ECONOMIA SOLIDÁRIA COMO ESTRATÉGIA PARA O DESENVOLVIMENTO LOCAL[1]
Thaissa Souza do Carmo Magno[2]
Universidade da Amazônia
Ana Maria Vasconcellos[3]
Universidade da Amazônia
Jones Nogueira Barros [4]
Universidade da Amazônia
João Cláudio Tupinambá Arroyo[5]
Universidade da Amazônia
arroyojc@hotmail.com
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Resumo
A economia solidária é um conjunto de atividades econômicas que busca a geração de renda por meio da união de forças de trabalho, talentos e do consumo consciente, reforçando as relações entre campo e cidade e entre produtores e consumidores. Assim torna-se necessário fortalecer a Economia Solidária como estratégia de inclusão econômica e reorganização social, sendo que esta oferece um caminho com potencial para o desenvolvimento local sustentável e solidário. Neste intuito este estudo tem como objetivo analisar de que forma a economia solidária contribui para o desenvolvimento local. Como metodologia foram realizados uma pesquisa bibliográfica e um estudo de caso descritivo. Concluiu-se que que a economia solidária pode ser usada como estratégia para o desenvolvimento local, pois permite em sua estrutura e metodologia ações de fomento e geração de emprego e renda, com alcance para um novo padrão de qualidade de vida, valorização do trabalho sob autogestão, das potencialidades locais, articulação entre os atores envolvidos de forma democrática e socialmente justa.
Palavras-chave: Economia solidária. Desenvolvimento local. Políticas públicas.
SOLIDARITY ECONOMY AS A STRATEGY FOR LOCAL DEVELOPMENT
Abstract
The solidarity economy is a set of economic activities that seeks to generate income through the union of workforce, talents and conscious consumption, reinforcing the relations between countryside and city and between producers and consumers. Thus, it becomes necessary to strengthen the Solidarity Economy as a strategy for economic inclusion and social reorganization, which offers a path with potential for sustainable and solidary local development. To this end, this study aims to analyze how the solidarity economy contributes to local development. As a methodology, a bibliographic research and a descriptive case study were carried out. It was concluded that the solidarity economy can be used as a strategy for local development, as it allows, in its structure and methodology, actions to promote and generate employment and income, with scope for a new standard of quality of life, appreciation of work under self-management, local potential, articulation between the actors involved in a democratic and socially fair way.
Keywords: Solidarity Economy. Local Development. Public policy.
1 INTRODUÇÃO
Com a primeira “revolução industrial”, no final do século XVIII, surge na Europa a economia solidária, contudo foi na Grã-Bretanha (mais precisamente na Inglaterra) que ela tomou a forma mais nítida a partir do século XIX, como uma “resposta ao agravamento da crise do trabalho” e da crescente insatisfação com o desempenho do sistema público de segurança social (FRANÇA FILHO E LAVILLE, 2004). Perante estes vazios econômicos e sociais que a história do capitalismo produziu surge, como modelo alternativo, a economia solidária. Esta constitui-se como uma nova forma de organização do trabalho e das atividades econômicas em geral (GAIGER, 2004) emergindo como uma importante alternativa para a inclusão de trabalhadores no mercado de trabalho, dando uma nova oportunidade aos mesmos, através da autogestão. Existindo a possibilidade de recuperarem as empresas de massa falida, e darem continuidade às mesmas, com um novo modo de produção, em que a maximização do lucro deixa de ser o principal objetivo, dando lugar à maximização da quantidade e da qualidade do trabalho (SINGER, 2004). Portanto, desde a origem, não se trata de uma “economia dos pobres”, de uma estratégia lateral de geração de emprego e renda para amenizar as consequências do capitalismo, mas, em si, uma nova forma de organização social e seus ativos primários (ARROYO E SCHUCH, 2006).
A economia solidária ganhou destaque por volta dos finais do século XX, quando se proporcionou como uma resposta dos trabalhadores à reestruturação produtiva e ao uso abusivo e sem critérios de novas tecnologias que provocaram, ainda que sem intenção, desemprego em massa, encerramento de firmas e marginalização cada vez maior, sobretudo nos países do chamado Terceiro Mundo (VEIGA, 2004). Esta resposta de equilíbrio afigura-se como uma reação onde o agir se coloca como uma alternativa possível para os trabalhadores que estão na sua maioria excluídos do mercado de trabalho formal e do consumo (CULTI, 2006).
Este estudo tem como objetivo analisar de que forma a economia solidária contribui para o desenvolvimento local. O método usado para a elaboração deste artigo foi uma pesquisa bibliográfica descritiva, onde buscou-se estudos anteriores sobre os assuntos aqui citados, confrontando os autores e apresentando os conceitos e desafios da economia solidária e desenvolvimento local. Buscou-se de forma qualitativa, através do site da prefeitura de Barcarena e nas visitas as feiras, realizar o levantamento descritivo de ações de fomento a economia solidária para a geração de desenvolvimento local.
Este artigo está estrutura do da seguinte forma: primeiro será discutido os conceitos sobre economia solidária, posteriormente será feito uma análise sobre desenvolvimento local. E por último será apresentado exemplos de ações no qual a economia solidária é usada como estratégia para o desenvolvimento local.
