tem como objetivo realizar o mapeamento e visualização do domínio Seca e Semiárido e suas redes de conhecimento, por meio de técnicas bibliométricas, de Análise de Redes Sociais e ferramentas de visualização de informação. A partir daí o Nut-Seca pode conhecer melhor seus potenciais usuários e parceiros de pesquisa, sentando assim as bases para a criação de produtos e serviços de informação e novas ferramentas e práticas de gestão do conhecimento (Cavalcanti I, 2023).

 

2 REFERENCIAL TEÓRICO

Redes podem ser entendidas como sistemas que articulam e conectam os nós que delas fazem parte, cujos representantes, segundo as Ciências Sociais, são sujeitos sociais que estabelecem um número variado de formas de relação (Marteleto; Silva, 2004).  “A metáfora do tecido ou rede, inicialmente na sociologia e depois na psicologia e antropologia, [serve] para associar o comportamento individual à estrutura à qual ele pertence” (Marteleto; Silva, 2004, p. 42).

Corrales (2005, p. 7-8, tradução nossa), desde o marco de redes políticas baseado em Börzel (1997), define redes como

um conjunto de relações relativamente estáveis, de natureza não hierárquica e independente, que ligam uma grande variedade de atores que partilham interesses comuns no que diz respeito a uma política, e que trocam recursos para prosseguir esses interesses partilhados, admitindo que a cooperação é o melhor caminho para alcançar objetivos comuns.

 

Podemos então definir redes sociais como “redes de comunicação que envolvem uma linguagem simbólica, limites culturais, relações de troca e de poder” (Fialho, 2014, p. 10); e como aquilo que “refere-se a uma conceção da sociedade como sendo construída por redes de relações interpessoais ou intergrupais” (Fialho, 2014, p. 11) que estabelecem entre si um fluxo compartilhado de elementos de interesses comuns, gerando conhecimento a partir da associação entre os nós participantes.

O fluxo de conhecimento, do qual tratamos, explicita a existência de uma rede social como âmbito anterior, mas que ao mesmo tempo transpõe as relações dos próprios membros que compartilham conhecimento dentro de temas de interesse. “A ideia de ‘redes sociais’ é uma metáfora estrutural para que se observem grupos de indivíduos, compreendendo os atores e suas relações” (Recuero, 2017, p. 18). 

Tomaél analisa a relação entre redes sociais e redes de conhecimento da seguinte forma:

Consideram-se assim as redes de conhecimento como redes sociais, visto serem tecidas por interações decorrentes da cooperação e trabalhos em parcerias, que resultam em benefícios cujos reflexos podem beneficiar uma organização ou uma comunidade, que possivelmente esteja inserida em uma estrutura maior. Isto significa que uma rede cria, naturalmente, as condições necessárias para se projetar em territórios cada vez maiores. Participar de uma rede social é estar inserido em uma estrutura social, e sempre haverá novas possibilidades e novas fronteiras a ultrapassar e novas oportunidades a buscar (Tomaél, 2008, p. 11).

 

Deste modo, o relacionamento entre as pessoas, as instituições e os grupos de pesquisa, interligados “por uma rede estruturada de relacionamentos em comum, criando elos sistemáticos configurados em relações de conhecimentos organizacionais”, formam uma rede de conhecimento, de modo que esses conhecimentos gerados passem e possam ser objeto de análise e reflexão de “especialistas que convivem em um contexto comum, compartilhando seus conhecimentos e gerando benefícios organizacionais. [Pois], o conhecimento organizacional está nos atores institucionais que o detém.” (Ferreira; Alvares; Martins, 2017, p. 148).

Segundo afirmam Creech e Willard (2001 apud Tomaél, 2008, p. 4) “redes do conhecimento têm uma grande variedade de espaços de atuação, tanto reais quanto virtuais, dentro dos quais desenvolvem seus projetos. Todos podem ser necessários, em algum ponto, para o desenvolvimento de projetos em colaboração. "

Assim, a colaboração muitas vezes é a geradora da articulação entre os atores de redes de conhecimento e essa interação fortalece os seus membros ao fortalecer o seu conjunto quando agrega as experiências de cultura organizacional e intelectual de um ator a outro ou sua combinação, relevando assim a necessária reciprocidade na complementaridade no momento de criação e uso de produtos e serviços. A reciprocidade por sua vez deve considerar as naturezas, estados e condições de cada um dos atores envolvidos.

Portanto, o compartilhamento e a construção do conhecimento dependerão das interações entre os nós ou atores, que por sua vez definirão as

posições nas [...] redes sociais, que vão sendo modificadas por essas mesmas ações. A posição desses atores é, ao mesmo tempo, produto e produtora de interações, ou seja, a rede influencia e é influenciada pela posição de seus usuários. (Recuero, 2017, p. 13).