2 ECONOMIA SOLIDÁRIA
O conceito de Economia Solidária, na América Latina, refere-se essencialmente ao conjunto de iniciativas que, a partir da associação livre e democrática dos trabalhadores, visa ganho econômico e benefícios como qualidade de vida, reconhecimento e participação cidadã (GAIGER, 2004). Para Singer e Souza (2000) ela é referida como um marco das relações socioeconômicas comunitárias locais, regionais e em redes, que se expandem em diferentes espaços geográficos. Gaiger (2004) resume a Economia Solidária como uma atividade de projeção e busca de reconhecimento na esfera pública, de reivindicação e de institucionalização das classes mais necessitadas, pela qual ela se constitui como um movimento social atuante no cenário político da América Latina.
Na acepção de Singer (2004) a Economia Solidária é formada, principalmente, por empreendimento auto gestionários atuantes em diversas atividades econômicas como a produção, comercialização, consumo e crédito, que, uma vez reunidos em um todo economicamente consistente, cooperando entre si em vez de competirem, constituiriam as bases de um modo solidário de produção podendo superar o sistema capitalista. Em outro trabalho do autor (SINGER, 2002), afirma que a Economia Solidária é outro modo de produção, cujos princípios básicos são a propriedade coletiva ou associada do capital e o direito à liberdade individual. Segundo Arroyo e Schuch (2006) Economia Solidária é uma nova tecitura social, é “a economia que que se estabelece a partir da associação, da cooperação, da comunhão, tanto entre indivíduos para a constituição de um empreendimento coletivo, como entre empreendimentos para obter saltos de competitividade, em estruturas em rede que também podem ser compreendidos como empreendimentos coletivos”
A aplicação desses princípios une todos os que produzem numa única classe de trabalhadores que são possuidores de capital, por igual ou não, conforme decidir cada cooperativa ou sociedade econômica. O resultado natural é a solidariedade social e a igualdade de direitos, cuja reprodução, no entanto, pode ser reforçada por mecanismos estatais de redistribuição solidária da renda.
Na concepção de Barretos, Lopes e Paula (2011), a proposta da Economia Solidária emerge como uma possibilidade de geração de renda, inserção e mudança social. Em seus estudos, eles questionaram esse tema de estudo da seguinte maneira: em que consiste o movimento da Economia Solidária? Conceitualmente, a Economia Solidária se baseia na ideia de que os benefícios da atividade econômica devem estar ao alcance daqueles que a realizam, ou seja, dos trabalhadores.
Tal proposta diferencia-se da realidade da sociedade centrada no mercado, justamente em função dos seus princípios e valores. Segundo Alves et al (2016), seus fundamentos são o humanismo, a liberdade, a igualdade, cooperação, a solidariedade e a racionalidade. Ainda com os autores, independentemente do ponto de vista, é fato que a Economia Solidária constitui um caminho alternativo, capaz de possibilitar aos envolvidos a vivência da imersão de dimensões sociais – e aqui, leia-se laços sociais, solidariedade, ajuda mútua no campo econômico. Tais iniciativas representam uma possibilidade para os excluídos do mundo do trabalho, sendo conhecidas atualmente como Economia Solidária (FRANÇA FILHO e LAVILLE, 2004).
Para Alves da Silva e Silva (2008), o conceito de economia solidária é algo que está em construção e apresenta várias acepções. O que nos dias de hoje denomina-se por economia solidária “ficou por décadas imerso, sob títulos como autogestão, cooperativismo, economia informal ou economia popular” (LECHAT, 2005).
Assim, partindo de uma definição da economia solidária como conjunto de atividades contribuindo para a democratização da economia a partir de engajamentos de cidadania (LAVILLE, 1999), ao nosso ver, o desafio que se coloca a esse fenômeno não é o de substituição da ação estatista — como, por exemplo, numa perspectiva filantrópica —, sintomática de um processo de desregulação da economia. Mas, ao contrário, seu objetivo é muito mais o de uma articulação junto à esfera pública a fim de produzir um reencastramento da economia num projeto de integração social e cultural.
Para França Filho (2007) a compreensão substantiva da economia pode, em resumo, associar a ideia de economia a toda forma de produção e de distribuição de riqueza – o que significa assumir o pressuposto básico de uma definição de economia como economia plural. A noção de economia plural de se pensar uma outra forma de produção e distribuição de riqueza, isto é, uma economia não necessariamente contra o mercado (imaginando-se ingenuamente ou autoritariamente que ele possa ser aniquilado), mas uma economia com mercado, mas sob a condição de que este seja submetido a outros princípios (FRANÇA FILHO, 2003). Como as formas de “fazer economia”, de produzir e distribuir riquezas, variaram historicamente nas diferentes culturas humanas, pode-se reconhecer diferentes economias, o que Polanyi (1983) denomina de diferentes princípios do comportamento econômico: o mercado autorregulado, a redistribuição, a reciprocidade e a domesticidade.
Arruda (2000) conceitua a Economia Solidária como uma proposta ideológica de contraponto a economia capitalista. Todavia, não como um programa, mas uma filosofia de vida, que consiste em uma nova forma de pensar o ser humano, a economia e o mundo como um todo. Define como base desta filosofia, os valores da partilha, reciprocidade e solidariedade.
Existem ainda autores que visualizam a Economia Solidária como um movimento social, por ser compreendida como um movimento que luta contra as consequências da desregulamentação econômica e do movimento global de reestruturação produtiva (ALBUQUERQUE, 2003). Abordam ainda que se trata de um movimento social no qual convivem grupos sociais com diferentes concepções e projetos societários, cujas demandas são, em parte, atendidas pelo Estado e mediadas por instituições que dão apoio e assessoria para buscar assegurar a existência e a viabilidade dos chamados empreendimento econômicos solidários (TIRIBA, 2008). Santana Junior (2007) define ainda como um movimento social de tipo novo, por efetivar a convergência entre o velho movimento (movimento operário que reivindica rendas) e o novo movimento social (movimentos temáticos que reivindicam direitos). Todos estes autores apontam a Economia Solidária como contraponto ao capitalismo e defendem em termos metodológicos o apoio do Estado, financiando e criando políticas públicas para a Economia Solidária.
Segundo o Fórum Brasileiro de Economia Solidária - FBES (2003), a Economia Solidária constitui o fundamento de uma globalização humanizadora, de um desenvolvimento sustentável, socialmente justo e voltado para a satisfação racional das necessidades de cada um e de todos os cidadãos da Terra, seguindo um caminho intergeracional de desenvolvimento sustentável na qualidade de sua vida. Já os apontamentos do Ministério do Trabalho e Emprego - MTE (2008) definem a Economia Solidária como um jeito diferente de produzir, vender, comprar e trocar o que é preciso para viver, sem explorar os outros, sem querer levar vantagem, sem destruir o ambiente, e cooperando, fortalecendo o grupo, cada um pensando no bem de todos e no próprio bem.
Segundo os autores (FRANÇA FILHO E LAVILLE, 2004), como critérios da Economia Solidária tem-se: 1. Pluralidade de princípios econômicos (utilização de diferentes fontes de recursos –mercado, poderes públicos e práticas reciprocitárias), 2. Autonomia institucional (independência e autonomia na gestão), 3. Democratização dos processos decisórios, 4. Sociabilidade comunitária-pública (valorização de relações comunitárias e afirmação do princípio de alteridade), 5. Finalidade multidimensional (além da dimensão econômica, a organização internaliza uma dimensão social, cultural, ecológica e política, no sentido de projetar-se um espaço público).
A Economia Solidária, portanto, constitui-se em uma das formas de os sujeitos contestarem o sistema, seja por meio dos princípios nos quais os trabalhadores inseridos nesses empreendimentos estão respaldados, seja pela compreensão dos mesmos em relação ao modo com que ocorre a produção e comercialização existentes, em que predominam a individualidade, a competitividade e a consequente exclusão social (GOERCK e FRAGA, 2010). Ela compreende o conjunto de atividades econômicas de produção, distribuição, consumo, poupança e crédito, organizadas sob a forma de autogestão (ALVES ET AL.,2016).
Para Carvalho (2011), a implementação da economia solidária como política pública se insere em um contexto de transformações do mundo do trabalho, “que demandam do poder público respostas para relações de trabalho distintas do emprego assalariado”. Foi a partir de tais condições que o Governo Federal “assumiu o desafio de implementar políticas que estendam ações de inclusão, proteção e fomento aos trabalhadores/as que participam das demais formas de organização do mundo do trabalho entre elas, as iniciativas de economia solidária”. Considera ainda que, “ao constituírem um modo de produção alternativo ao capitalismo, onde os próprios trabalhadores/as assumem coletivamente a gestão de seus empreendimentos econômicos, as iniciativas de economia solidária vêm apontando para soluções mais definitivas à falta de trabalho e renda”.
No entanto, observam-se os críticos à Economia Solidária, como Vainer (2000) que a define como uma utopia experimental. Para o autor, diversos órgãos como o Banco Mundial, o Banco Interamericano de Desenvolvimento e outras agências multilaterais ou nacionais, como o Comunidade Solidária, estão vendendo a ideia do desenvolvimento local como alternativa para as periferias. Para ele isto seria uma estratégia ideológica2 e política, que, na melhor das hipóteses, pretende compensar a miséria engendrada pelo desenvolvimento do capitalismo e, quase sempre, acabar por produzir apenas alguns mecanismos de controle político das populações miseráveis. Sob essa perspectiva, o autor afirma que a Economia Solidária não se apresenta como alternativa global ao projeto capitalista liberal. Entretanto, em certas circunstâncias, as associações solidárias podem oferecer a vivência, mesmo que limitada no tempo e na qualidade. Afirma ainda que a importância da Economia Solidária reside no fato dela se colocar como um elemento fundamental de combate à desesperança. Por isso aborda uma utopia experimental: “porque utopia é uma coisa que não existe; de outro, porque experimental é algo que se vive” (VAINER, 2000).
França Filho (2006b) também apresenta certos contrapontos sobre o crescimento súbito do tema economia solidária, afirmando que existem problemas, com a utilização errônea do tema da economia solidária muitas vezes é captado, por certas estruturas de governo, como mais um modismo, apoiando-se, assim, em bases muito frágeis de tratamento da questão da geração de trabalho e renda.
Deste conjunto de definições conceituais e olhares sistêmicos sobre os contornos e propriedades da Economia Solidária, na perspectiva do Desenvolvimento Local, objeto central deste artigo, é possível identificar dois campos de interpretação que impactam sobre as estratégias e as operações deste conjunto de atividades inovadoras que está apenas a iniciar sua articulação ainda como casos de sucesso para avançar para novo sistema.
Um campo conceitual tem como centro a transformação sócio econômica a partir do refazer a economia em seu cotidiano através dos empreendimentos econômicos solidários estabelecendo novas relações entre si e com os consumidores, no seio da sociedade civil, ressignificando o próprio mercado nos territórios de influência. Outro campo conceitual centra o processo de transformação na elaboração de programa e políticas públicas, a partir de governos para, através de empreendimentos o processo chegue ao cotidiano das pessoas. Este é um ponto do debate estratégico que merece o centro dos esforços dos sujeitos da Economia Solidaria na atualidade.