No que concerne ao tipo de conexões e relações entre atores de redes de conhecimento identificamos dois modos relevantes de abordagem: formal e informal. Na abordagem informal, mapear os atores de uma rede carrega a dificuldade de identificação das ligações e conexões entre eles pois revela uma dinâmica quase imperceptível entre os indivíduos que compartilham informação e conhecimento com baixa estruturação, pois podem surgir sem tempo determinado e em condições imprevistas assim como podem encerrar suas atividades por um mero acordo entre os envolvidos, sejam indivíduos, coletivos ou organizações, ou por finalizarem projetos idealizados restritamente (Johnson, 2011). Positivamente, a informalidade pode facilitar a transferência de conhecimento e de recursos entre os atores, o que proporciona acesso a uma gama considerável de elementos para uma melhor compreensão do processo de intercâmbio dessa transferência de recursos e conhecimento.

Já a abordagem formal parte da formalização e estruturação baseadas em contratos e em acordos de cooperação entre as partes das redes que buscam geralmente desenvolver projetos de pesquisa ou produtos específicos (Johnson, 2011), e caracterizam-se “por uma estrutura de ligação prescrita previamente pela organização, como objetivo de organizar direcionar e padronizar os relacionamentos internos, de acordo com o estipulado com o organograma organizacional” (Andreoli et al., 2019, p. 156).

As abordagens formais [...] apoiam-se fortemente no conhecimento explícito e em sistemas de código bem compreendidos, foram as primeiras a analisar sistematicamente a estrutura, mas com o decorrer do tempo o poder das forças informais passou a ser cada vez mais reconhecido no pensamento organizacional (Johnson, 2011, p. 93).

Ainda de acordo com o autor, a estrutura de uma organização está composta “por elementos de ambas as abordagens (além de contar com outros componentes), sendo a tensão entre o formal e o informal uma questão crítica para a vida social da informação e da inovação” e do conhecimento (Johnson, 2011, p. 93).

Para Casas e Luna (2001 apud Müller, 2018, p. 68), as redes e suas interações formais

são importantes no processo de compartilhamento do conhecimento, mas as informais são as que trazem melhores resultados, uma vez que nestas redes a presença dos conhecimentos tácitos impulsiona o compartilhamento e oportuniza a criação de novos conhecimentos entre os participantes. Neste sentido, tanto nas redes de conhecimento formais quanto nas informais, a interação efetiva entre os atores e o compartilhamento de informações e conhecimentos são seus elementos motores [...].

É por meio das interações, do compartilhamento de informações e da qualidade destas informações que uma rede poderá alcançar efetividade (Tomaél, 2008; Johnson, 2011).

 

3 MÉTODOS

Trata-se de uma pesquisa exploratória e descritiva, que utiliza o ferramental aberto pelo paradigma teórico-metodológico da Análise de Domínio (AD) (Hjørland; Albrechtsen, 1995). O domínio pode ser “uma área de experiência, um corpus de literatura, inclusive um sistema de indivíduos e práticas que partilham uma linguagem ou terminologia comum” (Hjørland, 2017). Neste caso, o domínio Seca e Semiárido no Brasil comporta, pelo menos, duas categorias significativas: caatinga e semiárido.

Caatinga é uma das seis regiões naturais ou biomas do Brasil, mas a única que se considera exclusivamente brasileira pela sua especificidade e diversidade de espécies de animais e plantas. É o bioma que predomina na região Nordeste do Brasil (abrange os estados do Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Bahia, Maranhão, mas também a faixa norte de Minas Gerais) e está inserida no contexto do clima semiárido. Este tipo de clima se caracteriza tanto pela ausência ou escassez das chuvas, quanto por sua alta variabilidade espacial e temporal, o que provoca a ocorrência das secas de forma cíclica (ASA Brasil, [20--?]). Segundo Magalhães (2019), “enquanto Caatinga é um conceito natural, um ecossistema, o Semiárido brasileiro é um conceito político, delimitado legalmente por meio de Portaria do Governo (embora também exista definição natural para o clima do Semiárido)”. A região semiárida, portanto, envolve não apenas o território da caatinga, mas também aqueles municípios que atendem aos critérios políticos que têm sido definidos pelo Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR) e pela Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE) (Magalhães, 2019).

Os territórios do semiárido e da caatinga têm sofrido historicamente com processos acelerados de degradação ambiental, causados pela ação humana: desmatamento, monocultura, pecuária extensiva, contribuindo assim para a desertificação, a seca e a perda da biodiversidade brasileira. Isso, unido à concentração de terras e de águas nas mãos de uma pequena elite, agudiza os problemas de exclusão social e as crises econômica e socioambiental que vive a região (ASA Brasil, [20--?]).