3 FALANDO EM DESENVOLVIMENTO LOCAL
Segundo Oliveira (2002), o debate acerca do conceito de desenvolvimento é bastante rico no meio acadêmico, principalmente quanto à distinção entre desenvolvimento e crescimento econômico, pois muitos autores atribuem apenas os incrementos constantes no nível de renda como condição para se chegar ao desenvolvimento, sem, no entanto, se preocupar como tais incrementos são distribuídos. Deve-se acrescentar que “apesar das divergências existentes entre as concepções de desenvolvimento, elas não são excludentes. Na verdade, em alguns pontos, elas se completam” (SCATOLIN, 1989, p.24).
Desde os anos 60 que se argumenta que o crescimento econômico é uma simples variação do PIB (FURTADO,1961), enquanto desenvolvimento deve ser caracterizado como mudanças qualitativas no modo de vida das pessoas, nas instituições e nas estruturas produtivas (ALLEN; THOMAS, 2000).
Para a escola econômica estruturalista que inclui esses autores, desenvolvimento é o crescimento econômico (incrementos positivos no PIB e RIB) transformado para satisfazer as mais diversificadas necessidades das pessoas, envolvendo, principalmente, alimentação, saúde, habitação, educação, segurança, transporte e lazer, dentre outras (MITSCHEIN, ROCHA e VASCONCELLOS SOBRINHO, 2013). Para estes autores, o que se evidencia na linha de raciocínio da economia estruturalista é que embora crescimento econômico não é por si só desenvolvimento por via de mudanças qualitativas no modo de vida das pessoas, ele é condição para que este desenvolvimento aconteça. Neste sentido, são consideradas sociedades desenvolvidas e sociedades em desenvolvimento àquelas que são capazes de produzir continuamente e na mesma proporção de atendimento das necessidades das coletividades que também se multiplicam ao longo da história (MITSCHEIN, ROCHA e VASCONCELLOS SOBRINHO, 2013).
O desenvolvimento, em qualquer concepção, deve resultar do crescimento econômico acompanhado de melhoria na qualidade de vida, ou seja, deve incluir “as alterações da composição do produto e a alocação de recursos pelos diferentes setores da economia, de forma a melhorar os indicadores de bem-estar econômico e social (pobreza, desemprego, desigualdade, condições de saúde, alimentação, educação e moradia)” (VASCONCELLOS e GARCIA, 1998, p. 205).
O desenvolvimento deve ser encarado como um processo complexo de mudanças e transformações de ordem econômica, política e, principalmente, humana e social, assim como, segundo Mitschein, Rocha e Vasconcellos Sobrinho (2013) o processo de desenvolvimento deve ser entendido como contínuo e de variação de sociedade para sociedade em que alguns países levaram séculos para alcançar e outros sobrepuseram suas hegemonias a partir do avanço da lógica capitalista pós revolução industrial. Para Oliveira (2002), desenvolvimento nada mais é que o crescimento – incrementos positivos no produto e na renda – transformado para satisfazer as mais diversificadas necessidades do ser humano, tais como: saúde, educação, habitação, transporte, alimentação, lazer, dentre outras. Segundo Sen (1999), desenvolvimento significa remover os obstáculos para que uma pessoa possa fazer aquilo que quer e pode fazer na vida, significa superar o analfabetismo, a falta de saúde, impossibilidade de acesso a recursos e a ausência de liberdades civis e políticas. O desenvolvimento enquanto liberdade traz em seu bojo a noção de igualdade de gênero, redução da pobreza, acesso ao consumo, democracia, direitos humanos e democracia (SEN, 1999).
Ainda com Oliveira (2002), para esclarecer a controvérsia entre o conceito de crescimento econômico e o conceito de desenvolvimento, pensar em desenvolvimento é, antes de qualquer coisa, pensar em distribuição de renda, saúde, educação, meio ambiente, liberdade, lazer, dentre outras variáveis que podem afetar a qualidade de vida da sociedade. O autor continua que na literatura especializada em economia é muito comum associar desenvolvimento com industrialização, pois a indústria é responsável por incrementos positivos no nível do produto, no assim chamado crescimento econômico. Isso ocorre, principalmente, devido à ampliação da atividade econômica advinda dos efeitos de encadeamento oriundos do processo de industrialização. Tais efeitos servem para aumentar a crença de que a industrialização é indispensável para se obter melhores níveis de crescimento e de qualidade de vida. Essa é a razão pela qual todos os países do mundo almejam tanto industrializar seu território.
Por muito tempo foi esquecido que as pessoas são tanto os meios quanto o fim do desenvolvimento econômico (OLIVEIRA, 2002), e o autor ainda afirma que o que importa, na verdade, mais do que o simples nível de crescimento ou de industrialização é o modo como os frutos do progresso, da industrialização, do crescimento econômico são distribuídos para a população, de modo a melhorar a vida de todos. Autores como Allen e Thomas (2000) e Furtado (1961), afirma a ideia de que o desenvolvimento continua sendo de fundamental importância para que as sociedades busquem a divisão equilibrada de recursos e poder para uma relação mais harmoniosa entre todos aqueles que fazem parte das sociedades.
Para Mitschein, Rocha e Vasconcellos Sobrinho (2013), o approach do desenvolvimento baseado nas pessoas traz para o centro do debate o tema desenvolvimento humano. Segundo os autores, o approach do desenvolvimento humano se dá pela melhoria da qualidade de vida das pessoas que, por sua vez, é refletido pelo alcance da satisfação dos indivíduos tanto sob a perspectiva objetiva (emprego, renda, objetos possuídos, qualidade da habitação, educação e saúde) quanto sob o viés das condições subjetivas (segurança, privacidade, reconhecimento, afeto).