Para o mapeamento e a visualização das redes de conhecimento no domínio Seca e Semiárido foram utilizados a combinação dos métodos bibliométricos e de Análise de Redes Sociais. Segundo Oliveira (2013, p. 41) “a Bibliometria passa a se constituir de forma que alguns procedimentos, antes tomados como meramente técnicos, passem a adquirir caráter teórico-conceitual e contextualizado, à luz da Análise de Domínio”, já que as análises desse tipo evidenciam as relações entre as disciplinas no contexto social da comunicação científica (Guimarães, 2014). Foram utilizados indicadores bibliométricos de produção, citação e relacionais; esses últimos destacados nesta comunicação (coautoria, coocorrência de palavras-chave, cocitação e acoplamento bibliográfico).

Complementando as análises bibliométricas, foi empregada também a Análise de Redes Sociais (ARS). Como abordagem teórico-metodológica a ARS vem ganhando espaço na Ciência da Informação por permitir analisar diferentes objetos de pesquisa junto a modelos matemáticos, ainda que seu uso seja incipiente na área (Grácio; Oliveira, 2020). É considerado um método estrutural que “parte da observação das interdependências e da ausência das mesmas entre os membros de um ator coletivo ou de um meio social organizado” (Lazagra; Higgins, 2014, p. 5). Esse mapeamento permite reconstituir o sistema de interdependências, descrevê-lo, analisar as influências nos seus membros e os variados processos e relações sociais que decorrem do sistema. Esse sistema de interdependências observadas é, metaforicamente, uma rede social.

A aplicação da ARS requer a escolha das relações a serem observadas e a especificação do conjunto observado. Na presente pesquisa, as relações selecionadas foram: coautoria, cocitação de autores, acoplamento bibliográfico de autores e relações de coocorrência temática (autores e palavras-chave). A ARS permitiu: a) representar a estrutura das diferentes redes sociais, por meio da descrição de clusters e atores individuais e suas relações de interdependência; b) identificar a posição dos atores mediante medidas de centralidade; c) sugerir a influência ou significado do pertencimento dos atores a determinados clusters; d) analisar eventuais mudanças da constituição das redes ao longo do tempo.

A recuperação da produção bibliográfica estudada foi realizada em duas etapas. Na etapa 1, o conjunto de atores selecionados foi delimitado pela produção científica recuperada da base de dados Scopus. Sua seleção se justifica pela sua abrangência multidisciplinar e as potencialidades para a aplicação das técnicas bibliométricas. Foram utilizadas as seguintes estratégias de busca no campo integrado Title, Abstract e Keywords: ((caatinga OR ("dry forest" AND northeast AND brazil) OR  ( ( semi-arid  OR  semiarid )  AND  northeast  AND  brazil )  OR  ( ( sertaneja  OR  sertão )  AND  northeast  AND  brazil )). A busca foi realizada em abril de 2022 e abrangeu todos os documentos publicados até 2021. Foram recuperados 4.676 registros distribuídos no período entre 1970 até 2021

Na etapa 2, no intuito de encontrar produções mais afins à missão original do NUT-Seca, a saber: estudar os impactos da seca, enfatizando suas consequências na pequena produção rural, e como esse fenômeno condicionava a política econômica, a cultura local e a própria organização social em todo o estado do Rio Grande do Norte,  foi acrescentada,  à mesma estratégia de busca, o filtro de área do conhecimento (Ciências Ambientais; Ciências Sociais; Artes e Humanidades; Multidisciplinar; Economia, Econometria e Finanças; Negócios, Gestão e Contabilidade, e Psicologia). O levantamento foi realizado em 7 de julho de 2022 e em termos quantitativos a resposta da base foi de 1.359 documentos. 

As métricas e visualizações das redes foram realizadas com os softwares Gephi 9.0.4. e VOSviewer 1.6.16. Utilizaram-se duas medidas de importância relativa dos nós na rede: 1) centralidade de grau, que representa o número total de conexões de um nó; neste caso, a quantidade de conexões entre os autores e seus coautores e entre os autores e as palavras-chave; e 2) centralidade de intermediação, que quantifica o número de vezes que um nó serve como “ponte” ao longo do caminho mais curto entre outros dois.

A pesquisa foi complementada com buscas realizadas na base de dados do Diretório dos Grupos de Pesquisa, mantido pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), pelas palavras-chave, também deduzidas do escopo do núcleo epistêmico, tais como: caatinga, semi-árido ou semiárido e seca, nos campos de busca Linha de Pesquisa, Nome da Linha de Pesquisa, Nome do grupo e Repercussões do grupo. Foram recuperados 554 Grupos de Pesquisa. Neste caso, a análise dos indicadores circunscreveu-se à produção dos Grupos por área de conhecimento, por região e por instituição.

Os currículos Lattes (CNPq) dos pesquisadores também foram consultados para melhor compreensão das características e interdependências identificadas por meio do mapeamento e visualização das redes.

 

4 RESULTADOS

Em continuação, apresenta-se o mapeamento e a visualização das redes de conhecimento no domínio Seca e Semiárido: redes de coautoria, redes temáticas, redes de cocitação, redes de acoplamento bibliográfico e redes em grupos de pesquisa.

 

4.1 REDES DE COAUTORIA

Os 4.676 documentos recuperados na etapa 1 foram produzidos por 12.478 autores. Uma explicação mais detalhada da produção científica recuperada foi apresentada em Sánchez-Tarragó e Cavalcanti I (2022). Desse total de autores, 73,4% foram responsáveis por apenas uma publicação, enquanto 1,2% dos autores produziram 9 ou mais publicações, em coautoria ou individualmente.

Com o objetivo de melhor visualizar a estrutura do sistema de interdependências foi feito um recorte da rede conformada pelos autores com 5 ou mais documentos como primeiro autor e seus coautores mais produtivos (Figura 1). A cor e tamanho dos nós se correspondem com a métrica de centralidade de grau, que aqui representa a quantidade de relações diretas de coautoria. O grosso da aresta representa a quantidade de documentos em coautoria. Os autores com maior centralidade de grau são Inara Roberta Leal e Ulysses Paulino de Albuquerque, com 5 e 4 relações de coautoria, respectivamente. O cluster que Leal conecta direta ou indiretamente (cluster 1) está composto por 7 componentes, enquanto Albuquerque é elemento central de um cluster de 11 componentes (cluster 2). São os dois maiores clusters nesta rede de 7 agrupamentos. Ou seja, ainda que Leal tem maior centralidade de grau do que Albuquerque, sua rede tem menor densidade pois como será visto mais na frente Albuquerque é um ator intermediador de mais conexões.

A rede de conhecimento representada no cluster 1 está conformada por professoras e professores que atuaram ou atuam no Departamento de Botânica da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e pesquisadoras que foram orientandas de Pós-Graduação neste Departamento. Trata-se, portanto, de uma rede de coautoria de natureza intrainstitucional. Predominam os atores de sexo feminino: além de Leal, outras duas autoras, professoras do referido departamento, também se destacam na métrica de grau: Ariadna Valentina de Freitas e Lopes e Isabel Cristina Sobreira Machado. Ambas as autoras são pesquisadoras de longa trajetória na área, bolsistas de produtividade do CNPq e professoras de pós-graduação.

 

Figura 1 – Rede de coautoria no domínio Seca e Semiárido. Scopus, 1970-2021.

Centralidade de grau

Gráfico

Descrição gerada automaticamente

 

  Fonte: Os autores (2022)

 

Já no cluster 2 se observa uma coautoria interinstitucional, com conexões fundamentais entre atores vinculados à Universidade Federal de Pernambuco, a Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) e a Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Outros autores neste cluster que se destacam na centralidade de grau são: Eliza Maria Xavier Freire, a pesquisadora e bolsista do CNPq com maior produtividade na temática da UFRN e Reinaldo Farias Paiva de Lucena, atualmente professor da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS), cuja pós-graduação aconteceu na UFRPE sob a supervisão de Albuquerque.

É possível observar também a centralidade de intermediação do autor Albuquerque (UFPE), que está em posição de atuar como “ponte” entre as subredes de Lucena (UFRPE) e a de Freire (UFRN). De fato, a trajetória de ensino e pesquisa de Albuquerque, que começou na UFRPE, se reflete nas relações de coautoria com pesquisadores que atuaram nessa universidade (como Araújo) e com pesquisadores que fizeram pós-graduação nela sob sua supervisão (o caso de Monteiro, atualmente professor da Universidade Federal do Piauí, e o próprio Lucena).

Embora o mapa represente a capacidade de intermediar e articular especificamente relações de coautoria, é possível que esse potencial de intermediação do pesquisador Albuquerque tenha reflexos na gestão de outros recursos, por exemplo, capacidade de liderar grupos de pesquisa, coordenar laboratórios e fazer parte de mesas coordenadoras de sociedades científicas internacionais, como pode ser constatado no currículo do pesquisador.

Finalmente, é possível apontar que as redes de coautoria aqui mapeadas são redes de conhecimento informais em torno do domínio Seca e Semiárido, pois expressam relações mais ou menos estáveis de compartilhamento de recursos (entre eles, informação), transformação dinâmica de conhecimentos tácitos a explícitos, e vice-versa, e interesses comuns. Essas redes de conhecimento informais podem ser também reflexo de (ou se tornar em) relações mais formais, por exemplo, na forma de grupos de pesquisa.