Na discussão do desenvolvimento humano e das pessoas como centralidade do conceito de desenvolvimento, Sen (1999) argumenta que para melhorar a qualidade de vida das pessoas é necessário expandir as possibilidades de ser, fazer, ter e poder dos indivíduos. Ainda com o autor, propiciar que os indivíduos tenham capacidades funcionais como ser saudável e bem nutrido, capacidades de exercer suas habilidades a partir do exercício do conhecimento adquirido, capacidades de adquirir (consumir) o que desejam e capacidades de poder influenciar sobre tudo aquilo que afetam suas vidas por via da participação nas tomadas de decisões das comunidades em que estão inseridos.
O conceito de desenvolvimento, no entanto, não pode ser desvinculado do de “localidade econômica” que em Arroyo (2007) ganha relevância para além das peculiaridades naturais com potencial econômico, que eventualmente possua.
4 ECONOMIA SOLIDÁRIA COMO ESTRATÉGIA DE DESENVOLVIMENTO LOCAL
No trabalho de França Filho (2007), ele afirma a importância das políticas públicas na efetivação das práticas de economia solidária. Ele afirma, se o campo da economia solidária no Brasil tem evoluído de formas de auto-organização socioeconômica inovadoras para modos de auto-organização políticos também inéditos no âmbito da sociedade civil, hoje tal dinâmica parece complexificar-se e enriquecer-se ainda mais, com a participação cada vez maior dos próprios poderes públicos. Ainda com o autor, a expressão mais acabada dessa relação tem sido o aparecimento e a multiplicação das políticas públicas dedicadas ao assunto, sobretudo no nível das prefeituras municipais.
Ressalta a interação entre os atores dessa política, enfatizando a importância de tais políticas para redefinir as relações entre sociedade civil e poder político, no sentido de sua maior democratização, ampliando efetivamente nossa forma de conceber e realizar a ação pública. Isto porque um aspecto basilar na concepção e implementação de tais políticas diz respeito à necessidade de interações recíprocas entre o poder público e outros atores.
Aborda também o caráter de vocação ao desenvolvimento, devido a transversalidade no modo de intervenção de tais políticas, acima mencionado, decorre de sua segunda vocação, a propensão a se constituir como políticas de desenvolvimento. Ao se dirigirem a um público historicamente excluído, tais políticas respondem a demandas efetivas do campo mais estruturado da economia solidária, mas também induzem processos de auto-organização coletiva e solidária. Neste sentido, a política de geração de trabalho e renda, numa perspectiva sustentável solidária (FRANÇA FILHO, 2006b), associa-se diretamente a uma concepção de desenvolvimento com enfoque territorial e a visão e regulação da economia consubstanciado nessa ideia.
Em resumo, o autor reforça que as práticas de economia popular e solidária no Brasil ganharam em complexidade nos últimos anos, como um campo de atores que inventam alternativas econômicas e políticas inovadoras para a resolução dos problemas cotidianos enfrentados em seus respectivos territórios, decorrentes dos processos de exclusão social. De iniciativas originais no plano socioeconômico, em que também se afirma numa dimensão política forte - seja através da democratização das relações de produção em direção a processos auto gestionários, seja pela afirmação de um novo espaço público de proximidade, naquelas experiências em que se vivencia um outro modo de instituir a economia nos territórios, através de processos de construção conjunta da oferta e da demanda - surgem formas de auto-organização política, indicando a constituição de espaços públicos de um segundo nível (FRANÇA FILHO, 2006a) em relação aos de proximidade. Mais recentemente, constata-se a multiplicação crescente de políticas públicas de economia solidária, fato novo na dinâmica deste campo, uma vez que tais políticas intervêm no seio de espaços públicos em diferentes níveis, redefinindo as relações entre sociedade civil e poder político, numa abordagem ampliada da ação pública.
A economia solidária surge-nos como uma estratégia para um novo modelo de desenvolvimento sustentável, includente e solidário, visto que todos os envolvidos beneficiam dos seus resultados económicos, sociais, políticos e culturais. Sendo que não há qualquer tipo de discriminação entre os envolvidos, havendo total respeito pela raça, etnia, gênero, geração e opção religiosa (ALVES DA SILVA E SILVA, 2008).
Para uma análise das práticas de economia solidária como estratégia de desenvolvimento local, utilizou como estudo de caso o município de Barcarena-PA. O município de Barcarena (Figura 1), no Estado do Pará, possui 127.027 mil habitantes, localiza-se na região do Tocantins e faz parte da Mesorregião Metropolitana de Belém. Barcarena é classificada como médio desenvolvimento, com o índice de 0, 662 (IBGE, 2021). Embora Barcarena seja identificado como um município industrial, devido à presença do complexo Hydro que processa a alumina e o exporta para diversos países, do Porto de Vila do Conde com fluxo de cargas e mercadorias e a proximidade com Belém e seu mercado consumidor, ainda mantém uma face rural. Barcarena abrange, além da própria Sede, a Região das Estradas e a Região das Ilhas e outra sediada na Vila dos Cabanos, abrangendo toda a região do Murucupí e ainda a Região da Vila do Conde.
Figura 1. Localização do Município de Barcarena, Pará. |
Fonte: Site oficial da prefeitura de Barcarena. |
Em 2015 foi aprovada a Lei Municipal n˚ 2163/2015, de 01 de junho de 2015, que institui no Município de Barcarena, a Política Municipal de Fomento à Economia Solidária e o Selo de economia Solidária e cria o Conselho Municipal de Economia Solidária e o Fundo Municipal de Economia Solidária e dá outras providencias.