 

4.2 REDES TEMÁTICAS NO DOMÍNIO

As relações intelectuais e sociais que se estabelecem entre os autores do domínio Seca e Semiárido também podem ser mapeadas por meio da análise de coocorrência entre autores e palavras-chave (Figura 2). Se considerarmos que as palavras-chave atribuídas a um documento são uma representação sintética dos temas e conceitos fundamentais abordados nos documentos, então identificar quais são as palavras-chave mais frequentemente usadas implica identificar os temas e conceitos predominantes no domínio. A técnica de coocorrência permite aprofundar essa análise mostrando em que medida grupos de palavras-chave/temas/conceitos estão frequentemente associados entre si e com os pesquisadores que as utilizaram.

Para melhor visualização, foi feito um recorte dos autores com mais de 6 documentos como primeiro autor e as palavras-chave mais frequentemente empregadas e foi aplicado o algoritmo de detecção de comunidades do Gephi, que atribui cor aos nós segundo similaridades dos atributos, delimitando assim clusters ou comunidades. O tamanho dos nós foi definido pela centralidade de grau.

No sistema de interdependências foram identificadas seis comunidades delimitadas pelos graus de coocorrência. Essas comunidades (clusters) representam proximidade temática entre os autores com outros autores e com as palavras-chave. Os autores Leal, Sales, Passos e Aptroot aparecem mais associados ao termo Caatinga (cluster roxo), enquanto Ribeiro, Alves e Saito estão mais ligados ao termo Semiárido e a outros como Distribuição geográfica e Animais (cluster verde claro). Questões associadas à Classificação taxonômica e Diversidade de espécies reúnem a Lira, Ramos GJP e Ramos TPA (cluster verde escuro); Plantas medicinais e Etnobotânica, entre outros, aparecem associados com mais força a Albuquerque e Marinho (cluster azul); Costa aparece associado à biodiversidade e Conservação (cluster laranja), enquanto Santos e Dantas aparecem mais próximos de termos como Solos, Mudança climática e Regiões áridas (cluster rosa).

 

Figura 2 – Mapa de rede de coocorrência autor e palavras-chave no domínio Seca e Semiárido. Scopus 1970-2021

 Diagrama

Descrição gerada automaticamente

Fonte: Os autores (2022)

 

Entre as palavras-chave mais frequentes não foram identificados termos que sugerissem diretamente uma discussão sociopolítica da seca e do semiárido. Esse é um aspecto medular na discussão epistemológica, pois o NUT-seca foi criado com essa vertente mais sociopolítica. Essa escassez poderia estar relacionada com a seleção da fonte de dados e sua cobertura de periódicos de Ciências Sociais. Contudo, uma análise criteriosa realizada na categoria Ciências Sociais de Scopus, permitiu identificar alguns trabalhos que discutem, por exemplo, os conflitos por água no semiárido, a insegurança alimentar, as políticas públicas e programas de governo, entre outros.

A rede de coocorrência de autor e palavras-chave pode ser considerada uma rede de conhecimento informal, cuja estrutura só é visível por meio do mapeamento realizado com a abordagem ARS. Essa rede constituída em torno de associações temáticas tem componentes (atores) que compartilham interesses comuns que podem estar expressos na forma de relações de coautoria, orientação, citação, colaboração e inclusive, na forma de competição por recursos.

 

4.3 REDE DE COCITAÇÃO DE AUTORES

A cocitação de autores permite identificar os núcleos intelectuais de um domínio, levando em conta que a citação constitui um indicador de influência intelectual e social numa comunidade acadêmica. Neste caso, o objetivo foi mapear as redes que se estabelecem entre autores muito citados em função da frequência de citação conjunta com outros autores altamente citados. Levando em conta que as referências nos documentos geralmente têm certa coerência ou afinidade temática, pode-se assumir que esses autores citados juntos guardam alguma semelhança entre eles (percebida pelos autores citantes) em função de proximidade temática, metodológica, de abordagem, disciplinar, entre outras (Grácio, 2016).

Esta análise foi feita com os documentos recuperados na etapa 2, ou seja, aqueles filtrados pela área de conhecimento Ciências Sociais. Definimos como critério de ponto de corte autores com mais de 40 citações, ou seja, 29 autores no total, para 18,1% do total de autores da amostra na base Scopus (160 autores).

Para a visualização da estrutura da rede foi utilizado o software VOSviewer, que a delimitou em três clusters, o que sugere proximidade (e distâncias) entre os autores. O tamanho dos nós na ilustração representa a quantidade de citações de cada autor. Vale ressaltar que todos os autores e autoras altamente citados e cocitados são brasileiros (Figura 3).