Esta lei, em seu artigo 1°, tem como objetivo de fomentar à Economia Solidária no Município de Barcarena/PA, a qual terá como diretriz fundamental a promoção da economia solidária e o desenvolvimento de grupos organizados auto gestionários de atividades econômicas, visando à sua integração no mercado e a auto sustentabilidade de suas atividades.
No art. 3°, a Política Municipal de Fomento à Economia Solidária, para atingir seus objetivos, deverá promover a elaboração e a compatibilização de ações específicas, a partir dos seguintes instrumentos gerais: I -a geração de produto ou serviço, por meio da organização, da cooperação, da gestão democrática e da solidariedade; II -a distribuição equitativa das riquezas produzidas coletivamente; III -a autogestão; IV -o desenvolvimento integrado e sustentável; V -o respeito ao equilíbrio dos ecossistemas; VI -a valorização do ser humano e do trabalho; VII -o estabelecimento de relações igualitárias entre homens e mulheres; VIII -o empoderamento social; IX -valorização da cultura; X -o respeito aos costumes e tradições culturais; XI -segurança no trabalho e qualidade de vida do trabalhador.
No art. 12, fica criado o Conselho Municipal da Economia Solidária -CMES. E no art. 16, fica criado o Fundo Municipal de Economia Solidária (FMES) que se destinará a apoiar, subsidiar, avalizar operação de crédito, qualificar, organizar, instrumentalizar e orientar os empreendimentos de Economia Solidária. E o Selo de Economia Solidária (no art. 19), para identificação, pelos consumidores, do caráter solidário e ecológico dos insumos, da produção, da industrialização, do transporte e da comercialização dos produtos.
Apesar de ter sido aprovada em 2015, apenas em 2018 a prefeitura de Barcarena, por meio da Secretaria de Trabalho e Emprego (SEMUTE), tem desenvolvido ou apoiado iniciativas que permitam promover a implementação desta lei, como a eleição dos conselheiros de economia solidária.
A atuação da prefeitura diante da aprovação da lei e das ações desenvolvidas, segundo Singer (2002), constitui um importante papel do Estado como financiador e apoiador desse tipo de organizações, além da necessidade de conciliar uma lógica de competição com cooperação. Além disso, para Carvalho (2011), parte-se do princípio de que a economia solidária deve estar pautada em uma nova lógica de desenvolvimento, que seja capaz de combinar o crescimento econômico (a finalidade econômica) com desenvolvimento humano (a partir de um ponto de vista humanista).
Em 2019, A prefeitura de Barcarena promoveu o encontro de capacitação sobre Economia Solidária. O evento foi organizado por meio da parceria entre a prefeitura e governo do estado, através da Secretaria de assistência social, trabalho, emprego e Renda (SEASTER), com apoio do Senac. Dezenas de artesãos e catadores, além de comerciantes, participaram. Desde que foi aprovada a lei municipal que garante apoio à Economia Solidária, ao menos 17 empreendimentos de Economia Solidária foram cadastrados, sendo a maioria voltados para a área de artesanato, enquanto alguns são da área da agricultura familiar. Segundo a coordenadora do departamento de economia solidária da SEMUTE, a Economia Solidária é um conjunto de atividades empreendedoras geradoras de emprego e renda para a população. Por isso, que o governo municipal tem apoiado a capacitação (entre os temas estão o associativismo e o cooperativismo).de pequenos empreendedores.
Para Alves da Silva e Silva (2008), a qualificação desses atores para executarem suas atividades é um fator de suma importância para sustentar seus postos de trabalho. Os autores afirmam que a economia solidária tem enfrentado um problema que se afigura constante, o fato acontece porque os trabalhadores inseridos no âmbito da economia solidária estão mais habituados e preparados para o trabalho físico e pouco qualificado, denotando-se alguma falta de arcaboiço técnico-profissional. Assim sendo, torna-se necessário a consolidação de instituições locais, públicas e privadas, na formação dos cidadãos tornando-os mais qualificados e aptos a enfrentar novos desafios.
Outra ação promovida pela prefeitura foi o Verão Fest Ecologia 2019, onde se realizou a I Feira da Economia Solidária, reunindo os principais mestres artesãos e trabalhadores manuais do município. Com a exposição e comercialização dos produtos, o objetivo foi divulgar a arte produzida em Barcarena e fortalecer a geração de renda aos profissionais locais.
Formada por cooperativas e associações, a economia solidária é um conjunto de atividades econômicas que busca a geração de renda por meio da união de forças e talentos e do consumo consciente, reforçando as relações entre campo e cidade e entre produtores e consumidores. Em Barcarena, a economia solidária é uma das frentes de atuação da SEMUTE, que auxilia no desenvolvimento de atividades para geração de emprego e renda aos moradores do município.
Em 2020 ocorreu a edição ao I ciclo de Feirinhas Itinerantes da Economia Solidária do Município de Barcarena. Teve como objetivo: Fomentar a economia local. Em vários pontos do município, ocorreram as feiras. Estiveram presente artesão do município, agricultores familiares, trabalhadores manuais e pequenos empreendedores, vendendo e expondo seus produtos.