Numa análise micro do sistema de interdependência, em nível individual, destaca o ator Albuquerque, UP (pertencente ao cluster verde) como um pesquisador não apenas muito produtivo, senão também muito citado (382 citações). Pertencente ao cluster azul, Alves RRN destaca com 413 citações. Já no cluster vermelho, há certo equilíbrio quanto ao número de citações, sobressaindo os nós Tabarelli, M, Marengo, JA e Sampaio, EVSB, com 146, 117 e 112 citações, respectivamente. Albuquerque, UP, Alves, RRN e Tabarelli, M ocupam a posição central de seus clusters.

 

Figura 3 – Rede de cocitação de autores. Scopus, 1970-2021. Categoria Ciências Sociais e Humanas.

 

Fonte: Os autores (2022)

 

Para cada cluster foi feito um cruzamento entre os autores identificados e os dados dos Grupos de Pesquisas dos quais fazem parte os pesquisadores, extraídos do Diretório do CNPq/Lattes. Foi possível assim verificar a associação entre pesquisadores e seus temas. Somente à guisa de exemplo, no cluster vermelho destaca Tabarelli M, que estuda temas como Conservação Biológica, Ecologia de Comunidades (tema compartilhado com Rodal MJN) e Ecologia de Ecossistemas (tema comum com Silva, JMC). No cluster verde, vale mencionar a Albuquerque UP, que investiga sobre Antropologia Ecológica (tema compartido com Ramos M A), Bioprospecção, Ecologia Aplicada (tema compartilhado com Medeiros PM) e Ecologia Humana (que compartilha com Begossi A, Medeiros PM e Ramos MA). Por último, no cluster azul destaca Alves RRN cujos temas se voltam à Ecologia (comum a Araújo HFP), Etnoecologia (tema compartilhado com Souto WMS e Araújo HFP), Etnozoologia (tema compartido com Souto WMS e Ferreira FS), Zoologia (tema compartilhado com Souto WMS, Araújo HFP, Ferreira FS e Vieira WLS) e Zoologia Aplicada (tema comum a Barboza RRD e Mourão JS).

As redes de cocitação de autores são também expressão de intercâmbios de conhecimento importante que se estabelecem no domínio. Elas expressam também a influência de determinados atores, como Albuquerque, citado aqui como um exemplo relevante, que não apenas destaca como intermediário de outras redes de conhecimento, articulador de redes de coautoria, senão também que constitui um referente intelectual importante na pesquisa no domínio.

 

4.4 REDE DE ACOPLAMENTO BIBLIOGRÁFICO DE AUTOR

A técnica de Acoplamento bibliográfico permite mapear as redes de associações entre autores a partir dos documentos que têm em comum nas suas listas de referências. O acoplamento passará a existir quando os autores possuírem referências citadas em comum (Grácio, 2016); quanto maior a quantidade de referências citadas em comum maior será a força de ligação (proximidade) entre eles. Diferentemente da cocitação de autores, que trata mais num sentido dos registros pretéritos, ou seja, de autores citados juntos em acúmulo temporal, as redes de autores acoplados apontam para frentes de pesquisa, ou seja, autores ativos que estão trabalhando em temas comuns.

Para mapear e representar essas redes foram selecionados os autores com mais de 4 documentos no corpus recuperado na fase 2, ou seja, aqueles filtrados pela área de conhecimento Ciências Sociais, para um total de 19 autores. Quanto ao tamanho dos nós, ele representa a força total de ligações do autor com os outros autores, ou seja, maior tamanho, maior será a força total de ligações entre os nós.

Na figura 4 é possível visualizar, em três clusters diferentes (verde, azul e vermelho), os autores do corpus representados juntos em função da similaridade de suas referências bibliográficas. Se compararmos as duas redes aqui projetadas, a de cocitação de autores e a de acoplamento bibliográfico, podemos observar algo interessante: os dois maiores nós na rede de cocitação de autores (Albuquerque UP e Alves RRN, cluster verde e azul, respectivamente) estão em clusters temáticos separados ainda que estejam sendo citados juntos; no entanto, na rede de acoplamento bibliográfico os dois estão compartilhando um mesmo cluster (cluster verde). Esta representação afiança a ideia de que as pesquisas de ambos estejam de fato relacionadas, e podemos inferir que essa aproximação temática pode ter se dado nos últimos anos, dado o reflexo mais recente do expressado na visualização, ou que os autores que citaram os dois conjuntamente estão utilizando ambos para sustentar temáticas e pesquisas diferentes.

O acoplamento bibliográfico, portanto, também permite identificar e mapear redes de conhecimento informais; neste caso, frentes de pesquisa que podem estar se desenvolvendo e cujos componentes podem ou não estar trabalhando efetivamente juntos, seja por meio de relações de coautoria ou outras relações de colaboração.