Estas feiras realizadas pela prefeitura, visa valorizar as potencialidades locais, que segundo Alves da Silva e Silva (2008), a valorização das potencialidades locais e na diversidade cultural contribuir para uma nova dinâmica do mercado interno através da promoção do potencial de desenvolvimento regional, visando a criação de novos postos de trabalho, a fixação das populações, a promoção do meio-ambiente e a melhoria da qualidade de vida dos cidadãos, estabelecendo-se, para o efeito, novos sistemas de apoio às pequenas e micro empresas, aos serviços de carácter social, aos produtos inovadores e às artes e ofícios tradicionais, bem como à promoção de agentes e iniciativas de animação local. Ratificado por Gomes et al. (2007), quando diz que a indução do desenvolvimento local ou territorial requer a combinação de políticas adequadas com as necessidades e potencialidades locais.
Além de valorizar o produto local as feiras buscam expor e conscientizar a população sobre a importância de comprar produtos locais e dos empreendimentos de Economia Solidária, como afirmam Tauile (2002) e Singer (2002) que por meio da constituição de redes de consumo solidário, na qual a sociedade deve se conscientizar da compra de produtos e serviços de organizações solidárias, criando-se assim, preferências para as organizações da Economia Solidária. O que fortalece os empreendimentos e gera emprego e renda local.
Neste ano de 2021, foi lançado o formulário que visa o apoio e fomento a economia solidária. A SEMUTE, por meio da coordenadoria da economia solidária, criou dois formulários virtuais para realizar o cadastro das entidades de apoio e fomento à economia solidária e dos empreendimentos econômicos solidários de Barcarena. O objetivo é construir um diagnóstico para possibilitar o mapeamento das entidades e empreendimentos por território, que irá orientar as ações de apoio e fomento à economia solidária no município. Podem ser cadastradas associações, cooperativas e grupos de produção econômico solidário.
Outra ação de grande importância para o desenvolvimento local, foi o Projeto Tipitix. É um projeto de empreendedorismo agroalimentar comunitário, realizado pelo Fundo de Sustentabilidade Hydro e Fundação Mutsui Bussan do Brasil. A prefeitura de Barcarena, por meio da Secretaria de Agricultura, apoiou e participou da iniciativa, que promoverá o trabalho de agricultores familiares locais, empreendedores e organizações comunitárias, através do ciclo de desenvolvimento de negócios e dos apoios que o projeto oferece para aumentar a qualidade e o valor agregado da produção local.
O projeto Tipitix, fortalece e qualifica os empreendimentos de economia solidária, principalmente, na área da agricultura familiar, contribuindo para o desenvolvimento local. Para Alves da Silva e Silva (2008), a inserção da economia solidária nos processos de desenvolvimento local fortalece a combinação das ações estruturantes de acesso às alternativas locais de criação de emprego com melhoria nas condições de vida da população. Os autores reforçam a democratização do acesso e a ampliação de programas e projetos que contribuam para a criação e fortalecimento das redes, das cadeias, das centrais de comercialização e do sistema de comércio justo, de forma a promover a sustentabilidade aos diversos empreendimentos solidários. Assim torna-se necessário fortalecer a Economia Solidária como estratégia de inclusão econômica e social, sendo que esta oferece um caminho com potencial para o desenvolvimento local sustentável e solidário.
Ainda com os autores, o desenvolvimento local é uma forma de melhorar a vida de todas as pessoas, humana e socialmente, essa melhoria repercute-se nas gerações presentes quer nas vindouras tornando-se assim em desenvolvimento sustentável. Neste sentido, quando se pensa em desenvolvimento local não se pode esquecer o protagonismo local e a mudança de paradigma, em promoção da democracia participativa, em construção de ambientes equilibrados e produtivos e na associação com preceitos fundamentais da Economia Solidária (Gomes et al., 2007). Seguindo estes preceitos temos que o desenvolvimento local se rege pelos princípios: a) democracia participativa: as políticas de desenvolvimento local devem fazer-se acompanhar da intensificação de todas as formas de participação e protagonismo do povo, de forma a garantir a inclusão justa de todos os sectores da sociedade no desenvolvimento local e nacional; b) organização popular: o êxito do modelo depende da capacidade organizativa e do compromisso de todos os sujeitos do desenvolvimento, e por eles é necessário promover e garantir a participação e o protagonismo das comunidades nos processos de diagnóstico, desenho e consolidação das propostas; c) desconcentração territorial: a estratégia territorial obedece à necessidade de superar o modelo centralizador, promotor da desigualdade geográfica e do subdesenvolvimento regional, e de oferecer a todas as comunidades do país oportunidades iguais de desenvolvimento considerando as potencialidades locais e a inter-relação de comunidades e regiões; d) redistribuição da terra: os fins da justiça social, soberania alimentar e equilíbrio territorial dependem do desenvolvimento rural integral e de uma justa redistribuição de terras. Segue daí o valor estratégico outorgado à luta contra o latifúndio, e em favor da reforma agrária integral, como meios para garantir o direito à terra dos camponeses e demais produtores agropecuários; e) ambiente equilibrado e produtivo: para conseguir um desenvolvimento equitativo e duradouro é necessário garantir um aproveitamento sustentável dos recursos naturais e o respeito ao meio ambiente em todas as atividades produtivas, industriais e extrativas; f) dar prioridade à produção nacional: o modelo coloca especial ênfase na recuperação, fortalecimento, ativação e criação de atividades produtivas nacionais, e na sua diversificação e eficiência; g) independência e pertinência tecnológica: não se trata de promover a simples aquisição de tecnologias, mas de conjugar os saberes tradicionais com os avanços tecnológicos, sob critérios de pertinência. Desta forma deve-se combinar a tecnologia artesanal com a de última geração, segundo a necessidade de cada atividade produtiva; h) soberania alimentar: fortalecer a capacidade da nação para autos sustentabilidade. Daí o valor estratégico de ambos os elementos, desde o ponto de vista da economia sustentável, a defesa e a segurança nacional; i) cooperativismo: as formas de associação económica e solidária constituem a modalidade básica de organização para o trabalho em prol dos objetivos do desenvolvimento local. O cooperativismo como modelo de organização põe em prática os princípios de interesse coletivo, da solidariedade, participação igualitária e inclusão social; j) trabalho não-dependente: por meio do cooperativismo e das associações de produção e comercialização busca-se a transformação das relações de produção capitalista dependentes, para formar uma rede de cooperativas e de produtores independentes mutuamente relacionados com base em interesses comuns; k) cultura local: esse modelo valoriza e fortalece as vocações e particularidades locais, regionais e nacionais, levando em conta os saberes e culturas populares, a história das comunidades, das etnias e das suas raízes; l) igualdade de género: a plena incorporação das mulheres, em igualdade de condições na vida política, económica e cultural do país, é um pressuposto fundamental para superar as desigualdades e garantir um desenvolvimento sustentável e equitativo para todos e todas; m) comunicação livre e alternativa: a importância de fortalecer e promover as formas e meios de comunicação alternativas das comunidades é vital e necessária para o êxito das novas dinâmicas de desenvolvimento. Por isso, de forma a garantir a liberdade de informação e expressão a todos, as experiências de desenvolvimento local devem promover as iniciativas de comunicação independentes e comunitárias.
Como ação de continuidade da execução da lei de economia solidária, foi realizada, neste ano de 2021, o fórum de eleição das cinco entidades de apoio e fomento à economia solidária e cinco de empreendimentos econômicos solidários para o biênio 2021-2023 do Conselho Municipal de Economia Solidária. O evento foi promovido pela Prefeitura de Barcarena, por meio da Secretaria Municipal de Trabalho e Emprego (SEMUTE). O Fórum também ofertou uma formação aos participantes sobre a Política de Economia Solidária no Brasil, no Estado e em Barcarena. Houve, ainda, palestra de representante da Secretaria Estadual de Trabalho, Emprego e Renda (SEASTER), da Rede Todos Pelo Trabalho e da Coordenadoria de Economia Solidária, ligada à SEMUTE. O Conselho tem um papel importante e fundamental de consolidar a política de economia solidária, por meio da gestão compartilhada das políticas públicas, assim como reunir as entidades para o reconhecimento e fortalecimento da economia solidária no município.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Concluímos que a economia solidária pode ser usada como estratégia para o desenvolvimento local, pois permite em sua estrutura e metodologia ações de fomento e geração de emprego e renda, qualidade de vida, valorização das potencialidades locais, articulação entre os atores envolvidos de forma democrática e socialmente justa.
Por outro lado, a sorte da economia solidária depende de um novo sistema de regulação, capaz de ordenar dinamicamente as regras do jogo econômico, de modo a expandir as práticas de autogestão e viabilizar uma transposição de escala das iniciativas que proliferam em pequena dimensão. Bem como de um processo formativo não apenas técnico, mas gerencial, o princípio da autogestão é fundamental.
Uma questão política, portanto, de escolha entre modelos de desenvolvimento, de chamada e fortalecimento de novos atores sociais e de direcionamento dos recursos públicos. Seu avanço requer que a questão seja assimilada pelas instituições políticas e se reflita na conduta do Estado e nas opções de governo. De modo crescente, o fato vem se verificando no Brasil, especialmente no âmbito local, por meio de políticas municipais (GAIGER, 2004).
Para Souza e Augusto Junior (2020), as conexões e articulações entre os empreendimentos de economia solidária em seus rendimentos monetários e não monetários - gerados por eles próprios - e também, quando articulados com políticas governamentais e de Estado condizentes, permite, de fato, um grande potencial para eles se fortalecerem e se desenvolverem, incluindo cada vez mais trabalhadores e apontando para uma nova economia, capaz de promover desenvolvimento socioeconômico efetivamente includente.
Assim sendo, podemos dizer que a Economia Solidária permite fomentar o desenvolvimento local, pois segundo Gomes et al. (2007), valoriza a diversidade, preocupa-se com a relação do ser humano com o meio ambiente do qual é parte, oferece alternativas para uma construção social de desenvolvimento econômico, para a desmistificação das técnicas, para a democratização da ciência e da tecnologia e para o pleno exercício da cidadania. A verdade é que a Economia Solidária se tornou num importante instrumento de combate à exclusão social e à pobreza, pois permite a incrementação do emprego e rendimento para muitos e variados trabalhadores. Além disso, contesta o modelo capitalista propondo a construção de relações econômicas mais justas, solidárias e sustentáveis, fomentando desta forma o desenvolvimento local justo e solidário (ALVES DA SILVA E SILVA, 2008).
No que tange o referido assunto, como forma de contribuição para pesquisas futuras, a discussão mais profunda sobre políticas públicas de implementação desta economia nos municípios; assim como, o acompanhamento ao longo do tempo de seus efeitos sobre a economia municipal; a análise dos atores envolvidos e sua organização social para a efetividade da economia solidária; são temas que ainda precisam ser aprofundados, a nível municipal.
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[1] O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de nível superior-Brasil (CAPES).
[2] Doutoranda em Administração pela UNAMA. Servidora pública do município de Barcarena, Pa.
[3] Doutora em Desenvolvimento Local pela Swansea University (Reino Unido). Docente PPAD/UNAMA.
[4] Doutor em Administração. Docente PPAD/UNAMA.
[5] Mestre em Economia. Doutorando em Desenvolvimento Urbano. Docente UNAMA.