Figura 4 – Rede de acoplamento bibliográfico de autores. Scopus, 1979-2021, Categoria Ciências Sociais e Humanas

 

Fonte: Os autores (2022)

 

Após as quatro análises realizadas podemos apontar que as redes mapeadas por meio da ARS, utilizando como dados a produção científica registrada na Scopus, se apresentam em muitos casos como redes de conhecimento não apenas informais, mas até “invisíveis”. Ou seja, é a técnica ARS, as ferramentas de visualização e o estudo do domínio (por meio da revisão dos currículos e as publicações) que permitem identificar e desenhar redes que podem não ser visíveis a olho nu. Muitas vezes, nem os próprios atores dentro dessas redes são cientes de que formam parte delas, nem mesmo conhecem outros atores. Contudo, identificar quem forma parte dessas redes invisíveis, sua estrutura, a qualidade de suas relações e as implicações dessas relações pode representar enormes vantagens para os próprios pesquisadores e suas instituições, assim como oportunidades estratégicas para o Nut-Seca repensar seus serviços, práticas e conexões.

 

4.5 REDES DE CONHECIMENTO EM GRUPOS DE PESQUISA

Um grupo de pesquisa constitui na essência uma rede de pessoas (geralmente, professores, pesquisadores, estudantes e técnicos) que mantém de forma permanente uma atividade de pesquisa numa instituição. É, portanto, uma rede de conhecimento formalizada com o intuito de compartilhar, produzir e transferir conhecimento científico-tecnológico em um domínio dado (ou entre domínios).

No domínio Seca e Semiárido foram identificados 554 grupos de pesquisa, vinculados a 83 instituições. Dessas 83 instituições, 47 (56,6%) são do Nordeste, 5 (6%) do Norte, 8 (9,6%) do Centro-Oeste, 4 (4,8%) do Sul e 16 (19,2%) do Sudeste do país, com destaque para as instituições de educação superior do Nordeste. O predomínio dos grupos de pesquisa do Nordeste se corresponde também com o protagonismo dessa região na produção científica, como descrito mais amplamente em Cavalcanti I (2023), o que, por sua vez, pode ter relação como o fato de serem os Estados mais afetados pelo fenômeno da seca.

Vale ressaltar que, apesar da UFPE ser a instituição com maior produtividade no domínio, como referendado pelas publicações recuperadas da Scopus, não é a instituição que mantém o maior número de grupos de pesquisa, destacando-se neste quesito a Universidade Federal Rural do Semiárido (UFERSA). Isso pode indicar que há espaço aberto para uma maior articulação entre as redes de conhecimento no domínio estudado.

Alguns desses grupos de pesquisa reúnem pesquisadores destacados neste artigo como grandes produtores de conhecimento no domínio temático, tal é o caso do grupo mantido pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) nomeado “Estudos Multidisciplinares aspectos ambientais, culturais e socioeconômicos”, integrado, entre outros, por Ulysses Paulino de Albuquerque e Reinaldo Farias Paiva de Lucena. Outros pesquisadores, como Inara Roberta Leal e Marcelo Tabarelli, encontram-se no grupo de pesquisa “Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos da Universidade Federal da Paraíba” (UFPB). O grupo “Dinâmica da água, energia e CO2 em ecossistemas e agroecossistemas (DAECO), nascido na Universidade Federal do Agreste Pernambucano (UFAPE), conta com a colaboração de Antônio Celso Dantas Antonino.

Portanto, é possível afirmar que as redes de conhecimento informais (e algumas invisíveis) representadas pelas redes de coautoria, coocorrência de palavras-chave, cocitação e acoplamento bibliográfico, em muitos casos têm também como contrapartida redes de conhecimento formalizadas em forma de grupos de pesquisa cadastrados no Diretório dos Grupos de Pesquisa CNPq/Lattes.

 

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir da percepção da necessidade de potencializar o papel do Núcleo Temático da Seca e do Semiárido da UFRN como agente dinamizador da produção, gestão e disseminação de conhecimento no domínio Seca e Semiárido, evitando seu isolamento e desconexão com as redes de conhecimento que se desenvolvem na atualidade, a presente pesquisa teve como objetivo realizar uma análise e mapeamento do domínio Seca e Semiárido e de suas redes de conhecimento como parte das práticas de gestão do conhecimento. Busca-se contribuir, para além de evitar a subutilização de seu acervo e experiência, para que ele revitalize seus serviços e produtos de informação e conhecimento, recolocando-os no contexto das pesquisas e das relações sociais que se estabelecem no domínio.

As análises bibliométricas e os procedimentos de ARS permitiram identificar e caracterizar a estruturas das redes de conhecimento no domínio da Seca e Semiárido por meio do mapeamento dos seus componentes corporizados em documentos, relações e atores, tais como pesquisadores em universidades públicas, federais e estaduais e institutos de ensino e pesquisa. A caracterização foi feita tanto em nível macro (da rede como um todo) quanto no nível micro (atores individuais). Ou seja, foi possível mapear e visualizar os clusters (agrupamentos) que compõem as redes, seu tamanho e densidade (número de conexões), pertencimento dos atores aos clusters, laços entre os atores (fracos e fortes), distância ou proximidade entre atores e clusters, e posição relativa dos atores. Esses aspectos permitem fazer diversas interpretações sociológicas e informacionais sobre as características das redes. A partir daqui também foram caracterizados os atores individuais e institucionais das redes, assim como as diferentes relações que se estabelecem entre eles (coautoria, coautoria intra e interinstitucional, cocitação, acoplamento).

Foi identificada também a centralidade de alguns atores individuais e institucionais. No caso da coautoria, a centralidade foi caracterizada e foi possível identificar aqueles pesquisadores que têm maior poder de intermediação nas redes (conectando várias redes entre si). Essa centralidade de intermediação pode ser chave no momento de procurar atores com poder de articulação, influência e transferência de informação para o restante das redes.

O mapeamento permitiu identificar redes de pesquisadores associados pelas temáticas. Também, evidenciou certo desequilíbrio temático na produção científica publicada e registrada na Scopus a favor de assuntos vinculados às Ciências Biológicas e Ciências Naturais, em detrimento de assuntos das Ciências Sociais e Humanas.

Em respeito à tipologia foi possível constatar a existência de redes informais, a exemplo das redes de coautoria; e de redes formalizadas em grupos de pesquisa cadastrados na plataforma CNPq/Lattes. A partir das visualizações geradas por meio de abordagens de ARS e as ferramentas de visualização foi possível detectar e exibir o que definimos como redes invisíveis das relações entre autores cocitados, autores acoplados e as redes de autores vinculados pelas palavras-chaves utilizadas para definir os temas de suas pesquisas.

Sobre essas redes invisíveis, é oportuno comentar da possível existência de outras redes invisibilizadas pelos limites metodológicos ao se definir tanto o recorte dos dados da pesquisa quanto as próprias bases de dados selecionadas para a execução do mapeamento. As próprias visualizações exibidas pela pesquisa ocultam alguns componentes das redes à raiz dos pontos de corte adotados para visibilizar, por outro lado, aqueles atores destacados. O recorte dos dados também está diretamente ligado ao tempo. A ampliação e aprofundamento do escopo de pesquisa tornarão possível a visualização de outros componentes.

Em suma, uma Análise de Domínio, enquanto perspectiva teórico-metodológica, é sempre circunstancial, pois, como um recorte criterioso, depende da dinâmica histórica das fontes, do momento temporal e do método aplicado; depende, finalmente, da própria interpretação dos que analisamos os domínios como realidade mutável. Consideramos que os resultados apresentados são um pequeno recorte da realidade do domínio, suficiente para retratar a situação e as relações entre os atores que formam redes de conhecimento no domínio Seca e Semiárido.

O mapeamento dessas redes formais, informais, invisíveis (agora visíveis) e seus componentes (atores, documentos, relações) constitui uma prática de gestão do conhecimento, mas também subsídios para propor outras várias ferramentas e práticas de gestão do conhecimento que podem ser executadas pelo NUT-Seca para, de forma proativa, contribuir com a pesquisa no domínio Seca e Semiárido. Entre elas estão mapas das redes de conhecimento no domínio, encontros e reuniões temáticas, relatórios técnicos, sistemas de organização do conhecimento, formação continuada e mapeamento sistemático das redes de conhecimento. Cada uma delas tem potenciais implicações para os produtos e serviços do NUT-Seca. Essa contribuição passa, inclusive, pela conformação de outras redes de conhecimento formais ou informais, sempre visíveis ou que venham a ser visibilizadas posteriormente.

 

REFERÊNCIAS

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[1] Especialista em Mediação Cultural (Departamento de Ciência da Informação - UFPE). Mestre em Gestão da Informação e do Conhecimento (Programa de Pós-Graduação em Gestão da Informação e do Conhecimento - UFRN). Bibliotecário-Documentalista da Biblioteca do Centro de Filosofia e Ciências Humanas (UFPE).

[2] Doutora em Documentación e Información Científica (Universidad de Granada, Espanha). Professora Adjunta do Departamento de Ciência da Informação (UFRN). Professora do Programa de Pós-graduação em Ciência da Informação (UFRN).

[3] Doutor em Information Stratégique Et Critique Veille Technol pela Université Paul Cézanne Aix Marseille III, França. Professor do Programa de Pós-graduação em Ciência da Informação da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)